Skip to main content

Capítulo Dezesseis

O Rei Citraketu Encontra-se com o Senhor Supremo

Como se relata neste capítulo, Citraketu foi capaz de falar com seu filho morto e ouvi-lo discorrer sobre a verdade da vida. Quando Citraketu ficou apaziguado, o grande sábio Nārada lhe deu um mantra, e, cantando aquele mantra, Citraketu encontrou refúgio aos pés de lótus de Saṅkarṣaṇa.

A entidade viva é eterna. Portanto, não nasce nem morre (na hanyate hanyamāne śarīre). De acordo com as reações das ativida­des fruitivas, obtém-se nascimento em várias espécies de vida entre pássaros, animais selvagens, árvores, seres humanos, semideuses e assim por diante, mudando, então, de um corpo a outro. Por um certo período, alguém recebe uma determinada espécie de corpo e, em uma relação infundada, age como filho ou pai. Neste mundo material, todas as relações mantidas com amigos, parentes ou inimigos consistem em dualidade, na qual, baseados na ilusão, sentimo-nos felizes ou infelizes. A entidade viva é realmente uma alma espiritual parte integrante de Deus e que nada tem a ver com as relações no mundo de dualidade. Portanto, Nārada Muni acon­selhou Citraketu a não se lamentar por aquele que estava ali fazendo as vezes de seu filho morto.

Após ouvirem as instruções de seu filho morto, Citraketu e sua esposa puderam entender que todas as relações neste mundo mate­rial são causas de sofrimento. As rainhas que ministraram veneno ao filho de Kṛtadyuti ficaram muitíssimo envergonhadas. Elas expiaram seu ato pecaminoso de matar a criança e abandonaram suas aspira­ções a ter filhos. Em seguida, Nārada Muni cantou orações em louvor a Nārāyaṇa, que existe como catur-vyūha, e instruiu Citraketu transmitindo-lhe ensinamentos acerca do Senhor Supremo, que cria, mantém e aniquila tudo e que é o mestre da natureza material. Após instruir o rei Citraketu dessa maneira, ele regressou a Brahmaloka. Essas instruções sobre a Verdade Absoluta se chamam mahā-vidyā. Após ser iniciado por Nārada Muni, o rei Citraketu entoou o mahā­vidyā e, depois de uma semana, ficou na presença do Senhor Saṅ­karṣaṇa, que Se fazia acompanhar dos quatro Kumāras. O Senhor estava esmeradamente vestido com roupas azuis, e usava um elmo e adornos de ouro. Seu rosto parecia muito feliz. Na presença do Senhor Saṅkarṣaṇa, Citraketu prestou reverências e se colocou a oferecer orações.

Em suas orações, Citraketu disse que milhões de universos repousam nos poros de Saṅkarṣaṇa, que, ilimitado, não tem começo nem fim. Entre os devotos, a eternidade do Senhor O faz famoso. A diferença entre prestar adoração ao Senhor ou aos semideuses é que quem adora o Senhor também se torna eterno, ao passo que qualquer bênção outorgada pelos semideuses não é permanente. Quem não se torna devoto não pode entender a Suprema Personalidade de Deus.

Depois que Citraketu concluiu suas orações, o ilimitado Senhor Supremo revelou-Se a Citraketu.

Texto

śrī-bādarāyaṇir uvāca
atha deva-ṛṣī rājan
samparetaṁ nṛpātmajam
darśayitveti hovāca
jñātīnām anuśocatām

Sinônimos

śrī-bādarāyaṇiḥ uvāca — Śrī Śukadeva Gosvāmī disse; atha — assim; deva-ṛṣiḥ — o grande sábio Nārada; rājan — ó rei; samparetam — morto; nṛpa-ātmajam — o filho do rei; darśayitvā — tornando visível; iti — assim; ha — na verdade; uvāca — explicando; jñātīnām — a todos os parentes; anuśocatām — que estavam se lamentando.

Tradução

Śrī Śukadeva Gosvāmī disse: Meu querido rei Parīkṣit, através de seu poder místico, o grande sábio Nārada trouxe o filho morto para ser visto por todos os parentes que se lamentavam e, então, falou o seguinte.

Texto

śrī-nārada uvāca
jīvātman paśya bhadraṁ te
mātaraṁ pitaraṁ ca te
suhṛdo bāndhavās taptāḥ
śucā tvat-kṛtayā bhṛśam

Sinônimos

śrī-nāradaḥ uvāca — Śrī Nārada Muni disse; jīva-ātman — ó entidade viva; paśya — vê só; bhadram — boa fortuna; te — a ti; mātaram — a mãe; pitaram — o pai; ca — e; te — teus; suhṛdaḥ — amigos; bāndha­vāḥ — parentes; taptāḥ — aflitos; śucā — pela lamentação; tvat-kṛtayā — devido a ti; bhṛśam — muito grandemente.

Tradução

Śrī Nārada Muni disse: Ó entidade viva, toda a boa fortuna esteja contigo. Vê só o estado de teu pai e de tua mãe. Em decorrência de tua partida, todos os teus amigos e parentes estão imersos na aflição.

Texto

kalevaraṁ svam āviśya
śeṣam āyuḥ suhṛd-vṛtaḥ
bhuṅkṣva bhogān pitṛ-prattān
adhitiṣṭha nṛpāsanam

Sinônimos

kalevaram — corpo; svam — teu próprio; āviśya — entrando em; śeṣam — o restante da; āyuḥ — duração da vida; suhṛt-vṛtaḥ — cercado por teus amigos e parentes; bhuṅkṣva — simplesmente desfruta de; bhogān — todas as opulências desfrutáveis; pitṛ — por teu pai; prat­tān — concedidas; adhitiṣṭha — aceita; nṛpa-āsanam — o trono do rei.

Tradução

Porque morreste prematuramente, ainda te resta um período para viver. Portanto, podes voltar a teu corpo e desfrutar do resto de tua vida, cercado por teus amigos e parentes. Aceita o trono real e todas as opulências ofertadas por teu pai.

Texto

jīva uvāca
kasmiñ janmany amī mahyaṁ
pitaro mātaro ’bhavan
karmabhir bhrāmyamāṇasya
deva-tiryaṅ-nṛ-yoniṣu

Sinônimos

jīvaḥ uvāca — a entidade viva disse; kasmin — em qual; janmani — nascimento; amī — todos esses; mahyam — a mim; pitaraḥ — pais; mātaraḥ — mães; abhavan — foram; karmabhiḥ — pelos resultados da ação fruitiva; bhrāmyamāṇasya — que estou vagando; deva-tiryak — dos semideuses e dos animais inferiores; nṛ — e da espécie humana; yoniṣu — nos ventres.

Tradução

Através do poder místico de Nārada Muni, a entidade viva voltou a seu corpo morto, onde ficou por um curto período de tempo, e, em resposta ao pe­dido de Nārada Muni, disse: De acordo com os resultados de minhas atividades fruitivas, eu, o ser vivo, transmigro de um corpo a outro, ora indo às espécies dos semideuses, ora às espécies dos animais inferiores, ora aos vegetais, ora à espécie humana. Portanto, em que nascimento estes foram minha mãe e meu pai? Ninguém é de fato minha mãe e pai. Como posso aceitar que essas duas pessoas sejam meus pais?

Comentário

SIGNIFICADO—Aqui, torna-se bem claro que o ser vivo entra em um corpo mate­rial que é como uma máquina criada pelos cinco elementos grossei­ros da natureza material (terra, água, fogo, ar e céu) e pelos três elementos sutis (mente, inteligência e ego). Como se confirma na Bhagavad-gītā, existem duas identidades separadas, chamadas de natureza inferior e superior, ambas pertencentes à Suprema Personalidade de Deus. De acordo com os resultados das ações fruitivas da entidade viva, ela é forçada a entrar nos elementos materiais em diferentes formas de corpos.

Desta vez, supunha-se que a entidade viva era filho de Mahārāja Citraketu e da rainha Kṛtadyuti porque, de acordo com as leis da natureza, ela entrara em um corpo feito pelo rei e pela rainha. Na verdade, entretanto, ela não era filho deles. O ser vivo é filho da Suprema Personalidade de Deus, mas, como deseja desfrutar deste mundo material, o Senhor Supremo lhe confere a oportunidade de entrar em vários corpos. A entidade viva não tem uma verdadeira relação com o corpo material que obtém de seu pai e mãe materiais. Ela é parte integrante do Senhor Supremo, mas tem permissão de aceitar diferentes corpos. O corpo criado pelos ditos pai e mãe não possuem realmente nenhuma conexão com seus supostos criadores. Portanto, a entidade viva negou terminantemente que Mahārāja Citraketu e sua esposa fossem seu pai e sua mãe.

Texto

bandhu-jñāty-ari-madhyastha-
mitrodāsīna-vidviṣaḥ
sarva eva hi sarveṣāṁ
bhavanti kramaśo mithaḥ

Sinônimos

bandhu — amigos; jñāti — membros familiares; ari — inimigos; madhyastha — neutros; mitra — benquerentes; udāsīna — indiferentes; vidviṣaḥ — ou pessoas invejosas; sarve — todas; eva — na verdade; hi — decerto; sarveṣām — de todas; bhavanti — tornam-se; kramaśaḥ — aos poucos; mithaḥ — umas das outras.

Tradução

Neste mundo material, que segue em frente parecendo um rio que arrasta a entidade viva, todas as pessoas se tornam amigos, parentes ou inimigos no decorrer do tempo. Elas também agem com neutralidade, como mediadoras, desprezam umas às outras e cultivam muitas outras relações. Entretanto, apesar desses vários tipos de convívio, ninguém possui um relacionamento permanente.

Comentário

SIGNIFICADO—Nossa experiência prática neste mundo material é que a mesma pessoa que hoje é nosso amigo amanhã pode tornar-se nosso inimi­go. As relações que temos como amigos ou inimigos, homens da família ou estranhos, são, na verdade, o resultado de diferentes relacionamentos. Citraketu Mahārāja se lamentava por seu filho, que agora estava morto, mas ele poderia ter ponderado de outra maneira a situação. “Esta entidade viva”, ele poderia ter pensado, “foi meu inimigo em minha vida anterior, e agora, tendo aparecido como meu filho, está me deixando prematuramente apenas para me causar dor e agonia.” Por que ele não deveria considerar que seu filho morto fora seu antigo inimigo e, em vez de ficar lamentando-se, por que não se sentir feliz com a morte do inimigo? Como se afirma na Bhagavad-gītā (3.27), prakṛteḥ kriyamāṇāni guṇaiḥ karmāṇi sarvaśaḥ: de fato, tudo acontece devido à nossa associação com os modos da natureza material. Portanto, alguém que, em contato com o modo da bon­dade, é meu amigo hoje, pode ser meu inimigo amanhã, ao se deixar influenciar pelos modos da paixão e da ignorância. À medida que os modos da natureza material agem, ficamos iludidos e, em termos das reações de diferentes convívios em diferentes condições, aceita­mos que os outros são amigos, inimigos, filhos ou pais.

Texto

yathā vastūni paṇyāni
hemādīni tatas tataḥ
paryaṭanti nareṣv evaṁ
jīvo yoniṣu kartṛṣu

Sinônimos

yathā — assim como; vastūni — mercadorias; paṇyāni — destinadas ao comércio; hema-ādīni — tais como ouro; tataḥ tataḥ — daqui para ali; paryaṭanti — movem-se; nareṣu — entre os homens; evam — dessa maneira; jīvaḥ — a entidade viva; yoniṣu — em diferentes espécies de vida; kartṛṣu — em diferentes pais materiais.

Tradução

Assim como o ouro e outras mercadorias continuamente são trans­feridos de um lugar a outro no decorrer da compra e da venda, do mesmo modo, a entidade viva, como resultado de suas atividades fruitivas, vaga por todo o universo, sendo injetada por consecutivos pais em diferentes corpos em diferentes espécies de vida.

Comentário

SIGNIFICADO—Já se explicou que o filho de Citraketu era seu inimigo em uma vida passada e agora aparecera como seu filho somente para lhe causar dores mais profundas. Na verdade, com a morte prematura do filho, o pai se desfez em severa lamentação. Alguém poderia apresentar o seguinte argumento: “Se o filho do rei era seu inimigo, como o rei po­deria desenvolver tanta afeição por ele?” Em resposta, apresenta-se o exemplo de que, quando a riqueza de alguém cai nas mãos de seu inimigo, o dinheiro se torna amigo do inimigo. Então, o inimigo pode usá-lo para seus propósitos pessoais. Na verdade, ele pode até mesmo usá-lo para prejudicar o seu proprietário anterior. Portanto, o dinheiro não pertence nem a um nem a outro. O dinheiro sempre é dinheiro, mas, em diferentes circunstâncias, pode ser usado como inimigo ou amigo.

Como se explica na Bhagavad-gītā, não é através de pai ou mãe nenhum que a entidade viva obtém seu nascimento. A entidade viva é uma entidade inteiramente à parte dos supostos pai e mãe. Pelas leis da natureza, a entidade viva é forçada a entrar no sêmen de um pai e ser injetada no ventre da mãe. Ela não controla a escolha da qualidade do pai que ela aceitará. Prakṛteḥ kriyamāṇāni: as leis da natureza forçam-na a aceitar diferentes pais e mães, assim como um bem de consumo que é comprado e vendido. Portanto, a apa­rente relação de pai e filho é um arranjo da prakṛti, a natureza mate­rial. Como não tem sentido, chama-se ilusão.

A mesma entidade viva, às vezes, refugia-se em um pai e em uma mãe sob a forma de bestas e, outras vezes, em pai e mãe humanos. Às vezes, ela aceita um pai e mãe entre os pássaros, e, outras vezes, aceita pai e mãe entre os semideuses. Śrī Caitanya Mahāprabhu, portanto, diz:

brahmāṇḍa bhramite kona bhāgyavān jīva
guru-kṛṣṇa-prasāde pāya bhakti-latā-bīja

Atormentada vida após vida pelas leis da natureza, a entidade viva vaga por todo o universo, em diferentes planetas e em diferentes espécies de vida. Se, de alguma forma, ela for bastante afortunada, entrará em contato com um devoto que a retificará por completo. Então, a entidade viva voltará ao lar, voltará ao Supremo. Portan­to, declara-se:

janame janame sabe pitā mātā pāya
kṛṣṇa guru nahi mile baja hari ei

Na transmigração da alma por diferentes corpos, cada ser, em cada forma de vida – seja humana, animal, vegetal ou sobre-humana – obtém pai e mãe. Isso não é muito difícil. A dificuldade está em obter um mestre espiritual autêntico e em obter Kṛṣṇa. Portanto, o dever do ser humano é não deixar escapar a oportunidade de entrar em contato com o representante de Kṛṣṇa, o mestre espiritual fidedigno. Quem está sob a orientação do mestre espiritual, que é o pai espiritual, pode voltar ao lar, voltar ao Supremo.

Texto

nityasyārthasya sambandho
hy anityo dṛśyate nṛṣu
yāvad yasya hi sambandho
mamatvaṁ tāvad eva hi

Sinônimos

nityasya — da eterna; arthasya — coisa; sambandhaḥ — relação; hi — na verdade; anityaḥ — temporária; dṛśyate — é observada; nṛśu — na sociedade humana; yāvat — enquanto; yasya — de quem; hi — na verdade; sambandhaḥ — relação; mamatvam — propriedade; tāvat — este período; eva — na verdade; hi — decerto.

Tradução

Poucas são as entidades vivas que nascem na espécie humana; muitas outras nascem como animais. Embora ambas sejam entidades vivas, suas relações não são permanentes. Durante algum tempo, um animal pode permanecer sob a custódia de um ser humano, e depois, a posse do mesmo animal pode ser transferida para outros seres humanos. Logo que o animal se vai, o ex-proprietário perde o seu senso de propriedade. Enquanto o animal estiver em sua posse, o dono decerto sentirá afinidade pelo animal, mas logo que este é vendido, a afinidade se esvai.

Comentário

SIGNIFICADO—Sem precisar aludir ao fato de que a alma transmigra de um corpo a outro, as relações entre as entidades vivas são impermanentes mesmo nesta vida, como se exemplifica neste verso. O filho de Citra­ketu se chamava Harṣaśoka, ou “júbilo e lamentação”. A entidade viva decerto é eterna, mas, porque está coberta por uma roupa tem­porária, o corpo, sua eternidade passa despercebida. Dehino ’smin yathā dehe kaumāraṁ yauvanaṁ jarā: “Neste corpo atual, a alma corporificada passa, continuamente, da infância à juventude e à velhice.” Assim, a veste corpórea é impermanente. A entidade viva, entretanto, é permanente. Assim como um animal é transferido de um proprietário a outro, a entidade viva que era o filho de Citraketu foi por algum tempo esse filho, mas, tão logo foi transferida para outro corpo, a relação afetiva se rompeu. Como se afirma no exem­plo dado no verso anterior, quando alguém possui algum artigo em suas mãos, considera-o seu, mas, logo que lhe é tirado, torna-se de outra pessoa. Então, ele deixa de ter algum vínculo com o artigo e não sente afeição pelo mesmo, nem se lamenta por ele.

Texto

evaṁ yoni-gato jīvaḥ
sa nityo nirahaṅkṛtaḥ
yāvad yatropalabhyeta
tāvat svatvaṁ hi tasya tat

Sinônimos

evam — assim; yoni-gataḥ — estando dentro de uma determinada espécie de vida; jīvaḥ — a entidade viva; saḥ — ela; nityaḥ — eterna; nirahaṅkṛtaḥ — sem identificação com o corpo; yāvat — enquanto; yatra — onde; upalabhyeta — pode-se encontrá-la; tāvat — por esse período; svatvam — o conceito do eu; hi — na verdade; tasya — dela; tat — isto.

Tradução

Muito embora uma entidade viva mantenha com outra uma liga­ção baseada em corpos perecíveis, a entidade viva é eterna. Na verdade, o corpo é que nasce ou se extingue, e não a entidade viva. Ninguém deve aceitar que a entidade viva nasce ou morre. O ser vivo, na verdade, não tem relação com os supostos pais e mães. Logo que ele, como resultado de suas atividades fruitivas passadas, apa­rece como filho de um certo pai e mãe, ele tem um vínculo com o corpo dado por esse pai e essa mãe. Domina-o, assim, a falsa ideia de que é filho deles e age afetuosamente. Entretanto, tão logo ele morre, a relação termina. Nessas circunstâncias, ninguém deve entregar-se ao júbilo ou à lamentação infundados.

Comentário

SIGNIFICADO—Quando passa a viver dentro do corpo material, a entidade viva julga falsamente que é o corpo, embora realmente não o seja. Sua relação com seu corpo e com seus aparentes pai e mãe são conceitos falsos e ilusórios. Essa ilusão perdura até a pessoa se esclarecer acerca da verdadeira situação da entidade viva.

Texto

eṣa nityo ’vyayaḥ sūkṣma
eṣa sarvāśrayaḥ svadṛk
ātmamāyā-guṇair viśvam
ātmānaṁ sṛjate prabhuḥ

Sinônimos

eṣaḥ — esta entidade viva; nityaḥ — eterna; avyayaḥ — imperecível; sūkṣmaḥ — muitíssimo diminuta (não é vista pelos olhos materiais); eṣaḥ — esta entidade viva; sarva-āśrayaḥ — a causa de diferentes classes de corpos; sva-dṛk — autorrefulgente; ātma-māyā-guṇaiḥ — através dos modos da natureza material que estão sujeitos à Suprema Personalidade de Deus; viśvam — este mundo material; ātmānam — ela própria; sṛjate — parece; prabhuḥ — o mestre.

Tradução

A entidade viva é eterna e imperecível porque, de fato, não tem começo nem fim. Ela nunca nasce ou morre. Ela é o princípio básico de toda classe de corpos, mas não pertence à categoria corpórea. O ser vivo é tão sublime que, em qualidade, é igual ao Senhor Supremo. Entretanto, porque é extremamente pequeno, tem a tendên­cia de se deixar iludir pela energia externa, e assim, de acordo com seus diferentes desejos, cria vários corpos para si próprio.

Comentário

SIGNIFICADO—Este verso alude à filosofia de acintya-bhedābheda – igualdade e diferença simultâneas. Tal qual a Suprema Personalidade de Deus, a entidade viva é eterna (nitya), mas a diferença é que o Senhor Supremo é o maior, ou seja, ninguém é igual a Ele ou maior do que Ele, ao passo que a entidade viva é sūkṣma, ou extremamente pequena. Os śāstras descrevem que a magnitude da entidade viva é de um décimo de milésimo do tamanho da ponta de um cabelo. O Senhor Supremo é onipenetrante (aṇḍāntara-stha-paramāṇu-cayāntara-stham). Relativamente, se a entidade viva é aceita como a menor, surge naturalmente a pergunta sobre quem é o maior. O maior é a Suprema Personalidade de Deus, e o menor, a entidade viva.

Outra peculiaridade da jīva é que ela é coberta por māyā. Ātmamāyā-guṇaiḥ: ela tem a tendência a ficar coberta pela energia ilusória do Senhor Supremo. Como é responsável por sua vida condicionada no mundo material, a entidade viva é descrita como prabhu (“o mestre”). Se quiser, pode adentrar este mundo material ou, se preferir, pode voltar ao lar, voltar ao Supremo. Porque ela quis desfrutar deste mundo material, a Suprema Personalidade de Deus, por intermédio da energia material, deu-lhe um corpo material. Como o próprio Senhor diz na Bhagavad-gītā (18.61):

īśvaraḥ sarva-bhūtānāṁ
hṛd-deśe ’rjuna tiṣṭhati
bhrāmayan sarva-bhūtāni
yantrārūḍhāni māyayā

“O Senhor Supremo está situado no coração de todos, ó Arjuna, e está dirigindo as andanças de todas as entidades vivas, que estão sentadas num tipo de máquina feita de energia material.” O Senhor Supremo confere à entidade viva a oportunidade de desfrutar neste mundo material conforme ela deseje, mas Ele tem a franqueza de expressar Seu próprio desejo de que ela abandone todas as aspirações mate­riais, renda-se plenamente a Ele e retorne ao lar, retorne ao Supremo.

A entidade viva é diminuta (sūkṣma). Com relação a isso, Jīva Gosvāmī diz que a entidade viva dentro do corpo dificilmente pode ser encontrada pelos cientistas materialistas, embora as autoridades nos informem que a entidade viva está dentro do corpo, o qual é diferente da entidade viva.

Texto

na hy asyāsti priyaḥ kaścin
nāpriyaḥ svaḥ paro ’pi vā
ekaḥ sarva-dhiyāṁ draṣṭā
kartṝṇāṁ guṇa-doṣayoḥ

Sinônimos

na — não; hi — na verdade; asya — à entidade viva; asti — existe; priyaḥ — querido; kaścit — alguém; na — não; apriyaḥ — não querido; svaḥ — próprio; paraḥ — outrem; api — também; — ou; ekaḥ — aquela; sarva-dhiyām — das variedades de inteligência; draṣṭā — que observa; kartṝṇām — dos autores; guṇa-doṣayoḥ — das atividades certas e erradas.

Tradução

A essa entidade viva, ninguém é querido, e ninguém é desfavorável. Ela não faz distinção alguma entre aquilo que é propriedade sua e aquilo que pertence a outrem. Ela não tem rivais; em outras palavras, não se deixa afetar nem por amigos nem por inimi­gos, benquerentes ou malfeitores. Tudo o que ela faz é observar, testemunhar as diferentes atividades dos homens.

Comentário

SIGNIFICADO—Como se explica no verso anterior, a entidade viva tem as mesmas qualidades da Suprema Personalidade de Deus, mas em quantidades diminutas, porque é uma mera partícula (sūkṣma), ao passo que o Senhor Supremo é onipenetrante e grandioso. Para o Senhor Supremo, não existem amigos, inimigos ou parentes, pois Ele está inteiramente livre de todos os defeitos que caracterizam as almas condicionadas que vivem na ignorância. Por outro lado, Ele é extremamente bondoso para com Seus devotos e Se mostra favorável a eles, e não fica nada satisfeito com pessoas que invejam Seus devotos. Como o próprio Senhor confirma na Bhagavad-gītā (9.29):

samo ’haṁ sarva-bhūteṣu
na me dveṣyo ’sti na priyaḥ
ye bhajanti tu māṁ bhaktyā
mayi te teṣu cāpy aham

“Não invejo ninguém, tampouco sou parcial com alguém. Sou igual para com todos. Porém, todo aquele que Me presta serviço com devoção é um amigo, e está em Mim, e Eu também sou seu amigo.” O Senhor Supre­mo não tem inimigo ou amigo, mas Se sente inclinado a um devoto que está sempre ocupado em Seu serviço devocional. Do mesmo modo, em outra passagem da Gītā (16.19), o Senhor diz:

tān ahaṁ dviṣataḥ krūrān
saṁsāreṣu narādhamān
kṣipāmy ajasram aśubhān
āsurīṣv eva yoniṣu

“Aqueles que são invejosos e mesquinhos, que são os mais baixos dos homens, são arrojados por Mim no oceano da existência material, onde permanecem em várias espécies de vida demoníaca.” O Senhor é extremamente antagônico àqueles que invejam Seus devotos. Para proteger Seus devotos, às vezes o Senhor tem que matar os inimi­gos deles. Por exemplo, para proteger Prahlāda Mahārāja, o Senhor teve que matar o inimigo Hiraṇyakaśipu, embora Hiraṇyakaśipu tenha alcançado a salvação em decorrência de ter sido morto pelo Senhor. Como é a testemunha das atividades de todos, o Senhor presencia as ações dos inimigos de Seus devotos e tem a propensão a puni-los. Em outras circunstâncias, entretanto, Ele simplesmente testemunha o que as entidades vivas fazem e lhes confere os resultados de suas ações piedosas ou pecaminosas.

Texto

nādatta ātmā hi guṇaṁ
na doṣaṁ na kriyā-phalam
udāsīnavad āsīnaḥ
parāvara-dṛg īśvaraḥ

Sinônimos

na — não; ādatte — aceita; ātmā — o Senhor Supremo; hi — na ver­dade; guṇam — felicidade; na — não; doṣam — infelicidade; na — nem; kriyā-phalam — o resultado de qualquer atividade fruitiva; udāsīna­-vat — exatamente como um homem neutro; āsīnaḥ — situado (no âma­go do coração); para-avara-dṛk — vendo a causa e o efeito; īśvaraḥ — o Senhor Supremo.

Tradução

O Senhor Supremo [ātmā], a razão da causa e do efeito, não Se sujeita à felicidade ou à infelicidade consequentes às ações fruitivas. Não se Lhe impõe aceitar um corpo material, e, como não possui um corpo material, Ele é sempre neutro. As entidades vivas, sendo partes integrantes do Senhor, possuem Suas qualidades em proporções diminutas. Portanto, ninguém deve deixar se afetar pela lamentação.

Comentário

SIGNIFICADO—A alma condicionada tem amigos e inimigos. Ela é afetada pelas virtudes e defeitos de sua posição. O Senhor Supremo, entretanto, é sempre transcendental. Porque Ele é o īśvara, o controlador Su­premo, Ele não é afetado pela dualidade. Portanto, pode-se dizer que Ele está situado no âmago do coração de todos, onde age como testemunha neutra que assiste às causas e efeitos das atividades, sejam elas boas ou más. Devemos entender também que udāsīna, “neutro”, não significa que Ele não aja, mas significa apenas que Ele não é afetado pessoalmente. Por exemplo, um juiz do tribunal é neutro quando dois grupos opositores aparecem diante dele, apesar do que ele assumirá uma atitude conforme o caso exija. Para nos tornarmos completamente neutros, ou seja, indiferentes às atividades materiais, tudo o que devemos fazer é buscar o refúgio dos pés de lótus da suprema pessoa neutra.

Mahārāja Citraketu foi alertado de que permanecer neutro em circunstâncias tão aflitivas como a morte de um filho é algo impossível. Todavia, uma vez que o Senhor sabe como ajustar tudo, o melhor procedimento é depender dEle e fazer nosso dever em serviço devocional ao Senhor. Em nenhuma circunstância, convém deixar­-se perturbar pela dualidade. Como se afirma na Bhagavad-gītā (2.47):

karmaṇy evādhikāras te
mā phaleṣu kadācana
mā karma-phala-hetur bhūr
mā te saṅgo ’stv akarmaṇi

“Tens o direito de executar teu dever prescrito, mas não podes exigir os frutos da ação. Jamais te consideres a causa dos resultados de tuas atividades, e jamais te apegues ao não cumprimento do teu dever.” Todos devemos executar nosso dever devocional e, quanto aos resultados de nossas ações, devemos depender da Suprema Personalidade de Deus.

Texto

śrī-bādarāyaṇir uvāca
ity udīrya gato jīvo
jñātayas tasya te tadā
vismitā mumucuḥ śokaṁ
chittvātma-sneha-śṛṅkhalām

Sinônimos

śrī-bādarāyaṇiḥ uvāca — Śrī Śukadeva Gosvāmī disse; iti — dessa maneira; udīrya — falando; gataḥ — partiu; jīvaḥ — a entidade viva (que aparecera como filho de Mahārāja Citraketu); jñātayaḥ — os paren­tes e membros familiares; tasya — dele; te — eles; tadā — naquele mo­mento; vismitāḥ — estando espantados; mumucuḥ — abandonaram; śokam — lamentação; chittvā — rompendo; ātma-sneha — da afeição consequente a uma relação; śṛṅkhalām — os grilhões de ferro.

Tradução

Śrī Śukadeva Gosvāmī continuou: Quando a alma condicionada [jīva], sob a forma do filho de Mahārāja Citraketu, terminou de falar essas palavras e partiu, Citraketu e os outros parentes do falecido ficaram todos espantados. Somente assim romperam os grilhões da afeição que os prendia a ele, e deixaram de se lamentar.

Texto

nirhṛtya jñātayo jñāter
dehaṁ kṛtvocitāḥ kriyāḥ
tatyajur dustyajaṁ snehaṁ
śoka-moha-bhayārtidam

Sinônimos

nirhṛtya — removendo; jñātayaḥ — o rei Citraketu e todos os outros parentes; jñāteḥ — do filho; deham — o corpo; kṛtvā — realizando; ucitāḥ — apropriadas; kriyāḥ — atividades; tatyajuḥ — abandonaram; dustyajam — muito difícil de abandonar; sneham — afeição; śoka — lamentação; moha — ilusão; bhaya — medo; arti — e aflição; dam — dando.

Tradução

Depois que executaram seus deveres, realizando as devidas cerimônias fúnebres e cremando o corpo da criança morta, os parentes abandonaram a afeição que leva à ilusão, à lamentação, ao medo e à dor. Sem dúvida, é difícil alguém conseguir abandonar tal afei­ção, mas eles a abandonaram muito facilmente.

Texto

bāla-ghnyo vrīḍitās tatra
bāla-hatyā-hata-prabhāḥ
bāla-hatyā-vrataṁ cerur
brāhmaṇair yan nirūpitam
yamunāyāṁ mahārāja
smarantyo dvija-bhāṣitam

Sinônimos

bāla-ghnyaḥ — aquelas que mataram a criança; vrīḍitāḥ — estando muitíssimo envergonhadas; tatra — ali; bāla-hatyā — devido a terem matado a criança; hata — tendo perdido; prabhāḥ — todo o brilho corpóreo; bāla-hatyā-vratam — a expiação por matar a criança; ceruḥ — executaram; brāhmaṇaiḥ — pelos sacerdotes; yat — os quais; nirūpi­tam — descreveram; yamunāyām — no rio Yamunā; mahā-rāja — ó rei Parīkṣit; smarantyaḥ — lembrando-se da; dvija-bhāṣitam — afirmação feita pelo brāhmaṇa.

Tradução

As co-esposas da rainha Kṛtadyuti, que haviam envenenado a criança, ficaram muito envergonhadas, e perderam todo o seu brilho corpóreo. Enquanto se lamentavam, ó rei, lembraram-se das ins­truções de Aṅgirā e abandonaram sua ambição de ter filhos. Seguin­do as orientações dos brāhmaṇas, elas se dirigiram às margens do Yamunā, onde se banharam e expiaram suas atividades pecaminosas.

Comentário

SIGNIFICADO—Neste verso, convém dar particular atenção à palavra bāla-hatyā­-hata-prabhāh. A prática de matar crianças existe na sociedade hu­mana há um longo tempo, desde tempos imemoriais – mas outrora acontecia raramente. No momento atual, entretanto, nesta era de Kali, o aborto – matar a criança dentro do útero – tornou-se algo muito comum, e, às vezes, a criança é morta até mesmo depois de nascer. Ao executar esse ato tão abominável, a mulher gradualmente perde todo o seu brilho corpóreo (bāla-hatyā-hata prabhāḥ). Também se deve­ notar que as senhoras que cometeram o ato pecaminoso de admi­nistrar veneno à criança ficaram muitíssimo envergonhadas e, de acordo com as orientações dos brāhmaṇas, tiveram de se submeter à expiação por matarem a criança. Toda mulher que tenha executado tão infame ato pecaminoso deve expiá-lo, mas atualmente ninguém se prontifica a se submeter à expiação. Em consequência, as mulhe­res responsáveis têm que sofrer nesta e na próxima vida. Aquelas que são almas sinceras, após ouvirem sobre este incidente, devem abster-se de matar crianças e devem expiar suas atividades pecami­nosas, adotando muito seriamente a consciência de Kṛṣṇa. Se alguém canta o mahā-mantra Hare Kṛṣṇa e não comete ofensas, todas as suas ações pecaminosas são com certeza expiadas de imediato, mas ninguém deve voltar a incorrer nesses atos, pois estaria cometendo uma ofensa.

Texto

sa itthaṁ pratibuddhātmā
citraketur dvijoktibhiḥ
gṛhāndha-kūpān niṣkrāntaḥ
saraḥ-paṅkād iva dvipaḥ

Sinônimos

saḥ — ele; ittham — dessa maneira; pratibuddha-ātmā — estando plenamente instruído no conhecimento espiritual; citraketuḥ — rei Citraketu; dvija-uktibhiḥ — mediante as instruções dos brāhmaṇas perfeitos (Aṅgirā e Nārada Muni); gṛha-andha-kūpāt — do poço escuro da vida familiar; niṣkrāntaḥ — saiu; saraḥ — de um lago, ou reservatório de água; paṅkāt — do lodo; iva — como; dvipaḥ — um elefante.

Tradução

Recebendo essa luz trazida pelas instruções dos brāhmaṇas Aṅgirā e Nārada, o rei Citraketu ficou plenamente instruído no conhecimento espiritual. Assim como um elefante escapa de um barrento reservatório de água, o rei Citraketu saiu do poço escuro da vida familiar.

Texto

kālindyāṁ vidhivat snātvā
kṛta-puṇya-jala-kriyaḥ
maunena saṁyata-prāṇo
brahma-putrāv avandata

Sinônimos

kālindyām — no rio Yamunā; vidhi-vat — de acordo com as regulações prescritas; snātvā — banhando-se; kṛta — executando; puṇya — piedosas; jala-kriyaḥ — oblações através de oferecimento de água; maunena — com gravidade; saṁyata-prāṇaḥ — controlando a mente e os sentidos; brahma-putrau — aos dois filhos do senhor Brahmā (Aṅgirā e Nārada); avandata — ofereceu suas orações e reverências.

Tradução

O rei se banhou na água do Yamunā e, de acordo com os deveres prescritos, ofereceu aos antepassados e aos semideuses oblações de água. Controlando com muita gravidade seus sentidos e sua mente, ofereceu, então, seus respeitos e reverências aos filhos do senhor Brahmā [Aṅgirā e Nārada].

Texto

atha tasmai prapannāya
bhaktāya prayatātmane
bhagavān nāradaḥ prīto
vidyām etām uvāca ha

Sinônimos

atha — depois disso; tasmai — a ele; prapannāya — que era rendi­do; bhaktāya — sendo um devoto; prayata-ātmane — que era autocontrolado; vidyām — conhecimento transcendental; etām — isto; uvāca — falou; ha — na verdade.

Tradução

Depois disso, estando muito satisfeito com Citraketu, que era um devoto autocontrolado e uma alma rendida, Nārada, o poderosíssimo sábio, transmitiu-lhe as seguintes instruções transcendentais.

Texto

oṁ namas tubhyaṁ bhagavate
vāsudevāya dhīmahi
pradyumnāyāniruddhāya
namaḥ saṅkarṣaṇāya ca
namo vijñāna-mātrāya
paramānanda-mūrtaye
ātmārāmāya śāntāya
nivṛtta-dvaita-dṛṣṭaye

Sinônimos

oṁ — ó meu Senhor; namaḥ — reverências; tubhyam — a Vós; bhagavate — a Suprema, Personalidade de Deus; vāsudevāya — Kṛṣṇa, o filho de Vasudeva; dhīmahi — que eu medite em; pradyumnāya — a Pradyumna; aniruddhāya — a Aniruddha; namaḥ — respeitosas reverências; saṅkarṣaṇāya — ao Senhor Saṅkarṣaṇa; ca — também; namaḥ — todas as reverências; vijñāna-mātrāya — à forma que é plena de conhecimento; parama-ānanda-mūrtaye — plena de bem-aventu­rança transcendental; ātma-ārāmāya — ao Senhor, que é autossufi­ciente; śāntāya — e livre de perturbações; nivṛtta-dvaita-dṛṣṭaye — cuja visão não é afetada pela dualidade, ou aquele que é único e inigualável.

Tradução

[Nārada deu a Citraketu o seguinte mantra.] Ó Senhor, ó Suprema Personalidade de Deus, que sois invocado mediante o oṁkāra [praṇava], ofereço-Vos minhas respeitosas reverências. Ó Senhor Vāsudeva, medito em Vós. Ó Senhor Pradyumna, Senhor Aniruddha e Senhor Saṅkarṣaṇa, ofereço-Vos minhas respeitosas reverências. Ó reservatório de potência espiritual, ó bem-aventurança suprema, ofereço minhas respeitosas reverências a Vós que sois autossuficiente e muito pacífico. Ó verdade última, que não tendes rival à Vossa altura, sois conhecido como Brahman, Paramātmā e Bha­gavān e, portanto, sois o reservatório de todo o conhecimento. Ofereço-Vos minhas respeitosas reverências.

Comentário

SIGNIFICADO—Na Bhagavad-gītā, Kṛṣṇa diz ser praṇavaḥ sarva-vedeṣu, a sílaba oṁ encontrada nos mantras védicos. Em conhecimento transcendental, dirigimo-nos ao Senhor como praṇava, oṁkāra, que é uma maneira de o Senhor manifestar-Se sob a forma do som. Oṁ namo bhagavate vāsudevāya. Vāsudeva, que é uma expansão de Nārāyaṇa, expande-Se como Pradyumna, Aniruddha e Saṅkarṣaṇa. De Saṅkarṣaṇa, surge uma segunda expansão Nārāyaṇa, e, desse Nārāyaṇa, vêm outras expansões de Vāsudeva, Pradyumna, Saṅkarṣaṇa e Aniruddha. O Saṅkarṣaṇa deste grupo é a causa que origina os três puruṣas, a saber, Kāraṇodakaśāyī Viṣṇu, Garbhodakaśāyī Viṣṇu e Kṣīrodakaśāyī Viṣṇu. Em cada universo, Kṣīrodakaśāyī Viṣṇu está situado em um planeta especial chamado Śvetadvīpa. Confirma isso a Brahma-saṁhitā: aṇḍāntara-stha. A palavra aṇḍa se refere a este universo. Dentro deste universo, existe um planeta chamado Śvetadvīpa, onde reside Kṣīrodakaśāyī Viṣṇu. É dEle que procedem todas as encarnações dentro deste universo.

Como se confirma na Brahma-saṁhitā, todas essas formas da Suprema Personalidade de Deus são advaita, não-diferentes, e também são acyuta, infalíveis; diferente do que acontece com as almas condicionadas, essas formas não caem. A entidade viva comum tem a ten­dência a cair nas garras de māyā, mas o Senhor Supremo, em Suas diferentes encarnações e formas, é acyuta, infalível. Portanto, Seu corpo é diferente do corpo material que a alma condicionada possui.

O dicionário Medinī explica da seguinte maneira a palavra mātrā: mātrā karṇa-vibhūṣāyāṁ vitte māne paricchade. A palavra mātrā, em suas diversas acepções, é usada para indicar o enfeite da orelha, propriedade, respeito e a posse de uma cobertura. Como se afirma na Bhagavad-gītā (2.14):

mātrā-sparśās tu kaunteya
śītoṣṇa-sukha-duḥkha-dāḥ
āgamāpāyino ’nityās
tāṁs titikṣasva bhārata

“Ó filho de Kuntī, o aparecimento transitório de felicidade e afli­ção, bem como o seu desaparecimento no devido tempo, são como o aparecimento e desaparecimento das estações de inverno e verão. Surgem da percepção sensorial, ó descendente de Bharata, e é pre­ciso aprender a tolerá-los sem se perturbar.” No estado de vida condicionada, o corpo é usado à guisa de veste, e assim como no verão e no inverno diferentes vestes se fazem necessárias, nós, almas condicionadas, estamos mudando de corpos ao gosto de nossos desejos. Entretanto, porque o corpo do Senhor Supremo é cheio de conhecimento, não requer cobertura alguma. A ideia de que o corpo de Kṛṣṇa é como o nosso – em outras palavras, de que Seu corpo é diferente de Sua alma – é um equívoco. Essas diferenças não se aplicam a Kṛṣṇa, porque Seu corpo é pleno de conhecimento. Aqui, recebemos corpos materiais devido à nossa falta de conhecimento, mas, porque Kṛṣṇa, Vāsudeva, é pleno de conhecimento, não há diferença entre Seu corpo e Sua alma. Kṛṣṇa lembra-Se do que disse há quarenta milhões de anos ao deus do Sol, mas o ser vivo comum não pode lembrar-se do que disse anteontem. Essa é a diferença entre o corpo de Kṛṣṇa e o nosso corpo. Portanto, o Senhor é chamado de vijñāna-mātrāya paramānanda-mūrtaye.

Porque o corpo do Senhor é pleno de conhecimento, Ele sempre desfruta de bem-aventurança transcendental. Na verdade, Sua forma é, em si, paramānanda. Confirma isso o Vedānta-sūtra: ānandamayo ’bhyāsāt. Por natureza, o Senhor é ānandamaya. Sempre que vemos Kṛṣṇa, Ele está cheio de ānanda, em todas as circunstâncias. Ninguém pode deprimi-lO. Ātmārāmāya: Ele não precisa sair em busca de prazer externo, haja vista que Ele é autossuficiente. Śāntāya: Ele não tem ansiedades. Alguém que precisa buscar prazer em outras fontes está sempre cheio de ansiedades. Os karmīs, os jñānīs e os yogīs estão cheios de ansiedade porque não se contentam com o que têm, mas o devoto nada exige; ele está simplesmente satisfeito com o serviço ao Senhor que é completamente bem-aventurado.

Nivṛtta-dvaita-dṛṣṭaye: em nossa vida condicionada, nossos corpos têm diferentes partes, mas, embora Kṛṣṇa aparentemente tenha diferentes partes corpóreas, nenhuma parte de Seu corpo difere de alguma outra. Kṛṣṇa pode ver com Seus olhos, e Kṛṣṇa pode ver sem a ajuda dos Seus olhos. Portanto, a Śvetāśvatara Upaniṣad diz que paśyaty acakṣuḥ. Ele pode ver com Suas mãos e com Suas pernas. Ele não precisa de uma determinada parte corpórea para executar uma determinada ação. Aṅgāni yasya sakalendriya-vṛttimanti: como Ele pode fazer qualquer coisa que deseje com qualquer parte de Seu corpo, Ele é chamado de todo-poderoso.

Texto

ātmānandānubhūtyaiva
nyasta-śakty-ūrmaye namaḥ
hṛṣīkeśāya mahate
namas te ’nanta-mūrtaye

Sinônimos

ātma-ānanda — de Vossa bem-aventurança pessoal; anubhūtyā — pela percepção; eva — decerto; nyasta — tendo abandonado; śakti­-ūrmaye — as ondas da natureza material; namaḥ — respeitosas reverên­cias; hṛṣīkeśāya — ao supremo controlador dos sentidos; mahate — ao Supremo; namaḥ — respeitosas reverências; te — a Vós; ananta — ilimitadas; mūrtaye — cujas expansões.

Tradução

Percebendo Vossa bem-aventurança pessoal, sois sempre transcendental às ondas da natureza material. Portanto, meu Senhor, ofereço-Vos minhas respeitosas reverências. Sois Vós quem exerceis o supremo controle sobre os sentidos e Vos expandis em ilimitadas formas. Sois o maior, e, portanto, ofereço-Vos minhas respeitosas reverências.

Comentário

SIGNIFICADO—Este verso mostra analiticamente a diferença existente entre a entidade viva e o Senhor Supremo. A forma do Senhor e a forma da alma condicionada são diferentes porque o Senhor é sempre bem­-aventurado, ao passo que a alma condicionada está sempre sob a influência das três classes de sofrimentos presentes no mundo material. O Senhor Supremo é sac-cid-ānanda-vigraha. Ele obtém ānanda, bem-­aventurança, a partir do Seu próprio eu. O corpo do Senhor é transcendental, espiritual, mas, porque tem um corpo material, a alma condiciona­da está sempre atormentada por muitos problemas mentais e corpóreos. A alma condicionada sempre está perturbada pelo apego e pelo de­sapego, enquanto o Senhor Supremo sempre está livre dessas dualidades. O Senhor é o mestre supremo de todos os sentidos, e a alma condicionada é controlada pelos sentidos. O Senhor é o maior, e a entidade viva é a menor. A entidade viva é condicionada às ondas da natureza material, mas o Senhor Supremo é transcendental a todas as ações e reações. As expansões do corpo do Senhor Supremo são inumeráveis (advaitam acyutam anādim ananta-rūpam), mas a alma condicionada é limitada a apenas uma forma. Através da história, tomamos conhecimento de que, através do poder místico, uma alma condicio­nada pode, às vezes, expandir-se em oito formas, mas as expansões corpóreas do Senhor são ilimitadas. Isso significa que, ao contrário dos corpos das entidades vivas, os corpos da Suprema Personalidade de Deus não têm começo nem fim.

Texto

vacasy uparate ’prāpya
ya eko manasā saha
anāma-rūpaś cin-mātraḥ
so ’vyān naḥ sad-asat-paraḥ

Sinônimos

vacasi — quando as palavras; uparate — cessam; aprāpya — não alcançando o objetivo; yaḥ — aquele que; ekaḥ — único e inigualável; manasā — a mente; saha — com; anāma — sem nome material; rūpaḥ — ou forma material; cit-mātraḥ — totalmente espiritual; saḥ — Ele; avyāt — por favor, proteja; naḥ — a nós; sat-asat-paraḥ — que é a causa de todas as causas (a causa suprema).

Tradução

As palavras e a mente da alma condicionada não podem aproximar-se da Suprema Personalidade de Deus, pois os nomes e formas materiais não são aplicáveis ao Senhor, que é inteiramente espiritual e está situado além da concepção de formas grosseiras e sutis. O Brahman impessoal é outra de Suas formas. Que Ele, conforme o Seu agrado, proteja-nos.

Comentário

SIGNIFICADO—Menciona-se neste verso o Brahman impessoal, que é a refulgência do Senhor.

Texto

yasminn idaṁ yataś cedaṁ
tiṣṭhaty apyeti jāyate
mṛṇmayeṣv iva mṛj-jātis
tasmai te brahmaṇe namaḥ

Sinônimos

yasmin — em quem; idam — esta (manifestação cósmica); yataḥ — de quem; ca — também; idam — esta (manifestação cósmica); tiṣṭha­ti — permanece; apyeti — dissolve-se; jāyate — nasce; mṛt-mayeṣu — em coisas feitas de terra; iva — como; mṛt-jātiḥ — oriundas da terra; tasmai — nEle; te — a Vós; brahmaṇe — a causa suprema; namaḥ — respeitosas reverências.

Tradução

Assim como potes feitos completamente de terra situam-se na terra após serem criados e voltam a se transformar em terra após serem quebrados, esta manifestação cósmica é causada pelo Brahman Supremo, situa-se no Brahman Supremo e volta ao mesmo Brahman Supremo. Portanto, uma vez que o Senhor Supremo é a causa do Brahman, ofereçamos a Ele nossas respeitosas reverências.

Comentário

SIGNIFICADO—O Senhor Supremo é a causa da manifestação cósmica, a qual Ele mantém após a criação, e, após a aniquilação, o Senhor é o reserva­tório de tudo.

Texto

yan na spṛśanti na vidur
mano-buddhīndriyāsavaḥ
antar bahiś ca vitataṁ
vyomavat tan nato ’smy aham

Sinônimos

yat — quem; na — não; spṛśanti — podem tocar; na — nem; viduḥ — podem conhecer; manaḥ — a mente; buddhi — a inteligência; indriya — os sentidos; asavaḥ — os ares vitais; antaḥ — dentro; bahiḥ — fora; ca — também; vitatam — expandindo; vyoma-vat — como o céu; tat — para Ele; nataḥ — curvado; asmi — estou; aham — eu.

Tradução

O Brahman Supremo emana da Suprema Personalidade de Deus e Se expande como o céu. Embora não seja tocado por nada material, Ele existe dentro e fora. Entretanto, a mente, a inteligência, os sentidos e a força vital não podem tocá-lO nem conhecê-lO. Ofereço-Lhe minhas respeitosas reverências.

Texto

dehendriya-prāṇa-mano-dhiyo ’mī
yad-aṁśa-viddhāḥ pracaranti karmasu
naivānyadā lauham ivāprataptaṁ
sthāneṣu tad draṣṭrapadeśam eti

Sinônimos

deha — o corpo; indriya — sentidos; prāṇa — ares vitais; manaḥ — mente; dhiyaḥ — e inteligência; amī — todos esses; yat-aṁśa-viddhāḥ — sendo influenciados pelos raios do Brahman, ou do Senhor Supremo; pracaranti — eles se movem; karmasu — em várias atividades; na — não; eva — na verdade; anyadā — em outra ocasião; lauham — ferro; iva — como; aprataptam — não aquecido (pelo fogo); sthāneṣu — nestas circunstâncias; tat — isso; draṣṭṛ-apadeśam — o nome de um assunto; eti — alcança.

Tradução

Assim como o ferro tem o poder de queimar ao ficar incandescente após o contato com o fogo, do mesmo modo, o corpo, os sen­tidos, a força vital, a mente e a inteligência, embora não passem de montes de matéria, podem funcionar em suas atividades quando a Suprema Personalidade de Deus lhes infunde uma partícula de consciência. Assim como o ferro só pode queimar após aquecido pelo fogo, os sentidos corpóreos só podem agir após serem ativados pelo Brahman Supremo.

Comentário

SIGNIFICADO—Incandescente, o ferro pode queimar, mas não pode queimar o fogo original. Portanto, a consciência da pequena partícula do Brahman depende inteiramente do poder do Brahman Supremo. Na Bhagavad-gītā, o Senhor diz que mattaḥ smṛtir jñānam apohanaṁ ca: “De Mim, a alma condicionada recebe memória, conhecimento e esquecimento.” O poder para executar atividades provém do Senhor Supremo, e, quando o Senhor retira esse poder, a alma con­dicionada fica sem energia e não consegue mais agir através dos vários sentidos que possui. O corpo inclui cinco sentidos cognosci­tivos, cinco sentidos funcionais e a mente, que, na verdade, são apenas montes de matéria. Por exemplo, o cérebro é simplesmente matéria, mas, quando acionado pela energia da Suprema Perso­nalidade de Deus, o cérebro pode agir, assim como o ferro pode queimar quando fica incandescente após receber a influência do fogo. O cérebro pode agir enquanto estamos despertos ou mesmo enquanto sonhamos, mas, quando estamos em sono profundo ou incons­cientes, o cérebro fica inativo. Como é um monte de matéria, o cérebro não tem poder para agir de maneira independente. Ele só pode agir quando é favorecido pela influência da Suprema Personalidade de Deus, que é Brahman ou Parabrahman. É através desse processo que se pode entender como o Brahman Supremo, Kṛṣṇa, está presente em toda parte, assim como o brilho solar está presente devido à influência do deus do Sol que está presente no globo solar. O Senhor Supremo se chama Hṛṣīkeśa; apenas Ele é quem dirige os senti­dos. A menos que recebam o poder de Sua energia, nossos sentidos não podem agir. Em outras palavras, apenas Ele vê, apenas Ele trabalha, apenas Ele escuta e apenas Ele é o princípio ativo ou o controlador supremo.

Texto

oṁ namo bhagavate mahā-puruṣāya mahānubhāvāya mahā-vibhūti-pataye sakala-sātvata-parivṛḍha-nikara-kara-kamala-kuḍmalopalālita-caraṇāravinda-yugala parama-parameṣṭhin namas te.

Sinônimos

oṁ — ó Suprema Personalidade de Deus; namaḥ — respeitosas reverências; bhagavate — a Vós, ó Senhor, que sois repleto das seis opulências; mahā-puruṣāya — o desfrutador supremo; mahā-anubhāvāya — a mais perfeita alma realizada, ou a Superalma; mahā-vibhūti­-pataye — o mestre de todo o poder místico; sakala-sātvata-parivṛḍha — de todos os melhores devotos; nikara — da multidão; kara-kamala — das mãos de lótus; kuḍmala — mediante os botões; upalālita — servi­dos; caraṇa-aravinda-yugala — cujos dois pés de lótus; parama — mais elevado; parame-ṣṭhin — que estais situado no planeta espiritual; namaḥ te — respeitosas reverências a Vós.

Tradução

Ó Senhor transcendental, que estais situado no planeta mais elevado do mundo espiritual, Vossos dois pés de lótus são sempre massageados pelas mãos de uma multidão dos melhores devotos, mãos estas semelhantes a botões de lótus. Sois a Suprema Personalidade de Deus, repleto de seis opulências. Sois a pessoa suprema mencio­nada nas orações Puruṣa-sūkta. Sois o mestre mais perfeito e autorrealizado de todo o poder místico. Ofereço-Vos minhas respeitosas reverências.

Comentário

SIGNIFICADO—Afirma-se que, embora única, a Verdade Absoluta manifesta-Se sob diferentes aspectos, tais como Brahman, Paramātmā e Bhaga­vān. Os versos anteriores descreveram os aspectos Brahman e Para­mātmā da Verdade Absoluta. Agora, esta oração na qualidade de bhakti-yoga é oferecida à Pessoa Suprema Absoluta. Neste contexto, usam-se as palavras sakala-sātvata-parivṛḍha. A palavra sātvata sig­nifica “devotos”, e sakala, “todos juntos”. Os devotos, que também têm pés de lótus, servem os pés de lótus do Senhor com suas mãos de lótus. Às vezes, pode acontecer de os devotos não serem com­petentes para servir os pés de lótus do Senhor, e, em vista disto, o Senhor é chamado de parama-parameṣṭhin. Ele é a Pessoa Suprema, apesar do que Ele é muito bondoso com os devotos. Ninguém é com­petente para servir o Senhor, mas, embora o devoto não seja competente, o misericordioso Senhor aceita a humilde tentativa empreendida pelo devoto.

Texto

śrī-śuka uvāca
bhaktāyaitāṁ prapannāya
vidyām ādiśya nāradaḥ
yayāv aṅgirasā sākaṁ
dhāma svāyambhuvaṁ prabho

Sinônimos

śrī-śukaḥ-uvāca — Śrī Śukadeva Gosvāmī disse; bhaktāya — ao devoto; etām — este; prapannāya — àquele que se rendeu por completo; vidyām — conhecimento transcendental; ādiśya — ensinando; nāra­daḥ — o grande sábio Nārada; yayau — partiu; aṅgirasā — o grande santo Aṅgirā; sākam — com; dhāma — para o planeta mais elevado; svāyambhuvam — pertencente ao senhor Brahmā; prabho — ó rei.

Tradução

Śrī Śukadeva Gosvāmī prosseguiu: Nārada, tendo-se tornado o mestre espiritual de Citraketu, instruiu-o plenamente nesta oração porque Citraketu se rendera por completo. Ó rei Parīkṣit, Nārada, acompanhado do grande sábio Aṅgirā, partiu, então, para o planeta mais elevado, conhecido como Brahmaloka.

Comentário

SIGNIFICADO—Durante sua primeira visita ao rei Citraketu, Aṅgirā não trouxe Nārada consigo. Entretanto, depois da morte do filho de Citraketu, Aṅgirā trouxe Nārada para instruir o rei Citraketu sobre bhakti-yoga. O ponto é que, no começo, Citraketu não estava em um espírito de renúncia, mas, após a morte de seu filho, quando ficou imerso em sua grande lamentação, ele despertou para a plataforma de renún­cia ao receber as instruções que mostravam a falsidade deste mundo material e das posses materiais. Somente nesta etapa é que se pode ensinar bhakti-yoga. Enquanto a pessoa se mantém apegada ao gozo material, não consegue compreender o bhakti-yoga. Confirma-se isso na Bhagavad-gītā (2.44):

bhogaiśvarya-prasaktānāṁ
tayāpahṛta-cetasām
vyavasāyātmikā buddhiḥ
samādhau na vidhīyate

“Na mente daqueles que estão muito apegados à gratificação dos sentidos e à opulência material, e que se deixam confundir por essas coisas, não ocorre a determinação resoluta de prestar serviço devocional ao Senhor Supremo.” Enquanto alguém estiver muito apegado ao gozo material, não poderá concentrar sua mente no tema do serviço devocional.

No momento atual, o movimento da consciência de Kṛṣṇa está tendo boa acolhida nos países ocidentais porque a juventude oci­dental chegou à fase de vairāgya, ou renúncia. Ela está praticamente contrariada com o prazer material extraído das fontes materiais, e isso resultou em uma população de hippies em todos os países ociden­tais. Se esses jovens forem agora instruídos sobre bhakti-yoga, a consciência de Kṛṣṇa, as instruções decerto vingarão.

Logo que assimilou a filosofia de vairāgya-vidyā, o conhecimen­to da renúncia, Citraketu pôde compreender o processo de bhakti-­yoga. Com relação a isso, Śrīla Sārvabhauma Bhaṭṭācārya disse que vairāgya-vidyā-nija-bhakti-yoga. Vairāgya-vidyā e bhakti-yoga correm em linhas paralelas. É essencial compreender uma para, então, compreender a outra. Também se diz: bhaktiḥ pareśānubhavo viraktir anyatra ca. (Śrīmad-Bhāgavatam 11.2.42) O avanço em serviço devocional, ou em consciência de Kṛṣṇa, é caracterizado pela intensificação da renúncia ao gozo material. Nārada Muni é o pai do serviço devocional, e, portanto, somente para conceder imotivada misericórdia ao rei Citraketu, Aṅgirā trouxe Nārada Muni para instruir o rei. Essas instruções foram extremamente eficazes. Todo aquele que segue os passos de Nārada Muni é, sem dúvidas, um devoto puro.

Texto

citraketus tu tāṁ vidyāṁ
yathā nārada-bhāṣitām
dhārayām āsa saptāham
ab-bhakṣaḥ susamāhitaḥ

Sinônimos

citraketuḥ — o rei Citraketu; tu — na verdade; tām — esse; vidyām — conhecimento transcendental; yathā — assim como; nārada-bhāṣi­tām — instruído pelo grande sábio Nārada; dhārayām āsa — cantou; sapta-aham — por uma semana contínua; ap-bhakṣaḥ — bebendo ape­nas água; su-samāhitaḥ — com muita atenção e cuidado.

Tradução

Jejuando e bebendo apenas água, Citraketu, por uma semana, cantou continuamente, com muito cuidado e atenção, o mantra dado por Nārada Muni.

Texto

tataḥ sa sapta-rātrānte
vidyayā dhāryamāṇayā
vidyādharādhipatyaṁ ca
lebhe ’pratihataṁ nṛpa

Sinônimos

tataḥ — disto; saḥ — ele; sapta-rātra-ante — ao fim de sete noites; vidyayā — pelas orações; dhāryamāṇayā — sendo cuidadosamente praticadas; vidyādhara-adhipatyam — domínio sobre os Vidyādharas (como resultado intermediário); ca — também; lebhe — alcançou; apratihatam — sem se desviar das instruções do mestre espiritual; nṛpa — ó rei Parīkṣit.

Tradução

Ó rei Parīkṣit, após apenas uma semana de prática constante do mantra recebido do mestre espiritual, Citraketu, como um resultado intermediário do seu avanço em conhecimento espiritual, alcançou o governo do planeta dos Vidyādharas.

Comentário

SIGNIFICADO—Se um devoto, após ser iniciado, cumpre rigorosamente as instru­ções do mestre espiritual, naturalmente se mune das opulên­cias materiais de vidyādhara-adhipatyam e outros postos equivalentes obtidos como resultados intermediários. Para alcançar resultado exi­toso, o devoto não precisa praticar yoga, karma ou jñāna. O serviço devocional é, em si, suficiente para conceder ao devoto todo o poder material. O devoto puro, entretanto, nunca está apegado ao poder material, embora o obtenha muito facilmente sem envidar nenhum es­forço pessoal. Citraketu recebeu este benefício paralelo concedido pelo serviço devocional, o qual executou rigidamente de acordo com as instruções de Nārada.

Texto

tataḥ katipayāhobhir
vidyayeddha-mano-gatiḥ
jagāma deva-devasya
śeṣasya caraṇāntikam

Sinônimos

tataḥ — depois disso; katipaya-ahobhiḥ — dentro de poucos dias; vidyayā — pelo mantra espiritual; iddha-manaḥ-gatiḥ — o caminho de sua mente ficando iluminado; jagāma — foi; deva-devasya — do mestre de todos os outros senhores ou semideuses; śeṣasya — Senhor Śeṣa; caraṇa-antikam — ao refúgio dos pés de lótus.

Tradução

Depois disso, dentro de pouquíssimos dias, pela influência do mantra que Citraketu praticara, sua mente ficou cada vez mais iluminada para o progresso espiritual, e ele obteve o refúgio aos pés de lótus de Anantadeva.

Comentário

SIGNIFICADO—A conquista última do devoto é se refugiar aos pés de lótus do Senhor em qualquer um dos planetas do céu espiritual. Como resul­tado da estrita observância do serviço devocional, o devoto pode receber todas as opulências materiais quando elas forem necessárias, mas, na verdade, o devoto não está interessado em opulências ma­teriais, tampouco o Senhor Supremo as concede. Quando o devoto realmente se ocupa no serviço devocional ao Senhor, suas aparentes opulências materiais não são materiais; todas elas são espirituais. Por exemplo, se o devoto aplica algum dinheiro em construir um templo belo e dispendioso, seu investimento não é material, mas espiritual (nirbandhaḥ kṛṣṇa-sambandhe yuktaṁ vairāgyam ucyate). A mente do devoto jamais se desvia para o aspecto material do templo. Os tijolos, pedras e madeiras usados na construção do templo são espi­rituais, assim como a Deidade, embora feita de pedra, não é pedra, senão que é a própria Suprema Personalidade de Deus. Quanto mais alguém avança em consciência espiritual, mais pode entender os elementos do serviço devocional. Nada usado no serviço devo­cional é material; tudo é espiritual. Por conseguinte, ao receber uma opulência aparentemente material, o devoto a utiliza no avanço es­piritual. Essa opulência tem por objetivo ajudar o devoto a avançar rumo ao reino espiritual. Assim, Mahārāja Citraketu per­maneceu em opulência material como vidyādhara-pati, mestre dos Vidyādharas, e, prestando serviço devocional, tornou-se perfeito no transcurso de pouquíssimos dias, regressando ao lar, regressando ao Supremo, por ter-se refugiado aos pés de lótus do Senhor Śeṣa, Ananta.

A opulência material de um karmī e a opulência material de um devoto não estão no mesmo nível. Śrīla Madhvācārya comenta o seguinte:

anyāntaryāmiṇaṁ viṣṇum
upāsyānya-samīpagaḥ
bhaved yogyatayā tasya
padaṁ vā prāpnuyān naraḥ

Adorando o Senhor Viṣṇu, a pessoa pode obter tudo o que deseja, mas o devoto puro jamais pede ao Senhor Viṣṇu algum lucro ma­terial. Ao contrário, ele serve ao Senhor Viṣṇu e não tem desejos materiais, de modo que, no final, transfere-se ao reino espiritual. Com relação a isso, Śrīla Vīrarāghava Ācārya comenta que yatheṣṭa-gatir ity arthaḥ: adorando Viṣṇu, o devoto pode obter tudo o que bem quiser. Mahārāja Citraketu queria somente voltar ao lar, voltar ao Supremo, e, portanto, concretizou seu intento.

Texto

mṛṇāla-gauraṁ śiti-vāsasaṁ sphurat-
kirīṭa-keyūra-kaṭitra-kaṅkaṇam
prasanna-vaktrāruṇa-locanaṁ vṛtaṁ
dadarśa siddheśvara-maṇḍalaiḥ prabhum

Sinônimos

mṛṇāla-gauram — branco como as fibras de um lótus; śiti-vāsa­sam — usando roupas de seda azul; sphurat — reluzente; kirīṭa — elmo; keyūra — braceletes; kaṭitra — cinto; kaṅkaṇam — cujas pulseiras; prasanna-vaktra — rosto sorridente; aruṇa-locanam — tendo olhos avermelhados; vṛtam — cercado; dadarśa — ele viu; siddha-īśvara­-maṇḍalaiḥ — pelos devotos mais perfeitos; prabhum — a Suprema Personalidade de Deus.

Tradução

Ao obter o refúgio do Senhor Śeṣa, a Suprema Personalidade de Deus, Citraketu viu que Ele era tão branco como as fibras de uma flor de lótus. Ele estava vestido com roupas azuladas e enfeitado com um elmo muito reluzente, e usava braceletes, cinto e pulseiras. Trazia o rosto sorridente, e Seus olhos eram avermelhados. Ele estava cercado por ilustres pessoas liberadas, tais como Sanat-kumāra.

Texto

tad-darśana-dhvasta-samasta-kilbiṣaḥ
svasthāmalāntaḥkaraṇo ’bhyayān muniḥ
pravṛddha-bhaktyā praṇayāśru-locanaḥ
prahṛṣṭa-romānamad ādi-puruṣam

Sinônimos

tat-darśana — pela visão da Suprema Personalidade de Deus; dhvasta — destruídos; samasta-kilbiṣaḥ — tendo todos os pecados; svastha — saudável; amala — e puro; antaḥkaraṇaḥ — o âmago de cujo coração; abhyayāt — aproximou-se face a face; muniḥ — o rei, que estava silencioso devido à completa satisfação mental; pravṛddha­-bhaktyā — com uma atitude de intenso serviço devocional; praṇaya­-aśru-locanaḥ — com lágrimas nos olhos devido ao amor; prahṛṣṭa-­roma — seus cabelos arrepiados devido ao júbilo; anamat — ofereceu respeitosas reverências; ādi-puruṣam — à expansão da personalidade original.

Tradução

Tão logo viu o Senhor Supremo, Mahārāja Citraketu se limpou de toda a contaminação material e se situou em sua consciência de Kṛṣṇa original, completamente purificado. Ele se fez si­lencioso e grave, e, devido ao amor pelo Senhor, lágrimas caíram de seus olhos, e seus cabelos se arrepiaram. Com grande devoção e amor, ofereceu suas respeitosas reverências à original Personalidade de Deus.

Comentário

SIGNIFICADO—Neste verso, a expressão tad-darśana-dhvasta-samasta-kilbiṣaḥ é muito importante. Se alguém vê regularmente a Suprema Personalidade de Deus no templo, aos poucos dará consigo descontaminado, livre de todos os desejos materiais, pelo simples fato de visitar o templo e ver a Deidade. Quando alguém se livra de todos os resultados de atividades pecaminosas, ele se purifica e, com a mente saudável e bem limpa, continuará seu progresso em consciência de Kṛṣṇa.

Texto

sa uttamaśloka-padābja-viṣṭaraṁ
premāśru-leśair upamehayan muhuḥ
premoparuddhākhila-varṇa-nirgamo
naivāśakat taṁ prasamīḍituṁ ciram

Sinônimos

saḥ — ele; uttamaśloka — da Suprema Personalidade de Deus; pada-­abja — dos pés de lótus; viṣṭaram — o escabelo; prema-aśru — de lágrimas de amor puro; leśaiḥ — com as gotas; upamehayan — molhando; muhuḥ — repetidas vezes; prema-uparuddha — embargada pelo amor; akhila — todas; varṇa — das letras; nirgamaḥ — a emissão; na ­ — não; eva — na verdade; aśakat — foi capaz; tam — a Ele; prasamīḍi­tum — para oferecer orações; ciram — por um longo tempo.

Tradução

Com lágrimas de amor e afeição, Citraketu molhava repetidamente o escabelo onde repousavam os pés de lótus do Senhor Supremo. Porque sua voz estava embargada de êxtase, por conside­rável tempo se mostrou incapaz de pronunciar qualquer uma das letras do alfabeto para oferecer orações adequadas ao Senhor.

Comentário

SIGNIFICADO—Todas as letras do alfabeto e as palavras formadas por essas letras devem ser empregadas no oferecimento de orações à Suprema Personalidade de Deus. Mahārāja Citraketu se deparou com a oportunidade de oferecer orações ao Senhor compondo belos versos com as letras do alfabeto, mas, devido ao seu êxtase, por um considerável tempo ele não pôde agregar aquelas letras para oferecer orações ao Senhor. Como se afirma no Śrīmad-Bhāgavatam (1.5.22):

idaṁ hi puṁsas tapasaḥ śrutasya vā
sviṣṭasya sūktasya ca buddhi-dattayoḥ
avicyuto ’rthaḥ kavibhir nirūpito
yad uttamaśloka-guṇānuvarṇanam

Se alguém é dotado de habilidades científicas, filosóficas, políticas, econômicas ou qualquer outra aptidão e deseja atingir a perfeição de seu conhecimento, deve oferecer orações à Suprema Persona­lidade de Deus, compondo poemas de primeira classe ou ocupando seus talentos a serviço do Senhor. Era esse o intento de Citraketu, mas ele não o concretizou devido ao êxtase amoroso. Portanto, teve que esperar por um tempo considerável até que chegasse o momento de ele oferecer orações.

Texto

tataḥ samādhāya mano manīṣayā
babhāṣa etat pratilabdha-vāg asau
niyamya sarvendriya-bāhya-vartanaṁ
jagad-guruṁ sātvata-śāstra-vigraham

Sinônimos

tataḥ — depois disso; samādhāya — controlando; manaḥ — a mente; manīṣayā — com sua inteligência; babhāṣa — falou; etat — isto; pratilabdha — retomando; vāk — fala; asau — aquela pessoa (rei Citraketu); niyamya — controlando; sarva-indriya — de todos os sentidos; bāhya — externos; vartanam — a divagação; jagat-gurum — que é o mestre espiritual de todos; sātvata — do serviço devocional; śāstra — das sagradas escrituras; vigraham — a forma personificada.

Tradução

Depois disso, controlando sua mente com sua inteligência e, dessa maneira, restringindo seus sentidos, afastando-os das ocupações externas, ele retomou as palavras adequadas com as quais poderia expressar seus sentimentos. Assim, colocou-se a oferecer orações ao Senhor, que é a personificação das escrituras sagradas [os sātvata-saṁhitās, tais como a Brahma-saṁhitā e o Nārada-pañcarātra] e que é o mestre espiri­tual de todos. Ele ofereceu as seguintes orações.

Comentário

SIGNIFICADO—Não é com palavras mundanas que se oferecem orações ao Senhor. A pessoa deve tornar-se espiritualmente avançada, controlando a mente e os sentidos. Então, poderá encontrar palavras adequadas para oferecer orações ao Senhor. Citando o seguinte verso do Padma Purāṇa, Śrīla Sanātana Gosvāmī nos proíbe de cantar qualquer canção que não seja cantada por devotos autorizados.

avaiṣṇava-mukhodgīrṇaṁ
pūtaṁ hari-kathāmṛtam
śravaṇaṁ naiva kartavyaṁ
sarpocchiṣṭaṁ yathā payaḥ

As palavras ou canções de alguém que não é exemplar no comportamento vaiṣṇava, e que não segue estritamente as regras e regula­ções e não canta o mantra Hare Kṛṣṇa, não devem ser aceitas pelos devotos puros. As palavras sātvata-śāstra-vigraham indicam que o corpo sac-cid-ānanda do Senhor jamais pode ser aceito como sendo feito de māyā. As orações que os devotos oferecem ao Senhor não são oferecidas a uma forma imaginária. A existência da forma do Senhor é corroborada em toda a literatura védica.

Texto

citraketur uvāca
ajita jitaḥ sama-matibhiḥ
sādhubhir bhavān jitātmabhir bhavatā
vijitās te ’pi ca bhajatām
akāmātmanāṁ ya ātmado ’ti-karuṇaḥ

Sinônimos

citraketuḥ uvāca — o rei Citraketu disse; ajita — ó meu inconquis­tável Senhor; jitaḥ — conquistado; sama-matibhiḥ — por pessoas que controlaram a mente; sādhubhiḥ — os devotos; bhavān — Vossa Onipotência; jita-ātmabhiḥ — que controlaram todos os sentidos; bhavatā — por vós; vijitāḥ — conquistados; te — eles; api — também; ca — e; bhajatām — àqueles que vivem ocupados em Vosso serviço; akāma-ātmanām — motivação de lucro material; yaḥ — quem; ātma­-daḥ — entregando-Vos; ati-karuṇaḥ — extremamente misericordioso.

Tradução

Citraketu disse: Ó Senhor inconquistável, embora não possais ser conquistado por ninguém, é certo que sois conquistado pelos devotos que controlam a mente e os sentidos. Eles podem manter-Vos sob seu controle porque tendes imotivada misericórdia para com os devotos que não buscam em Vós lucro material. Na verdade, Vós Vos entregais a eles e, devido a isso, também exerceis pleno controle sobre Vossos devotos.

Comentário

SIGNIFICADO—Tanto o Senhor quanto os devotos conquistam. O Senhor é conquistado pelos devotos, e os devotos são conquistados pelo Senhor. Devido a essa conquista mútua, ambos os lados obtêm bem-aventurança transcendental em seu relacionamento. A perfeição máxima dessa conquista recíproca é manifestada por Kṛṣṇa e pelas gopīs. As gopīs conquistaram Kṛṣṇa, e Kṛṣṇa conquistou as gopīs. Assim, sempre que tocava Sua flauta, Kṛṣṇa conquistava a mente das gopīs, e, sem ver as gopīs, Kṛṣṇa não podia ser feliz. Outros transcenden­talistas, tais como os jñānīs e os yogīs, não podem conquistar a Su­prema Personalidade de Deus; somente os devotos puros podem conquistá-lO.

Os devotos puros são descritos como sama-mati, o que significa que, haja o que houver, eles nunca se desviam de seu serviço devocional. Não se deve pensar que os devotos adoram o Senhor Supremo apenas quando estão felizes; eles O adoram mesmo quando estão aflitos. Felicidade e aflição não impedem o processo do serviço devocional. Portanto, o Śrīmad-Bhāgavatam diz que o serviço devo­cional é ahaituky apratihatā, imotivado e ininterrupto. Quando o devoto oferece ao Senhor serviço devocional desprovido de motiva­ção (anyābhilāṣitā-śūnyam), esse serviço não pode ser impedido por nenhuma condição material (apratihatā). Assim, o devoto que oferece serviço em quaisquer condições de vida pode conquistar a Su­prema Personalidade de Deus.

Uma distinção especial entre os devotos e os outros transcendentalistas, a saber, os jñānīs e os yogīs, é que os jñānīs e os yogīs tentam artificialmente se tornarem unos com o Supremo, ao passo que os devotos jamais ambicionam essa consecução impossível. Os devotos sabem que estão na posição de servos eternos do Senhor Supremo e que jamais serão unos com Ele. Portanto, são chamados de sama-mati ou jitātmā. Eles sentem ojeriza à ideia de obter unidade com o Supremo. Eles não anelam alcançar essa unidade; em vez disso, cultivam desejos de se livrarem de todos os anseios materiais. Portanto, são chamados de niṣkāma, destituídos de desejos. Uma entidade viva não pode existir sem desejos, mas os desejos que nunca podem ser satisfeitos são chamados kāma, desejos luxuriosos. Kāmais tais tair hṛta jñānāh: devido aos desejos luxuriosos, os não-devotos são despojados de sua inteligência. Assim, são incapazes de conquistar o Senhor Supremo, ao passo que os devotos, estando livres desses desejos infundados, podem con­quistar o Senhor. Tais devotos também são conquistados pela Su­prema Personalidade de Deus. Porque eles são puros e estão livres de todos os desejos materiais, rendem-se plenamente ao Senhor Su­premo, e, portanto, o Senhor os conquista. Tais devotos nunca de­sejam a liberação. Tudo o que querem é servir aos pés de lótus do Senhor. Porque servem o Senhor e não desejam nenhum tipo de remuneração, eles podem obter a misericórdia do Senhor. Por natureza, o Senhor é muito misericordioso, e, ao notar que Seu servo está tra­balhando sem desejos de lucro material, Ele naturalmente Se deixa conquistar.

Os devotos estão sempre ocupados em servir.

sa vai manaḥ kṛṣṇa-padāravindayor
vacāṁsi vaikuṇṭha-guṇānuvarṇane

Todas as atividades de seus sentidos estão ocupadas a serviço do Senhor. Devido a essa devoção, o Senhor entrega-Se aos Seus de­votos como se eles pudessem usá-lO para qualquer propósito que desejassem. Evidentemente, prestar serviço é o único propósito em que os devotos se fixam. Quando o devoto se rende plenamente e não tem aspiração a ganhos materiais, o Senhor na certa lhe proporciona todas as oportunidades para executar serviço ao Senhor. Essa é a atitude tomada pelo Senhor quando é conquistado por Seus devotos.

Texto

tava vibhavaḥ khalu bhagavan
jagad-udaya-sthiti-layādīni
viśva-sṛjas te ’ṁśāṁśās
tatra mṛṣā spardhanti pṛthag abhimatyā

Sinônimos

tava — Vossas; vibhavaḥ — opulências; khalu — na verdade; bhaga­van — ó Suprema Personalidade de Deus; jagat — da manifestação cósmica; udaya — a criação; sthiti — manutenção; laya-ādīni — dissolução e assim por diante; viśva-sṛjaḥ — os criadores do mundo manifesto; te — eles; aṁśa-aṁśāḥ — partes de Vossa porção plenária; tatra — nisto; mṛṣā — em vão; spardhanti — rivais mútuos; pṛthak — da separação; abhimatyā — por uma falsa concepção.

Tradução

Meu querido Senhor, esta manifestação cósmica e sua criação, manutenção e aniquilação são meras opulências Vossas. Uma vez que o senhor Brahmā e outros criadores não passam de uma pequena porção de uma porção Vossa, o poder parcial de que estão dotados e com o qual podem criar não os transforma em Deus [īśvara]. A consciência que eles têm como senhores à parte, portanto, é mera­mente falso prestígio. Ela não é válida.

Comentário

SIGNIFICADO—O devoto que se rendeu plenamente aos pés de lótus do Senhor sabe muito bem que a energia criadora de que as entidades vivas, desde o senhor Brahmā descendo até a pequena formiga, são dotadas existe porque elas são partes integrantes do Senhor. Na Bhagavad-gītā (15.7), o Senhor diz que mamaivāṁśo jīva-loke jīva-bhūtaḥ sanātanaḥ: “As entidades vivas presentes neste mundo condicionado são Minhas eternas partes fragmentárias.” Como as centelhas do fogo, as entidades vivas não passam de pequenas porções do espírito supremo. Porque são partes do Supremo, têm capacidade criativa em quantidade muito diminuta.

Os ditos cientistas do mundo materialista moderno se orgulham de terem criado facilidades modernas, tais como grandes aviões, mas o mérito de criar os aviões deve ser atribuído à Suprema Personali­dade de Deus, não aos cientistas que criaram ou inventaram esses produtos supostamente maravilhosos. O primeiro aspecto a ser consi­derado é a inteligência dos cientistas; é por determinação do Senhor Supremo que alguém consegue elevar-se. Na Bhagavad-gītā (15.15), o Senhor diz que mattaḥ smṛtir jñānam apohanaṁ ca: “É de Mim que vêm a lembrança, o conhecimento e o esquecimento.” Porque o Senhor Supremo, como a Superalma, situa-Se no âmago do coração de toda entidade viva, a ordem pela qual alguém avança em conhecimento científico ou em faculdades criativas vem dEle. Ademais, os ingredientes para fabricar máquinas maravilhosas, tais como aviões, também são fornecidos pelo Senhor, e não pelos cientistas. Antes que o avião fosse criado, seus ingredientes já existiam, tendo sido causados pela Suprema Personalidade de Deus, mas, quando a criação manifesta do avião é destroçada, os detritos restantes se tornam um problema para os seus pretensos criadores. Outro exemplo é que o ocidente está criando muitos automóveis. É óbvio que os ingredientes para esses carros são supridos pelo Senhor Su­premo, e a inteligência com a qual se executa a dita criação também é suprida pelo Senhor. Em última análise, quando os carros são demolidos, os seus pretensos criadores encontram sérias dificul­dades para resolver o problema causado pelos detritos. O verdadeiro criador, o criador original, é a Personalidade de Deus. É apenas circunstancialmente que alguém cria algo com a inteligência fornecida pelo Senhor, e, mais tarde, a criação volta a ser um problema. Portanto, o pretenso criador não deve receber o mérito do ato da criação; o único mérito fica com a Suprema Personalidade de Deus. Aqui, afirma-se corretamente que o mérito de todas as opulências da criação, manutenção e aniquilação pertence ao Senhor Supremo, e não às entidades vivas.

Texto

paramāṇu-parama-mahatos
tvam ādy-antāntara-vartī traya-vidhuraḥ
ādāv ante ’pi ca sattvānāṁ
yad dhruvaṁ tad evāntarāle ’pi

Sinônimos

parama-aṇu — da partícula atômica; parama-mahatoḥ — e da maior (o resultado da combinação de átomos); tvam — Vós; ādi-anta — tanto no começo quanto no fim; antara — e no meio; vartī — existindo; traya-vidhuraḥ — embora não tenhais começo, fim ou meio; ādau — no começo; ante — no fim; api — também; ca — e; sattvānām — de todas as existências; yat — o qual; dhruvam — permanente; tat — isto; eva — decerto; antarāle — no meio; api — também.

Tradução

Vós existis no começo, no meio e no fim de tudo, desde a mais diminuta partícula da manifestação cósmica – o átomo –, até os gigantescos universos e até a totalidade da energia material. Entre­tanto, sois eterno e não tendes começo, meio ou fim. Percebe-se Vossa existência nessas três fases e, assim, sois permanente. Quando a manifestação cósmica deixa de existir, continuais existindo como a potência original.

Comentário

SIGNIFICADO—A Brahma-saṁhitā (5.33) diz:

advaitam acyutam anādim ananta-rūpam
ādyaṁ purāṇa-puruṣaṁ nava-yauvanaṁ ca
vedeṣu durlabham adurlabham ātma-bhaktau
govindam ādi-puruṣaṁ tam ahaṁ bhajāmi

“Adoro Govinda [Kṛṣṇa], a Suprema Personalidade de Deus, que é a pessoa original – absoluta, infalível, sem começo, que, embora tenha Se expandido em formas ilimitadas, permanece a mesma pessoa original e, sendo o mais velho, parece sempre um jovem viçoso. Essas eternas, bem-aventuradas e oniscientes formas do Senhor não podem ser compreendidas nem mesmo pelos melhores eruditos entendidos nos Vedas, mas sempre se manifestam para os devotos puros e imaculados.” A Suprema Personalidade de Deus não tem causa, pois Ele é a causa de tudo. O Senhor está além das atividades de causa e efeito. Ele existe eternamente. Em outro verso, a Brahma-saṁhitā diz que aṇḍāntara-stha-paramāṇu-cayāntara-stham: o Senhor existe dentro do universo gigantesco e dentro do átomo. O ingresso do Senhor no átomo e no universo indica que, sem Sua presença, nada realmente poderia existir. Os cientistas afirmam que a água é uma combinação de hidrogênio e oxigênio, mas, ao verem a vastidão do oceano, tentam descobrir qual a procedência de tamanha quan­tidade de hidrogênio e oxigênio e, desse modo, ficam estupefatos. Eles pensam que tudo surgiu das substâncias químicas – mas de onde vieram as substâncias químicas? Isso eles não sabem responder. Como é a causa de todas as causas, a Suprema Personalidade de Deus pode produzir uma imensa quantidade de substâncias químicas e criar uma situação favorável ao surgimento dessas substâncias. De fato, observamos que as substâncias químicas são produzidas pelas entidades vivas. Por exemplo, um limoeiro produz muitas tonela­das de ácido cítrico. O ácido cítrico não é a causa da árvore; ao con­trário, a árvore é a causa de o ácido aparecer. Do mesmo modo, a Suprema Personalidade de Deus é a causa de tudo. Ele é a causa da árvore que produz o ácido cítrico (bījaṁ māṁ sarva-bhūtānām). Os devotos sabem que as potências originais que causam a manifes­tação cósmica não estão nas substâncias químicas, mas na Suprema Personalidade de Deus, pois Ele é a causa das substâncias químicas.

Tudo é causado ou manifestado pela energia do Senhor Supremo, e, quando tudo é aniquilado ou dissolvido, a potência original entra no corpo do Senhor Supremo. Portanto, este verso diz: ādāv ante ’pi ca sattvānāṁ yad dhruvaṁ tad evāntarāle ’pi. A palavra dhruvam significa “permanente”. A realidade permanente é Kṛṣṇa, e não esta manifestação cósmica. Como se afirma na Bhagavad-gītā, aham ādir hi devānām and mattaḥ sarvaṁ pravartate: Kṛṣṇa é a causa que origina tudo. Arjuna reconheceu o Senhor Kṛṣṇa como a pessoa original (puruṣaṁ śāśvataṁ divyam ādi-devam ajaṁ vibhum), e a Brahma-­saṁhitā descreve-O como a pessoa original (govindam ādi-puruṣam). Ele é a causa de todas as causas, seja no começo, no meio ou no fim.

Texto

kṣity-ādibhir eṣa kilāvṛtaḥ
saptabhir daśa-guṇottarair aṇḍa-kośaḥ
yatra pataty aṇu-kalpaḥ
sahāṇḍa-koṭi-koṭibhis tad anantaḥ

Sinônimos

kṣiti-ādibhiḥ — pelos ingredientes do mundo material, começando pela terra; eṣaḥ — este; kila — na verdade; āvṛtaḥ — coberto; saptabhiḥ — sete; daśa-guṇa-uttaraiḥ — cada um dez vezes maior do que o anterior; aṇḍa-kośaḥ — universo em forma de ovo; yatra — em quem; patati — cai; aṇu-kalpaḥ — como um átomo diminuto; saha — com; aṇḍa-koṭi­-koṭibhiḥ — milhões desses universos; tat — portanto; anantaḥ — (sois chamado de) ilimitado.

Tradução

Cada universo está coberto por sete camadas – terra, água, fogo, ar, céu, a totalidade da energia e o falso ego –, cada uma dez vezes maior do que a anterior. Além deste, existem inúmeros universos, e, embora eles sejam ilimitadamente grandes, movem-se como átomos dentro de Vós. Portanto, sois chamado de ilimitado [ananta].

Comentário

SIGNIFICADO—A Brahma-saṁhitā (5.48) diz:

yasyaika-niśvasita-kālam athāvalambya
jīvanti loma-vilajā jagad-aṇḍa-nāthāḥ
viṣṇur mahān sa iha yasya kalā-viśeṣo
govindam ādi-puruṣaṁ tam ahaṁ bhajāmi

A origem da criação material é Mahā-Viṣṇu, que repousa no Oceano Causal. Quando Ele dorme naquele oceano, milhões de universos procedem de Sua exalação, e todos eles são aniquilados quando Ele inala. Esse Mahā-Viṣṇu é uma porção plenária de uma porção de Viṣṇu, Govinda (yasya kalā-viśeṣaḥ). A palavra kalā se refere a uma porção plenária de uma porção plenária. De Kṛṣṇa, ou Govinda, vem Balarāma; de Balarāma, Saṅkarṣaṇa; de Saṅkarṣaṇa, Nārāyaṇa; de Nārāyaṇa, o segundo Saṅkarṣaṇa; do segundo Saṅkarṣaṇa, Mahā-Viṣṇu; de Mahā-Viṣṇu, Garbhodakaśāyī Viṣṇu; e, de Garbhodakaśāyī-Viṣṇu, Kṣīrodakaśāyī Viṣṇu. Kṣīrodakaśāyī-Viṣṇu controla cada um dos universos. Isso é um indicativo do significado de ananta, ilimitado. O que dizer, então, da potência e da existência ilimitadas do Senhor? Este verso descreve as coberturas do universo (saptabhir daśa-guṇottarair aṇḍa-kośaḥ). A primeira cobertura é terra; a segun­da, água; a terceira, fogo; a quarta, ar; a quinta, céu; a sexta, a totalidade da energia material, e a sétima é o falso ego. Logo em seguida à cobertura de terra, cada cobertura é dez vezes maior do que a anterior. Assim, podemos apenas imaginar quão grande é cada universo, e existem muitos milhões de universos. Como o próprio Senhor confirma na Bhagavad-gītā (10.42):

athavā bahunaitena
kiṁ jñātena tavārjuna
viṣṭabhyāham idaṁ kṛtsnam
ekāṁśena sthito jagat

“Mas qual é a necessidade, Arjuna, de todo esse conhecimento minucioso? Com um simples fragmento de Mim mesmo, Eu penetro e sustento todo este universo.” O mundo material inteiro representa apenas um quarto da energia do Senhor Supremo. Portanto, Ele Se chama­ ananta.

Texto

viṣaya-tṛṣo nara-paśavo
ya upāsate vibhūtīr na paraṁ tvām
teṣām āśiṣa īśa
tad anu vinaśyanti yathā rāja-kulam

Sinônimos

viṣaya-tṛṣaḥ — ansiosos por desfrutarem de gozo dos sentidos; nara­paśavaḥ — animais parecidos com seres humanos; ye — quem; upāsa­te — adoram muito suntuosamente; vibhūtīḥ — pequenas partículas do Senhor Supremo (semideuses); na — não; param — o Supremo; tvām — Vós; teṣām — deles; āśiṣaḥ — as bênçãos; īśa — ó controlador supre­mo; tat — eles (os semideuses); anu — depois de; vinaśyanti — serão aniquiladas; yathā — assim como; rāja-kulam — aqueles que são assistidos pelo governo (quando o governo termina).

Tradução

Ó Senhor, ó Supremo, as pessoas sem inteligência que estão sedentas de gozo material e que adoram vários semideuses não passam de animais com corpo humano. Devido a suas propensões anima­lescas, elas se recusam a adorar Vossa Onipotência, e, em vez disso, adoram os semideuses insignificantes, que são meramente pequenas fagulhas de Vossa glória. Com a destruição de todo o universo, e, portanto, também dos semideuses, as bênçãos recebidas dos semi­deuses se esvaem, assim como a nobreza de um rei que não mais está no poder.

Comentário

SIGNIFICADO—A Bhagavad-gītā (7.20) diz que kāmais tais tair hṛta jñānāḥ pra­padyante ’nya-devatāḥ: “Aqueles cujas mentes são arrastadas por desejos materiais se rendem aos semideuses.” Seguindo essa mesma linha, este verso condena a adoração aos semideuses. Podemos demonstrar nosso respeito aos semideuses, mas não se devem adorá-­los. A inteligência daqueles que adoram os semideuses está perdida (hṛta jñānāḥ) porque esses adoradores não sabem que, quando toda a manifestação cósmica material for aniquilada, os semideuses, que são líderes departamentais dessa manifestação, serão exterminados.
Quando os semideuses forem aniquilados, as bênçãos que eles outorgaram aos homens ininteligentes também serão aniquiladas. Portanto, o devoto não deve ficar adorando os semideuses para, em troca, obter opulência material, mas deve ocupar-se a serviço do Senhor, pois Ele satisfará todos os seus desejos.

akāmaḥ sarva-kāmo vā
mokṣa-kāma udāra-dhīḥ
tīvreṇa bhakti-yogena
yajeta puruṣaṁ param

“Quer esteja repleta de todos os desejos materiais, quer esteja livre de desejos materiais, quer deseje liberação, uma pessoa que tenha inteligência refinada não deve medir esforços para adorar o todo supremo, a Personalidade de Deus.” (Śrīmad-Bhāgavatam 2.3.10). Este é o dever de um ser humano perfeito. Quem quer que tenha formato de ser humano, mas cujas ações são exatamente as de um animal se chama nara-paśu ou dvipada-paśu, um animal de duas patas. Um ser hu­mano que não está interessado em consciência de Kṛṣṇa é, neste ensejo, condenado como nara-paśu.

Texto

kāma-dhiyas tvayi racitā
na parama rohanti yathā karambha-bījāni
jñānātmany aguṇamaye
guṇa-gaṇato ’sya dvandva-jālāni

Sinônimos

kāma-dhiyaḥ — desejos de gozo dos sentidos; tvayi — em Vós; ra­citāḥ — executados; na — não; parama — ó Suprema Personalidade de Deus; rohanti — crescem (produzem outros corpos); yathā — assim como; karambha-bījãni — sementes esterilizadas ou fritas; jñāna­-ātmani — em Vós, cuja existência é plena de conhecimento; aguṇa­maye — que não sois afetado pelas qualidades materiais; guṇa-ga­ṇataḥ — das qualidades materiais; asya — de uma pessoa; dvandva-­jālāni — as redes da dualidade.

Tradução

Ó Senhor Supremo, se as pessoas obcecadas por desejos materiais e que buscam obter gozo dos sentidos através da opulência material adoram a Vós que sois a fonte de todo o conhecimento e sois transcendental às qualidades materiais, elas não estão sujeitas ao renas­cimento material, assim como sementes esterilizadas ou fritas não germinam. As entidades vivas estão sujeitas a repetidos nascimen­tos e mortes porque são condicionadas à natureza material, porém, como sois transcendental, aquele que tem a propensão a se associar convosco em transcendência escapa às condições impostas pela na­tureza material.

Comentário

SIGNIFICADO—Confirma-se isso na Bhagavad-gītā (4.9), onde o Senhor diz:

janma karma ca me divyam
evaṁ yo vetti tattvataḥ
tyaktvā dehaṁ punar janma
naiti mām eti so ’rjuna

“Aquele que conhece a natureza transcendental de Meu aparecimen­to e atividades, ao deixar o corpo, não volta a nascer neste mundo material, mas alcança Minha morada eterna, ó Arjuna.” Se alguém, querendo entender Kṛṣṇa, simplesmente se ocupa em consciência de Kṛṣṇa, decerto se torna imune ao processo de repetidos nascimen­tos e mortes. Como a Bhagavad-gītā afirma explicitamente, tyaktvā dehaṁ punar janma naitk: tal pessoa, pelo simples fato de se ocupar em consciência de Kṛṣṇa ou entender Kṛṣṇa, a Suprema Personali­dade de Deus, torna-se muito cotada para retornar ao lar, retornar ao Supremo. Mesmo aqueles que estão obcecados por desejos ma­teriais também podem chegar a adorar a Suprema Personalidade de Deus tão firmemente que acabam voltando ao Supremo. O fato é que, embora talvez ainda cultive muitos desejos materiais, se alguém chega à consciência de Kṛṣṇa, sente-se cada vez mais atraído pelos s de lótus de Kṛṣṇa ao se associar com o Senhor Supremo mediante o canto de Seu santo nome. O Senhor Supremo e Seu santo nome são idênticos. Assim, essa pessoa acaba desinteressando-se do apego gozo material. A perfeição da vida é perder o interesse pelo gozo material e se interessar por Kṛṣṇa. Se, de alguma maneira, alguém chega à consciência de Kṛṣṇa, mesmo que seja através da busca de ganho material, o resultado é que ele se libertará. Kāmād dvesād blayāt snehāt. Quer esteja procurando satisfazer seus desejos mate­riais, quer seja pela influência da inveja, pelo temor, pela afeição ou por qualquer outra razão, se alguém se dirige a Kṛṣṇa, sua vida é exitosa.

Texto

jitam ajita tadā bhavatā
yadāha bhāgavataṁ dharmam anavadyam
niṣkiñcanā ye munaya
ātmārāmā yam upāsate ’pavargāya

Sinônimos

jitam — conquistado; ajita — ó inconquistável; tadā — então; bha­vatā — por Vossa Onipotência; yadā — quando; āha — falado; bhāga­vagm — que ajuda o devoto a se aproximar da Suprema Personali­dade de Deus; dharmam — o processo religioso; anavadyam — sem de defeitos (livre de contaminação); niṣkiñcanāḥ — que não têm desejos de serem felizes com opulências materiais; ye — aqueles que; mu­nayaḥ — grandes filósofos e sábios exímios; ātma-ārāmāḥ — que são satisfeitos (conhecendo perfeitamente bem sua posição constitucional de servos eternos do Senhor); yam — quem; upāsate — adoram; apavargāya — para se libertarem do cativeiro material.

Tradução

Ó inconquistável, quando falastes sobre bhāgavata-dharma, o incontaminado sistema religioso através do qual se alcança refúgio aos Vossos pés de lótus, esta foi Vossa vitória. As pessoas que não têm desejos materiais, como, por exemplo, os Kumāras, que são sábios autossatisfeitos, adoram-Vos para se libertarem da contaminação material. Em outras palavras, para alcançar refúgio aos Vossos pés de lótus, eles aceitam o processo de bhāgavata-dharma.

Comentário

SIGNIFICADO—Como afirma Śrīla Rūpa Gosvāmī no Bhakti-rasāmṛta-sindhu:

anyābhilāṣitā-śūnyaṁ
jñāna-karmādy-anāvṛtam
ānukūlyena kṛṣṇānu-
śīlanaṁ bhaktir uttamā

“É em uma atitude favorável e sem desejos de lucro ou ganho mate­riais obtidos através de atividades fruitivas ou especulação filosófica que se deve prestar transcendental serviço amoroso ao Supremo Senhor Kṛṣṇa. Chama-se a isso serviço devocional puro.­

O Nārada-pañcarātra também diz:

sarvopādhi-vinirmuktaṁ
tat-paratvena nirmalam
hṛṣīkeṇa hṛṣīkeśa-
sevanaṁ bhaktir ucyate

“Devemos livrar-nos de todas as designações materiais e purificar-nos de toda a contaminação material. Devemos reaver nossa identidade pura, na qual ocupamos nossos sentidos a serviço do proprietário dos sentidos. Isso se chama serviço devocional.” Isso também se chama bhāgavata-dharma. Sem aspirações materiais, todos simples­mente devem servir a Kṛṣṇa, como o aconselham a Bhagavad-gītā, o Nārada-pañcarātra e o Śrīmad-Bhāgavatam. Bhāgavata-dharma é o processo de religião exposto pelos devotos puros, representantes diretos da Suprema Personalidade de Deus, tais como Nārada, Śuka­deva Gosvāmī e seus humildes servos na sucessão discipular. Quem entende bhāgavata-dharma se livra imediatamente da contaminação material. As entidades vivas, que são partes integrantes da Suprema Personalidade de Deus, sofrem vagando neste mundo material. Quando o próprio Senhor as instrui sobre bhāgavata-dharma e elas adotam o processo, essa vitória é do Senhor, pois Ele, então, resgata essas almas caídas. O devoto que segue os princípios de bhāgavata­-dharma se sente muito agradecido à Suprema Personalidade de Deus. Ele pode entender o que é a vida sem bhāgavata-dharma e o que é a vida com bhāgavata-dharma e, assim, fica eternamente grato ao Senhor. Adotar a consciência de Kṛṣṇa e trazer para a consciência de Kṛṣṇa as almas que estão caídas é vitória do Senhor Kṛṣṇa.

sa vai puṁsāṁ paro dharmo
yato bhaktir adhokṣaje
ahaituky apratihatā
yayātmā suprasīdati

“A ocupação [dharma] suprema, designada para toda a humanida­de, é aquela através da qual os homens podem alcançar o amoroso serviço devocional ao Senhor transcendental. Para satisfazer intei­ramente o eu, esse serviço devocional deve ser imotivado e ininter­rupto.” (Śrīmad-Bhāgavatam 1.2.6) Portanto, o Śrīmad-Bhāgavatam é o processo religioso transcendental puro.

Texto

viṣama-matir na yatra nṛṇāṁ
tvam aham iti mama taveti ca yad anyatra
viṣama-dhiyā racito yaḥ
sa hy aviśuddhaḥ kṣayiṣṇur adharma-bahulaḥ

Sinônimos

viṣama — desigual (tua religião, minha religião; tua crença, minha crença); matiḥ — consciência; na — não; yatra — na qual; nṛṇām — da sociedade humana; tvam — tu; aham — eu; iti — assim; mama — meu; tava — teu; iti — assim; ca — também; yat — a qual; anyatra — em outra parte (nos sistemas religiosos diferentes do bhāgavata-dharma); viṣama-dhiyā — por essa inteligência desigual; racitaḥ — feito; yaḥ — aquilo que; saḥ — esse sistema de religião; hi — na verdade; aviśud­dhaḥ — impuro; kṣayiṣṇuḥ — temporário; adharma-bahulaḥ — cheio de irreligião.

Tradução

Por estarem cheias de contradições, todas as formas de religião, com exceção do bhāgavata-dharma, atuam sob concepções de resultados fruitivos e de distinções de “tu e eu” e “teu e meu”. Os seguidores do Śrīmad-Bhāgavatam não adquiriram semelhante consciência. Todos eles são conscientes de Kṛṣṇa, e sabem que são de Kṛṣṇa e que Kṛṣṇa é deles. Existem outros sistemas religiosos que, sendo de classe inferior, são praticados por pessoas que desejam exterminar seus inimigos ou buscam poderes místicos, mas esses sis­temas religiosos, estando cheios de paixão e inveja, são impuros e temporários. Porque estão cheios de inveja, prolifera neles a irreli­gião.

Comentário

SIGNIFICADO—O bhāgavata-dharma não tem contradições. Os conceitos de “tua religião” e “minha religião” estão completamente ausentes do bhāgavata-dharma. Bhāgavata-dharma significa seguir as ordens que o Senhor Supremo, Bhagavān, expôs na Bhagavad-gītā: sarva-dharmān parityajya mām ekaṁ śaraṇaṁ vraja. Só existe um Deus, e Ele existe para todos. Portanto, todos devem render-se a Deus. Esse conceito de religião é puro. Tudo o que Deus ordena constitui religião (dharmaṁ tu sākṣād bhagavat-praṇītam). No bhāgavata-­dharma, está fora de cogitação dizer: “Em que acreditas”­ e “Em que acredito”. Todos devem crer no Senhor Supremo e cumprir Suas ordens. Ānukūlyena kṛṣṇānuśīlanam: tudo o que Kṛṣṇa diz – tudo o que Deus afirma – deve ser diretamente executado. Isso é dharma, religião.

Se alguém realmente é consciente de Kṛṣṇa, não pode ter inimi­gos. Como sua única ocupação é induzir os outros a se renderem a Kṛṣṇa, ou Deus, como ele pode ter inimigos? Se alguém promove a religião hindu, a religião muçulmana, a religião cristã, esta religião ou aquela religião, haverá conflitos. A história mostra que os seguidores dos sistemas religiosos sem uma clara concepção acerca de Deus têm lutado uns com os outros. Na história humana, podem-­se mencionar muitos desses exemplos, mas os sistemas de religião que não se concentram no serviço ao Supremo são temporários e não podem durar muito tempo, pois estão cheios de inveja. Exis­tem muitas atividades dirigidas contra esses sistemas religiosos, de modo que se deve abandonar a ideia de “minha crença” e “tua crença”. Todos devem crer em Deus e se render a Ele. Isso é bhāgavata­-dharma.

Bhāgavata-dharma não é uma crença sectária inventada, pois requer pesquisas para saber como é que tudo está relacionado com Kṛṣṇa (īśāvāsyam idaṁ sarvam). De acordo com os preceitos védi­cos, sarvaṁ khalv idaṁ brahma: o Brahman, o Supremo, está presente em tudo. O bhāgavata-dharma manifesta essa presença do Supremo. Bhāgavata-dharma não considera que tudo o que existe no mundo é falso. Porque tudo emana do Supremo, nada pode ser falso; tudo tem alguma utilidade no serviço ao Supremo. Por exemplo, agora estamos ditando em um microfone e gravando em um ditafone e, assim, estamos comprovando como a máquina pode vincular-se ao Brahman Supremo. Como estamos usando esta máquina a serviço do Senhor, ela é Brahman. Esse é o significado de sarvaṁ khalv idaṁ brahma. Tudo é Brahman porque tudo pode ser usado a serviço do Senhor Supremo. Nada é mithyā, falso; tudo tem substancialidade.

O bhāgavata-dharma se chama sarvotkṛṣṭa, o melhor de todos os sistemas religiosos, porque aqueles que seguem o bhāgavata-dharma não invejam ninguém. Os bhāgavatas de verdade, os devotos puros, sendo destituídos de inveja, convidam todos a se unirem ao movimento da consciência de Kṛṣṇa. Portanto, o devoto é tal qual a Suprema Personalidade de Deus. Suhṛdaṁ sarva-bhūtānām: é amigo de todas as entidades vivas. Por conseguinte, esse é o melhor de todos os siste­mas religiosos. Enquanto as assim chamadas religiões se restringem a um determinado tipo de pessoa que tem uma crença em particular, essa discriminação não encontra respaldo na consciência de Kṛṣṇa, ou no bhāgavata-dharma. Se esmiuçarmos os sistemas religiosos através dos quais se adoram os semideuses ou outrem que não a Suprema Personalidade de Deus, verificaremos que estão cheios de inveja e que, portanto, são impuros.

Texto

kaḥ kṣemo nija-parayoḥ
kiyān vārthaḥ sva-para-druhā dharmeṇa
sva-drohāt tava kopaḥ
para-sampīḍayā ca tathādharmaḥ

Sinônimos

kaḥ — que; kṣemaḥ — benefício; nija — para a própria pessoa; pa­rayoḥ — e para os outros; kiyān — quanto; — ou; arthaḥ — propósito; sva-para-druhā — que inveja o autor e os outros; dharmeṇa — com o sistema religioso; sva-drohāt — porque sente inveja do seu próprio eu; tava — Vossa; kopaḥ — ira; para-sampīḍayā — causando dor aos outros; ca — também; tathā — bem como; adharmaḥ — irreligião.

Tradução

Como um sistema religioso que fomenta em alguém a inveja à própria pessoa e aos outros pode ser benéfico para ele e para estes? O que há de auspicioso em seguir tal sistema? O que realmente se ganha com isso? Causando dor pessoal devido à autoinveja e causando dor aos outros, provoca-se a Vossa ira e se pratica a irreligião.

Comentário

SIGNIFICADO—Todo sistema religioso, exceto o processo de bhāgavata-dharma – serviço eterno à Suprema Personalidade de Deus – é um sistema de inveja a si próprio e aos outros. Por exemplo, existem muitos sistemas religiosos nos quais se recomendam sacrifícios de animais. Esses sacrifícios de animais são inauspiciosos tanto para o sacrifi­cador quanto para o animal. Embora, às vezes, tenha-se permissão para sacrificar um animal perante a deusa Kālī e comê-lo em vez de comprar carne em um açougue, a permissão de comer carne após um sacrifício na presença da deusa Kālī não é decretada pela Suprema Personalidade de Deus. É uma mera concessão ao sujeito desafortunado que não consegue se abster do consumo de carne. Tem por objetivo restringir seu incontido desejo de comer carne. Semelhante sistema religioso é condenado. Portanto, Kṛṣṇa diz que sarva-dharmān parityajya mām ekaṁ śaraṇaṁ vraja: “Abandona todos os outros deveres e rende-te a Mim.” Essa é a última palavra no que se refere à religião.

Alguém poderia argumentar que os Vedas recomendam o sacrifí­cio de animais. Essa recomendação, entretanto, é um método que favorece a restrição. Se os Vedas não restringirem a compra de carne, as pessoas comprarão carne no mercado, que ficará inundado de açougues, e os matadouros proliferarão. Para restringir isso, às vezes os Vedas dizem que alguém pode comer carne após sacrificar diante da deusa Kālī um animal insignificante, como um bode, por exemplo. Em qualquer caso, um sistema de religião no qual se recomendam sacri­fícios de animais é inauspicioso tanto para aqueles que executam os sacrifícios quanto para os animais. As pessoas invejosas que executam pomposos sacrifícios de animais são da seguinte maneira condenadas na Bhagavad-gītā (16.17):

ātma-sambhāvitāḥ stabdhā
dhana-māna-madānvitāḥ
yajante nāma-yajñais te
dambhenāvidhi-pūrvakam

“Acomodados e sempre cínicos, deixando-se iludir pela riqueza e pelo falso prestígio, eles às vezes orgulhosamente executam sacrifícios apenas de nome, sem seguirem nenhuma regra ou regulação.” Às vezes, os sacrifícios de animais são executados muito pomposamente, com grandes arranjos para a adoração à deusa Kālī, mas esses festi­vais, embora executados em nome de yajña, não são yajñas de verda­de, pois yajña significa satisfazer a Suprema Personalidade de Deus. Nesta era, portanto, recomenda-se especificamente que yajñaiḥ saṅkīrtana-prāyair yajanti hi sumedhasaḥ: aqueles que têm inteligência arguta satisfazem o yajña-puruṣa, Viṣṇu, cantando o mantra Hare Kṛṣṇa. As pessoas invejosas, entretanto, recebem da Suprema Personalidade de Deus a seguinte desaprovação:

ahaṅkāraṁ balaṁ darpaṁ
kāmaṁ krodhaṁ ca saṁśritāḥ
mām ātma-para-deheṣu
pradviṣanto ’bhyasūyakāḥ
tān ahaṁ dviṣataḥ krūrān
saṁsāreṣu narādhamān
kṣipāmy ajasram aśubhān
āsurīṣv eva yoniṣu

“Confundidos pelo falso ego, força, orgulho, luxúria e ira, os demônios passam a invejar a Suprema Personalidade de Deus, que está em seus próprios corpos e nos corpos dos outros, e blasfemam contra a religião verdadeira. Aqueles que são invejosos e maliciosos, os mais baixos entre os homens, Eu os lanço perpetuamente no oceano da existência material, em várias espécies de vida demoníaca.” (Bhagavad-gītā 16.18-19) Como indicam as palavras tava kopaḥ, essas pessoas são condenadas pela Suprema Personalidade de Deus. Quem comete assassinato tem inveja de si próprio e também da pessoa a quem matou, pois o resultado de cometer um assassinato é que ela será presa e enforcada. Se alguém viola as leis governamentais hu­manas, pode escapar de ser morto pelo Estado, mas ninguém pode escapar das leis de Deus. Quem mata qualquer animal, tem que ser morto pelo mesmo animal em sua pró­xima vida. Essa é a lei da natureza. Todos devem seguir as instruções do Senhor Supremo: sarva-dharmān parityajya mām ekaṁ śaraṇaṁ vraja. Se alguém segue qualquer outro sistema de religião, fica sujeito à punição que, de várias maneiras, a Suprema Personalidade de Deus inflige a quem Lhe desobedece. Portanto, se alguém segue um sistema religioso inventado, tem inveja não apenas dos outros, mas também de si próprio. Consequentemente, seu sistema de religião é inútil.

dharmaḥ svanuṣṭhitaḥ puṁsāṁ
viṣvaksena-kathāsu yaḥ
notpādayed yadi ratiṁ
śrama eva hi kevalam

“Os deveres [dharma] executados pelos homens, não importando a posição destes, não passam de uma grande quantidade de esforço inútil se não provocam atração pela mensagem do Senhor Supremo.” Seguir um sistema religioso que não desperta nas pessoas a cons­ciência de Kṛṣṇa, ou consciência de Deus, é um mero desperdício de tempo e trabalho.

Texto

na vyabhicarati tavekṣā
yayā hy abhihito bhāgavato dharmaḥ
sthira-cara-sattva-kadambeṣv
apṛthag-dhiyo yam upāsate tv āryāḥ

Sinônimos

na — não; vyabhicarati — falha; tava — Vosso; īkṣā — ponto de vista; yayā — pelo qual; hi — na verdade; abhihitaḥ — declarado; bhāgava­taḥ — em relação com Vossas instruções e atividades; dharmaḥ — prin­cípio religioso; sthira — inertes; cara — móveis; sattva-kadambeṣu — entre as entidades vivas; apṛthak-dhiyaḥ — que não consideram dis­tinções; yam — o qual; upāsate — seguem; tu — decerto; āryāḥ — aqueles que são avançados em civilização.

Tradução

Meu querido Senhor, o dever ocupacional da pessoa é ensinado no Śrīmad-Bhāgavatam e na Bhagavad-gītā, cujas instruções estão de acordo com Vosso ponto de vista, o qual nunca se desvia da meta máxima da vida. Aqueles que seguem seus deveres ocupacionais sob Vossa supervisão, sendo equânimes com todas as entidades vivas, móveis e inertes, e não considerando ninguém superior ou inferior, são chamados de arianos. Esses arianos prestam adoração a Vós, a Suprema Personalidade de Deus.

Comentário

SIGNIFICADO—Bhāgavata-dharma e kṛṣṇa-kathā são idênticos. Śrī Caitanya Mahāprabhu queria que todos se tornassem gurus e, na linha da Bhagavad-gītā, Śrīmad-Bhāgavatam, Purāṇas, Vedānta-sūtra e textos védicos afins, pregassem em toda parte as instruções de Kṛṣṇa. Os arianos, cuja civilização é avançada, seguem o bhāgavata-dharma. Prahlāda Mahārāja, embora um simples menino de cinco anos, recomendava:

kaumāra ācaret prājño
dharmān bhāgavatān iha
durlabhaṁ mānuṣaṁ janma
tad apy adhruvam arthadam

Sempre que seus professores se ausentavam da sala de aula, Prah­lāda Mahārāja se aproveitava da oportunidade e pregava o bhāgavata-­dharma a seus colegas de classe. Ele dizia que, desde o comecinho da vida, desde os cinco anos de idade, as crianças devem ser instruí­das sobre o bhāgavata-dharma porque a forma de vida humana, que é muito raramente obtida, presta-se a compreender este tema.

Bhāgavata-dharma significa viver de acordo com as instruções da Suprema Personalidade de Deus. Na Bhagavad-gītā, observamos que o Senhor Supremo dividiu a sociedade humana em quatro classes sociais, a saber, brāhmaṇa, kṣatriya, vaiśya e śūdra. Também, os Purāṇas e outros textos védicos estabeleceram quatro āśramas, que são as categorias de vida espiritual. Portanto, bhāgavata-dharma sig­nifica o varṇāśrama-dharma das quatro classes sociais e das quatro classes espirituais.

Os membros da sociedade humana que seguem estritamente os princípios de bhāgavata-dharma e vivem de acordo com as instru­ções da Suprema Personalidade de Deus são chamados de arianos ou ārya. Uma civilização de arianos que seguem à risca as instruções do Senhor e que jamais se desviam dessas instruções é perfeita. Esses homens civilizados não discriminam entre árvores, animais, seres humanos e outras entidades vivas. Paṇḍitāḥ sama-darśinaḥ: porque são completamente educados em consciência de Kṛṣṇa, veem todos os seres vivos com a mesma visão. Se nem mesmo uma pequenina planta os arianos matam desnecessariamente, o que dizer, então, de cortar árvores para com isso obter gozo dos senti­dos? No momento atual, em todo o mundo, matar é uma atividade proeminente. Os homens matam as árvores, matam os animais e matam também outros seres humanos, e fazem tudo isso apenas para o gozo dos senti­dos. Semelhante civilização não é ariana. Como se afirma aqui, sthira-cara-sattva-kadambeṣv apṛthag-dhiyaḥ. A palavra apṛthag-­dhiyaḥ indica que os arianos não fazem distinções entre graus de vida superior e inferior. Toda espécie de vida deve ser protegida. Todos os seres vivos, mesmo as árvores e as plantas, têm direito a viver. Esse é o princípio básico de uma civilização ariana. Excluídas as entidades vivas inferiores, aqueles que chegaram à plataforma da civilização humana devem dividir-se em uma sociedade de brāhmaṇas, kṣatriyas, vaiśyas e śūdras. Os brāhmaṇas devem seguir as instruções que a Suprema Personalidade de Deus comunicou na Bhagavad-gītā e em outros textos védicos. Devem-se adotar como critério guṇa e karma. Em outras palavras, devem-se adquirir as qualidades de brāhmaṇa, kṣatriya, vaiśya ou śūdra e agir no nível correspondente. Essa é a civilização aceita pelos arianos. Por que eles a aceitam? Porque estão muito ansiosos por satisfazer Kṛṣṇa. Essa civilização é perfeita.

Os arianos não se desviam das instruções de Kṛṣṇa, tampouco duvidam de Kṛṣṇa, mas os não-arianos e outras pessoas demoníacas se recusam a aceitar as instruções da Bhagavad-gītā e do Śrīmad­-Bhāgavatam. Isso porque eles foram treinados para obter gozo dos sentidos às custas de todas as outras entidades vivas. Nūnaṁ pramattaḥ kurute vikarma: sua única atividade consiste em se entregar a toda espécie de atividades proibidas para extrair delas o gozo dos sentidos. Yad indriya prītaya āpṛṇoti: eles se desviam dessa maneira porque querem satisfazer seus sentidos. Eles não têm nenhuma outra ocupa­ção ou ambição. O verso anterior condena o seu método de civi­lização. Kaḥ kṣemo nija-parayoḥ kiyān vārthaḥ sva-para-druhā dharmeṇa: “De que adianta uma civilização que mata a si própria e aos outros?”

Este verso, portanto, aconselha que todos se tornem membros da civilização ariana e aceitem as instruções da Suprema Personalidade de Deus. Devem-se cumprir os deveres sociais, políticos e religiosos de acordo com essas instruções. É na tentativa de estabelecer uma sociedade na maneira como Kṛṣṇa a instituiu que estamos espalhando o movimento da consciência de Kṛṣṇa. Esse é o significado da cons­ciência de Kṛṣṇa. Portanto, estamos apresentando a Bhagavad-gītā como ela é, e afugentando todas as outras classes de invenção mental. Os tolos e patifes interpretam a Bhagavad-gītā ao seu próprio modo. Quando Kṛṣṇa diz que man-manā bhava mad-bhakto mad-yājī māṁ namaskuru: “Pensa sempre em Mim, torna-te Meu devoto, adora­Me e oferece-Me tuas homenagens”, eles comentam que não é a Kṛṣṇa que devemos render-nos. Assim, tiram da Bhagavad-gītā significados imaginários. Entretanto, para o completo bem-estar da sociedade humana, o movimento da consciência de Kṛṣṇa segue estritamente o bhāgavata-dharma, as instruções da Bhagavad-gītā e do Śrīmad-Bhāgavatam. Quem deturpa a Bhagavad-gītā, distorcendo-lhe algum significado para o gozo de seus sentidos, não é ariano. Por­tanto, os comentários sobre a Bhagavad-gītā feitos por essas pessoas devem ser imediatamente rejeitados. Convém seguir a Bhagavad-gītā como ela é. Na Bhagavad-gītā (12.6-7), o Senhor Śrī Kṛṣṇa diz:

ye tu sarvāṇi karmāṇi
mayi sannyasya mat-parāḥ
ananyenaiva yogena
māṁ dhyāyanta upāsate
teṣām ahaṁ samuddhartā
mṛtyu-saṁsāra-sāgarāt
bhavāmi na cirāt pārtha
mayy āveśita-cetasām

“Aqueles que Me adoram, dedicando todas as suas atividades a Mim e não se afastando de sua devoção a Mim, ocupando-se no serviço devocional e sempre meditando em Mim, tendo fixado suas mentes em Mim, ó filho de Pṛthā – para eles, Eu sou o pronto salvador do oceano de nascimentos e mortes.”

Texto

na hi bhagavann aghaṭitam idaṁ
tvad-darśanān nṛṇām akhila-pāpa-kṣayaḥ
yan-nāma sakṛc chravaṇāt
pukkaśo ’pi vimucyate saṁsārāt

Sinônimos

na — não; hi — na verdade; bhagavan — ó meu Senhor; aghaṭitam — não ocorrido; idam — isto; tvat — de Vós; darśanāt — vendo; nṛṇām — de todos os seres humanos; akhila — todos; pāpa — dos pecados; kṣayaḥ — aniquilação; yat-nāma — cujo nome; sakṛt — uma única vez; śravaṇāt — ouvindo; pukkaśaḥ — a classe inferior, os caṇḍālas; api — também; vimucyate — liberta-se; saṁsārāt — do cativeiro da existên­cia material.

Tradução

Meu Senhor, é bem possível que alguém se liberte imediatamente de toda a contaminação material ao ver-Vos. E, sem nem mesmo precisar ver-Vos pessoalmente, basta ouvir Vosso santo nome uma única vez para que até mesmo os caṇḍālas, os homens da classe mais baixa, libertem-se de toda a contaminação material. Nessas circunstâncias, quem não se libertará da contaminação ma­terial simplesmente vendo-Vos?

Comentário

SIGNIFICADO—Como se afirma no Śrīmad-Bhāgavatam (9.5.16), yan-nāma-śruti-mātreṇa pumān bhavati nirmalaḥ: para se purificar de imediato, basta ouvir o santo nome do Senhor. Portanto, nesta era de Kali, como todas as pessoas são muito contaminadas, recomenda-se o canto do santo nome do Senhor como o único método para se progredir.

harer nāma harer nāma
harer nāmaiva kevalam
kalau nāsty eva nāsty eva
nāsty eva gatir anyathā

“Nesta era de desavenças e hipocrisia, o único meio de libertação é o canto do santo nome do Senhor. Não há outra maneira. Não há outra maneira. Não há outra maneira.” (Bṛhan-nāradīya Purāṇa) Há quinhentos anos, Śrī Caitanya Mahāprabhu introduziu este canto dos santos nomes, e agora, através do movimento da consciência de Kṛṣṇa, o movimento Hare Kṛṣṇa, vemos de fato que, simples­mente por ouvirem o santo nome do Senhor, homens considerados como pertencentes à classe inferior estão se libertando de todas as atividades pecaminosas. Saṁsāra, a existência material, é o resulta­do de ações pecaminosas. Todos neste mundo material estão conde­nados, mas, assim como há diferentes graus de prisioneiros, existem diferentes graus de homens. Todos eles, em todos os status de vida, estão sofrendo. De modo a parar de sofrer na existência mate­rial, deve-se adotar o movimento Hare Kṛṣṇa de saṅkīrtana, ou a vida consciente de Kṛṣṇa.

Aqui se afirma que yan-nāma sakṛc chravaṇāt: o santo nome da Suprema Personalidade de Deus é tão poderoso que até mesmo os mais baixos dos homens podem purificar-se caso o ouçam em uma atitu­de em que não há ofensas (kirāta-hūṇāndhra-pulinda-pulkaśāḥ). Se esses homens, que são chamados de caṇḍālas e que são inferiores aos śūdras, também podem purificar-se pelo simples fato de ouvirem o santo nome do Senhor, o que dizer, então, do resultado de verem o Senhor pessoalmente? Em nossa posição atual, a Suprema Personalidade de Deus pode ser vista pessoalmente como a Deidade no templo. A Deidade do Senhor não é diferente do Senhor Supre­mo. Como não podemos ver o Senhor Supremo com nossos atuais olhos embotados, o Senhor bondosamente consentiu em aparecer diante de nós sob uma forma que nos é visível. Portanto, a Deidade no templo não deve ser considerada material. Oferecendo alimento à Deidade e decorando e servindo a Deidade, obtém-se o mesmo resultado que se consegue ao servir ao Senhor pessoalmente em Vaikuṇṭha.

Texto

atha bhagavan vayam adhunā
tvad-avaloka-parimṛṣṭāśaya-malāḥ
sura-ṛṣiṇā yat kathitaṁ
tāvakena katham anyathā bhavati

Sinônimos

atha — portanto; bhagavan — ó Suprema Personalidade de Deus; vayam — nós; adhunā — no momento atual; tvat-avaloka — vendo-Vos; parimṛṣṭa — eliminados; āśaya-malāḥ — desejos contaminados existentes no coração; sura-ṛṣiṇā — pelo grande sábio dos semideuses (Nā­rada); yat — o qual; kathitam — tendo falado; tāvakena — que é Vosso devoto; katham — como; anyathā — de outra maneira; bhavati — pode ser.

Tradução

Portanto, meu querido Senhor, o simples fato de Vos ver acabou eliminando toda a contaminação das atividades pecaminosas e seus resultados manifestos como apego material e desejos luxuriosos, que sempre abarrotaram minha mente e o âmago do meu coração. Tudo o que é predito pelo grande sábio Nārada Muni jamais é impugna­do. Em outras palavras, obtive Vossa audiência como resultado do treinamento que recebi de Nārada Muni.

Comentário

SIGNIFICADO—Este é o processo do caminho perfeito. A pessoa deve receber lições de autoridades do quilate de Nārada, Vyāsa e Asita, e seguir os princípios por eles delineados. Então, mesmo com seus próprios olhos, ela será capaz de ver a Suprema Personalidade de Deus. Tudo o que ela pre­cisa é de treinamento. Ataḥ śrī-kṛṣṇa-nāmādi na bhaved grāhyam indriyaiḥ. Com nossos olhos e demais sentidos embotados, não conseguimos perceber a Suprema Personalidade de Deus, mas, se seguirmos as instruções das autoridades e ocuparmos nossos sentidos a serviço do Senhor, teremos a oportunidade de vê-lO. Logo que alguém vê a Suprema Personalidade de Deus, todas as reações pecaminosas presentes no âmago do coração com certeza são eliminadas.

Texto

viditam ananta samastaṁ
tava jagad-ātmano janair ihācaritam
vijñāpyaṁ parama-guroḥ
kiyad iva savitur iva khadyotaiḥ

Sinônimos

viditam — bem conhecido; ananta — ó ilimitado; samastam — tudo; tava — por Vós; jagat-ātmanaḥ — que sois a Superalma de todas as entidades vivas; janaiḥ — pela massa de pessoas, ou todas as entida­des vivas; iha — dentro deste mundo material; ācaritam — executado; vijñāpyam — a ser informado; parama-guroḥ — à Suprema Personalidade de Deus, o mestre supremo; kiyat — quanto; iva — decerto; savituḥ — ao Sol; iva — como; khadyotaiḥ — pelos vagalumes.

Tradução

Ó ilimitada Suprema Personalidade de Deus, porque sois a Supe­ralma, conheceis perfeitamente bem tudo o que a entidade viva faz neste mundo material. Na presença do Sol, não há nada a ser reve­lado através da luz de um vaga-lume. Do mesmo modo, porque conheceis tudo, em Vossa presença não há nada que eu possa fazer conhecer.

Texto

namas tubhyaṁ bhagavate
sakala-jagat-sthiti-layodayeśāya
duravasitātma-gataye
kuyogināṁ bhidā paramahaṁsāya

Sinônimos

namaḥ — todas as reverências; tubhyam — a Vós; bhagavate — Vossa Onipotência; sakala — toda; jagat — da manifestação cósmica; sthiti — da manutenção; laya — dissolução; udaya — e da criação; īśāya — ao Senhor Supremo; duravasita — impossível de entender; ātma-gataye — cuja própria posição; ku-yoginām — daqueles que estão apegados aos objetos dos sentidos; bhidā — pela falsa compreensão da separação; parama-haṁsāya — ao supremo puro.

Tradução

Meu querido Senhor, sois o criador, mantenedor e aniquilador desta manifestação cósmica, mas as pessoas que são muito materialistas e sempre enxergam divisões não têm olhos para ver-Vos. Como não podem entender Vossa verdadeira posição, concluem que a manifestação cósmica independe de Vossa opulência. Meu Senhor, sois a pureza suprema, e sois pleno de todas as seis opulências. Portanto, ofereço-Vos minhas respeitosas reverências.

Comentário

SIGNIFICADO—Os homens ateístas pensam que a manifestação cósmica surgiu por acaso, através de uma combinação da matéria, sem a interven­ção divina. Os materialistas que se dizem químicos e os filósofos ateus sempre evitam até mesmo vincular o nome de Deus à manifestação cósmica. Eles não conseguem entender a criação de Deus, pois são muito materialistas. A Suprema Personalidade de Deus é paramahaṁsa, ou a pureza suprema, ao passo que aqueles que são pecaminosos, estando muito apegados ao gozo dos senti­dos materiais, e, portanto, tal qual asnos, estando ocupados em atividades materiais, são os mais baixos dos homens. Todo o conhecimento científico a eles atribuído é nulo e vazio devido ao seu temperamento ateísta. Assim, eles não podem entender a Suprema Personalidade de Deus.

Texto

yaṁ vai śvasantam anu viśva-sṛjaḥ śvasanti
yaṁ cekitānam anu cittaya uccakanti
bhū-maṇḍalaṁ sarṣapāyati yasya mūrdhni
tasmai namo bhagavate ’stu sahasra-mūrdhne

Sinônimos

yam — quem; vai — na verdade; śvasantam — esforçar-Se; anu — após; viśva-sṛjaḥ — os administradores da criação cósmica; śvasanti — também se esforçam; yam — quem; cekitānam — perceber; anu — após; cittayaḥ — todos os sentidos cognoscitivos; uccakanti — percebem; bhū-maṇḍalam — o imenso universo; sarṣapāyati — torna-se como se­mentes de mostarda; yasya — de quem; mūrdhni — sobre a cabeça; tasmai — a Ele; namaḥ — reverências; bhagavate — a Suprema Perso­nalidade de Deus, pleno de seis opulências; astu — possa haver; sahasra-mūrdhne — que tem milhares de capelos.

Tradução

Meu querido Senhor, é depois de tomardes Vossa iniciativa que o senhor Brahmā, Indra e os outros administradores da manifestação cósmica se ocupam em diferentes atividades. Após perceberdes a energia material, meu Senhor, é que os sentidos começam a perce­ber. A Suprema Personalidade de Deus mantém sobre Suas cabeças todos os universos, que para Ele são parecidos com sementes de mostarda. Ofereço minhas respeitosas reverências a essa Personalidade Suprema, possuidora de milhares de capelos.

Texto

śrī-śuka uvāca
saṁstuto bhagavān evam
anantas tam abhāṣata
vidyādhara-patiṁ prītaś
citraketuṁ kurūdvaha

Sinônimos

śrī-śukaḥ uvāca — Śrī Śukadeva Gosvāmī disse; saṁstutaḥ — sendo adorado; bhagavān — a Suprema Personalidade de Deus; evam — dessa maneira; anantaḥ — Senhor Ananta; tam — a ele; abhāṣata — respondeu; vidyādhara-patim — o rei dos Vidyādharas; prītaḥ — es­tando muito satisfeito; citraketum — rei Citraketu; kuru-udvaha — ó melhor da dinastia Kuru, Mahārāja Parīkṣit.

Tradução

Śukadeva Gosvāmī continuou: O Senhor, a Suprema Personalidade de Deus, Anantadeva, estando muitíssimo satisfeito com as orações oferecidas por Citraketu, o rei dos Vidyādharas, respondeu­-lhe o seguinte, ó melhor da dinastia Kuru, Mahārāja Parīkṣit.

Texto

śrī-bhagavān uvāca
yan nāradāṅgirobhyāṁ te
vyāhṛtaṁ me ’nuśāsanam
saṁsiddho ’si tayā rājan
vidyayā darśanāc ca me

Sinônimos

śrī-bhagavān uvāca — a Suprema Personalidade de Deus, Saṅkarṣaṇa, respondeu; yat — o que; nārada-aṅgirobhyām — pelos grandes sábios Nārada e Aṅgirā; te — a ti; vyāhṛtam — falado; me — a Mim; anuśāsanam — a adoração; saṁsiddhaḥ — completamente perfeito; asi — és; tayā — devido a isso; rājan — ó rei; vidyayāmantra; darśa­nāt — da visão direta; ca — bem como; me — de Mim.

Tradução

A Suprema Personalidade de Deus, Anantadeva, respondeu da seguinte maneira: Ó rei, como resultado de teres aceitado as instruções que os grandes sábios Nārada e Aṅgirā proferiram a Meu res­peito, adquiriste completo conhecimento transcendental. Porque agora entendes a ciência espiritual, viste-Me face a face. Portanto, agora és completamente perfeito.

Comentário

SIGNIFICADO—A perfeição da vida consiste em recebermos educação espiritual e compreendermos a existência do Senhor e como Ele cria, mantém e aniquila a manifestação cósmica. Quem tem conhecimento perfei­to pode desenvolver seu amor por Deus através da associação com pessoas perfeitas, tais como Nārada, Aṅgirā e os membros de sua sucessão discipular. Então, ele se torna capaz de ver face a face a ilimitada Suprema Personalidade de Deus. Embora seja ilimitado, o Senhor, por Sua misericórdia imotivada, torna-Se visível para o devoto, que, então, é capaz de vê-lO. Em nossa atual situação condicionada, não podemos ver ou entender a Suprema Personalidade de Deus.

ataḥ śrī-kṛṣṇa-nāmādi
na bhaved grāhyam indriyaiḥ
sevonmukhe hi jihvādau
svayam eva sphuraty adaḥ

“Através de seus sentidos materialmente contaminados, ninguém pode entender a natureza transcendental do nome, forma, qualidade e passatempos de Śrī Kṛṣṇa. Somente quando alguém se torna espiritualmente impregnado de transcendental serviço ao Senhor é que o nome, a forma, a qualidade e os passatempos transcendentais do Senhor lhe são revelados.” (Bhakti-rasāmṛta-sindhu 1.2.234) Se alguém adota a vida espiritual sob a direção de Nārada Muni ou do seu representante e, dessa maneira, ocupa-se a serviço do Senhor, qualifica-­se para ver o Senhor face a face. A Brahma-saṁhitā (5.38) afirma:

premāñjana-cchurita-bhakti-vilocanena
santaḥ sadaiva hṛdayeṣu vilokayanti
yaṁ śyāmasundaram acintya-guṇa-svarūpaṁ
govindam ādi-puruṣaṁ tam ahaṁ bhajāmi

“Adoro Govinda, o Senhor primordial, que sempre é visto pelos de­votos cujos olhos estão untados com a polpa do amor. Ele é visto sob Sua eterna forma de Śyāmasundara, situado dentro do coração do devoto.” Devem-se seguir as instruções do mestre espiritual. Assim, a pessoa pode qualificar-se para ver a Suprema Personalidade de Deus, como evidenciado por Mahārāja Citraketu.

Texto

ahaṁ vai sarva-bhūtāni
bhūtātmā bhūta-bhāvanaḥ
śabda-brahma paraṁ brahma
mamobhe śāśvatī tanū

Sinônimos

aham — Eu; vai — na verdade; sarva-bhūtāni — expandido sob diferentes formas de entidades vivas; bhūta-ātmā — a Superalma de todas as entidades vivas (o diretor supremo e desfrutador delas); bhūta-­bhāvanaḥ — a causa da manifestação de todas as entidades vivas; śabda-brahma — a vibração sonora transcendental (o mantra Hare Kṛṣṇa); param brahma — a Suprema Verdade Absoluta; mama — Minhas; ubhe — ambas (ou seja, a forma sonora e a forma de identi­dade espiritual); śāśvatī — eternos; tanū — dois corpos.

Tradução

Todas as entidades vivas, móveis e inertes, são Minhas expansões e são distintas de Mim. Sou a Superalma de todos os seres vivos, que existem porque Eu os manifesto. Sou a forma das vibra­ções transcendentais como o omkāra e Hare Kṛṣṇa Hare Rāma, e sou a Suprema Verdade Absoluta. Essas Minhas duas formas – a saber, o som transcendental e a eternamente bem-aventurada forma espiritual da Deidade –, são Minhas formas eternas; elas não são materiais.

Comentário

SIGNIFICADO—Nārada e Aṅgirā instruíram Citraketu acerca da ciência do serviço devocional. Então, devido ao serviço devocional, Citraketu viu a Suprema Personalidade de Deus. Prestando serviço devocional, avança-se passo a passo, e quem está na plataforma de amor a Deus (premā pumartho mahān) vê o Senhor Supremo a cada momento. Como se afirma na Bhagavad-gītā, quando alguém, acatando as ins­truções do mestre espiritual, ocupa-se em serviço devocional vinte e quatro horas por dia (teṣāṁ satata-yuktānāṁ bhajatāṁ prīti-pūrvakam), seu serviço devocional se torna cada vez mais agradável. Então, a Suprema Personalidade de Deus, que está no âmago do coração de todos, fala ao devoto (dadāmi buddhi-yogaṁ taṁ yena mām upayānti te). Citraketu Mahārāja primeiramente foi instruído por seus gurus, Aṅgirā e Nārada, e agora, tendo seguido suas instruções, atingiu a etapa em que se vê o Senhor Supremo face a face. Portanto, agora o Senhor passou a instruí-lo na essência do conhecimento.

A essência do conhecimento é que existem duas classes de vastu, ou substâncias. Uma é real, e a outra, sendo ilusória ou temporária, às vezes é chamada de irreal. Devemos considerar essas duas classes de existência. O tattva, ou verdade, consiste em Brahman, Paramāt­mā e Bhagavān. Como se afirma no Śrīmad-Bhāgavatam (1.2.11):

vadanti tat tattva-vidas
tattvaṁ yaj jñānam advayam
brahmeti paramātmeti
bhagavān iti śabdyate

“Transcendentalistas eruditos que conhecem a Verdade Absoluta chamam essa substância não-dual de Brahman, Paramātmā ou Bhagavān.” A Verdade Absoluta tem esses três aspectos eternos. Portanto, combinados, Brahman, Paramātmā e Bhagavān são a substância.

São duas as categorias de emanações da não-substância – atividades e atividades proibidas (karma e vikarma). Karma se refere à vida piedosa ou às atividades materiais executadas durante o dia e às atividades mentais oníricas noturnas. De certa forma, essas ati­vidades são desejadas. Vikarma, entretanto, refere-se às atividades ilusórias, que são algo parecido com o fogo-fátuo. Essas são as atividades que não têm significado. Por exemplo, os cientistas mo­dernos imaginam que, através de combinações químicas, pode-se produzir a vida, e estão muito atarefados tentando provar isso nos laboratórios de todo o mundo, embora, na história, ninguém tenha sido capaz de produzir a substância da vida através de combinações materiais. Essas atividades se chamam vikarma.

O que acontece de fato é que todas as atividades materiais são ilusórias, e o progresso na ilusão é um simples desperdício de tempo. Essas atividades ilusórias se chamam akārya, e nos cabe conhecer tais atividades recorrendo às instruções da Suprema Personalidade de Deus. Como se afirma na Bhagavad-gītā (4.17):

karmaṇo hy api boddhavyaṁ
boddhavyaṁ ca vikarmaṇaḥ
akarmaṇaś ca boddhavyaṁ
gahanā karmaṇo gatiḥ

“É dificílimo entender as complexidades da ação. Portanto, deve-se saber exatamente o que é ação, o que é ação proibida e o que é inação.” Deve-se aprender isso diretamente com a Suprema Personalidade de Deus, que, como Anantadeva, está instruindo o rei Citraketu devido à fase de serviço devocional avançado que ele alcançou, seguindo as instruções de Nārada e Aṅgirā.

Nesta passagem, afirma-se que ahaṁ vai sarva-bhūtāni: o Senhor é tudo (sarva-bhūtāni), incluindo as entidades vivas e os elementos materiais ou físicos. Como o Senhor diz na Bhagavad-gītā (7.4-5):

bhūmir āpo ’nalo vāyuḥ
khaṁ mano buddhir eva ca
ahaṅkāra itīyaṁ me
bhinnā prakṛtir aṣṭadhā
apareyam itas tv anyāṁ
prakṛtiṁ viddhi me parām
jīva-bhūtāṁ mahā-bāho
yayedaṁ dhāryate jagat

“Terra, água, fogo, ar, éter, mente, inteligência e falso ego — juntos, todos estes oito elementos formam Minhas energias materiais separadas. Além dessas, ó Arjuna de braços poderosos, existe uma outra energia, a Minha energia superior, que consiste das entidades vivas que exploram os recursos desta natureza material inferior.” A entidade viva tenta assenhorear-se dos elementos materiais ou físicos, mas tanto os ele­mentos físicos quanto a centelha espiritual são energias que emanam da Suprema Personalidade de Deus. Portanto, o Senhor diz que ahaṁ vai sarva-bhūtāni: “Eu sou tudo.” Assim como o calor e a luz emanam do fogo, essas duas energias – os elementos físicos e as entidades vivas – emanam do Senhor Supremo. Por isso, o Senhor diz que ahaṁ vai sarva-bhūtāni: “Eu expando as categorias físicas e espirituais.”

Também como a Superalma, o Senhor guia as entidades vivas que estão condicionadas à atmosfera física. Logo, Ele é chamado de bhūtātmā bhūta-bhāvanaḥ. Ele concede à entidade viva a inteligência com a qual ela possa melhorar sua posição a fim de voltar ao lar, voltar ao Supremo, ou, se ela não quiser voltar ao Supremo, o Senhor ­lhe outorga a inteligência com a qual possa melhorar sua posição material. O próprio Senhor confirma isso na Bhagavad-gītā (15.15), sarvasya cāhaṁ hṛdi sanniviṣṭo mattaḥ smṛtir jñānam apohanaṁ ca: “Eu estou situado no coração de todos, e é de Mim que vêm a lembrança, o conhecimento e o esquecimento.” Internamente, o Senhor provê ao ser vivo a inteligência com a qual se prontifique a trabalhar. Por­tanto, o verso anterior diz que nosso empenho começa após o empenho da Suprema Personalidade de Deus. De maneira independente, não podemos nos esforçar nem agir em nada. Logo, o Senhor é bhūta-bhāvanaḥ.

Outro aspecto específico do conhecimento dado neste verso é que śabda-brahma também é uma forma do Senhor Supremo. Em Sua eterna forma bem-aventurada, o Senhor Kṛṣṇa é aceito por Arjuna como paraṁ brahma. Na fase condicionada, a entidade viva aceita algo ilusório como substancial. Isso se chama māyā ou avidyā – ignorância. Portanto, de acordo com o conhecimento védico, a pessoa tem que se tornar um devoto e, então, deve distinguir entre avidyā e vidyā, que são elaboradamente explicados na Īśopaniṣad. Quem está de fato na plataforma de vidyā pode entender pessoal­mente a Personalidade de Deus sob Suas formas de Senhor Rāma, Senhor Kṛṣṇa e Saṅkarṣaṇa. O conhecimento védico é descrito como a respiração do Senhor Supremo, e as atividades começam baseadas no conhecimento védico. Por conseguinte, o Senhor diz que, quando Se esforça ou respira, os universos materiais passam a existir, e várias atividades se desenvolvem pouco a pouco. Na Bhagavad-gītā, o Senhor diz que praṇavaḥ sarva-vedeṣu: “Eu sou a sílaba oṁ em todos os mantras védicos.” O conhecimento védico começa com a vibra­ção do som transcendental praṇava, oṁkāra. O mesmo som trans­cendental é Hare Kṛṣṇa, Hare Kṛṣṇa, Kṛṣṇa Kṛṣṇa, Hare Hare/ Hare Rāma, Hare Rāma, Rāma Rāma, Hare Hare. Abhinnatvān nāma­-nāminoḥ: não há diferença entre o santo nome do Senhor e o próprio Senhor.

Texto

loke vitatam ātmānaṁ
lokaṁ cātmani santatam
ubhayaṁ ca mayā vyāptaṁ
mayi caivobhayaṁ kṛtam

Sinônimos

loke — neste mundo material; vitatam — expandida (na atitude de gozo material); ātmānam — a entidade viva; lokam — o mundo ma­terial; ca — também; ātmani — na entidade viva; santatam — difunde-se; ubhayam — ambos (o mundo material formado de elementos materiais e a entidade viva); ca — e; mayā — por Mim; vyāptam — per­meados; mayi — em Mim; ca — também; eva — na verdade; ubhayam — ambos; kṛtam — criados.

Tradução

Neste mundo de matéria, o qual ela aceita como constituído de recursos desfrutáveis, a alma condicionada se expande, pensando ser o desfrutador do mundo material. Do mesmo modo, o mundo ma­terial se expande na entidade viva como uma fonte de gozo. Dessa maneira, ambos se expandem, mas, como são Minhas energias, ambos são permeados por Mim. Como o Senhor Supremo, sou a causa desses efeitos, e se deve saber que ambos repousam em Mim.

Comentário

SIGNIFICADO—Segundo a filosofia māyāvāda, tudo é da mesma qualidade que a Suprema Personalidade de Deus, ou o Brahman Supremo, e, por­tanto, tudo é adorável. Essa perigosa teoria da escola māyāvāda con­verteu para o ateísmo as pessoas em geral. Apoiada nessa teoria, a pessoa pensa que é Deus, mas isso não é verdade. Como se afirma na Bhagavad-gītā (mayā tatam idaṁ sarvaṁ jagad avyakta-mūrtinā), o fato é que toda a manifestação cósmica é uma expansão das energias do Senhor Supremo, que se manifestam como elementos físicos e entidades vivas. As entidades vivas consideram erroneamente os elementos físicos como recursos que se prestam a lhes dar prazer, e se julgam os desfrutadores. Entretanto, nenhum deles é independen­te; ambos são energias do Senhor. A Suprema Personalidade de Deus é a causa que origina a energia material e a energia espiritual. Con­tudo, embora a expansão das energias do Senhor seja a causa origi­nal, ninguém deve pensar que o próprio Senhor expandiu-Se de diferentes maneiras. Rejeitando as teorias dos māyāvādīs, o Senhor diz claramente na Bhagavad-gītā que mat-sthāni sarva-bhūtāni na cāhaṁ teṣv avasthitaḥ: “Todos os seres estão em Mim, mas Eu não estou neles.” Tudo repousa nEle, e tudo é uma mera expansão de Suas energias, mas isso não significa que tudo seja tão adorável como o próprio Senhor. A expansão material é temporária, mas o Senhor não é temporário. As entidades vivas são partes do Senhor, mas elas não são o próprio Senhor. As entidades vivas deste mundo material não são inconcebíveis, mas o Senhor o é. A teoria de que as energias do Senhor, sendo expansões do Senhor, estão no mesmo nível que Ele, é incorreta.

Texto

yathā suṣuptaḥ puruṣo
viśvaṁ paśyati cātmani
ātmānam eka-deśa-sthaṁ
manyate svapna utthitaḥ
evaṁ jāgaraṇādīni
jīva-sthānāni cātmanaḥ
māyā-mātrāṇi vijñāya
tad-draṣṭāraṁ paraṁ smaret

Sinônimos

yathā — assim como; suṣuptaḥ — dormindo; puruṣaḥ — uma pessoa; viśvam — o universo inteiro; paśyati — percebe; ca — também; ātmani — nela própria; ātmānam — ela própria; eka-deśa-stham — deitada em algum lugar; manyate — ela considera; svapne — na condição oní­rica; utthitaḥ — despertando; evam — dessa maneira; jāgaraṇa-ādīni — os estados de vigília e assim por diante; jīva-sthānāni — as diferentes condições de existência da entidade viva; ca — também; ātmanaḥ — da Suprema Personalidade de Deus; māyā-mātrāṇi — as manifestações da potência ilusória; vijñāya — conhecendo; tat — delas; draṣṭāram — o criador ou testemunha de todas essas condições; param — o Supre­mo; smaret — todos devem sempre lembrar.

Tradução

Quando está em sono profundo, a pessoa sonha e vê em si mesma muitos outros objetos, tais como grandes montanhas e rios ou até talvez o universo inteiro, embora essas coisas estejam bem distantes. Às vezes, ao despertar de um sonho, a pessoa vê que está sob uma forma humana, deitada em sua cama em algum lugar do universo. Então, ela se vê, em termos de várias condições, como pertencente a uma determinada nacionalidade, família e assim por diante. Todas as condições de sono profundo, sonho e vigília são meras energias da Suprema Personalidade de Deus. Todos devem sempre se lembrar do criador do qual se originam essas condições, o Senhor Supremo, que não Se deixa afetar por elas.

Comentário

SIGNIFICADO—Nenhuma dessas condições das entidades vivas – a saber, sono profundo, sonho e vigília – é substancial. São meras manifestações das várias fases da vida condicionada. Pode haver muitas monta­nhas, rios, árvores, abelhas, tigres e serpentes situados a grandes dis­tâncias, mas, em um sonho, alguém pode imaginá-los como estando perto. Do mesmo modo, assim como à noite alguém pode ter sonhos sutis; des­perta, a entidade viva experiencia sonhos grosseiros, presentes sob a forma de nação, comunidade, sociedade, posses, arranha-céus, saldo bancário, posição e honra. Nessas circunstâncias, todos devem saber que a posição em que se encontram se deve ao seu contato com o mundo material. Em várias formas de vida, a pessoa se situa em diferentes posições, todas as quais são meras criações da energia ilusória, que funciona sob a direção da Suprema Personalidade de Deus. Portanto, o Senhor Supremo é o agente último, e tudo o que a entidade viva condicionada tem a fazer é se lembrar desse autor origi­nal, Śrī Kṛṣṇa. Como entidades vivas, estamos sendo arrastados pelas ondas da prakṛti, ou da natureza, que agem sob a direção do Senhor (mayādhyakṣeṇa prakṛtiḥ sūyate sa-carācaram). Bhaktivinoda Ṭhākura canta que (miche) māyāra vaśe, yāccha bhese’, khāccha hābuḍubu, bhāi: “Por que, em várias fases de sonho e vigília, tu te deixas arrastar pelas ondas da energia ilusória? Tudo isso são criações de māyā.” Nosso único dever é nos lembrarmos do supremo diretor dessa energia ilusória: Kṛṣṇa. Para fazermos isso, os śāstras nos aconselham que harer nāma harer nāma harer nāmaiva kevalam: devem-se cantar constantemente os santos nomes do Senhor – Hare Kṛṣṇa, Hare Kṛṣṇa, Kṛṣṇa Kṛṣṇa, Hare Hare/ Hare Rāma, Hare Rāma, Rāma Rāma, Hare Hare. O Senhor Supremo é compreendido em três diferentes fases, como Brahman, Paramātmā e Bhagavān, das quais Bhagavān é a compreensão última. Aquele que compreende Bhagavān – a Suprema Personalidade de Deus, Kṛṣṇa – é o mahātmā mais perfeito (vāsudevaḥ sarvam iti sa mahātmā sudur­labhaḥ). Quem está na forma de vida humana deve buscar entender a Suprema Personalidade de Deus, em consequência do que todos os outros itens se farão compreensíveis. Yasmin vijñāte sarvam evaṁ vijñātaṁ bhavati (Muṇḍaka Upaniṣad 1.3). De acordo com esse preceito védico, pelo simples fato de compreender Kṛṣṇa, pode-se compreender o Brahman, Paramātmā, prakṛti, a energia ilusória, a energia espiritual e tudo mais. Tudo será revelado. Prakṛti, a natureza material, funciona sob a direção do Senhor Supremo, e nós, entidades vivas, estamos sendo arrastados pelas várias fases da prakṛti. Para atingir a autorrealização, a pessoa deve sempre se lembrar de Kṛṣṇa. Como se afirma no Padma Purāṇa, smartavyaḥ satataṁ viṣṇuḥ: devemos sempre nos lembrar do Senhor Viṣṇu. Vismartavyo na jātucit: jamais devemos esquecer-nos do Senhor. Eis a perfeição da vida.

Texto

yena prasuptaḥ puruṣaḥ
svāpaṁ vedātmanas tadā
sukhaṁ ca nirguṇaṁ brahma
tam ātmānam avehi mām

Sinônimos

yena — por quem (o Brahman Supremo); prasuptaḥ — dormindo; puruṣaḥ — um homem; svāpam — o tema de um sonho; veda — co­nhece; ātmanaḥ — dele próprio; tadā — nesse momento; sukham — felicidade; ca — também; nirguṇam — sem contato com o ambiente material; brahma — o espírito supremo; tam — a Ele; ātmānam — o que permeia; avehi — simplesmente conhece; mām — a Mim.

Tradução

Informo-te que sou o Brahman Supremo, a Superalma onipenetrante através de quem a entidade viva adormecida pode compreen­der sua condição onírica e sua felicidade que está situada bem além das atividades dos sentidos materiais. Isto é, Eu sou a causa das atividades do ser vivo adormecido.

Comentário

SIGNIFICADO—Ao se livrar do falso ego, a entidade viva compreende sua posi­ção superior como alma espiritual, parte integrante da potência de prazer do Senhor. Assim, devido ao Brahman, mesmo enquanto dorme, a entidade viva pode desfrutar. O Senhor diz: “Esse Brahman, esse Paramātmā e esse Bhagavān são Eu mesmo.” Em seu Krama­-sandarbha, Śrīla Jīva Gosvāmī menciona esse fato.

Texto

ubhayaṁ smarataḥ puṁsaḥ
prasvāpa-pratibodhayoḥ
anveti vyatiricyeta
taj jñānaṁ brahma tat param

Sinônimos

ubhayam — ambas as classes de consciência (sono e vigília); sma­rataḥ — lembrando; puṁsaḥ — da pessoa; prasvāpa — da consciência durante o sono; pratibodhayoḥ — e da consciência enquanto está acordada; anveti — prolonga-se; vyatiricyeta — pode ultrapassar; tat — este; jñānam — conhecimento; brahma — o Brahman Supremo; tat — isto; param — transcendental.

Tradução

Se os sonhos são meros temas testemunhados pela Superalma, como a entidade viva, que é diferente da Superalma, pode lembrar-se das atividades dos sonhos? As experiências de alguém não podem ser entendidas por outrem. Portanto, o conhecedor dos fatos, a en­tidade viva que investiga os incidentes manifestos em sonhos e em vigília, é diferente das atividades circunstanciais. Este fator cognoscitivo é o Brahman. Em outras palavras, a qualidade de conhecer pertence às entidades vivas e à Alma Suprema. Assim, a entidade viva também pode experimentar as atividades de sonhos e de vigília. Em ambos os estados, o conhecedor é imutável, mas é qualitativa­mente uno com o Brahman Supremo.

Comentário

SIGNIFICADO—Em conhecimento, a entidade viva é qualitativamente una com o Brahman Supremo, mas a quantidade de conhecimento do Brahman Supremo é bem superior à encontrada na entidade viva, que é parte do Brahman. Porque é Brahman em qualidade, a entidade viva pode lembrar-se das atividades transcorridas nos sonhos e também pode conhecer as atividades que presencia agora na vigília.

Texto

yad etad vismṛtaṁ puṁso
mad-bhāvaṁ bhinnam ātmanaḥ
tataḥ saṁsāra etasya
dehād deho mṛter mṛtiḥ

Sinônimos

yat — o qual; etat — isto; vismṛtam — esquecido; puṁsaḥ — pela entidade viva; mat-bhāvam — Minha posição espiritual; bhinnam — separação; ātmanaḥ — da Alma Suprema; tataḥ — dessa; saṁsāraḥ — vida condicionada material; etasya — da entidade viva; dehāt — de um corpo; dehaḥ — outro corpo; mṛteḥ — de uma morte; mṛtiḥ — outra morte.

Tradução

Quando a entidade viva, julgando-se diferente de Mim, esquece-­se de sua identidade espiritual em conformidade com a qual goza de unidade qualitativa coMigo em eternidade, conhecimento e bem­-aventurança, é então que sua vida material condicionada começa. Em outras palavras, em vez de ajustar seus interesses aos Meus, ela se interessa em suas expansões corpóreas, tais como esposa, filhos e posses materiais. Dessa maneira, por influência de suas ações, recebe um corpo após outro, e, depois de uma morte, outra morte acontece.

Comentário

SIGNIFICADO—De um modo geral, os filósofos māyāvādīs ou as pessoas influenciadas pelos filósofos māyāvādīs julgam que estão no mesmo nível da Suprema Personalidade de Deus. É essa a causa de sua vida condicionada. Como afirma o poeta vaiṣṇava Jagadānanda Paṇḍita em seu Prema-vivarta:

kṛṣṇa-bahirmukha hañā bhoga vāñchā kare
nikaṭa-stha māyā tāre jāpaṭiyā dhare

Logo que a entidade viva se esquece de sua posição constitucional e se esforça para se tornar una com o Supremo, sua vida condicio­nada começa. A concepção de que o Brahman Supremo e a enti­dade viva são iguais, não apenas em qualidade, mas também em quantidade, é a causa da vida condicionada. Se alguém se esquece da diferença entre o Senhor Supremo e a entidade viva, sua vida condicionada começa. Vida condicionada significa abandonar um corpo para aceitar outro e se submeter à morte para aceitar outra morte. O filósofo māyāvādī ensina a filosofia de tat tvam asi, di­zendo: “És igual a Deus.” Ele se esquece de que tat tvam asi se refere­ à posição marginal da entidade viva, a qual é como o brilho solar. Existem calor e luz no Sol, e também existem calor e luz no brilho solar, e assim, qualitativamente, eles são unos. Mas ninguém deve esquecer-se de que o brilho solar repousa no Sol. Como o Senhor diz na Bhagavad-gītā, brahmaṇo hi pratiṣṭhāham: “Eu sou a fonte que origina o Brahman.” O brilho solar é importante devido à presença do globo solar. Ninguém deve pensar que o globo solar é importante devido à onipresença do brilho solar. Esquecer esse fato e se equivocar com ele se chama māyā. Porque se esquece de sua posição constitucional e da posição constitucional do Senhor Su­premo, a pessoa cai vítima de māyā, ou do saṁsāra – a vida condi­cionada. Com relação a isso, Madhvācārya diz:

sarva-bhinnaṁ parātmānaṁ
vismaran saṁsared iha
abhinnaṁ saṁsmaran yāti
tamo nāsty atra saṁśayaḥ

Quando alguém pensa que não existe nenhuma diferença entre a entidade viva e o Senhor Supremo, não há dúvida de que está em ignorância (tamaḥ).

Texto

labdhveha mānuṣīṁ yoniṁ
jñāna-vijñāna-sambhavām
ātmānaṁ yo na buddhyeta
na kvacit kṣemam āpnuyāt

Sinônimos

labdhvā — alcançando; iha — neste mundo material (especialmen­te nessa terra piedosa de Bhārata-varṣa, Índia); mānuṣīm — humana; yonim — a espécie; jñāna — do conhecimento através das escrituras védicas; vijñāna — e pondo em prática esse conhecimento; sambha­vām — onde existe uma possibilidade; ātmānam — sua verdadeira identidade; yaḥ — todo aquele que; na — não; buddhyeta — entende; na — nunca; kvacit — em momento algum; kṣemam — sucesso na vida; āpnuyāt — pode obter.

Tradução

O ser humano pode alcançar a perfeição da vida ao buscar a autorrealização por intermédio da literatura védica e da aplicação prática dos ensinamentos nela contidos. Isso é possível especialmente para o ser humano nascido na Índia, a terra da piedade. Um homem que nasce nessa situação favorável, porém não entende seu eu, é incapaz de alcançar a perfeição máxima, mesmo que galgue a vida nos sistemas planetários superiores.

Comentário

SIGNIFICADO—Esta afirmação é confirmada no Caitanya-caritāmṛta (Ādi 9.41). O Senhor Caitanya diz:

bhārata-bhūmite haila manuṣya-janma yāra
janma sārthaka kari’ kara para-upakāra

Todos os seres humanos nascidos na Índia podem alcançar o sucesso supremo através da literatura védica e de sua aplicação prática na vida. Quem é perfeito pode prestar serviço em prol da autorrealização de toda a sociedade humana. Essa é a melhor maneira de prestar trabalho humanitário.

Texto

smṛtvehāyāṁ parikleśaṁ
tataḥ phala-viparyayam
abhayaṁ cāpy anīhāyāṁ
saṅkalpād viramet kaviḥ

Sinônimos

smṛtvā — lembrando-se de; īhāyām — no campo de atividades com resultados fruitivos; parikleśam — o desperdício de energia e as condições dolorosas; tataḥ — deste; phala-viparyayam — o oposto do resultado desejado; abhayam — destemor; ca — também; api — na verdade; anīhāyām — quando não se desejam resultados fruitivos; saṅ­kalpāt — do desejo material; viramet — deve privar-se; kaviḥ — quem é avançado em conhecimento.

Tradução

Lembrando-se da grande tribulação encontrada no campo de ati­vidades executadas visando à obtenção de resultados fruitivos, e se recordando de como se recebe o inverso dos resultados que se desejam – quer se tomem como referência os resultados das atividades materiais ou das atividades fruitivas recomendadas nos textos védicos –, o homem inteligente deve privar-se do desejo de realizar ações fruitivas, pois, através desse tipo de empreendimento, ninguém pode alcançar a meta última da vida. Por outro lado, se alguém age sem desejos de resultados fruitivos – em outras palavras, se ele se ocupa em atividades devocionais –, pode alcançar a meta máxima da vida, libertando-se das condições dolorosas. Considerando isso, convém que a pessoa descontinue os desejos materiais.

Texto

sukhāya duḥkha-mokṣāya
kurvāte dampatī kriyāḥ
tato ’nivṛttir aprāptir
duḥkhasya ca sukhasya ca

Sinônimos

sukhāya — para a felicidade; duḥkha-mokṣāya — para ficarem livres do estado infeliz; kurvāte — realizam; dam-patī — a esposa e o espo­so; kriyāḥ — atividades; tataḥ — disto; anivṛttiḥ — nenhuma cessação; aprāptiḥ — nenhuma conquista; duḥkhasya — da infelicidade; ca — também; sukhasya — da felicidade; ca — também.

Tradução

Como esposo e esposa, um homem e uma mulher planejam juntos alcançar a felicidade e diminuir a infelicidade, trabalhando unidos de muitas maneiras, mas, como suas atividades são cheias de de­sejos, elas jamais se tornam fonte de felicidade e jamais diminuem a infelicidade. Ao contrário, causam imensa infelicidade.

Texto

evaṁ viparyayaṁ buddhvā
nṛṇāṁ vijñābhimāninām
ātmanaś ca gatiṁ sūkṣmāṁ
sthāna-traya-vilakṣaṇām
dṛṣṭa-śrutābhir mātrābhir
nirmuktaḥ svena tejasā
jñāna-vijñāna-santṛpto
mad-bhaktaḥ puruṣo bhavet

Sinônimos

evam — dessa maneira; viparyayam — inverso; buddhvā — compreendendo; nṛṇām — dos homens; vijña-abhimāninām — que se julgam in­çados de conhecimento científico; ātmanaḥ — do eu; ca — também; gatim — o progresso; sūkṣmām — extremamente difícil de entender; sthāna-traya — as três condições da vida (sono profundo, sonho e vigília); vilakṣaṇām — além de; dṛṣṭa — diretamente percebido; śrutā­bhiḥ — ou entendido através da informação fornecida pelas autorida­des; mātrābhiḥ — dos objetos; nirmuktaḥ — estando livre; svena — por sua própria; tejasā — faculdade de discriminação; jñāna-vijñāna — com conhecimento e aplicação prática do conhecimento; santṛptaḥ — es­tando plenamente satisfeita; mat-bhaktaḥ — Meu devoto; puruṣaḥ — uma pessoa; bhavet — deve tornar-se.

Tradução

Deve-se entender que as atividades das pessoas que se orgulham de sua experiência material trazem apenas resultados contraditórios com aqueles que essas pessoas concebem enquanto despertas, dor­mindo ou em sono profundo. Deve-se também entender que a alma espiritual, embora muito difícil de ser percebida pelo materialista, está acima de todas essas condições, e, valendo-se de sua faculdade de discriminação, a pessoa deve abster-se de desejar resultados frui­tivos tanto nesta quanto na próxima vida. Tornando-se, assim, ex­periente em conhecimento transcendental, ela deve tornar-se Meu devoto.

Texto

etāvān eva manujair
yoga-naipuṇya-buddhibhiḥ
svārthaḥ sarvātmanā jñeyo
yat parātmaika-darśanam

Sinônimos

etāvān — esse tanto; eva — na verdade; manujaiḥ — pelos seres humanos; yoga — pelo processo de ligação com o Supremo através de bhakti-yoga; naipuṇya — dotados de perspicácia; buddhibhiḥ — que têm inteligência; sva-arthaḥ — a meta última da vida; sarva-ātmanā — por todos os meios; jñeyaḥ — ser conhecida; yat — o que; para — do Senhor transcendental; ātma — e da alma; eka — da unidade; darśa­nam — entendendo.

Tradução

As pessoas que tentam alcançar a meta última da vida devem ter muita perspicácia em saber como observar a Suprema Pessoa Absoluta e a entidade viva, que, em seu relacionamento como a parte e o todo, são unos em qualidade. Essa é a compreensão última da vida. Não há verdade superior a essa.

Texto

tvam etac chraddhayā rājann
apramatto vaco mama
jñāna-vijñāna-sampanno
dhārayann āśu sidhyasi

Sinônimos

tvam — tu; etat — este; śraddhayā — com grande fé e aquiescência; rājan — o rei; apramattaḥ — sem ser louco nem se deixar ludibriar por alguma outra conclusão; vacaḥ — instrução; mama — Minha; jñāna­-vijñānasampannaḥ – sendo plenamente versado em conhecimento e o aplicando no cotidiano; dhārayan — aceitando; āśu — muito brevemente; sidhyasi — tu te tornarás o mais perfeito.

Tradução

Ó rei, se aceitares essa Minha conclusão, desapegando-te do gozo material, aderindo a Mim com grande fé e, assim, tornando-te sábio e plenamente versado no conhecimento e o aplicando no teu cotidiano, obterás a perfeição máxima, a qual é alcançar-Me.

Texto

śrī-śuka uvāca
āśvāsya bhagavān itthaṁ
citraketuṁ jagad-guruḥ
paśyatas tasya viśvātmā
tataś cāntardadhe hariḥ

Sinônimos

śrī-śukaḥ uvāca — Śrī Śukadeva Gosvāmī disse; āśvāsya — assegurando; bhagavān — a Suprema Personalidade de Deus; ittham — assim; citraketum — o rei Citraketu; jagat-guruḥ — o mestre espiritual supre­mo; paśyataḥ — enquanto olhava; tasya — ele; viśva-ātmā — a Superal­ma de todo o universo; tataḥ — dali; ca — também; antardadhe — desapareceu; hariḥ — o Senhor Hari.

Tradução

Śrī Śukadeva Gosvāmī prosseguiu: Após transmitir a Citraketu essas instruções e lhe dar essa garantia de obter a perfeição, a Suprema Personalidade de Deus, que é o mestre espiritual supremo, a alma suprema, Saṅkarṣaṇa, desapareceu daquele lugar enquanto Citraketu olhava em Sua direção.

Comentário

Neste ponto, encerram-se os Significados Bhaktivedanta do sexto canto, décimo sexto capítulo, do Śrīmad-Bhāgavatam, intitulado “O Rei Citraketu Encontra-se com o Senhor Supremo”.