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CAPÍTULO CINQUENTA E QUATRO

O Casamento de Kṛṣṇa e Rukmiṇī

Este capítulo descreve como o Senhor Śrī Kṛṣṇa, depois de raptar Rukmiṇī, derrotou os reis oponentes; desfigurou Rukmī, o irmão de Rukmiṇī; levou Rukmiṇī para Sua capital, e casou-Se com ela.

Enquanto Śrī Kṛṣṇa levava embora a princesa Rukmiṇī, os reis ini­migos reuniram seus exércitos e perseguiram-nO. O Senhor Baladeva e os generais do exército Yādava voltaram-se para enfrentar esses adversários, impedindo o avanço deles. Os exércitos inimigos, então, começaram a lançar incessantes chuvas de flechas sobre o exército do Senhor Kṛṣṇa. Ao ver as forças de seu futuro marido sofrer um ataque tão violento, Śrīmatī Rukmiṇī olhou para Śrī Kṛṣṇa cheia de temores. Mas Kṛṣṇa apenas sorriu e disse-lhe que não havia o que recear, pois era certo que Seu exército destruiria o inimigo sem demora.

O Senhor Balarāma e os outros heróis, em seguida, puseram-se a aniquilar o exército adversário com flechas nārāca. Os reis inimi­gos, liderados por Jarāsandha, retrocederam depois que seus exérci­tos foram destruídos nas mãos dos Yādavas.

Jarāsandha consolou Śiśupāla: “Felicidade e aflição nunca são permanentes, e estão sob o controle do Senhor Supremo. Por dezessete vezes, Kṛṣṇa me derrotou, mas, no final, eu O venci. Desse modo, vendo que vitória e derrota estão sob o controle do destino e do tempo, aprendi a não sucumbir à lamentação nem ao júbilo. O tempo agora favore­ce os Yādavas, de modo que eles te derrotaram apenas com um pequeno exército, mas, no futuro, o tempo te favorecerá, e é certo que os ven­cerás.” Consolado dessa maneira, Śiśupāla voltou a seu reino com seus seguidores.

O irmão de Rukmiṇī, Rukmī, que odiava Kṛṣṇa, ficou furioso pelo fato de Kṛṣṇa ter raptado sua irmã. Assim, depois de prometer dian­te de todos os reis presentes que não regressaria a Kuṇḍina enquan­to Kṛṣṇa não fosse destruído e Rukmiṇī resgatada, Rukmī partiu com seu exército para atacar o Senhor. Desconhecendo as glórias do Senhor Kṛṣṇa, Rukmī saiu ousadamente em uma única quadriga para atacar o Senhor. Ele se aproximou do Senhor, atingiu-O com flechas e exigiu que soltasse Rukmiṇī. Śrī Kṛṣṇa desviou-Se das armas de Rukmī, despedaçando-as. Então, ergueu bem alto Sua espada, mas Rukmiṇī intercedeu quando Ele estava para matar Rukmī e pediu-Lhe com fervor que poupasse a vida de seu irmão. O Senhor Kṛṣṇa não matou Rukmī, senão que, com Sua espada, arrancou tufos do cabelo de Rukmī aqui e ali, deixando-o desfigurado. Bem naquele momento, apareceu em cena o Senhor Baladeva com o exército Yādava. Ao ver Rukmī desfigu­rado, Ele mansamente censurou Kṛṣṇa: “Desfigurar um parente tão próximo equivale a matá-lo, motivo pelo qual ele não deve ser morto, mas libertado.”

Então, o Senhor Baladeva disse a Rukmiṇī que a deplorável con­dição de seu irmão era apenas fruto de suas ações passadas, pois cada qual é responsável por sua própria felicidade e sofrimento. Ele ainda a instruiu sobre a posição transcendental da alma jīva e como a ilusão de pensar que existem felicidade e aflição não passa do resultado da ignorância. Aceitando as instruções do Senhor Balarāma, Rukmiṇī abandonou seu pesar.

Rukmī, entretanto, sucumbiu à total frustração, privado como es­tava de toda a sua força e vontade de lutar. Como prometera solene­mente não voltar para casa sem vencer Kṛṣṇa, Rukmī construiu uma cidade naquele mesmo lugar e fixou residência ali, preservando sua raiva.

O Senhor Kṛṣṇa levou Rukmiṇī para Sua capital, Dvārakā, e casou-­Se com ela. Todos os cidadãos celebraram a cerimônia em estilo suntuoso, difundindo por toda a cidade relatos de como o Senhor raptara Rukmiṇī. Todos em Dvārakā sentiram grande prazer em ver o Senhor Kṛṣṇa unido a Rukmiṇī.

Texto

śrī-śuka uvāca
iti sarve su-saṁrabdhā
vāhān āruhya daṁśitāḥ
svaiḥ svair balaiḥ parikrāntā
anvīyur dhṛta-kārmukāḥ

Sinônimos

śrī-śukaḥ uvāca — Śukadeva Gosvāmī disse; iti — assim (falando); sarve — todos eles; su-saṁrabdhāḥ — com grande ira; vāhān — em seus veículos; āruhya — montando; daṁśitāḥ — usando armaduras; svaiḥ svaiḥ — cada um por si mesmo; balaiḥ — força militar; parikrāntāhrodeado; anvīyuḥ — seguiram; dhṛta — segurando; kārmukāḥ — seus arcos.

Tradução

Śukadeva Gosvāmī disse: Tendo falado dessa maneira, todos aqueles reis enfurecidos puseram suas armaduras e montaram em seus veículos. Cada rei, de arco na mão, estava rodeado por seu próprio exército enquanto saía em perseguição ao Senhor Kṛṣṇa.

Texto

tān āpatata ālokya
yādavānīka-yūthapāḥ
tasthus tat-sammukhā rājan
visphūrjya sva-dhanūṁṣi te

Sinônimos

tān — a eles; āpatataḥ — em perseguição; ālokya — vendo; yādava-­anīka — do exército Yādava; yūtha-paḥ — os oficiais; tasthuḥ — postaram-se; tat — a eles; sammukhāḥ —enfrentando diretamente; rājan — ó rei (Parīkṣit); visphūrjya — retesando; sva — seus; dhanūṁṣi — arcos; te — eles.

Tradução

Ao verem que os inimigos se precipitavam ao ataque, os comandantes do exército Yādava voltaram-se para enfrentá-los e ficaram firmes, ó rei, retesando a corda de seus arcos.

Texto

aśva-pṛṣṭhe gaja-skandhe
rathopasthe ’stra kovidāḥ
mumucuḥ śara-varṣāṇi
meghā adriṣv apo yathā

Sinônimos

aśva-pṛṣṭhe — a cavalo; gaja — de elefantes; skandhe — nos dorsos; ratha — de quadrigas; upasthe — nos assentos; astra — de armas; kovi­dāḥ — aqueles peritos no uso; mumucuḥ — soltavam; śara — de flechas; varṣāṇi — chuvas; meghāḥ — as nuvens; adriṣu — sobre as montanhas; apaḥ — água; yathā — como.

Tradução

Montados nos dorsos de cavalos e elefantes e sentados em qua­drigas, os reis inimigos, peritos em armas, lançavam chuvas de flechas sobre os Yadus assim como nuvens que derramam chuva sobre as montanhas.

Texto

patyur balaṁ śarāsāraiś
channaṁ vīkṣya su-madhyamā
sa-vrīḍm aikṣat tad-vaktraṁ
bhaya-vihvala-locanā

Sinônimos

patyuḥ — de seu Senhor; balam — o exército; śara — de flechas; āsā­raiḥ — pelas chuvas pesadas; channam — coberto; vīkṣya — vendo; su­-madhyamā — a mulher de cintura fina (Rukmiṇī); sa-vrīḍam — timidamente; aikṣat — olhou; tat — dEle; vaktram — para o rosto; bhaya — com medo; vihvala — perturbados; locanā — cujos olhos.

Tradução

A Rukmiṇī de cintura fina, vendo o exército de seu Senhor co­berto por torrentes de flechas, olhou timidamente para o rosto dEle com olhos amedrontados.

Texto

prahasya bhagavān āha
mā sma bhair vāma-locane
vinaṅkṣyaty adhunaivaitat
tāvakaiḥ śātravaṁ balam

Sinônimos

prahasya — rindo; bhagavān — o Senhor Supremo; āha — disse; sma bhaiḥ — não temas; vāma-locane — ó mulher de belos olhos; vinaṅkṣyati — será destruída; adhunā eva — agora mesmo; etat — esta; tāvakaiḥ — por teu (exército); śātravam — dos inimigos; balam — a força.

Tradução

Em resposta, o Senhor riu e garantiu-lhe: “Não tenhas medo, ó mulher de belos olhos. Esta força inimiga está prestes a ser destruída por teus soldados.”

Comentário

SIGNIFICADO—Para exprimir Sua grande afeição por Rukmiṇī, o Senhor Kṛṣṇa galantemente referiu-Se a Seu próprio exército Yādava como “teus homens”, indicando que toda a dinastia do Senhor era agora pro­priedade de Sua amada rainha. O Senhor Supremo, Kṛṣṇa, deseja compartilhar Suas opulências bem-aventuradas com todos os seres vivos, daí Ele sinceramente os convidar a voltarem ao lar, a voltarem a Deus. O movimento da consciência de Kṛṣṇa, introduzi­do no mundo inteiro por Śrīla Prabhupāda por ordem de seu mestre espiritual, Śrīla Bhaktisiddhānta Sarasvatī hākura, que pregou em toda a Índia por ordem de seu insigne pai, Śrīla Bhaktivinoda Ṭhākura, está difundindo a mensagem amorosa do Senhor Kṛṣṇa: Lembrem-se dEle, sirvam-nO, voltem para Ele e partilhem da abundância infinita do reino de Deus.

Texto

teṣāṁ tad-vikramaṁ vīrā
gada-saṅkarṣanādayaḥ
amṛṣyamāṇā nārācair
jaghnur haya-gajān rathān

Sinônimos

teṣām — por eles (os reis adversários); tat — aquele; vikramam — espetáculo de valentia; vīrāḥ — os heróis; gada — Gada, o irmão mais jovem do Senhor Kṛṣṇa; saṅkarṣaṇa — o Senhor Balarāma; ādayaḥ — e outros; amṛṣyamāṇāḥ — não tolerando; nārācaiḥ — com flechas feitas de ferro; jaghnuḥ — atingiram; haya — cavalos; gajān — elefantes; ra­thān — e quadrigas.

Tradução

Os heróis do exército do Senhor, liderados por Gada e Saṅ­karṣaṇa, não puderam tolerar a agressão dos reis adversários. Assim, com flechas de ferro, começaram a derrubar os cavalos, elefantes e quadrigas do inimigo.

Texto

petuḥ śirāṁsi rathinām
aśvināṁ gajināṁ bhuvi
sa-kuṇḍala-kirīṭāni
soṣṇīṣāṇi ca koṭiśaḥ

Sinônimos

petuḥ — caíam; śirāṁsi — as cabeças; rathinām — dos que estavam nas quadrigas; aśvinām — dos que cavalgavam; gajinām — dos que montavam elefantes; bhuvi — ao chão; sa — com; kuṇḍala — brincos; kirīṭāni — e elmos; sa — com; uṣṇīṣāṇi — turbantes; ca — e; koṭiśaḥ — aos milhões.

Tradução

As cabeças dos soldados que lutavam em quadrigas, cavalos e elefantes caíam ao chão aos milhões; algumas cabeças usavam brincos e elmos, enquanto outras usavam turbantes.

Texto

hastāḥ sāsi-gadeṣv-āsāḥ
karabhā ūravo ’ṅghrayaḥ
aśvāśvatara-nāgoṣṭra-
khara-martya-śirāṁsi ca

Sinônimos

hastāḥ — mãos; sa — com; asi — espadas; gadā — maças; iṣu-āsāḥ — arcos; karabhāḥ — mãos sem dedos; ūravaḥ — coxas; aṅghrayaḥ — pernas; aśva — de cavalos; aśvatara — burros; nāga — elefantes; uṣṭra — camelos; khara — asnos selvagens; martya — e seres humanos; śirāṁ­si — cabeças; ca — também.

Tradução

Por toda a parte, jaziam coxas, pernas e mãos sem dedos, bem como mãos que empunhavam espadas, maças e arcos, e também cabeças de cavalos, burros, elefantes, camelos, asnos selvagens e de seres humanos.

Comentário

SIGNIFICADO—Karabhāḥ indica a porção da mão que vai do punho até a base dos dedos. A mesma palavra também pode indicar uma tromba de ele­fante. Logo, neste verso, a implicação é que as coxas que jaziam no campo de batalha assemelhavam-se a trombas de elefantes.

Texto

hanyamāna-balānīkā
vṛṣṇibhir jaya-kāṅkṣibhiḥ
rājāno vimukhā jagmur
jarāsandha-puraḥ-sarāḥ

Sinônimos

hanyamāna — sendo mortos; bala-anīkāḥ — cujos exércitos; vṛṣṇi­bhiḥ — pelos Vṛṣṇis; jaya — pela vitória; kāṅkṣibhiḥ — que estavam ávidos; rājānaḥ — os reis; vimukhāḥ — desestimulados; jagmuḥ — abandonaram; jarāsandha-puraḥ-sarāḥ — encabeçados por Jarāsandha.

Tradução

Vendo seus exércitos serem derrubados pelos Vṛṣṇis, que estavam ávidos pela vitória, os reis liderados por Jarāsandha perde­ram o ânimo e abandonaram o campo de batalha.

Texto

śiśupālaṁ samabhyetya
hṛta-dāram ivāturam
naṣṭa-tviṣaṁ gatotsāhaṁ
śuṣyad-vadanam abruvan

Sinônimos

śiśupālam — de Śiśupāla; samabhyetya — aproximando-se; hṛta — roubada; dāram — cuja esposa; iva — como se; āturam — perturbado; naṣṭa — perdida; tviṣam — cuja cor; gata — ido; utsāham — cujo entusiasmo; śuṣyat — murcho; vadanam — cujo rosto; abruvan — disseram.

Tradução

Os reis se aproximaram de Śiśupāla, que estava perturbado como um homem que perdeu a esposa. Sua tez empalidecera, seu entusiasmo se fora, e seu rosto parecia murcho. Os reis disseram-­lhe o seguinte.

Comentário

SIGNIFICADO—Embora não tivesse casado com Rukmiṇī, Śiśupāla apaixonada­mente a considerava sua propriedade, em razão do que ficou devastado, tal qual um homem que perde sua amada esposa.

Texto

bho bhoḥ puruṣa-śārdūla
daurmanasyam idaṁ tyaja
na priyāpriyayo rājan
niṣṭhā dehiṣu dṛśyate

Sinônimos

bhoḥ bhoḥ — ó senhor; puruṣa — entre homens; śārdūla — ó tigre; daurmanasyam — estado de depressão mental; idam — este; tyaja — abandona; na — nenhuma; priya — do desejável; apriyayoḥ — ou do indesejável; rājan — ó rei; niṣṭhā — permanência; dehiṣu — entre seres corporificados; dṛśyate — é vista.

Tradução

[Jarāsandha disse:] Ouve, Śiśupāla, ó tigre entre os homens. Abandona tua depressão. Afinal, a felicidade e infelicidade dos seres corporificados jamais é vista como permanente, ó rei.

Texto

yathā dāru-mayī yoṣit
nṛtyate kuhakecchayā
evam īśvara-tantro ’yam
īhate sukha-duḥkhayoḥ

Sinônimos

yathā — como; dāru-mayī — feita de madeira; yoṣit — uma mulher; nṛtyate — dança; kuhaka — do titereiro; icchayā — pelo desejo; evam — da mesma forma; īśvara — do Senhor Supremo; tantraḥ — sob o controle; ayam — este mundo; īhate — esforça-se; sukha — em alegria; duḥ­khayoḥ — e sofrimento.

Tradução

Assim como uma marionete em forma de mulher dança confor­me o desejo do titereiro, da mesma forma este mundo, controlado pelo Senhor Supremo, se debate tanto na felicidade quanto no sofrimento.

Comentário

SIGNIFICADO—Pela vontade do Senhor Supremo, os seres vivos recebem os re­sultados adequados de suas atividades. Aquele que compreende a Verdade Absoluta rende-se à Verdade Absoluta, a Suprema Persona­lidade de Deus, e não se considera mais que ele esteja dentro do sistema de existência material. Visto que aqueles que se empenham dentro do sistema material, ou mundo material, estão necessariamente tentan­do explorar a criação de Deus, eles têm de sujeitar-se às reações, que são percebidas pelas almas condicionadas como dolorosas ou alegres. Em verdade, todo o modo de vida material é um fiasco quando visto da perspectiva da bem-aventurança absoluta.

Texto

śaureḥ sapta-daśāhaṁ vai
saṁyugāni parājitaḥ
trayo-viṁśatibhiḥ sainyair
jigye ekam ahaṁ param

Sinônimos

śaureḥ — com Kṛṣṇa; sapta-daśa — dezessete; aham — eu; vai — de fato; saṁyugāni — batalhas; parājitaḥ — perdido; trayaḥ-viṁśatibhiḥ — vinte e três; sainyaiḥ — com exércitos; jigye — ganhei; ekam — uma; aham — eu; param — somente.

Tradução

Em batalha contra Kṛṣṇa, eu e meus vinte e três exércitos per­demos por dezessete vezes; eu O derrotei somente por uma vez.

Comentário

SIGNIFICADO—Jarāsandha oferece sua própria vida como exemplo da inevitável felicidade e aflição deste mundo material.

Texto

tathāpy ahaṁ na śocāmi
na prahṛṣyāmi karhicit
kālena daiva-yuktena
jānan vidrāvitaṁ jagat

Sinônimos

tathā api — não obstante; aham — eu; na śocāmi — não lamento; na prahṛṣyāmi — nem me regozijo; karhicit — jamais; kālena — pelo tempo; daiva — com o destino; yuktena — em conjunto; jānan — sabendo; vi­drāvitam — que é conduzido; jagat — o mundo.

Tradução

Ainda assim, no entanto, eu nunca lamento nem me regozijo, por saber que este mundo é conduzido pelo tempo e pelo destino.

Comentário

SIGNIFICADO—Tendo dito que o Senhor Supremo controla este mundo, Jarāsandha explica o método específico de controle. Deve-se lembrar que, no con­texto védico, kāla, ou o tempo, não se refere a um mero sistema de medir os movimentos planetários como os dias, semanas, meses e anos, senão que se refere à maneira como as coisas estão se movendo. Tudo se movimenta segundo seu destino, e esse destino também é descrito como “o tempo”, visto que o destino de cada um é revelado e im­posto pelos movimentos do tempo.

Texto

adhunāpi vayaṁ sarve
vīra-yūthapa-yūthapāḥ
parājitāḥ phalgu-tantrair
yadubhiḥ kṛṣṇa-pālitaiḥ

Sinônimos

adhunā — agora; api — mesmo; vayam — nós; sarve — todos; vīra — dos heróis; yūtha-pa — dos líderes; yūtha-pāḥ — os líderes; parājitāḥ — derrotados; phalgu — insuficiente; tantraiḥ — cujo séquito; yadubhiḥ — pelos Yadus; kṛṣṇa-pālitaiḥ — protegidos por Kṛṣṇa.

Tradução

E agora todos nós, eminentes comandantes de líderes militares, fomos derrotados pelos Yadus e seu pequeno séquito, que são protegidos por Kṛṣṇa.

Texto

ripavo jigyur adhunā
kāla ātmānusāriṇi
tadā vayaṁ vijeṣyāmo
yadā kālaḥ pradakṣiṇaḥ

Sinônimos

ripavaḥ — nossos inimigos; jigyuḥ — venceram; adhunā — agora; kāle — o tempo; ātma — a eles; anusārīṇi — favorecendo; tadā — então; vayam — nós; vijeṣyāmaḥ — venceremos; yadā — quando; kālaḥ — o tempo; pradakṣiṇaḥ — voltar-se para nós.

Tradução

Agora nossos inimigos venceram porque o tempo lhes é favo­rável, mas, no futuro, quando o tempo nos for auspicioso, nós vence­remos.

Texto

śrī-śuka uvāca
evaṁ prabodhito mitraiś
caidyo ’gāt sānugaḥ puram
hata-śeṣāḥ punas te ’pi
yayuḥ svaṁ svaṁ puraṁ nṛpāḥ

Sinônimos

śrī-śukaḥ uvāca — Śukadeva Gosvāmī disse; evam — assim; prabo­dhitaḥ — persuadido; mitraiḥ — por seus amigos; caidyaḥ — Śiśupāla; agāt — foi; sa-anugaḥ — com seus seguidores; puram — para a sua cida­de; hata — dos mortos; śeṣāḥ — que restaram; punaḥ — de novo; te — eles; api — também; yayuḥ — foram; svam svam — cada qual para a sua; puram — cidade; nṛpāḥ — reis.

Tradução

Śukadeva Gosvāmī disse: Persuadido assim por seus amigos, Śiśupāla reuniu seus seguidores e regressou à sua capital. Os guerreiros sobreviventes também voltaram para suas respectivas cidades.

Texto

rukmī tu rākṣasodvāhaṁ
kṛṣṇa-dviḍ asahan svasuḥ
pṛṣṭhato ’nvagamat kṛṣṇam
akṣauhiṇyā vṛto balī

Sinônimos

rukmī — Rukmī; tu — todavia; rākṣasa — no estilo dos demônios; udvāham — o casamento; kṛṣṇa-dviṭ — que odiava Kṛṣṇa; asahan — incapaz de suportar; svasuḥ — de sua irmã; pṛṣṭhaḥ — de trás; anvaga­mat — seguiu; kṛṣṇam — o Senhor Kṛṣṇa; akṣauhiṇyā — por uma divisão akṣauhiṇī inteira; vṛtaḥ — rodeado; balī — poderosa.

Tradução

O poderoso Rukmī, todavia, sentia muita inveja de Kṛṣṇa. Ele não pôde suportar o fato de Kṛṣṇa ter levado embora sua irmã para casar-se com ela no estilo rākṣasa. Por isso, perseguiu o Senhor com uma divisão militar inteira.

Texto

rukmy amarṣī su-saṁrabdhaḥ
śṛṇvatāṁ sarva-bhūbhujām
pratijajñe mahā-bāhur
daṁśitaḥ sa-śarāsanaḥ
ahatvā samare kṛṣṇam
apratyūhya ca rukmiṇīm
kuṇḍinaṁ na pravekṣyāmi
satyam etad bravīmi vaḥ

Sinônimos

rukmī — Rukmī; amarṣī — intolerante; su-saṁrabdhaḥ — irado em extremo; śṛṇvatām — enquanto ouviam; sarva — todos; bhū-bhujām — os reis; pratijajñe — jurou; mahā-bāhuḥ — de braços poderosos; daṁśi­taḥ — usando sua armadura; sa-śarāsanaḥ — com seu arco; ahatvā — sem matar; samare — em batalha; kṛṣṇam — a Kṛṣṇa; apratyūhya — sem trazer de volta; ca — e; rukmiṇīm — Rukmiṇī; kuṇḍinam — na ci­dade de Kuṇḍina; na pravekṣyāmi — não entrarei; satyam — em ver­dade; etat — isto; bravīmi — digo; vaḥ — a todos vós.

Tradução

Frustrado e enfurecido, o Rukmī de braços poderosos, trajando armadura e brandindo seu arco, jurou diante de todos os reis: “Não retornarei a Kuṇḍina caso eu não mate Kṛṣṇa em ba­talha e não traga Rukmiṇī de volta comigo. Juro isto a vós.”

Comentário

SIGNIFICADO—Rukmī falou estas palavras iradas e, então, partiu em perseguição ao Senhor Kṛṣṇa, como se descreve nos versos seguintes.

Texto

ity uktvā ratham āruhya
sārathiṁ prāha satvaraḥ
codayāśvān yataḥ kṛṣṇaḥ
tasya me saṁyugaṁ bhavet

Sinônimos

iti — assim; uktvā — falando; ratham — em sua quadriga; āruhya — subindo; sārathim — a seu cocheiro; prāha — disse; satvaraḥ — rapidamen­te; codaya — conduze; aśvān — os cavalos; yataḥ — aonde; kṛṣṇaḥ — Kṛṣṇa; tasya — dEle; me — comigo; saṁyugam — luta; bhavet — deve haver.

Tradução

Depois de dizer isso, ele montou em sua quadriga e disse a seu cocheiro: “Conduze os cavalos bem depressa para onde Kṛṣṇa está. Ele e eu temos de lutar.”

Texto

adyāhaṁ niśitair bāṇair
gopālasya su-durmateḥ
neṣye vīrya-madaṁ yena
svasā me prasabhaṁ hṛtā

Sinônimos

adya — hoje; aham — eu; niśitaiḥ — afiadas; bāṇaiḥ — com minhas flechas; gopālasya — do vaqueiro; su-durmateḥ — cuja mentalidade é muito perversa; neṣye — arrancarei; vīrya — de Seu poder; madam — o orgulho inebriado; yena — pelo qual; svasā — irmã; me — minha; pra­sabham — violentamente; hṛtā — raptada.

Tradução

“Este vaqueirinho de mente perversa, desvairado devido a Sua proeza, raptou violentamente minha irmã. Mas hoje arrancarei Seu orgulho com minhas flechas afiadas.”

Comentário

SIGNIFICADO—Śrīla Śrīdhara Svāmī explica que gopālasya significa, na verdade, “do protetor dos Vedas”, enquanto durmateḥ significa “dEle cuja bela mente é compassiva mesmo para com os perversos”. Śrīla Viś­vanātha Cakravartī acrescenta que o verdadeiro sentido do que Rukmī disse é que hoje, lutando contra o Senhor Kṛṣṇa, Rukmī se livraria de suas pretensões de ser um grande herói.

Texto

vikatthamānaḥ kumatir
īśvarasyāpramāṇa-vit
rathenaikena govindaṁ
tiṣṭha tiṣṭhety athāhvayat

Sinônimos

vikatthamānaḥ — vangloriando-se; ku-matiḥ — tolo; īśvarasya — do Senhor Supremo; apramāṇa-vit —desconhecendo as dimensões; ra­thena ekena — com uma única quadriga; govindam — ao Senhor Kṛṣṇa; tiṣṭha tiṣṭha — levanta-Te e luta; iti — assim dizendo; atha — então; āhvayat — chamou.

Tradução

Vangloriando-se dessa maneira, o tolo Rukmī, que desconhecia a verdadeira extensão do poder do Senhor Supremo, aproximou-­se com sua quadriga solitária do Senhor Govinda e desafiou-O: “Levanta-Te e luta!”

Comentário

SIGNIFICADO—A partir destes versos, pode-se deduzir que, embora Rukmī tivesse partido com toda uma divisão militar, ele pessoalmente precipitou-se em direção ao Senhor Kṛṣṇa para lutar contra Ele.

Texto

dhanur vikṛṣya su-dṛḍhaṁ
jaghne kṛṣṇaṁ tribhiḥ śaraiḥ
āha cātra kṣaṇaṁ tiṣṭha
yadūnāṁ kula-pāṁsana

Sinônimos

dhanuḥ — seu arco; vikṛṣya — retesando; su — muito; dṛḍham — firmemente; jaghne — atingiu; kṛṣṇam — o Senhor Kṛṣṇa; tribhiḥ — com três; śaraiḥ — flechas; āha — disse; ca — e; atra — aqui; kṣaṇam — um momento; tiṣṭha — fica; yadūnām — dos Yadus; kula — da dinastia; pāṁsa­na — ó corruptor.

Tradução

Rukmī retesou a corda de seu arco com grande força e atingiu o Senhor Kṛṣṇa com três flechas. Então, ele disse: “Fica de pé aqui por um momento, ó profanador da dinastia Yadu!”

Comentário

SIGNIFICADO—Śrīla Śrīdhara Svāmī assinala que se pode entender kula-pāṁsana como uma combinação das palavras kula-pa, “ó Senhor da dinastia Yadu”, e aṁsana, “ó perito matador de inimigos”. O ācārya fornece os detalhes gramaticais que tornam possível essa interpretação.

Texto

yatra yāsi svasāraṁ me
muṣitvā dhvāṅkṣa-vad dhaviḥ
hariṣye ’dya madaṁ manda
māyinaḥ kūṭa-yodhinaḥ

Sinônimos

yatra — aonde; yāsi — fores; svasāram — irmã; me — minha; muṣi­tvā — tendo roubado; dhvāṅkṣa-vat — tal qual um corvo; haviḥ — a manteiga do sacrifício; hariṣye — retirarei; adya — hoje; madam — Teu falso orgulho; manda — ó tolo; māyinaḥ — do enganador; kūṭa — trapaceiro; yodhinaḥ — do lutador.

Tradução

“Aonde quer que fores, levando minha irmã, tal qual um corvo que rouba a manteiga do sacrifício, eu Te seguirei. Hoje mesmo vou livrar-Te de Teu falso orgulho, ó tolo, enganador e lutador trapaceiro!”

Comentário

SIGNIFICADO—Em seu surto histérico, Rukmī exibe as próprias qualidades que atribuía a Śrī Kṛṣṇa. Todo ser vivo é parte integrante do Senhor e pertence ao Senhor. Portanto, Rukmī era como um corvo tentando roubar a oferenda do sacrifício destinada ao prazer do Senhor.

Texto

yāvan na me hato bāṇaiḥ
śayīthā muñca dārīkām
smayan kṛṣṇo dhanuś chittvā
ṣaḍbhir vivyādha rukmiṇam

Sinônimos

yāvat — enquanto; na — não; me — minhas; hataḥ — morto; bāṇaiḥ — pelas flechas; śayīthaḥ — Te deitares; muñca — solta; dārīkām — a moça; smayan — sorrindo; kṛṣṇaḥ — o Senhor Kṛṣṇa; dhanuḥ — seu arco; chit­tvā — quebrando; ṣaḍbhiḥ — com seis (flechas); vivyādha — perfurado; rukmiṇam — Rukmī.

Tradução

“Solta a moça antes que eu Te aniquile com minhas flechas e Te obrigue a deitar-Te!” Em resposta a isso, o Senhor Kṛṣṇa sorriu e, com seis flechas, atingiu Rukmī e quebrou seu arco.

Comentário

SIGNIFICADO—Śrīla Viśvanātha Cakravartī ressalta que, na verdade, o Senhor Kṛṣṇa devia deitar-Se junto com Rukmiṇī em um belo leito de flores, mas, de­vido à timidez, Rukmī não mencionou diretamente esse ponto.

Texto

aṣṭabhiś caturo vāhān
dvābhyāṁ sūtaṁ dhvajaṁ tribhiḥ
sa cānyad dhanur ādhāya
kṛṣṇaṁ vivyādha pañcabhiḥ

Sinônimos

aṣṭabhiḥ — com oito (flechas); caturaḥ — os quatro; vāhān — cava­los; dvābhyām — com duas; sūtam — o cocheiro; dhvajam — o mastro da bandeira; tribhiḥ — com três; saḥ — ele, Rukmī; ca — e; anyat — outro; dhanuḥ — arco; ādhāya — pegando; kṛṣṇam — a Kṛṣṇa; vivyā­dha — perfurado; pañcabhiḥ — com cinco.

Tradução

O Senhor atingiu os quatro cavalos de Rukmī com oito flechas, seu cocheiro com duas, e a bandeira da quadriga com três. Rukmī empunhou outro arco e atingiu o Senhor Kṛṣṇa com cinco flechas.

Texto

tais tāditaḥ śaraughais tu
ciccheda dhanur acyutaḥ
punar anyad upādatta
tad apy acchinad avyayaḥ

Sinônimos

taiḥ — por estes; tāḍitaḥ — atingido; śara — de flechas; oghaiḥ — dilúvios; tu — embora; ciccheda — quebrou; dhanuḥ — o arco (de Rukmī); acyutaḥ — o Senhor Kṛṣṇa; punaḥ — de novo; anyat — outro; upādat­ta — ele (Rukmī) pegou; tat — aquele; api — também; acchinat — que­brou; avyayaḥ — o infalível Senhor.

Tradução

Embora atingido por essas muitas flechas, o Senhor Acyuta quebrou novamente o arco de Rukmī. Mais uma vez, Rukmī se valeu de outro arco, mas o Senhor infalível também quebrou este em pedaços.

Texto

parighaṁ paṭṭiśaṁ śūlaṁ
carmāsī śakti-tomarau
yad yad āyudham ādatta
tat sarvaṁ so ’cchinad dhariḥ

Sinônimos

parigham — clava com ponta de ferro; paṭṭiśam — arpão de três pontas; śūlam — lança; carma-asī — escudo e espada; śakti — pique; tomarau — dardo; yat yat — qualquer; āyudham — arma; ādatta — pegas­se; tat sarvam — todas elas; saḥ — Ele; acchinat — quebrava; hariḥ — o Senhor Kṛṣṇa.

Tradução

Clava de ferro, arpão de três pontas, lança, espada e escudo, pique, dardo – qualquer arma que Rukmī pegasse, o Senhor Hari a despedaçava.

Texto

tato rathād avaplutya
khaḍga-pāṇir jighāṁsayā
kṛṣṇam abhyadravat kruddhaḥ
pataṅga iva pāvakam

Sinônimos

tataḥ — então; rathāt — de sua quadriga; avaplutya — saltando; khaḍga — uma espada; pāṇiḥ — em sua mão; jighāṁsayā — com o de­sejo de matar; kṛṣṇam — ao Senhor Kṛṣṇa; abhyadravat — correu em direção ao; kruddhaḥ — furioso; pataṅgaḥ — um pássaro; iva — como; pāvakam — o vento.

Tradução

Rukmī, então, saltou de sua quadriga e, de espada em punho, precipitou-se furiosamente em direção a Kṛṣṇa a fim de matá-lO, como um pássaro que voa contra o vento.

Texto

tasya cāpatataḥ khaḍgaṁ
tilaśaś carma ceṣubhiḥ
chittvāsim ādade tigmaṁ
rukmiṇaṁ hantum udyataḥ

Sinônimos

tasya — dele; ca — e; āpatataḥ — que estava atacando; khaḍgam — a espada; tilaśaḥ — em pedacinhos; carma — o escudo; ca — e; iṣubhiḥ — com Suas flechas; chittvā — quebrando; asim — Sua espada; ādade — pegou; tigmam — afiada; rukmiṇam — Rukmī; hantum — para matar; udyataḥ — preparado.

Tradução

Quando Rukmī O atacou, o Senhor disparou flechas que pulverizaram sua espada e escudo. Kṛṣṇa, então, pegou Sua espada afiada e preparou-Se para matar Rukmī.

Texto

dṛṣṭvā bhrātṛ-vadhodyogaṁ
rukmiṇī bhaya-vihvalā
patitvā pādayor bhartur
uvāca karuṇaṁ satī

Sinônimos

dṛṣṭvā — vendo; bhrātṛ — seu irmão; vadha — de matar; udyogam — a tentativa; rukmiṇī — Śrīmatī Rukmiṇī; bhaya — pelo medo; vihvalā — agitada; patitvā — caindo; pādayoḥ — aos pés; bhartuḥ — de seu mari­do; uvāca — falou; karuṇam — pateticamente; satī — santa.

Tradução

Ao ver o Senhor Kṛṣṇa pronto para matar seu irmão, a santa Rukmiṇī encheu-se de apreensão. Caindo aos pés de seu marido, ela lastimosamente disse o seguinte.

Texto

śrī-rukmiṇy uvāca
yogeśvarāprameyātman
deva-deva jagat-pate
hantuṁ nārhasi kalyāṇa
bhrātaraṁ me mahā-bhuja

Sinônimos

śrī-rukmiṇī uvāca — Śrī Rukmiṇī disse; yoga-īśvara — ó controla­dor de todo o poder místico; aprameya-ātman — ó ser imensurável; deva-deva — ó Senhor dos senhores; jagat-pate — ó mestre do universo; hantum na arhasi — por favor, não mates; kalyāṇa — ó todo-auspicioso; bhrātaram — irmão; me — meu; mahā-bhuja — ó pessoa de braços poderosos.

Tradução

Śrī Rukmiṇī disse: Ó controlador de todo o poder místico, ser imensurável, Senhor dos senhores, mestre do universo! Ó pessoa todo-auspiciosa e de braços poderosos, por favor, não mates meu irmão!

Texto

śrī-śuka uvāca
tayā paritrāsa-vikampitāṅgayā
śucāvaśuṣyan-mukha-ruddha-kaṇṭhayā
kātarya-visraṁsita-hema-mālayā
gṛhīta-pādaḥ karuṇo nyavartata

Sinônimos

śrī-śukaḥ uvāca — Śukadeva Gosvāmī disse; tayā — por ela; pari­trāsa — em completo medo; vikampita — tremendo; aṅgayā — cujos membros; śucā — por causa da aflição; avaśuṣyat — secando; mukha — cuja boca; ruddha — e sufocada; kaṇṭhayā — cuja garganta; kātarya — em sua agitação; visraṁsita — desalinhado; hema — de ouro; mālayā — cujo colar; gṛhīta — segurou; pādaḥ — Seus pés; karuṇaḥ — compassi­vo; nyavartata — desistiu.

Tradução

Śukadeva Gosvāmī disse: O grande temor de Rukmiṇī fez os membros de seu corpo tremer e sua boca secar, e sua garganta ficou embargada de aflição. Em sua agitação, seu colar de ouro desalinhou-se. Ela agarrou os pés de Kṛṣṇa, e o Senhor, sentindo compaixão, desistiu de matá-lo.

Comentário

SIGNIFICADO—Śrīla Viśvanātha Cakravartī cita a “regra mundana” de que a irmã é a personificação da misericórdia: dayāyā bhaginī mūrtiḥ. Ainda que Rukmī fosse perverso e se opusesse ao melhor interesse de sua irmã, Rukmiṇī sentia compaixão por ele, e o Senhor partilhava de sua compaixão.

Texto

cailena baddhvā tam asādhu-kārīṇaṁ
sa-śmaśru-keśaṁ pravapan vyarūpayat
tāvan mamarduḥ para-sainyam adbhutaṁ
yadu-pravīrā nalinīṁ yathā gajāḥ

Sinônimos

cailena — com uma tira de pano; baddhvā — amarrando; tam — a ele; asādhu-kāriṇam — o malfeitor; sa-śmaśru-keśam — deixando ficar um pouco de bigode e cabelo; pravapan — rapando-o; vyarūpayat — desfigurou-o; tāvat — a esta altura; mamarduḥ — tinham esmagado; para — adversário; sainyam — o exército; adbhutam — extraordinário; yadu-pravīrāḥ — os heróis da dinastia Yadu; nalinīm — uma flor de lótus; yathā — como; gajāḥ — elefantes.

Tradução

O Senhor Kṛṣṇa amarrou o malfeitor com uma tira de pano. Então, passou a desfigurar Rukmī, rapando apenas partes de seu cabelo e bigode, de tal forma a conferir-lhe uma aparência ridícula. A essa altura, os heróis Yadus tinham esmagado o extraordinário exérci­to de seus adversários, assim como um elefante pisoteia uma flor de lótus.

Comentário

SIGNIFICADO—O Senhor Kṛṣṇa usou Sua mesma espada afiada para fazer no per­verso Rukmī um estranho corte de cabelo.

Texto

kṛṣṇāntikam upavrajya
dadṛśus tatra rukmiṇam
tathā-bhūtaṁ hata-prāyaṁ
dṛṣṭvā saṅkarṣaṇo vibhuḥ
vimucya baddhaṁ karuṇo
bhagavān kṛṣṇam abravīt

Sinônimos

kṛṣṇa — de Kṛṣṇa; antikam — da proximidade; upavrajya — aproximando-se; dadṛśuḥ — (os soldados Yadus) viram; tatra — lá; rukmi­ṇam — Rukmī; tathā-bhūtam — em tal condição; hata — morto; prāyam — praticamente; dṛṣṭvā — vendo; saṅkarṣaṇaḥ — Balarāma; vibhuḥ — o oni­potente; vimucya — soltando; baddham — o amarrado (Rukmī); karu­ṇaḥ — compassivo; bhagavān — o Senhor; kṛṣṇam — a Kṛṣṇa; abra­vīt — disse.

Tradução

Ao se aproximarem do Senhor Kṛṣṇa, os Yadus viram Rukmī nesse lastimável estado, quase morto devido à vergonha. Quando o onipotente Senhor Balarāma viu Rukmī, Ele compassivamente o soltou e disse o seguinte ao Senhor Kṛṣṇa.

Texto

asādhv idaṁ tvayā kṛṣṇa
kṛtam asmaj-jugupsitam
vapanaṁ śmaśru-keśānāṁ
vairūpyaṁ suhṛdo vadhaḥ

Sinônimos

asādhu — impropriamente; idam — isto; tvayā — por Ti; kṛṣṇa — ó Kṛṣṇa; kṛtam — feito; asmat — para Nós; jugupsitam — terrível; vapa­nam — o corte; śmaśru-keśānām — do bigode e do cabelo; vairūpyam — o desfiguramento; suhṛdaḥ — de um membro da família; vadhaḥ — morte.

Tradução

[O Senhor Balarāma disse:] Meu querido Kṛṣṇa, agiste de ma­neira imprópria! Esta ação trará vergonha para Nós, pois desfi­gurar um parente próximo cortando seu bigode e cabelo equivale a matá-lo.

Comentário

SIGNIFICADO—O onisciente Balarāma sabia que Rukmī era o culpado, mas, para animar a lamuriosa Rukmiṇī, Ele decidiu censurar Śrī Kṛṣṇa mansamente.

Texto

maivāsmān sādhvy asūyethā
bhrātur vairūpya-cintayā
sukha-duḥkha-do na cānyo ’sti
yataḥ sva-kṛta-bhuk pumān

Sinônimos

— por favor, não; eva — de fato; asmān — para conosco; sādhvi — ó santa mulher; asūyethāḥ — sintas hostilidade; bhrātuḥ — de teu irmão; vairūpya — com o desfiguramento; cintayā — por preocupação; sukha — de felicidade; duḥkha — e infelicidade; daḥ — o que dá; na — não; ca — e; anyaḥ — qualquer outro; asti — há; yataḥ — visto que; sva — de sua própria; kṛta — ação; bhuk — que sofre a reação; pumān — um homem.

Tradução

Santa mulher, por favor, não fiques descontente conosco de­vido à ansiedade causada pelo desfiguramento de teu irmão. Ninguém é responsável pela alegria e pesar de uma pessoa senão ela mesma, pois cada um experimenta o resultado de suas pró­prias ações.

Texto

bandhur vadhārha-doṣo ’pi
na bandhor vadham arhati
tyājyaḥ svenaiva doṣeṇa
hataḥ kiṁ hanyate punaḥ

Sinônimos

bandhuḥ — um parente; vadha — ser morto; arha — que merece; do­ṣaḥ — cuja má ação; api — ainda que; na — não; bandhoḥ — de um parente; vadham — sendo morto; arhati — merece; tyājyaḥ — ser abandonado; svena eva — por sua própria; doṣeṇa — falta; hataḥ — morto; kim — por que; hanyate — deve ser morto; punaḥ — de novo.

Tradução

[Dirigindo-Se mais uma vez a Kṛṣṇa, Balarāma disse:] Um parente não deve ser morto mesmo que sua má ação justifique a pena capital. Antes, ele deve ser expulso da família. Visto que já foi morto por seu próprio pecado, por que matá-lo outra vez?

Comentário

SIGNIFICADO—Para animar ainda mais a nobre Rukmiṇī, Balarāma enfatiza outra vez que Kṛṣṇa não deveria ter humilhado Rukmī.

Texto

kṣatriyāṇām ayaṁ dharmaḥ
prajāpati-vinirmitaḥ
bhrātāpi bhrātaraṁ hanyād
yena ghoratamas tataḥ

Sinônimos

kṣatriyāṇām — de guerreiros; ayam — este; dharmaḥ — código de dever sagrado; prajāpati — pelo progenitor original, o senhor Brahmā; vinirmitaḥ — estabelecido; bhrātā — um irmão; api — mesmo; bhrāta­ram — seu irmão; hanyāt — tem de matar; yena — pelo qual (código); ghora-tamaḥ — muito terrível; tataḥ — portanto.

Tradução

[Voltando-Se para Rukmiṇī, Balarāma continuou:] O código de dever sagrado dos guerreiros estabelecido pelo senhor Brahmā prescreve que alguém pode ser obrigado a matar o próprio irmão. Esta é de fato uma lei muito medonha.

Comentário

SIGNIFICADO—O Senhor Balarāma, no interesse da justiça, está apresentando uma análise completa da situação. Embora não se deva matar um parente, há circunstâncias atenuantes segundo os códigos militares. Na Guerra Civil Americana, acontecida em 1860, muitas famílias se dividiram entre o exército do Norte e do Sul, e assim, infelizmente, essa matan­ça fratricida tornou-se um caso comum. Essa matança é, sem dúvida, ghoratama, muito medonha. Mas tal é a natureza do mundo material, onde o dever, a honra e a suposta justiça muitas vezes criam conflitos. Apenas na plataforma espiritual, em consciência de Kṛṣṇa pura, po­demos transcender a dor inaceitável da existência material. Rukmī estava enlouquecido devido ao orgulho e inveja e, em virtude disso, não podia entender nada sobre Kṛṣṇa ou a consciência de Kṛṣṇa.

Texto

rājyasya bhūmer vittasya
striyo mānasya tejasaḥ
mānino ’nyasya vā hetoḥ
śrī-madāndhāḥ kṣipanti hi

Sinônimos

rājyasya — de reino; bhūmeḥ — de terra; vittasya — de riqueza; striyaḥ — de uma mulher; mānasya — de honra; tejasaḥ — de poder; māninaḥ — aqueles que são orgulhosos; anyasya — de alguma outra coisa; — ou; hetoḥ — por causa; śrī — em sua opulência; mada — por sua embriaguez; andhāḥ — cegos; kṣipanti — insultam; hi — de fato.

Tradução

[Balarāma dirigiu-Se mais uma vez a Kṛṣṇa:] Cegos pela vai­dade decorrente de possuir opulências pessoais, homens orgulho­sos ofendem os outros por causa de coisas tais como reino, terra, riqueza, mulheres, honra e poder.

Comentário

SIGNIFICADO—O Senhor Kṛṣṇa estava originalmente destinado a casar-Se com Rukmiṇī. Embora esse fosse o melhor arranjo para todos os interessados desde o início, Rukmī maliciosamente se opôs a esse arranjo magnífico. Quando, afinal, o desejo de sua irmã realizou-se e ela foi levada por Kṛṣṇa, o malévolo Rukmī atacou o Senhor com insultos vulgares e armas mortais. Por Sua vez, Kṛṣṇa amarrou-o e cortou parte de seu cabelo e bigode. Embora decerto humilhante para um príncipe arrogante como Rukmī, seu castigo não passou de um tapa na mão caso consideremos o que ele fizera.

Texto

taveyaṁ viṣamā buddhiḥ
sarva-bhūteṣu durhṛdām
yan manyase sadābhadraṁ
suhṛdāṁ bhadram ajña-vat

Sinônimos

tava — tua; iyam — esta; viṣamā — preconceituosa; buddhiḥ — atitude; sarva-bhūteṣu — para com todos os seres vivos; durhṛdām — daqueles que têm más intenções; yat — que; manyase — desejas; sadā — sempre; abhadram — mal; suhṛdām — a teus benquerentes; bhadram — bem; ajña-vat — como uma pessoa ignorante.

Tradução

[A Rukmiṇī, Balarāma disse:] Tua atitude é injusta, pois, como uma pessoa ignorante, desejas o bem aos que são inimigos de todos os seres vivos e que fizeram mal a teus verdadeiros benque­rentes.

Texto

ātma-moho nṛṇām eva
kalpate deva-māyayā
suhṛd durhṛd udāsīna
iti dehātma-māninām

Sinônimos

ātma — sobre o eu; mohaḥ — a confusão; nṛṇām — dos homens; eva — somente; kalpate — é efetuada; deva — do Senhor Supremo; māyayā — pela energia material ilusória; suhṛt — um amigo; durhṛt — um inimigo; udāsīnaḥ — uma pessoa neutra; iti — pensando assim; deha — o corpo; ātma — como o eu; māninām — para aqueles que consideram.

Tradução

A māyā do Senhor Supremo faz os homens se esquecerem do seu verdadeiro eu, e assim, confundindo o corpo com o eu, eles consideram os outros como amigos, inimigos ou pessoas neutras.

Texto

eka eva paro hy ātmā
sarveṣām api dehinām
nāneva gṛhyate mūḍhair
yathā jyotir yathā nabhaḥ

Sinônimos

ekaḥ — uma; eva — somente; paraḥ — a Suprema; hi — de fato; ātmā — Alma; sarveṣām — entre todos; api — e; dehinām — seres corporifica­dos; nānā — muitos; iva — como se; gṛhyate — é percebida; mūḍhaiḥ — por aqueles que estão confusos; yathā — como; jyotiḥ — um corpo ce­leste; yathā — como; nabhaḥ — o céu.

Tradução

Aqueles que estão confusos percebem a Alma Suprema única, que reside em todos os seres corporificados, como se fosse muitos, assim como se pode perceber a luz no céu, ou o próprio céu, como se fosse muitos.

Comentário

SIGNIFICADO—A última linha deste verso, yathā jyotir yathā nabhaḥ, introduz duas analogias em que percebemos uma coisa como sendo muitas. Jyotiḥ indica a luz de corpos celestes tais como o Sol ou a Lua. Ape­sar de só existir uma Lua, podemos vê-la refletida em tanques, rios, lagos e baldes de água. Então, pareceria haver muitas luas, embora só exista uma. De modo semelhante, percebemos uma presença divina em cada ser vivo, porque o Senhor Supremo está presente em toda parte, embora Ele seja um só. A segunda analogia dada aqui, yathā nabhaḥ, é a do céu. Se temos em uma sala uma fileira de vasos de barro vedados, o céu, ou ar, está em cada vaso, embora o céu mesmo seja um só.

O Śrīmad-Bhāgavatam (1.2.32) apresenta uma analogia semelhante a res­peito do fogo e da lenha:

yathā hy avahito vahnir
dāruṣv ekaḥ sva-yoniṣu
nāneva bhāti viśvātmā
bhūteṣu ca tathā pumān

“O Senhor, como a Superalma, permeia todas as coisas, assim como o fogo permeia a madeira, de modo que Ele parece ser de muitas varie­dades, embora Ele seja o absoluto, único e incomparável.”

Texto

deha ādy-antavān eṣa
dravya-prāṇa-guṇātmakaḥ
ātmany avidyayā kḷptaḥ
saṁsārayati dehinam

Sinônimos

dehaḥ — o corpo material; ādi — começo; anta — e fim; vān — que; eṣaḥ — este; dravya — dos elementos físicos; prāṇa — os sentidos; guṇa — e os modos primários da natureza material (bondade, paixão e ignorância); ātmakaḥ — composto; ātmani — ao eu; avidyayā — pela ignorância material; kḷptaḥ — imposto; saṁsārayati — faz experimen­tar o ciclo de nascimentos e mortes; dehinam — um ser corporificado.

Tradução

Este corpo material, que tem começo e fim, é composto dos elementos físicos, dos sentidos e dos modos da natureza. O corpo, imposto ao eu em virtude da ignorância material, faz com que a pessoa experimente o ciclo de nascimentos e mortes.

Comentário

SIGNIFICADO—O corpo material, constituído de várias qualidades, elementos etc. materiais, atrai e repele a alma condicionada e, dessa forma, enreda-a na existência material. Por causa da atração e repulsão por nosso próprio corpo e por outros corpos, estabelecemos relações temporá­rias, empenhamo-nos em grandes esforços e sacrifícios, fabricamos religiões imaginárias, fazemos nobres discursos e envolvemo-nos por completo na ilusão material. Como disse Shakespeare: “O mundo todo é um palco.” Para além do teatro um tanto absurdo da existência material, encontra-se o real e significativo mundo da consciência de Kṛṣṇa, a vida liberada das almas puras dedicadas ao serviço amoroso do Senhor Supremo.

Texto

nātmano ’nyena saṁyogo
viyogaś casataḥ sati
tad-dhetutvāt tat-prasiddher
dṛg-rūpābhyāṁ yathā raveḥ

Sinônimos

na — não; ātmanaḥ — para o eu; anyena — com alguma outra coisa; saṁyogaḥ — contato; viyogaḥ — separação; ca — e; asataḥ — com aqui­lo que é insubstancial; sati — ó pessoa discriminadora; tat — dele (o eu); hetutvāt — por originar; tat — por ele (o eu); prasiddheḥ — por ser revelado; dṛk — com o sentido da visão; rūpābhyām — e forma visível; yathā — como; raveḥ — para o Sol.

Tradução

Ó dama inteligente, a alma nunca experimenta contato com os objetos materiais insubstanciais nem se separa deles, visto que a alma é a origem deles e quem os ilumina. Assim, a alma se assemelha ao Sol, que não entra em contato nem se separa do sentido da visão e do que é visto.

Comentário

SIGNIFICADO—Como se explicou no verso anterior, a alma condicionada, por igno­rância, julga que ela é o corpo material e, por isso, gira no ciclo de nascimentos e mortes. De fato, matéria e espírito são co-energias da fonte original de tudo, o Senhor Supremo, que é a Verdade Abso­luta.

Como o Senhor Kṛṣṇa explica na Bhagavad-gītā (7.5): jīva-bhūtāṁ mahā-bāho yayedaṁ dhāryate jagat. O mundo material é sustentado pelo desejo dos seres vivos de explorá-lo. O mundo material é como uma prisão. Os criminosos estão determinados a cometer crimes, de modo que o governo acha necessário manter um sistema carcerário. De modo semelhante, o Senhor Supremo mantém os universos materiais porque as almas condicionadas estão determinadas a rebelar-se contra Ele e tentar desfrutar sem Sua amorosa cooperação. Assim, aqui se usa a expressão tad-dhetutvāt para descrever a alma, significando que a alma é a causa da reunião da matéria para formar um corpo material. O termo tat-prasiddheḥ indica que a alma é a causa através da qual o corpo pode ser percebido, e o mesmo termo também indica que esse fato é bem conhecido entre os iluminados.

Além do sentido dado, a palavra ātmanaḥ neste verso pode indicar a Alma Suprema, e, neste caso, o termo tad-dhetutvāt indica que o Senhor Kṛṣṇa expande Sua potência pessoal e, assim, manifesta o uni­verso material. Visto que o Senhor existe eternamente em Seu corpo espiritual puro, Ele jamais Se torna material, como aqui se indica.

Texto

janmādayas tu dehasya
vikriyā nātmanaḥ kvacit
kalānām iva naivendor
mṛtir hy asya kuhūr iva

Sinônimos

janma-ādayaḥ — nascimento e assim por diante; tu — mas; deh­asya — do corpo; vikriyāḥ — transformações; na — não; ātmanaḥ — do eu; kvacit — nunca; kalānām — das fases; iva — como; na — não; eva — de fato; indoḥ — da Lua; mṛtiḥ — a morte; hi — de fato; asya — dela; kuhūḥ — o dia da lua nova; iva — como.

Tradução

Nascimento e outras transformações são experimentados pelo corpo, mas nunca pelo eu; assim como modificações acontecem nas fases da lua, mas nunca na Lua, embora o dia da lua nova possa chamar-se a “morte” da Lua.

Comentário

SIGNIFICADO—Aqui, o Senhor Balarāma explica como as almas condicionadas se identificam com o corpo e como se deve abandonar essa identificação. Com certeza, toda pessoa comum se considera jovem, de meia-idade ou velha, saudável ou enferma. Mas tal identificação é uma ilusão, assim como o crescer e o minguar da Lua é uma ilusão. Quando nos identificamos com o corpo material, perdemos nossa capacidade de compreender a alma.

Texto

yathā śayāna ātmānaṁ
viṣayān phalam eva ca
anubhuṅkte ’py asaty arthe
tathāpnoty abudho bhavam

Sinônimos

yathā — como; śayānaḥ — alguém adormecido; ātmānam — a si mesmo; viṣayān — objetos dos sentidos; phalam — os frutos; eva — de fato; ca — também; anubhuṅkte — experimenta; api — mesmo; asati arthe — naquilo que não é real; tathā — assim; āpnoti — sujeita-se; abudhaḥ — o homem sem inteligência; bhavam — a existência material.

Tradução

Assim como alguém adormecido percebe a si mesmo, aos obje­tos do gozo dos sentidos e aos frutos de seus atos dentro da ilusão de um sonho; da mesma forma, quem não é inteligente tem de sujeitar-se à existência material.

Comentário

SIGNIFICADO—Como se afirma no śruti, asaṅgo hy ayaṁ puruṣaḥ: “O ser vivo não tem relação íntima com o mundo material.” Este ponto é expli­cado no presente verso. Uma afirmação semelhante se encontra no Śrīmad-­Bhāgavatam (11.22.56):

arthe ’hy avidyamāne ’pi
saṁsṛtir na nivartate
dhyāyato viṣayān asya
svapne ’narthāgamo yathā

“Para aquele que está meditando em gozo dos sentidos, a vida ma­terial, embora careça de existência real, não vai embora, assim como as experiências desagradáveis de um sonho não se vão.”

Texto

tasmād ajñāna-jaṁ śokam
ātma-śoṣa-vimohanam
tattva-jñānena nirhṛtya
sva-sthā bhava śuci-smite

Sinônimos

tasmāt — portanto; ajñāna — por causa da ignorância; jam — nasci­da; śokam — a lamentação; ātma — a ti mesma; śoṣa — secando; vimo­hanam — e confundindo; tattva — da verdade; jñānena — com conhecimento; nirhṛtya — dissipando; sva-sthā — restabelecida a Teu estado natural; bhava — sê, por favor; śuci-smite — ó pessoa cujo sorriso é puro.

Tradução

Portanto, com conhecimento transcendental, dissipa o pesar que está confundindo e enfraquecendo tua mente. Por favor, re­toma tua disposição natural, ó princesa de sorriso puro.

Comentário

SIGNIFICADO—O Senhor Balarāma lembra a Śrīmatī Rukmiṇī que ela é a eterna deusa da fortuna a executar passatempos com o Senhor neste mundo e que deve, portanto, abandonar seu aparente pesar.

Texto

śrī-śuka uvāca
evaṁ bhagavatā tanvī
rāmeṇa pratibodhitā
vaimanasyaṁ parityajya
mano buddhyā samādadhe

Sinônimos

śrī-śukaḥ uvāca — Śukadeva Gosvāmī disse; evam — assim; bhaga­vatā — pelo Senhor Supremo; tanvī — a Rukmiṇī de cintura fina; rā­meṇa — por Balarāma; pratibodhitā — iluminada; vaimanasyam — sua depressão; parityajya — abandonando; manaḥ — sua mente; buddhyā — pela inteligência; samādadhe — serena.

Tradução

Śukadeva Gosvāmī disse: Iluminada assim pelo Senhor Balarāma, a esbelta Rukmiṇī esqueceu sua depressão e estabilizou sua mente através da inteligência espiritual.

Texto

prāṇāvaśeṣa utsṛṣṭo
dviḍbhir hata-bala-prabhaḥ
smaran virūpa-karaṇaṁ
vitathātma-manorathaḥ
cakre bhojakaṭaṁ nāma
nivāsāya mahat puram

Sinônimos

prāṇa — com seu ar vital; avaśeṣaḥ — ficando só; utsṛṣṭaḥ — expul­so; dviḍbhiḥ — por seus inimigos; hata — destruída; bala — sua força; prabhaḥ — e refulgência corpórea; smaran — lembrando; virūpa-kara­ṇam — seu desfiguramento; vitatha — frustrados; ātma — seus pessoais; manaḥ-rathaḥ — desejos; cakre — fez; bhoja-kaṭam nāma — chamada Bhojakaṭa; nivāsāya — para sua residência; mahat — grande; puram — uma cidade.

Tradução

Deixado apenas com seu ar vital, rejeitado por seus inimigos e privado de sua força e brilho corpóreo, Rukmī não conseguia esquecer como fora desfigurado. Em total frustração, ele construiu para sua residência uma grande cidade, que chamou de Bhojakaṭa.

Texto

ahatvā durmatiṁ kṛṣṇam
apratyūhya yavīyasīm
kuṇḍinaṁ na pravekṣyāmīty
uktvā tatrāvasad ruṣā

Sinônimos

ahatvā — sem matar; durmatim — mal-intencionado; kṛṣṇam — a Kṛṣṇa; apratyūhya — sem trazer de volta; yavīyasīm — minha irmã mais nova; kuṇḍinam — em Kuṇḍina; na pravekṣyāmi — não entrarei; iti — assim; uktvā — tendo falado; tatra — lá (no mesmo lugar em que fora desfigurado); avasat — estabeleceu residência; ruṣā — em ira.

Tradução

Porque havia prometido: “Não entrarei de novo em Kuṇḍina enquanto não matar o perverso Kṛṣṇa e não trouxer de volta minha irmã mais nova”, em um estado de frustração e ira, Rukmī fixou residência naquele mesmo lugar.

Comentário

SIGNIFICADO—Śrīla Viśvanātha Cakravartī explica que a palavra bhoja quer dizer “experiência” e que kataḥ, segundo o dicionário Nānārtha-varga, significa “voto”. Assim, Bhojakaṭa é o lugar em que Rukmī experi­mentou grandes sofrimentos como resultado de seu voto.

Texto

bhagavān bhīṣmaka-sutām
evaṁ nirjitya bhūmi-pān
puram ānīya vidhi-vad
upayeme kurūdvaha

Sinônimos

bhagavān — o Senhor Supremo; bhīṣmaka-sutām — a filha de Bhīṣma­ka; evam — assim; nirjitya — derrotando; bhūmi-pān — os reis; puram — para Sua capital; ānīya — trazendo; vidhi-vate — de acordo com os pre­ceitos dos Vedas; upayeme — casou; kuru-udvaha — ó protetor dos Kurus.

Tradução

Dessa maneira, derrotando todos os reis adversários, a Supre­ma Personalidade de Deus levou a filha de Bhīṣmaka para Sua capital e casou-Se com ela segundo os preceitos védicos, ó prote­tor dos Kurus.

Texto

tadā mahotsavo nṝṇāṁ
yadu-puryāṁ gṛhe gṛhe
abhūd ananya-bhāvānāṁ
kṛṣṇe yadu-patau nṛpa

Sinônimos

tadā — então; mahā-utsavaḥ — grande júbilo; nṝṇām — pelo povo; yadu-puryām — na capital dos Yadus, Dvārakā; gṛhe gṛhe — em toda e cada casa; abhūt — surgiu; ananya-bhāvānām — que tinha amor exclusivo; kṛṣṇe — por Kṛṣṇa; yadu-patau — o chefe dos Yadus; nṛpa — ó rei (Parīkṣit).

Tradução

Naquela ocasião, ó rei, houve grande júbilo em todos os lares de Yadupurī, cujos cidadãos amavam apenas a Kṛṣṇa, o chefe dos Yadus.

Texto

narā nāryaś ca muditāḥ
pramṛṣṭa-maṇi-kuṇḍalāḥ
pāribarham upājahrur
varayoś citra-vāsasoḥ

Sinônimos

narāḥ — os homens; nāryaḥ — mulheres; ca — e; muditāḥ — alegres; pramṛṣṭa — polidos; maṇi — suas joias; kuṇḍalāḥ — e brincos; pāri­barham — presentes de casamento; upājahruḥ — ofereceram respeitosamente; varayoḥ — ao noivo e à noiva; citra — maravilhosas; vāsa­soḥ — cujas roupas.

Tradução

Todos os homens e mulheres, cheios de júbilo e adornados com joias e brincos esplendorosos, reverentemente ofereceram pre­sentes de casamento ao noivo e à noiva, que estavam vestidos com muito requinte.

Texto

sā vṛṣṇi-pury uttambhitendra-ketubhir
vicitra-mālyāmbara-ratna-toraṇaiḥ
babhau prati-dvāry upakḷpta-maṅgalair
āpūrṇa-kumbhāguru-dhūpa-dīpakaiḥ

Sinônimos

— aquela; vṛṣṇi-purī — cidade dos Vṛṣṇis; uttambhita — erguidas; indra-ketubhiḥ — com colunas festivas; vicitra — variadas; mālya — com guirlandas de flores; ambara — flâmulas de pano; ratna — e joias; toraṇaiḥ — com arcadas; babhau — parecia bela; prati — em cada; dvā­ri — porta; upakḷpta — arrumados; maṅgalaiḥ — com artigos auspicio­sos; āpūrṇa — cheios; kumbha — potes de água; aguru — perfumada com aguru; dhūpa — com incenso; dīpakaiḥ — e lamparinas.

Tradução

A cidade dos Vṛṣṇis parecia belíssima: havia altas colunas festivas e também arcadas decoradas com guirlandas de flores, flâmulas de tecido e joias preciosas. Arranjos auspiciosos de potes cheios d’água, incenso com perfume de aguru e lamparinas enfeitavam cada porta.

Texto

sikta-mārgā mada-cyudbhir
āhūta-preṣṭha-bhūbhujām
gajair dvāḥsu parāmṛṣṭa-
rambhā-pūgopaśobhitā

Sinônimos

sikta — borrifadas; mārgā — suas ruas; mada — uma secreção que escorre das testas dos elefantes agitados; cyudbhiḥ — exsudando; āhūta — convidados; preṣṭha — amados; bhū-bhujām — dos reis; ga­jaiḥ — pelos elefantes; dvāḥsu — nas portas; parāmṛṣṭa — colocadas; rambhā — por pés de banana-da-terra; pūga — e pés de noz de bétel; upaśobhitā — embelezadas.

Tradução

As ruas da cidade foram limpas pelos elefantes embriagados pertencentes aos amados reis que eram convidados do matrimô­nio, e esses elefantes aumentaram ainda mais a beleza da cidade co­locando troncos de bananeira e pés de noz de bétel em todas as portas.

Texto

kuru-sṛñjaya-kaikeya-
vidarbha-yadu-kuntayaḥ
mitho mumudire tasmin
sambhramāt paridhāvatām

Sinônimos

kuru-sṛñjaya-kaikeya-vidarbha-yadu-kuntayaḥ — dos membros dos clãs de Kuru, Sṛñjaya, Kaikeya, Vidarbha, Yadu e Kunti; mithaḥ — uns com os outros; mumudire — sentiam prazer; tasmin — naquela (festividade); sambhramāt — por empolgação; paridhāvatām — entre aqueles que estavam correndo.

Tradução

Os membros das famílias reais dos clãs de Kuru, Sṛñjaya, Kai­keya, Vidarbha, Yadu e Kunti encontravam-se alegremente entre as multidões de pessoas empolgadas que corriam de um lado para outro.

Texto

rukmiṇyā haraṇaṁ śrutvā
gīyamānaṁ tatas tataḥ
rājāno rāja-kanyāś ca
babhūvur bhṛśa-vismitāḥ

Sinônimos

rukmiṇyāḥ — de Rukmiṇī; haraṇam — sobre o rapto; śrutvā — ouvindo; gīyamānam — que estava sendo cantado; tataḥ tataḥ — por toda a parte; rājānaḥ — os reis; rāja-kanyāḥ — as filhas dos reis; ca — e; babhūvuḥ — ficaram; bhṛśa — extremamente; vismitāḥ — surpresos.

Tradução

Os reis e suas filhas ficaram totalmente maravilhados ao ouvirem a história do rapto de Rukmiṇī, a qual estava sendo glorifi­cada em canções por toda parte.

Texto

dvārakāyām abhūd rājan
mahā-modaḥ puraukasām
rukmiṇyā ramayopetaṁ
dṛṣṭvā kṛṣṇaṁ śriyaḥ patim

Sinônimos

dvārakāyām — em Dvārakā; abhūt — houve; rājan — ó rei; mahā­-modaḥ — grande alegria; pura-okasām — para os habitantes da cidade; rukmiṇyā — com Rukmiṇī; ramayā — a deusa da fortuna; upetam — unido; dṛṣṭvā — vendo; kṛṣṇam — o Senhor Kṛṣṇa; śriyaḥ — de toda a opulência; patim — o amo.

Tradução

Os cidadãos de Dvārakā ficaram radiantes de alegria ao verem Kṛṣṇa, o Senhor de toda opulência, unido a Rukmiṇī, a deusa da fortuna.

Comentário

Neste ponto, encerram-se os significados apresentados pelos humildes servos de Sua Divina Graça A.C. Bhaktivedanta Swami Prabhu­pāda referentes ao décimo canto, quinquagésimo quarto capítu­lo, do Śrīmad-Bhāgavatam, intitulado “O Casamento de Kṛṣṇa e Rukmiṇī”.