CAPÍTULO QUINZE
O Extermínio de Dhenuka, o Demônio Asno
Este capítulo descreve como o Senhor Balarāma e o Senhor Kṛṣṇa, enquanto pastoreavam as vacas nas terras de Vṛndāvana, mataram Dhenukāsura, possibilitando que os residentes de Vṛndāvana comessem os frutos das árvores tāla, e como salvaram os vaqueirinhos do veneno de Kāliya.
Revelando Sua fase de passatempos infantis (paugaṇḍa), Rāma e Kṛṣṇa estavam certo dia levando as vacas para pastar quando entraram em uma floresta atrativa, embelezada com um lago de águas cristalinas. Ali na floresta, Eles começaram a brincar com Seus amigos. Fingindo estar cansado, o Senhor Baladeva repousou a cabeça no colo de um vaqueirinho e descansou, enquanto o Senhor Kṛṣṇa ajudava a aliviar a fadiga de Seu irmão mais velho massageando-Lhe os pés. Depois, Kṛṣṇa também colocou a cabeça no colo de um vaqueirinho para descansar, e outro menino massageou Seus pés. Dessa forma, Kṛṣṇa, Balarāma e Seus amigos vaqueirinhos deleitaram-se com vários passatempos.
Durante essa brincadeira, Śrīdāmā, Subala, Stoka-Kṛṣṇa e outros vaqueirinhos descreveram a Rāma e Kṛṣṇa um demônio perverso e indomável chamado Dhenuka, o qual, sob a forma de um asno, vivia na floresta de Tālavana perto da colina Govardhana. Essa floresta era cheia de muitas variedades de frutas doces. Contudo, por medo deste demônio, ninguém ousava tentar saborear aquelas frutas, de modo que alguém teria de matar o demônio e todos os seus companheiros. O Senhor Rāma e o Senhor Kṛṣṇa, logo que ouviram falar da situação, partiram para essa floresta a fim de satisfazer o desejo de Seus companheiros.
Ao chegar a Tālavana, o Senhor Balarāma, sacudindo as palmeiras, derrubou muitas frutas, e logo que fez isso, o demônio asno, Dhenuka, precipitou-se em Sua direção para atacá-lO. Mas Balarāma, com uma mão, agarrou-lhe as patas traseiras, girou-o no ar e arremessou-o ao topo de uma árvore, matando-o desse modo. Enfurecidos, todos os amigos de Dhenukāsura arremeteram contra Rāma e Kṛṣṇa, mas estes os pegaram um a um, giraram-nos no ar e mataram-nos, até que, por fim, o tumulto teve fim. Quando Kṛṣṇa e Balarāma retornaram à comunidade dos vaqueiros, Yaśodā e Rohiṇī puseram-nOs em seus respectivos colos, beijaram Seus rostos, alimentaram-nOs com pratos requintados e, em seguida, puseram-nOs na cama.
Alguns dias depois, o Senhor Kṛṣṇa foi com os amigos, mas sem Seu irmão mais velho, às margens do Kālindī levar as vacas para pastar. As vacas e os vaqueirinhos ficaram muito sedentos e beberam um pouco da água do Kālindī. Mas como a água fora contaminada com veneno, todos eles caíram inconscientes na beira do rio. Kṛṣṇa então, por meio da misericordiosa chuva de Seu olhar, trouxe-os de volta à vida, e eles, recuperando a consciência, apreciaram Sua grande misericórdia.
Texto
tataś ca paugaṇḍa-vayaḥ-śrītau vraje
babhūvatus tau paśu-pāla-sammatau
gāś cārayantau sakhibhiḥ samaṁ padair
vṛndāvanaṁ puṇyam atīva cakratuḥ
Sinônimos
śrī-śukaḥ uvāca — Śrī Śukadeva Gosvāmī disse; tataḥ — então; ca — e; paugaṇḍa vayaḥ — a idade paugaṇḍa (dos seis aos dez anos); śritau — alcançando; vraje — em Vṛndāvana; babhūvatuḥ — Eles (Rāma e Kṛṣṇa) Se tornaram; tau — Eles dois; paśu-pāla — como vaqueiros; sammatau — nomeados; gāḥ — as vacas; cārayantau — encarregados; sakhibhiḥ samam — junto com Seus amigos; padaiḥ — com as marcas de Seus pés; vṛndāvanam — Śrī Vṛndāvana; puṇyam — auspiciosa; atīva — extremamente; cakratuḥ — fizeram.
Tradução
Śukadeva Gosvāmī disse: Quando o Senhor Rāma e o Senhor Kṛṣṇa chegaram à idade paugaṇḍa [seis a dez anos] enquanto moravam em Vṛndāvana, os vaqueiros permitiram que Eles assumissem a tarefa de pastorear as vacas. Ocupados assim na companhia de Seus amigos, os dois meninos tornaram a terra de Vṛndāvana muito auspiciosa em virtude de imprimirem sobre ela as marcas de Seus pés de lótus.
Comentário
SIGNIFICADO—O Senhor Kṛṣṇa queria animar Seus amigos vaqueirinhos, que tinham sido engolidos por Aghāsura e, depois, roubados pelo senhor Brahmā. Por isso, o Senhor decidiu levá-los à floresta de palmeiras chamada Tālavana, onde havia muitas frutas maduras e deliciosas. Visto que o corpo espiritual do Senhor Kṛṣṇa aparentemente crescera um pouco em idade e força, os homens mais velhos de Vṛndāvana, liderados por Nanda Mahārāja, decidiram promover Kṛṣṇa da função de apenas arrebanhar bezerros para a posição de vaqueirinho de tempo integral. Agora, Ele cuidaria das vacas, touros e bois adultos. Devido a sua grande afeição, Nanda Mahārāja antes considerara Kṛṣṇa muito pequeno e imaturo para tomar conta de vacas e touros crescidos. Declara-se na seção Kārttika-māhātmya do Padma Purāṇa:
smṛtā gopāṣṭamī budhaiḥ
tad-dinād vāsudevo ’bhūd
gopaḥ pūrvaṁ tu vatsapaḥ
“O oitavo dia lunar da quinzena da lua cheia do mês de kārttika é conhecido pelas autoridades como Gopāṣṭamī. A partir desse dia, o Senhor Vāsudeva passou a atuar como vaqueiro, ao passo que antes Ele pastoreava os bezerros.”
A palavra padaiḥ indica que o Senhor Kṛṣṇa, com Seus pés de lótus, abençoava a Terra caminhando em sua superfície. O Senhor não usava na floresta nenhum tipo de calçado, senão que andava descalço, criando grande ansiedade para as mocinhas de Vṛndāvana, que temiam que Seus delicados pés de lótus se ferissem.
Texto
gopair gṛṇadbhiḥ sva-yaśo balānvitaḥ
paśūn puraskṛtya paśavyam āviśad
vihartu-kāmaḥ kusumākaraṁ vanam
Sinônimos
tat — assim; mādhavaḥ — o Senhor Śrī Mādhava; veṇum — Sua flauta; udīrayan — soando; vṛtaḥ — rodeado; gopaiḥ — pelos vaqueirinhos; gṛṇadbhiḥ — que cantavam; sva-yaśaḥ — Suas glórias; bala-anvitaḥ — acompanhado pelo Senhor Balarāma; paśūn — os animais; puraskṛtya — mantendo na frente; paśavyam — cheia de alimento para as vacas; āviśat — Ele entrou; vihartu-kāmaḥ — desejando desfrutar passatempos; kusuma-ākaram — rica em flores; vanam — na floresta.
Tradução
Com o desejo de Se deleitar com passatempos, o Senhor Mādhava, soando Sua flauta, rodeado pelos vaqueirinhos que cantavam Suas glórias e pelo Senhor Baladeva, trazendo as vacas a Sua frente, entrou na floresta de Vṛndāvana, que era cheia de flores e rica em alimentos para os animais.
Comentário
SIGNIFICADO—Śrīla Sanātana Gosvāmī explicou os vários sentidos da palavra mādhava da seguinte maneira: Mādhava, normalmente, refere-se a Kṛṣṇa como “o Senhor, aquele que é o consorte da deusa da fortuna, Lakṣmī.” Esse nome também sugere que o Senhor Kṛṣṇa fez Seu advento na dinastia de Madhu. Visto que a estação da primavera também é conhecida como mādhava, entende-se que logo que o Senhor Kṛṣṇa entrava na floresta de Vṛndāvana, esta exibia automaticamente todas as opulências da primavera, enchendo-se de flores, brisas e de uma atmosfera celestial. Outra razão para o Senhor Kṛṣṇa ser conhecido como Mādhava é que Ele desfruta de passatempos em madhu, isto é, passatempos no sabor do amor conjugal.
Enquanto entrava na floresta de Śrī Vṛndāvana, o Senhor Kṛṣṇa soava alto Sua flauta, proporcionando, dessa maneira, inconcebível bem-aventurança a todos os residentes de Sua cidade natal, Vraja-dhāma. Esses passatempos simples de entrar alegremente na floresta, tocar flauta e assim por diante eram executados todo dia na terra espiritual de Vṛndāvana.
Texto
mahan-manaḥ-prakhya-payaḥ-sarasvatā
vātena juṣṭaṁ śata-patra-gandhinā
nirīkṣya rantuṁ bhagavān mano dadhe
Sinônimos
tat — aquela floresta; mañju — encantadores; ghoṣa — cujos sons; ali — de abelhas; mṛga — animais; dvija — e pássaros; ākulam — cheia; mahat — de grandes almas; manaḥ — à mente; prakhya — semelhante; payaḥ — cuja água; sarasvatā — com um lago; vātena — pelo vento; juṣṭam — servida; śata-patra — de flores de lótus de cem pétalas; gandhinā — com a fragrância; nirīkṣya — observando; rantum — para sentir prazer; bhagavān — a Suprema Personalidade de Deus; manaḥ — Sua mente; dadhe — voltou.
Tradução
Após observar aquela floresta, que ressoava com encantadores sons de abelhas, animais e pássaros, e que era embelezada por um lago de águas cristalinas semelhantes à mente das grandes almas e por uma brisa que transportava a fragrância de flores de lótus de cem pétalas, o Senhor Kṛṣṇa, a Suprema Personalidade de Deus, decidiu desfrutar sua auspiciosa atmosfera.
Comentário
SIGNIFICADO—O Senhor Kṛṣṇa viu que a floresta de Vṛndāvana proporcionava prazer a todos os cinco sentidos. As abelhas, pássaros e animais emitiam sons encantadores que traziam doce prazer aos ouvidos. O vento prestava fiel serviço ao Senhor soprando por toda a floresta, transportando a fresca umidade de um lago transparente e dando assim prazer ao sentido do tato. Mediante a doçura do vento, inclusive o sentido do paladar era estimulado, e a fragrância das flores de lótus dava prazer às narinas. E a floresta inteira era dotada de beleza celestial, o que concedia bem-aventurança espiritual aos olhos. Śrīla Viśvanātha Cakravartī Ṭhākura explicou desse modo o significado deste verso.
Texto
phala-prasūnoru-bhareṇa pādayoḥ
spṛśac chikhān vīkṣya vanaspatīn mudā
smayann ivāhāgra-jam ādi-pūruṣaḥ
Sinônimos
saḥ — Ele; tatra tatra — por toda parte; aruṇa — avermelhados; pallava — de seus botões; śrīyā — com a beleza; phala — de seus frutos; prasūna — e flores; uru-bhareṇa — com o pesado fardo; pādayoḥ — a Seus dois pés; spṛśat — tocando; śikhān — as pontas de seus galhos; vīkṣya — vendo; vanaspatīn — as árvores majestosas; mudā — com alegria; smayan — rindo; iva — quase; āha — falou; agra-jam — a Seu irmão mais velho, o Senhor Balarāma; ādi-pūruṣaḥ — o primordial Senhor Supremo.
Tradução
O Senhor primordial viu que as árvores majestosas, com seus belos botões avermelhados e seu pesado fardo de frutos e flores, curvavam-se para tocar Seus pés com as pontas dos galhos. Então, Ele sorriu meigamente e dirigiu-Se a Seu irmão mais velho.
Comentário
SIGNIFICADO—As palavras mudā smayann iva indicam que o Senhor Kṛṣṇa estava em espírito de brincadeira. Ele sabia que as árvores, na verdade, estavam prostrando-se para adorá-lO. Porém, no verso seguinte, o Senhor, falando com um humor amistoso e despreocupado, dá o crédito a Seu irmão, Balarāma.
Texto
aho amī deva-varāmarārcitaṁ
pādāmbujaṁ te sumanaḥ-phalārhaṇam
namanty upādāya śikhābhir ātmanas
tamo-’pahatyai taru-janma yat-kṛtam
Sinônimos
śrī-bhagavān uvāca — o Senhor Śrī Kṛṣṇa disse; aho — oh!; amī — essas; deva-vara — ó mais eminente dos Senhores (Śrī Balarāma); amara — pelos semideuses imortais; arcitam — adorados; pāda-ambujam — aos pés de lótus; te — de Ti; sumanaḥ — de flores; phala — e frutos; arhaṇam — oferendas; namanti — curvam-se; upādāya — apresentando; śikhābhiḥ — com suas cabeças; ātmanaḥ — delas mesmas; tamaḥ — trevas da ignorância; apahatyai — a fim de eliminar; taru-janma — seu nascimento como árvores; yat — por esta ignorância; kṛtam — criado.
Tradução
A Suprema Personalidade de Deus disse: Ó mais eminente dos Senhores, vê só como essas árvores prostram suas cabeças a Teus pés de lótus, que são adoráveis para os semideuses imortais. As árvores estão oferecendo-Te seus frutos e suas flores para erradicar a tenebrosa ignorância que provocou seu nascimento como árvores.
Comentário
SIGNIFICADO—As árvores de Vṛndāvana pensavam que, em virtude de ofensas anteriores, elas agora tinham nascido como árvores e, por serem imóveis, não podiam acompanhar o Senhor Kṛṣṇa em Suas andanças pela área de Vṛndāvana. Na realidade, todas as criaturas de Vṛndāvana, inclusive as árvores e vacas, eram grandes almas que podiam associar-se pessoalmente com a Suprema Personalidade de Deus. Contudo, por causa de sentimentos extáticos de saudade, as árvores consideravam-se em ignorância e, por isso, tentavam purificar-se prostrando-se aos pés de lótus de Kṛṣṇa e Balarāma. O Senhor Kṛṣṇa, ciente da mentalidade delas, olhava-as com afeição e, ao mesmo tempo, louvava seu serviço devocional a Seu irmão mais velho, Balarāma.
Texto
gāyanta ādi-puruṣānupathaṁ bhajante
prāyo amī muni-gaṇā bhavadīya-mukhyā
gūḍhaṁ vane ’pi na jahaty anaghātma-daivam
Sinônimos
ete — essas; alinaḥ — abelhas; tava — Tuas; yaśaḥ — glórias; akhila-loka — para todos os mundos; tīrtham — o lugar de peregrinação; gāyantaḥ — estão cantando; ādi-puruṣa — ó Personalidade de Deus original; anupatham — seguindo-Te pelo caminho; bhajante — estão ocupadas em adorar; prāyaḥ — na maior parte das vezes; amī — essas; muni-gaṇāḥ — grandes sábios; bhavadīya — entre Teus devotos; mukhyāḥ — os mais íntimos; gūḍham — escondida; vane — dentro da floresta; api — mesmo que; na jahati — não abandonam; anagha — ó pessoa imaculada; ātma-daivam — a própria Deidade adorável delas.
Tradução
Ó personalidade original, essas abelhas devem ser todas grandes sábios e elevadíssimos devotos Teus, pois elas Te adoram seguindo-Te pelo caminho e cantando-lhe as glórias, que por si mesmas são um lugar sagrado para o mundo inteiro. Embora estejas disfarçado dentro desta floresta, ó pessoa imaculada, elas se recusam a abandonar a Ti, que és o Senhor adorável delas.
Comentário
SIGNIFICADO—A palavra gūḍham é significativa neste verso. Ela indica que, embora a Suprema Personalidade de Deus sob Sua forma de Kṛṣṇa ou Balarāma pareça um ser humano comum dentro do mundo material, grandes sábios sempre reconhecem o Senhor como a Suprema Verdade Absoluta. Todas as formas transcendentais do Supremo são eternas e plenas de bem-aventurança e conhecimento, exatamente o oposto de nossos corpos materiais, que são temporários e cheios de sofrimento e ignorância.
Um significado da palavra tīrtha é “o meio para transpor a existência material”. Pela simples prática de ouvir as glórias do Senhor Supremo ou de cantá-las, chega-se de imediato à plataforma espiritual, além da existência material. As glórias transcendentais do Senhor são por isso descritas aqui como um tīrtha para o mundo inteiro. A palavra gāyantaḥ indica que grandes sábios abandonam seus votos de silêncio e outros processos egoístas em prol de glorificar as atividades do Senhor Supremo. Verdadeiro silêncio quer dizer não falar disparates, e limitar as próprias atividades verbais àqueles sons, afirmações e discussões pertinentes ao serviço amoroso prestado ao Senhor Supremo.
A palavra anagha expressa que o Senhor Supremo jamais executa atividades pecaminosas ou ofensivas. A palavra também indica que o Senhor logo perdoa um pecado ou ofensa cometido por um devoto amoroso e sincero que porventura se desvie do serviço ao Senhor. No contexto específico deste verso, a palavra anagha denota que o Senhor Balarāma não se perturbava com as abelhas que estavam constantemente a segui-lO (anupatham). O Senhor abençoou-as dizendo: “Ó abelhas, vinde a Meu bosque confidencial e ficai à vontade para saborear sua fragrância.”
Texto
kurvanti gopya iva te priyam īkṣaṇena
sūktaiś ca kokila-gaṇā gṛham āgatāya
dhanyā vanaukasa iyān hi satāṁ nisargaḥ
Sinônimos
nṛtyanti — estão dançando; amī — esses; śikhinaḥ — pavões; īḍya — ó adorável Senhor; mudā — com alegria; hariṇyaḥ — as corças; kurvanti — estão fazendo; gopyaḥ — as gopīs; iva — como se; te — para Ti; priyam — satisfação; īkṣaṇena — com seus olhares; sūktaiḥ — com preces védicas; ca — e; kokila-gaṇāḥ — Os cucos; gṛham — a seu lar; āgatāya — quem chegou; dhanyāḥ — afortunados; vana-okasaḥ — os residentes da floresta; iyān — tal; hi — de fato; satām — de personalidades santas; nisargaḥ — a natureza.
Tradução
Ó adorável Senhor, esses pavões estão dançando de alegria diante de Ti, essas corças estão agradando-Te com olhares afetuosos, assim como o fazem as gopīs, e esses cucos estão honrando-Te com preces védicas. Todos esses residentes da floresta são muito afortunados, e o comportamento deles para conTigo decerto condiz com a atitude de grandes almas ao receberem outra grande alma em seu lar.
Texto
pāda-spṛśo druma-latāḥ karajābhimṛṣṭāḥ
nadyo ’drayaḥ khaga-mṛgāḥ sadayāvalokair
gopyo ’ntareṇa bhujayor api yat-spṛhā śrīḥ
Sinônimos
dhanyā — afortunada; iyam — esta; adya — agora; dharaṇī — a Terra; tṛṇa — suas relvas; vīrudhaḥ — e arbustos; tvat — Teus; pāda — dos pés; spṛśaḥ — recebendo o toque; druma — as árvores; latāḥ — e trepadeiras; kara-ja — por Tuas unhas; abhimṛṣṭāḥ — tocadas; nadyaḥ — os rios; adrayaḥ — e montanhas; khaga — as aves; mṛgāḥ — e animais; sadaya — misericordiosos; avalokaiḥ — por Teus olhares; gopyaḥ — as gopīs; antareṇa — entre; bhujayoḥ — Teus dois braços; api — de fato; yat — pelo qual; spṛhā — mantém o desejo; śrīḥ — a deusa da fortuna.
Tradução
Esta Terra se tornou agora muito afortunada porque tocaste sua relva e arbustos com Teus pés, porque tocaste suas árvores e trepadeiras com Tuas unhas, e porque agraciaste seus rios, montanhas, aves e animais com Teus olhares misericordiosos. Mas, acima de tudo, abraçaste as jovens vaqueirinhas com Teus braços – favor almejado até mesmo pela própria deusa da fortuna.
Comentário
SIGNIFICADO—A palavra adya, “agora”, indica a ocasião do aparecimento do Senhor Balarāma e do Senhor Kṛṣṇa na Terra. Em Sua forma de Varāha, o Senhor Kṛṣṇa em pessoa salvou a Terra, e, de fato, entende-se que a Terra repousa perpetuamente sobre a potência de Śeṣa. Varāha e Śeṣa são ambos expansões de Balarāma, que é Ele próprio uma expansão do Senhor Kṛṣṇa, a original Personalidade de Deus. A afirmação do Senhor Kṛṣṇa de que “agora esta Terra se tornou muito afortunada” (dhanyeyam adya dharaṇī) ressalta que nada pode se igualar às bênçãos da Suprema Personalidade de Deus sob Sua forma pessoal de Kṛṣṇa, que apareceu ao mesmo tempo com Sua expansão plenária, Balarāma. A palavra composta karajābhimṛṣṭāḥ, “tocadas por Tuas unhas”, expressa que, enquanto andavam pela floresta, Kṛṣṇa e Balarāma apanhavam frutas e flores das árvores, arbustos e trepadeiras e usavam essa parafernália em Seus agradáveis passatempos. Às vezes, Eles arrancavam folhas das plantas e usavam-nas com as flores para enfeitarem Seus corpos.
Kṛṣṇa e Balarāma olhavam com amor e misericórdia para todos os rios, colinas e criaturas de Vṛndāvana. Porém, a bênção que as gopīs recebiam – de serem abraçadas diretamente pelos braços do Senhor – era a bênção suprema, desejada até mesmo pela própria deusa da fortuna. A deusa da fortuna, que vive em Vaikuṇṭha no peito do Senhor Nārāyaṇa, certa vez desejou ser abraçada por Śrī Kṛṣṇa e, a fim de conseguir essa bênção, executou severas austeridades. Śrī Kṛṣṇa explicou-lhe que seu verdadeiro lugar era em Vaikuṇṭha e que não era possível que ela morasse junto a Seu peito em Vṛndāvana. Ela, portanto, suplicou a Kṛṣṇa que Lhe permitisse permanecer em Seu peito sob a forma de um fio dourado, e Ele lhe concedeu essa bênção. Śrīla Viśvanātha Cakravartī Ṭhākura reconta esse episódio extraído dos Purāṇas.
Texto
evaṁ vṛndāvanaṁ śrīmat
kṛṣṇaḥ prīta-manāḥ paśūn
reme sañcārayann adreḥ
sarid-rodhaḥsu sānugaḥ
Sinônimos
śrī-śukaḥ uvāca — Śrī Śukadeva Gosvāmī disse; evam — desse modo; vṛndāvanam — com a floresta de Vṛndāvana e seus habitantes; śrīmat — bela; kṛṣṇaḥ — o Senhor Kṛṣṇa; prīta-manāḥ — estando satisfeito em Sua mente; paśūn — os animais; reme — tinha prazer; sañcārayan — fazendo-os pastar; adreḥ — nos arredores da montanha; sarit — do rio; rodhaḥsu — nas margens; sa-anugaḥ — junto com Seus companheiros.
Tradução
Śukadeva Gosvāmī disse: Expressando assim Sua satisfação com a bela floresta de Vṛndāvana e seus habitantes, o Senhor Kṛṣṇa, junto com Seus amigos, gostava de pastorear as vacas e outros animais nas margens do rio Yamunā abaixo da colina Govardhana.
Texto
madāndhāliṣv anuvrataiḥ
upagīyamāna-caritaḥ
pathi saṅkarṣaṇānvitaḥ
kala-vākyaiḥ śukaṁ kvacit
kvacit sa-valgu kūjantam
anukūjati kokilam
anukūjati kūjitam
abhinṛtyati nṛtyantaṁ
barhiṇaṁ hāsayan kvacit
nāmabhir dūra-gān paśūn
kvacid āhvayati prītyā
go-gopāla-manojñayā
Sinônimos
kvacit — às vezes; gāyati — Ele canta; gāyatsu — quando elas estão cantando; mada-andha — cegas pela embriaguez; aliṣu — as abelhas; anuvrataiḥ — junto com Seus companheiros; upagīyamāna — sendo cantados; caritaḥ — Seus passatempos; pathi — sobre o caminho; saṅkarṣaṇa-anvitaḥ — acompanhado pelo Senhor Baladeva; anujalpati — Ele tagarela em imitação; jalpantam — ao tagarelar; kala-vākyaiḥ — com fala entrecortada; śukam — papagaio; kvacit — às vezes; kvacit — às vezes; sa — com; valgu — encantador; kūjantam — cucular; anukūjati — Ele imita o cucular; kokilam — do cuco; kvacit — às vezes; ca — e; kala-haṁsānām — dos cisnes; anukūjati kūjitam — imita o arrulhar; abhinṛtyati — Ele dança diante do; nṛtyantam — dançante; barhiṇam — pavão; hāsayan — fazendo rir; kvacit — algumas vezes; megha — como nuvens; gambhirayā — grave; vācā — com Sua voz; nāmabhiḥ — pelo nome; dūra-gān — que se haviam desgarrado; paśūn — os animais; kvacit — outras vezes; āhvayati — Ele chama; prītyā — afetuosamente; go — as vacas; gopāla — e os vaqueirinhos; manaḥ jñayā — cuja voz encanta a mente.
Tradução
Às vezes, as abelhas em Vṛndāvana ficavam tão enlouquecidas de êxtase que fechavam os olhos e começavam a cantar. O Senhor Kṛṣṇa, passeando pela trilha da floresta com Seus amigos vaqueirinhos e Baladeva, respondia então às abelhas imitando o canto delas, enquanto Seus amigos cantavam sobre Seus passatempos. Às vezes, o Senhor Kṛṣṇa imitava o tagarelar do papagaio; outras vezes, com uma voz doce, imitava o cucular do cuco, e ainda outras vezes, o arrulhar dos cisnes. Algumas vezes, Ele, com muito vigor, imitava a dança do pavão, fazendo Seus amigos rirem. Outras vezes, com a voz tão grave quanto o ribombar de nuvens, Ele afetuosamente chamava pelo nome os animais que se haviam desgarrado do rebanho, encantando desse modo as vacas e os vaqueirinhos.
Comentário
SIGNIFICADO—Śrīla Sanātana Gosvāmī explica que o Senhor Kṛṣṇa brincava com Seus amigos, dizendo: “Vede só, este pavão não sabe dançar muito bem”, ao que Ele, com muito vigor, passava a imitar a dança do pavão, provocando grande riso entre Seus amigos. As abelhas de Vṛndāvana sugavam o pólen das flores da floresta, e a combinação desse néctar com a associação com o Senhor Kṛṣṇa deixava-as enlouquecidas devido à embriaguez. Então, elas fechavam os olhos em êxtase e, zumbindo, expressavam sua satisfação. E esse zumbir também era imitado com perícia pelo Senhor.
Texto
bhāradvājāṁś ca barhiṇaḥ
anurauti sma sattvānāṁ
bhīta-vad vyāghra-siṁhayoḥ
Sinônimos
cakora-krauñca-cakrāhva-bhāradvājān ca — os pássaros cakora, krauñca, cakrāhva e bhāradvāja; barhiṇaḥ — os pavões; anurauti sma — Ele gritava imitando; sattvānām — junto com as outras criaturas; bhīta-vat — agindo como se amedrontado; vyāghra-siṁhayoḥ — dos tigres e leões.
Tradução
Às vezes, Ele gritava imitando aves tais como os cakoras, os krauñcas, os cakrāhvas, os bhāradvājas e os pavões, e às vezes corria com os animais menores fingindo ter medo de leões e tigres.
Comentário
SIGNIFICADO—A palavra bhīta-vat, “como se amedrontado”, indica que o Senhor Kṛṣṇa brincava tal qual um menino qualquer e corria com as criaturas menores da floresta fingindo ter medo dos leões e tigres. De fato, em Vṛndāvana, a morada do Senhor, os leões e tigres não são violentos, de modo que não há motivo para temê-los.
Texto
gopotsaṅgopabarhaṇam
svayaṁ viśramayaty āryaṁ
pāda-saṁvāhanādibhiḥ
Sinônimos
kvacit — às vezes; krīḍā — de brincar; pariśrāntam — fatigado; gopa — de um vaqueirinho; utsaṅga — o colo; upabarhaṇam — usando como travesseiro; svayam — pessoalmente; viśramayati — alivia Seu cansaço; āryam — Seu irmão mais velho; pāda-saṁvāhana-ādibhiḥ — massageando Seus pés e oferecendo outros serviços.
Tradução
Quando Seu irmão mais velho, cansado de tanto brincar, repousava a cabeça no colo de um vaqueirinho, o Senhor Kṛṣṇa ajudava-O a relaxar massageando pessoalmente Seus pés e oferecendo outros serviços.
Comentário
SIGNIFICADO—As palavras pada-saṁvāhanādibhiḥ indicam que o Senhor Kṛṣṇa massageava os pés de Balarāma, abanava-O e trazia água do rio para Ele beber.
Texto
valgato yudhyato mithaḥ
gṛhīta-hastau gopālān
hasantau praśaśaṁsatuḥ
Sinônimos
nṛtyataḥ — que estavam dançando; gāyataḥ — cantando; kva api — às vezes; valgataḥ — movimentando-se; yudhyataḥ — lutando; mithaḥ — uns com os outros; gṛhīta-hastau — de mãos dadas; gopālān — os vaqueirinhos; hasantau — rindo; praśaśaṁsatuḥ — Eles ofereciam louvor.
Tradução
Às vezes, enquanto os vaqueirinhos dançavam, cantavam, movimentavam-se e brincavam de lutar uns com os outros, Kṛṣṇa e Balarāma, postados ali perto e de mãos dadas, glorificavam as atividades de Seus amigos e riam.
Texto
niyuddha-śrama-karśitaḥ
vṛkṣa-mūlāśrayaḥ śete
gopotsaṅgopabarhaṇaḥ
Sinônimos
kvacit — às vezes; pallava — feitos de ramos e botões novos; talpeṣu — em leitos; niyuddha — da luta; śrama — pela fadiga; karśitaḥ — esgotado; vṛkṣa — de uma árvore; mūla — na base; āśrayaḥ — abrigando-Se; śete — Ele Se deitava; gopa-utsaṅga — o colo de um vaqueirinho; upabarhaṇaḥ — fazendo de travesseiro.
Tradução
Às vezes, o Senhor Kṛṣṇa, cansado de lutar, deitava-Se na base de uma árvore, descansando em um leito de ramos e botões suaves e usando como travesseiro o colo de um amigo vaqueirinho.
Comentário
SIGNIFICADO—A palavra pallava-talpeṣu sugere que o Senhor Kṛṣṇa expandia-Se em muitas formas e deitava-Se em muitos leitos de ramos, folhas e flores construídos às pressas por Seus entusiasmados amigos vaqueirinhos.
Texto
kecit tasya mahātmanaḥ
apare hata-pāpmāno
vyajanaiḥ samavījayan
Sinônimos
pāda-saṁvāhanam — a massagem dos pés; cakruḥ — faziam; kecit — alguns deles; tasya — dEle; mahā-ātmanaḥ — grandes almas; apare — outros; hata-pāpmānaḥ — que estavam livres de todos os pecados; vyajanaiḥ — com leques; samavījayan — abanavam-nO com perfeição.
Tradução
Alguns dos vaqueirinhos, que eram todos grandes almas, então massageavam-Lhe os pés de lótus, e outros, qualificados por estarem livres de todo pecado, abanavam o Senhor Supremo com grande perícia.
Comentário
SIGNIFICADO—A palavra samavījayan indica que os vaqueirinhos abanavam o Senhor com muito cuidado e perícia, criando brisas suaves e refrescantes.
Texto
manojñāni mahātmanaḥ
gāyanti sma mahā-rāja
sneha-klinna-dhiyaḥ śanaiḥ
Sinônimos
anye — outros; tat-anurūpāṇi — adequadas para a ocasião; manaḥ-jñāni — atrativas para a mente; mahā-ātmanaḥ — da grande personalidade (o Senhor Kṛṣṇa); gāyanti sma — cantavam; mahā-rāja — ó rei Parīkṣit; sneha — por amor; klinna — derretidos; dhiyaḥ — seus corações; śanaiḥ — devagar.
Tradução
Meu querido rei, outros meninos cantavam encantadoras canções apropriadas para a ocasião, e seus corações derretiam de amor pelo Senhor.
Texto
gopātmajatvaṁ caritair viḍambayan
reme ramā-lālita-pāda-pallavo
grāmyaiḥ samaṁ grāmya-vad īśa-ceṣṭitaḥ
Sinônimos
evam — dessa maneira; nigūḍha — escondida; ātma-gatiḥ — Sua opulência pessoal; sva-māyayā — por Sua própria potência mística; gopa-ātmajatvam — a posição de filho de vaqueiro; caritaiḥ — por Suas atividades; viḍambayan — fingindo; reme — Ele desfrutava; ramā — pela deusa da fortuna; lālita — servidos; pāda-pallavaḥ — Seus pés, que são macios como botões novos; grāmyaiḥ samam — junto com moradores da vila; grāmya-vat — como uma personalidade da vila; īśa-ceṣṭitaḥ — embora também exibisse proezas próprias apenas do Senhor Supremo.
Tradução
Dessa maneira, o Senhor Supremo, cujos suaves pés de lótus são servidos pela deusa da fortuna em pessoa, ocultava Suas opulências transcendentais por meio de Sua potência interna e agia tal qual o filho de um vaqueiro. Todavia, mesmo enquanto Se divertia como um menino de vila na companhia de outros meninos de vila, Ele muitas vezes exibia proezas que só Deus poderia realizar.
Texto
rāma-keśavayoḥ sakhā
subala-stokakṛṣṇādyā
gopāḥ premṇedam abruvan
Sinônimos
śrīdāmā nāma — chamado Śrīdāmā; gopālaḥ — o vaqueirinho; rāma-keśavayoḥ — do Senhor Rāma e do Senhor Kṛṣṇa; sakhā — o amigo; subala-stokakṛṣṇa-ādyāḥ — Subala, Stokakṛṣṇa e outros; gopāḥ — vaqueirinhos; premṇā — com amor; idam — isto; abruvan — falaram.
Tradução
Certa vez, alguns dos vaqueirinhos – Śrīdāmā, o amigo muito íntimo de Rāma e Kṛṣṇa, junto com Subala, Stokakṛṣṇa e outros – falaram com muito amor as seguintes palavras.
Comentário
SIGNIFICADO—A palavra premṇā, “com amor”, indica que o pedido que os vaqueirinhos estão para apresentar ao Senhor Kṛṣṇa e ao Senhor Balarāma é motivado por amor, e não por desejo pessoal. Os vaqueirinhos estavam ávidos por verem Kṛṣṇa e Balarāma exibirem Seus passatempos de matar demônios e saborearem as deliciosas frutas da floresta Tāla, daí terem feito o seguinte pedido.
Texto
kṛṣṇa duṣṭa-nibarhaṇa
ito ’vidūre su-mahad
vanaṁ tālāli-saṅkulam
Sinônimos
rāma rāma — ó Rāma; mahā-bāho — ó pessoa de braços poderosos; kṛṣṇa — ó Kṛṣṇa; duṣṭa-nibarhaṇa — ó exterminador dos canalhas; itaḥ — daqui; avidūre — não muito longe; su-mahat — muito extensa; vanam — uma floresta; tāla-āli — de fileiras de palmeiras; saṅkulam — cheia.
Tradução
[Os vaqueirinhos disseram:] Ó Rāma, Rāma de braços poderosos! Ó Kṛṣṇa, destruidor dos canalhas! Não longe daqui, há uma enorme floresta cheia de bosques de palmeiras.
Comentário
SIGNIFICADO—Como se afirma no Śrī Varāha Purāṇa:
kṣetraṁ parama-durlabham
mathurā-paścime bhāge
adūrād yojana-dvayam
“Não longe do lado ocidental de Mathurā, à distância de dois yojanas [vinte e seis quilômetros], fica o lugar santo chamado Govardhana, que é muito difícil de alcançar.” Também se diz no Varāha Purāṇa:
dhenakāsura-rakṣitam
mathurā-paścime bhāge
adūrād eka-yojanam
“Não longe do lado ocidental de Mathurā, a um yojana [treze quilômetros], fica a floresta conhecida como Tālavana, que era guardada por Dhenukāsura.” Parece, portanto, que a floresta de Tālavana está localizada no meio do caminho entre Mathurā e a colina Govardhana. O Śrī Hari-vaṁśa descreve assim a floresta de Tālavana:
su-mahān kṛṣṇa-mṛttikaḥ
darbha-prāyaḥ sthulī-bhūto
loṣṭra-pāṣāṇa-varjitaḥ
“A terra ali é plana, lisa e muito extensa. O solo é preto, densamente coberto de grama darbha, sem pedras nem seixos.”
Texto
patanti patitāni ca
santi kintv avaruddhāni
dhenukena durātmanā
Sinônimos
phalāni — as frutas; tatra — lá; bhūrīṇi — muitíssimas; patanti — caem; patitāni — já caíram; ca — e; santi — são; kintu — porém; avaruddhāni — mantidas sob controle; dhenukena — por Dhenuka; durātmanā — o perverso.
Tradução
Naquela floresta de Tālavana, muitas frutas caem das árvores, e muitas já estão no chão. Mas todas elas são guardadas pelo perverso Dhenuka.
Comentário
SIGNIFICADO—O demônio Dhenuka não permitia que ninguém comesse as deliciosas frutas maduras das palmeiras de Tālavana, e os jovens amigos de Kṛṣṇa protestaram contra essa injusta usurpação do direito de saborear as frutas de uma floresta pública.
Texto
he kṛṣṇa khara-rūpa-dhṛk
ātma-tulya-balair anyair
jñātibhir bahubhir vṛtaḥ
Sinônimos
saḥ — ele; ati-vīryaḥ — muito poderoso; asuraḥ — um demônio; rāma — ó Rāma; he kṛṣṇa — ó Kṛṣṇa; khara-rūpa — a forma de um asno; dhṛk — assumindo; ātma-tulya — igual à dele mesmo; balaiḥ — cuja força; anyaiḥ — com outros; jñātibhiḥ — companheiros; bahubhiḥ — muitos; vṛtaḥ — rodeado.
Tradução
Ó Rāma, ó Kṛṣṇa! Dhenuka é um demônio poderosíssimo e que assumiu a forma de um asno. Está rodeado de muitos amigos que assumiram uma forma semelhante à sua e que são tão poderosos quanto ele.
Texto
bhītair nṛbhir amitra-han
na sevyate paśu-gaṇaiḥ
pakṣi-saṅghair vivarjitam
Sinônimos
tasmāt — dele; kṛta-nara-āhārāt — que comeu seres humanos; bhītaiḥ — que têm medo; nṛbhiḥ — pelos seres humanos; amitra-han — ó matador dos inimigos; na sevyate — não é frequentada; paśu-gaṇaiḥ — pelos vários animais; pakṣi-saṅghaiḥ — pelos bandos de aves; vivarjitam — abandonada.
Tradução
O demônio Dhenuka come seres humanos vivos, motivo pelo qual todos os homens e animais temem imensamente ir à floresta de Tāla. Ó matador do inimigo, até mesmo as aves temem voar naquela região.
Comentário
SIGNIFICADO—Os vaqueirinhos amigos do Senhor Kṛṣṇa e do Senhor Balarāma incentivaram os dois irmãos a irem de imediato à floresta de Tāla e matar o demônio asno. De fato, nesta passagem, eles chamam os irmãos de amitra-han, “matadores dos inimigos”. Os vaqueirinhos estavam sempre absortos em meditação extática sobre a potência da Suprema Personalidade de Deus e, por esse motivo, raciocinaram assim: “Kṛṣṇa já matou demônios terríveis como Baka e Agha, então o que há de tão especial com esse detestável asno chamado Dhenuka, que se tornou o inimigo público número um em Vṛndāvana?”
Os vaqueirinhos queriam que Kṛṣṇa e Balarāma matassem os demônios para que todos os piedosos habitantes de Vṛndāvana pudessem saborear as frutas da floresta Tāla. Então, eles pediram o favor especial de que os demônios asnos fossem mortos.
Texto
phalāni surabhīṇi ca
eṣa vai surabhir gandho
viṣūcīno ’vagṛhyate
Sinônimos
vidyante — estão presentes; abhukta-pūrvāṇi — nunca antes saboreadas; phalāni — frutas; surabhīṇi — fragrantes; ca — e; eṣaḥ — este; vai — de fato; surabhiḥ — fragrante; gandhaḥ — aroma; viṣūcīnaḥ — que se espalha por toda a parte; avagṛhyate — é percebido.
Tradução
Na floresta de Tāla, existem frutas de aroma muito doce que ninguém jamais saboreou. De fato, mesmo agora podemos sentir a fragrância das frutas tāla espalhada por toda parte.
Comentário
SIGNIFICADO—Segundo Śrīla Śrīdhara Svāmī, a doce fragrância das frutas tāla era levada por um vento leste, que carrega a chuva para a área de Vṛndāvana. Esse vento leste sopra geralmente no mês de bhādra e, assim, indica o excelente amadurecimento das frutas, enquanto o fato de os meninos poderem sentir seu cheiro indica a proximidade da floresta Tāla.
Texto
gandha-lobhita-cetasām
vāñchāsti mahatī rāma
gamyatāṁ yadi rocate
Sinônimos
prayaccha — por favor, dá; tāni — as; naḥ — a nós; kṛṣṇa — ó Kṛṣṇa; gandha — pela fragrância; lobhita — tornadas ávidas; cetasām — cujas mentes; vāñchā — o desejo; asti — é; mahatī — grande; rāma — ó Rāma; gamyatām — vamos; yadi — se; rocate — parece uma boa ideia.
Tradução
Ó Kṛṣṇa! Por favor, consegue aquelas frutas para nós. Nossas mentes se sentem muito atraídas por seu aroma! Querido Balarāma, nosso desejo de comer aquelas frutas é imenso. Se considerais uma boa ideia, vamos à floresta Tāla.
Comentário
SIGNIFICADO—Embora nenhum homem, ave ou fera sequer pudesse aproximar-se da floresta Tāla, os vaqueirinhos depositavam tanta fé no Senhor Kṛṣṇa e no Senhor Balarāma que tinham certeza de que os dois Senhores poderiam, sem esforço algum, matar os pecadores demônios asnos e conseguir as deliciosas frutas tāla. Os vaqueirinhos amigos do Senhor Kṛṣṇa são sublimes almas autorrealizadas que, em circunstâncias normais, não ambicionariam comer fruta alguma. Na verdade, com esses gracejos, eles apenas entusiasmam o Senhor a realizar Seus passatempos, instigando-O a executar na floresta Tāla feitos heroicos sem precedentes. Inúmeros demônios perturbavam a sublime atmosfera de Vṛndāvana durante a presença de Kṛṣṇa ali, mas o Senhor matava tais demônios como um evento popular diário.
Visto que já matara muitos demônios, o Senhor Kṛṣṇa, naquele dia em particular, decidiu dar as primeiras honras ao Senhor Balarāma, que exterminaria o primeiro demônio, Dhenuka. Por meio das palavras yadi rocate, os vaqueirinhos expressam que o Senhor Kṛṣṇa e o Senhor Balarāma não precisavam matar o demônio apenas para satisfazê-los, senão que Eles deveriam fazer isso apenas se os próprios Senhores gostassem da ideia.
Texto
suhṛt-priya-cikīrṣayā
prahasya jagmatur gopair
vṛtau tālavanaṁ prabhū
Sinônimos
evam — assim; suhṛt — de Seus amigos; vacaḥ — as palavras; śrutvā — ouvindo; suhṛt — a Seus amigos; priya — prazer; cikīrṣayā — desejando dar; prahasya — rindo; jagmatuḥ — os dois foram; gopaiḥ — pelos vaqueirinhos; vṛtau — rodeados; tāla-vanam — à floresta de Tāla; prabhū — os dois Senhores.
Tradução
Ouvindo as palavras de Seus queridos companheiros, Kṛṣṇa e Balarāma riram e, desejosos de agradar-lhes, partiram para Tālavana rodeados de Seus amigos vaqueirinhos.
Comentário
SIGNIFICADO—O Senhor Kṛṣṇa pensou: “Como um mero asno pode ser tão formidável?” E por isso sorriu ao ouvir o pedido de Seus amigos. Como disse o Senhor Kapila no Śrīmad-Bhāgavatam (3.28.32), hāsaṁ harer avanatākhila-loka-tīvra-śokāśru-sāgara-viśoṣaṇam aty-udāram: “O sorriso e o riso do Supremo Senhor Hari são muito magnânimos. De fato, para todos aqueles que se prostram ante o Senhor Supremo, Seu sorriso e riso secam o oceano de lágrimas provocadas pelo intenso sofrimento deste mundo.” Então, para animar Seus amiguinhos, o Senhor Kṛṣṇa e o Senhor Balarāma sorriram, riram e de imediato partiram com eles para a floresta Tāla.
Texto
tālān samparikampayan
phalāni pātayām āsa
mataṅ-gaja ivaujasā
Sinônimos
balaḥ — Balarāma; praviśya — entrando; bāhubhyām — com Seus dois braços; tālān — as palmeiras; samparikampayan — fazendo tremer por toda parte; phalāni — as frutas; pātayām āsa — fez cair; matam-gajaḥ — um elefante louco; iva — assim como; ojasā — por Sua força.
Tradução
O Senhor Balarāma entrou primeiro na floresta Tāla. Então, com Seus braços, começou a sacudir vigorosamente as árvores com a força de um elefante louco, fazendo as frutas tāla caírem no chão.
Texto
niśamyāsura-rāsabhaḥ
abhyadhāvat kṣiti-talaṁ
sa-nagaṁ parikampayan
Sinônimos
phalānām — das frutas; patatām — que estão caindo; śabdam — o som; niśamya — ouvindo; asura-rāsabhaḥ — o demônio sob a forma de um asno; abhyadhāvat — veio correndo; kṣiti-talam — a superfície da terra; sa-nagam — junto com as árvores; parikampayan — fazendo tremer.
Tradução
Ao ouvir o som das frutas que caíam, Dhenuka, o demônio asno, precipitou-se ao ataque, fazendo a terra e as árvores tremerem.
Texto
dvābhyāṁ padbhyāṁ balaṁ balī
nihatyorasi kā-śabdaṁ
muñcan paryasarat khalaḥ
Sinônimos
sametya — encontrando-O; tarasā — velozmente; pratyak — traseiras; dvābhyām — com as duas; padbhyām — patas; balam — o Senhor Baladeva; balī — o poderoso demônio; nihatya — golpeando; urasi — o peito; kā-śabdam — um horrendo som de zurro; muñcan — lançando; paryasarat — correu de um lado para o outro; khalaḥ — o asno.
Tradução
O poderoso demônio se lançou em direção ao Senhor Baladeva e, com os cascos de suas patas traseiras, golpeou prontamente o peito do Senhor. Então, em meio a zurros ensurdecedores, Dhenuka passou a correr de um lado para o outro.
Texto
upakroṣṭā parāk sthitaḥ
caraṇāv aparau rājan
balāya prākṣipad ruṣā
Sinônimos
punaḥ — de novo; āsādya — aproximando-se dEle; saṁrabdhaḥ — furioso; upakroṣṭā — o asno; parāk — com a parte posterior virada para o Senhor; sthitaḥ — ficando de pé; caraṇau — duas patas; aparau — traseiras; rājan — ó rei Parīkṣit; balāya — contra o Senhor Balarāma; prākṣipat — lançou; ruṣā — com ira.
Tradução
Novamente disparando em direção ao Senhor Balarāma, ó rei, o furioso asno aproximou-se outra vez do Senhor. Então, zurrando de ira, o demônio O atacou com um coice.
Comentário
SIGNIFICADO—A palavra upakroṣṭā indica um asno e também alguém que esteja gritando por perto. Dessa forma, aqui se indica que o poderoso Dhenuka emitia sons horríveis e cheios de ira.
Texto
bhrāmayitvaika-pāṇinā
cikṣepa tṛṇa-rājāgre
bhrāmaṇa-tyakta-jīvitam
Sinônimos
saḥ — Ele; tam — a ele; gṛhītvā — agarrando; prapadoḥ — pelos cascos; bhrāmayitvā — girando no ar; eka-pāṇinā — com uma só mão; cikṣepa — arremessou; tṛṇa-rāja-agre — no topo de uma palmeira; bhrāmaṇa — pelo girar; tyakta — abandonando; jīvitam — a vida.
Tradução
O Senhor Balarāma agarrou Dhenuka pelos cascos, girou-o no ar com uma só mão e arremessou-o no topo de uma palmeira. Esse violento movimento giratório matou o demônio.
Texto
vepamāno bṛhac-chirāḥ
pārśva-sthaṁ kampayan bhagnaḥ
sa cānyaṁ so ’pi cāparam
Sinônimos
tena — por aquele (corpo morto de Dhenukāsura); āhataḥ — atingida; mahā-tālaḥ — a grande palmeira; vepamānaḥ — tremendo; bṛhatśirāḥ — que tinha um grande topo; pārśva-stham — outra situada ao lado dela; kampayan — fazendo sacudir; bhagnaḥ — quebrada; saḥ — aquela; ca — e; anyam — outra; saḥ — aquela; api — ainda; ca — e; aparam — uma outra.
Tradução
O Senhor Balarāma lançou o cadáver de Dhenukāsura sobre a palmeira mais alta da floresta, e quando o demônio morto caiu no topo da árvore, esta começou a sacudir. A grande palmeira, fazendo com que outra árvore a seu lado também sacudisse, partiu-se em virtude do peso do demônio. A árvore vizinha fez sacudir outra árvore, e esta, por sua vez, atingiu mais outra, que também começou a sacudir. Desse modo, muitas árvores na floresta sacudiram e se partiram.
Comentário
SIGNIFICADO—O Senhor Balarāma arremessou o demônio Dhenuka com tanta violência sobre a grande palmeira que desencadeou uma reação em cadeia, e muitas altas palmeiras sacudiram e, depois, partiram-se, fazendo um enorme estardalhaço.
Texto
khara-deha-hatāhatāḥ
tālāś cakampire sarve
mahā-vāteritā iva
Sinônimos
balasya — do Senhor Balarāma; līlayā — como o passatempo; utsṛṣṭa — lançado para cima; khara-deha — em virtude do corpo do asno; hata-āhatāḥ — que se chocavam umas contra as outras; tālāḥ — as palmeiras; cakampire — balançaram; sarve — todas; mahā-vāta — por um poderoso vento; īritāḥ — sopradas; iva — como se.
Tradução
Em virtude do passatempo do Senhor Balarāma de lançar o corpo do demônio asno ao topo da mais alta palmeira do local, todas as árvores começaram a balançar e chocar-se umas contra as outras como se agitadas por ventos poderosos.
Texto
hy anante jagad-īśvare
ota-protam idaṁ yasmiṁs
tantuṣv aṅga yathā paṭaḥ
Sinônimos
na — não; etat — isto; citram — surpreendente; bhagavati — para a Personalidade de Deus; hi — de fato; anante — que é o ilimitado; jagat-īśvare — o Senhor do universo; ota-protam — estendido horizontal e verticalmente; idam — este universo; yasmin — sobre o qual; tantuṣu — sobre seus fios; aṅga — meu querido Parīkṣit; yathā — assim como; paṭaḥ — um tecido.
Tradução
Meu querido Parīkṣit, o fato de o Senhor Balarāma ter matado Dhenukāsura não é algo tão admirável, considerando que Ele é a ilimitada Personalidade de Deus, o controlador do universo inteiro. De fato, o cosmo inteiro repousa nEle, assim como um tecido repousa sobre seus fios horizontais e verticais.
Comentário
SIGNIFICADO—Pessoas desafortunadas não podem apreciar os bem-aventurados passatempos do Senhor Supremo. A esse respeito, Śrīla Jīva Gosvāmī explica que o Senhor Supremo possui potência e força ilimitadas, como aqui o exprime a palavra anante. O Senhor exibe uma fração minúscula de Seu poder conforme a necessidade de uma situação em particular. O Senhor Balarāma desejava derrotar a corja de asnos demoníacos que haviam tomado a floresta Tālavana ilegalmente, motivo pelo qual exibiu apenas a opulência divina suficiente para matar sem dificuldade Dhenukāsura e os outros demônios.
Texto
jñātayo dhenukasya ye
kroṣṭāro ’bhyadravan sarve
saṁrabdhā hata-bāndhavāḥ
Sinônimos
tataḥ — então; kṛṣṇam — ao Senhor Kṛṣṇa; ca — e; rāmam — ao Senhor Rāma; ca — e; jñātayaḥ — os companheiros íntimos; dhenukasya — de Dhenuka; ye — que; kroṣṭāraḥ — os asnos; abhyadravan — atacaram; sarve — todos; saṁrabdhāḥ — enfurecidos; hata-bāndhavāḥ — tendo sido morto o amigo deles.
Tradução
Os outros demônios asnos, amigos íntimos de Dhenukāsura, ficaram enfurecidos ao ver sua morte, e então precipitaram-se todos de imediato em direção a Kṛṣṇa e Balarāma para atacá-lOs.
Comentário
SIGNIFICADO—Śrīla Sanātana Gosvāmī faz o seguinte comentário sobre este verso: “Neste verso, afirma-se que os demônios asnos atacaram primeiro Kṛṣṇa e depois Balarāma (kṛṣṇaṁ ca rāmaṁ ca). Uma razão para isso é que os demônios, tendo visto a intrepidez do Senhor Balarāma, julgaram prudente atacar Kṛṣṇa primeiro. Ou pode ser que, por causa da afeição para com Seu irmão mais velho, o Senhor Kṛṣṇa tenha-Se colocado entre Balarāma e os demônios asnos. Também se pode entender que as palavras kṛṣṇaṁ ca rāmaṁ ca indicam que o Senhor Balarāma, devido à afeição por Seu irmão mais novo, veio ficar ao lado do Senhor Kṛṣṇa.”
Texto
rāmaś ca nṛpa līlayā
gṛhīta-paścāc-caraṇān
prāhiṇot tṛṇa-rājasu
Sinônimos
tān tān — a todos eles, um por um; āpatataḥ — atacando; kṛṣṇaḥ — o Senhor Kṛṣṇa; rāmaḥ — o Senhor Balarāma; ca — e; nṛpa — ó rei; līlayā — facilmente; gṛhīta — agarrando; paścāt-caraṇān — as patas traseiras deles; prāhiṇot — lançaram; tṛṇa-rājasu — sobre as palmeiras.
Tradução
Ó rei, quando os demônios atacaram, Kṛṣṇa e Balarāma facilmente agarraram-nos um após o outro por suas patas traseiras e lançaram-nos todos nos topos das palmeiras.
Texto
daitya-dehair gatāsubhiḥ
rarāja bhūḥ sa-tālāgrair
ghanair iva nabhas-talam
Sinônimos
phala-prakara — com pilhas de frutas; saṅkīrṇam — coberta; daitya-dehaiḥ — com os corpos dos demônios; gata-asubhiḥ — que estavam sem vida; rarāja — brilhava; bhūḥ — a terra; sa-tāla-agraiḥ — com os topos das palmeiras; ghanaiḥ — com nuvens; iva — como; nabhaḥ-tālam — o céu.
Tradução
Coberta com pilhas de frutas e com os cadáveres dos demônios, que estavam enroscados nos topos partidos das palmeiras, a terra parecia muito bela. De fato, a terra brilhava como o céu adornado de nuvens.
Comentário
SIGNIFICADO—Segundo Śrīla Viśvanātha Cakravartī Ṭhākura, os corpos dos demônios eram escuros, como escuras nuvens azuladas, e a grande quantidade de sangue que escorrera de seus corpos pareciam brilhantes nuvens vermelhas. Desse modo, toda a cena era muito bela. A Suprema Personalidade de Deus em Suas várias formas, tais como Rāma e Kṛṣṇa, é sempre transcendental, e quando Ele encena Seus passatempos transcendentais, o resultado é sempre belo e transcendental, mesmo quando o Senhor pratica atos violentos como a matança dos teimosos demônios asnos.
Texto
niśamya vibudhādayaḥ
mumucuḥ puṣpa-varṣāṇi
cakrur vādyāni tuṣṭuvuḥ
Sinônimos
tayoḥ — dos dois irmãos; tat — este; su-mahat — muito grande; karma — ato; niśamya — ouvindo; vibudha-ādayaḥ — os semideuses e outros seres vivos elevados; mumucuḥ — soltaram; puṣpa-varṣāṇi — chuvas de flores; cakruḥ — executaram; vādyāni — música; tuṣṭuvuḥ — ofereceram orações.
Tradução
Ao ouvirem sobre o magnífico feito dos dois irmãos, os semideuses e outros elevados seres vivos lançaram chuvas de flores e, em glorificação, ofereceram música e orações.
Comentário
SIGNIFICADO—Śrīla Sanātana Gosvāmī comenta que os semideuses, grandes sábios e outros seres excelsos estavam todos atônitos e extáticos ao verem a maneira incomum, rápida e despreocupada como Kṛṣṇa e Balarāma mataram os poderosíssimos demônios asnos da floresta de Tāla.
Texto
manuṣyā gata-sādhvasāḥ
tṛṇaṁ ca paśavaś cerur
hata-dhenuka-kānane
Sinônimos
atha — então; tāla — das palmeiras; phalāni — as frutas; ādan — comiam; manuṣyāḥ — os seres humanos; gata-sādhvasāḥ — tendo perdido o medo; tṛṇam — na relva; ca — e; paśavaḥ — os animais; ceruḥ — pastavam; hata — morto; dhenuka — do demônio Dhenuka; kānane — na floresta.
Tradução
As pessoas agora se sentiam livres para voltar à floresta onde Dhenuka fora morto e, sem medo, comiam as frutas das palmeiras. Da mesma forma, as vacas agora à vontade, podiam pastar livremente por sobre aquela relva.
Comentário
SIGNIFICADO—Segundo os ācāryas, homens de classe baixa, como os pulindas, comeram as frutas das palmeiras, mas os vaqueirinhos amigos de Kṛṣṇa consideravam-nas indesejáveis, pois foram contaminadas com o sangue dos asnos.
Texto
puṇya-śravaṇa-kīrtanaḥ
stūyamāno ’nugair gopaiḥ
sāgrajo vrajam āvrajat
Sinônimos
kṛṣṇaḥ — o Senhor Śrī Kṛṣṇa; kamala-patra-akṣaḥ — cujos olhos são como pétalas de lótus; puṇya-śravaṇa-kīrtanaḥ — ouvir e cantar sobre qual é a atividade mais piedosa; stūyamānaḥ — sendo glorificado; anugaiḥ — por Seus seguidores; gopaiḥ — os vaqueirinhos; sa-agra-jaḥ — com Seu irmão mais velho, Balarāma; vrajam — a Vraja; āvrajat — retornou.
Tradução
Então, o Senhor Śrī Kṛṣṇa de olhos de lótus, cujas glórias são muito piedosas de ouvir e cantar, voltou para casa em Vraja com Seu irmão mais velho, Balarāma. Ao longo do caminho, os vaqueirinhos, Seus fiéis seguidores, cantavam Suas glórias.
Comentário
SIGNIFICADO—Quando se vibram as glórias de Śrī Kṛṣṇa, tanto os oradores quanto os ouvintes se purificam e se tornam piedosos.
Texto
vanya-prasūna-rucirekṣaṇa-cāru-hāsam
veṇum kvaṇantam anugair upagīta-kīrtiṁ
gopyo didṛkṣita-dṛśo ’bhyagaman sametāḥ
Sinônimos
tam — a Ele; go-rajaḥ — com a poeira levantada pelas vacas; churita — coberto; kuntala — dentro dos cachos de cabelo; baddha — colocada; barha — uma pena de pavão; vanya-prasūna — com flores silvestres; rucira-īkṣaṇa — olhos encantadores; cāru-hāsam — e um belo sorriso; veṇum — Sua flauta; kvaṇantam — soando; anugaiḥ — por Seus companheiros; upagīta — sendo cantadas; kīrtim — Suas glórias; gopyaḥ — as gopīs; didṛkṣita — ansiosos por ver; dṛśaḥ — os olhos delas; abhyagaman — adiantaram-se; sametāḥ — em um só grupo.
Tradução
O cabelo do Senhor Kṛṣṇa, coberto com a poeira levantada pelas vacas, estava decorado com uma pena de pavão e flores silvestres. O Senhor tinha um olhar encantador e um belo sorriso, tocando Sua flauta enquanto Seus companheiros cantavam Suas glórias. Com olhos muito ansiosos por vê-lO, as gopīs, todas juntas, adiantaram-se para encontrá-lO.
Comentário
SIGNIFICADO—Superficialmente, as gopīs eram mocinhas casadas, de modo que seria natural que elas ficassem envergonhadas e temerosas de lançar olhares amorosos a um belo jovem como Śrī Kṛṣṇa. Mas Śrī Kṛṣṇa é a Suprema Personalidade de Deus, e todos os seres vivos são Seus servos eternos. Portanto, as gopīs, embora fossem as mais puras de todas as grandes almas, não hesitaram em se adiantar e satisfazer seus olhos acometidos pelo amor com a visão do belo e jovem Kṛṣṇa. As gopīs também desfrutaram do doce som de Sua flauta e da encantadora fragrância de Seu corpo.
Texto
tāpaṁ jahur viraha-jaṁ vraja-yoṣito ’hni
tat sat-kṛtiṁ samadhigamya viveśa goṣṭhaṁ
savrīḍa-hāsa-vinayaṁ yad apāṅga-mokṣam
Sinônimos
pītvā — bebendo; mukunda-mukha — do rosto do Senhor Mukunda; sāragham — o mel; akṣi-bhṛṅgaiḥ — com seus olhos semelhantes a abelhas; tāpam — tristeza; jahuḥ — abandonavam; viraha-jam — baseada na separação; vraja-yoṣitaḥ — as senhoras de Vṛndāvana; ahni — durante o dia; tat — este; sat-kṛtim — oferecimento de respeito; samadhigamya — aceitando plenamente; viveśa — Ele entrava; goṣṭham — a vila dos vaqueiros; sa-vrīḍa — com vergonha; hāsa — riso; vinayam — e humildade; yat — que; apāṅga — dos olhares de soslaio delas; mokṣam — a emissão.
Tradução
Com seus olhos semelhantes a abelhas, as mulheres de Vṛndāvana bebiam o mel do belo rosto do Senhor Mukunda e, assim, abandonavam a tristeza que sentiam durante o dia por estarem com saudade dEle. As jovens de Vṛndāvana lançavam olhares de soslaio ao Senhor – olhares cheios de timidez, riso e submissão –, e Śrī Kṛṣṇa, aceitando completamente esses olhares como um adequado oferecimento de respeito, entrava na vila dos vaqueiros.
Comentário
SIGNIFICADO—Em Kṛṣṇa, a Suprema Personalidade de Deus, Śrīla Prabhupāda descreve este incidente da seguinte forma: “Em Vṛndāvana, todas as gopīs permaneciam muito taciturnas por causa da ausência de Kṛṣṇa. Durante todo o dia, elas pensavam em Kṛṣṇa na floresta ou nEle tomando conta das vacas no pasto. Quando viam que Kṛṣṇa estava de volta, todas as suas ansiedades de imediato eram mitigadas, e elas ficavam olhando para o rosto dEle da mesma forma que os zangões pairam sobre a flor de lótus em busca de mel. Quando Kṛṣṇa entrava na vila, as gopīs jovens davam um largo sorriso. Enquanto tocava a flauta, Kṛṣṇa apreciava os belos rostos sorridentes das gopīs.”
O Senhor Supremo, Śrī Kṛṣṇa, é o mestre supremo da arte romântica, motivo pelo qual Ele, com muita perícia, intercambiava sentimentos amorosos com as jovens vaqueirinhas de Vṛndāvana. Ao ficar apaixonada, uma jovem casta olha para seu amado com timidez, júbilo e submissão. Quando o amado, recebendo seu olhar, aceita sua oferenda de amor e fica então satisfeito com ela, o coração amoroso da jovem se enche de felicidade. Eram exatamente assim os intercâmbios românticos que ocorriam entre o belo jovem Kṛṣṇa e as amorosas vaqueirinhas de Vṛndāvana.
Texto
putrayoḥ putra-vatsale
yathā-kāmaṁ yathā-kālaṁ
vyadhattāṁ paramāśiṣaḥ
Sinônimos
tayoḥ — aos dois; yaśodā-rohiṇyau — Yaśodā e Rohiṇī (as mães de Kṛṣṇa e Balarāma, respectivamente); putrayoḥ — a seus filhos; putravatsale — que tinham muita afeição pelos filhos; yathā-kāmam — de acordo com os desejos dEles; yathā-kālam — de acordo com o tempo e as circunstâncias; vyadhattām — apresentavam; parama-āśiṣaḥ — oferendas primorosas e agradáveis.
Tradução
Mãe Yaśodā e mãe Rohiṇī, agindo com muita afeição para com seus dois filhos, ofereciam-Lhes tudo o que havia de melhor em resposta a todos os Seus desejos e nas várias ocasiões apropriadas.
Comentário
SIGNIFICADO—A palavra paramāśiṣaḥ indica as bênçãos agradáveis de uma mãe amorosa, que incluem comida saborosa, belas roupas, joias, brinquedos e afeição constante. As palavras yathā-kāmaṁ yathā-kālam indicam que, embora Yaśodā e Rohiṇī satisfizessem todos os desejos de seus filhos, Kṛṣṇa e Balarāma, elas também regulavam, segundo a conveniência, as atividades dos meninos. Em outras palavras, elas preparavam pratos saborosos para seus filhos, mas garantiam que os meninos comeriam na hora certa. De igual modo, seus filhos brincavam na hora certa e dormiam na hora certa. A expressão yathā-kāmam não indica que as mães deixavam os meninos fazer tudo o que quisessem sem discriminação, senão que elas derramavam suas bênçãos sobre seus filhos de modo conveniente e civilizado.
Śrīla Sanātana Gosvāmī comenta que as mães amavam tanto seus filhos que, ao abraçarem-nOs, elas examinavam atentamente todas as partes de Seus corpos para ver se Eles estavam fortes e saudáveis.
Texto
majjanonmardanādibhiḥ
nīvīṁ vasitvā rucirāṁ
divya-srag-gandha-maṇḍitau
Sinônimos
gata — ida; adhvāna-śramau — cuja exaustão de estar na estrada; tatra — lá (em Seu lar); majjana — pelo banho; unmardana — massagem; ādibhiḥ — etc.; nīvīm — em roupas de baixo; vasitvā — sendo vestidos; rucirām — encantadoras; divya — transcendentais; srak — com guirlandas; gandha — e fragrâncias; maṇḍitau — decorados.
Tradução
Após serem banhados e massageados, os dois jovens Senhores aliviavam-Se da exaustão provocada por andar nas estradas do campo. Então, trajavam vestes atrativas e eram enfeitados com guirlandas e fragrâncias transcendentais.
Texto
svādy annam upalālitau
saṁviśya vara-śayyāyāṁ
sukhaṁ suṣupatur vraje
Sinônimos
jananī — por Suas mães; upahṛtam — oferecida; prāśya — comendo bastante; svādu — deliciosa; annam — comida; upalālitau — sendo mimados; saṁviśya — entrando; vara — excelente; śayyāyām — para a cama; sukham — felizes; suṣupatuḥ — os dois dormiam; vraje — em Vraja.
Tradução
Após comerem o suntuoso jantar que Suas mães Lhes davam e serem mimados de várias maneiras, os dois irmãos deitavam-Se em Suas ótimas camas e adormeciam felizes na vila de Vraja.
Texto
vṛndāvana-caraḥ kvacit
yayau rāmam ṛte rājan
kālindīṁ sakhibhir vṛtaḥ
Sinônimos
evam — assim; saḥ — Ele; bhagavān — a Suprema Personalidade de Deus; kṛṣṇaḥ — Kṛṣṇa; vṛndāvana-caraḥ — vagueando e agindo em Vṛndāvana; kvacit — certa vez; yayau — foi; rāmam ṛte — sem o Senhor Balarāma; rājan — ó rei Parīkṣit; kālindīm — ao rio Yamunā; sakhibhiḥ — de Seus amigos; vṛtaḥ — rodeado.
Tradução
Ó rei, o Supremo Senhor Kṛṣṇa vagueava assim pela área de Vṛndāvana, representando Seus passatempos. Certa vez, rodeado de Seus amigos, Ele foi sem Balarāma ao rio Yamunā.
Texto
nidāghātapa-pīḍitāḥ
duṣṭaṁ jalaṁ papus tasyās
tṛṣṇārtā viṣa-dūṣitam
Sinônimos
atha — então; gāvaḥ — as vacas; ca — e; gopāḥ — os vaqueirinhos; ca — e; nidāgha — do verão; ātapa — pelo sol ofuscante; pīḍitāḥ — afligidos; duṣṭam — contaminada; jalam — a água; papuḥ — beberam; tasyāḥ — do rio; tṛṣa-ārtāḥ — atormentados pela sede; viṣa — pelo veneno; dūṣitam — estragada.
Tradução
Naquela ocasião, as vacas e vaqueirinhos estavam sentindo intensa aflição decorrente do sol ofuscante do verão. Afligidos pela sede, eles beberam a água do rio Yamunā. Contudo, ela fora contaminada por um veneno.
Texto
daivopahata-cetasaḥ
nipetur vyasavaḥ sarve
salilānte kurūdvaha
kṛṣṇo yogeśvareśvaraḥ
īkṣayāmṛta-varṣiṇyā
sva-nāthān samajīvayat
Sinônimos
viṣa-ambhaḥ — a água envenenada; tat — aquela; upaspṛśya — simplesmente tocando; daiva — em virtude da potência mística da Personalidade de Deus; upahata — perdida; cetasaḥ — sua consciência; nipetuḥ — caíram; vyasavaḥ — sem vida; sarve — todos eles; salila-ante — à beira da água; kuru-udvaha — ó herói da dinastia Kuru; vīkṣya — vendo; tān — a eles; vai — de fato; tathā-bhūtān — em tal estado; kṛṣṇaḥ — o Senhor Kṛṣṇa; yoga-īśvara-īśvaraḥ — o mestre de todos os mestres de yoga; īkṣayā — por Seu olhar; amṛta-varṣiṇyā — que é uma chuva de néctar; sva-nāthān — aqueles que aceitaram somente Kṛṣṇa como seu amo; samajīvayat — trouxe de volta à vida.
Tradução
Logo que tocaram a água envenenada, todas as vacas e meninos, em virtude do divino poder do Senhor, perderam a consciência e caíram sem vida à beira da água. Ó herói dos Kurus, ao vê-los em tal estado, o Senhor Kṛṣṇa, o mestre de todos os mestres da potência mística, sentiu compaixão destes devotos, que não tinham outro Senhor senão Ele. Em razão disso, Ele de imediato os trouxe de volta à vida lançando sobre eles o néctar de Seu olhar.
Texto
samutthāya jalāntikāt
āsan su-vismitāḥ sarve
vīkṣamāṇāḥ parasparam
Sinônimos
te — eles; sampratīta — recuperando perfeitamente; smṛtayaḥ — sua memória; samutthāya — levantando-se; jala-antikāt — da água; āsan — ficaram; su-vismitāḥ — muito espantados; sarve — todos; vīkṣamāṇāḥ — olhando; parasparam — uns para os outros.
Tradução
Após recuperarem sua plena consciência, as vacas e os meninos levantaram-se da água e começaram a se entreolhar com grande espanto.
Texto
govindānugrahekṣitam
pītvā viṣaṁ paretasya
punar utthānam ātmanaḥ
Sinônimos
anvamanisata — eles depois pensaram; tat — isto; rājan — ó rei Parīkṣit; govinda — do Senhor Govinda; anugraha-īkṣitam — devido ao olhar misericordioso; pītvā — tendo bebido; viṣam — o veneno; paretasya — daqueles que perderam suas vidas; punaḥ — novamente; utthānam — levantando-se; ātmanaḥ — por si mesmos.
Tradução
Ó rei, os vaqueirinhos então entenderam que, embora tivessem bebido veneno e de fato morrido, eles, devido ao simples olhar misericordioso de Govinda, haviam recuperado suas vidas e, por sua própria força, tinham-se levantado.
Comentário
Neste ponto, encerram-se os significados apresentados pelos humildes servos de Sua Divina Graça A.C. Bhaktivedanta Swami Prabhupāda referentes ao décimo canto, décimo quinto capítulo, do Śrīmad-Bhāgavatam, intitulado “O Extermínio de Dhenuka, o Demônio Asno”.