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CAPÍTULO SETENTA

As Atividades Diárias do Senhor Kṛṣṇa

Este capítulo descreve as atividades diárias do Senhor Śrī Kṛṣṇa e duas propostas que Lhe foram apresentadas – uma por um mensa­geiro de Dvārakā, e outra pelo sábio Nārada.

Nas primeiras horas da manhã, o Senhor Kṛṣṇa levantava-Se e banhava-Se com água limpa. Depois de realizar os rituais da madrugada e outros deveres religiosos, Ele oferecia oblações no fogo do sacrifício, cantava o mantra Gāyatrī, adorava e pagava tributo aos semideuses, sábios e antepassados, e oferecia respeitos aos brāhmaṇas eruditos. Então, tocava em substâncias auspiciosas, adornava-Se com ornamentos celestiais e satisfazia Seus súditos presenteando-os com qualquer coisa que desejassem.

Dāruka, o quadrigário do Senhor, trazia Sua quadriga, e o Senhor montava nela e dirigia-Se para o salão de assembleias reais. Quando Se acomodava em Seu assento na assembleia, rodeado pelos Yādavas, Ele parecia a Lua rodeada pelo círculo de estrelas chamadas nakṣatras. Trovado­res recitavam Suas glórias ao acompanhamento de tambores, címba­los, vīṇās e outros instrumentos.

Em certa ocasião, os porteiros escoltaram um mensageiro até o salão de assembleias. O mensageiro ofereceu prostradas reverências ao Senhor e, em seguida, dirigiu-se a Ele de mãos postas: “Ó Senhor, Jarā­sandha capturou vinte mil reis e os mantém prisioneiros. Por favor, fazei alguma coisa, pois todos esses reis são Vossos devotos ren­didos.”

Bem naquele momento, Nārada Muni apareceu. O Senhor Śrī Kṛṣṇa e todos os membros da assembleia levantaram-se e ofereceram reverências a Nārada inclinando suas cabeças. O sábio aceitou um assen­to, após o que o Senhor Kṛṣṇa gentilmente perguntou-lhe: “Visto que viajas por todo o universo, por favor, informa-Nos o que os irmãos Pāṇḍavas planejam fazer.” Então, Nārada louvou o Senhor Supremo e respondeu: “O rei Yudhiṣṭhira deseja executar o sacrifício Rājasūya. Para isso, ele solicita a Tua sanção e a Tua presença. Muitos semideuses e reis ilustres comparecerão simplesmente para Te ver.”

Compreendendo que os Yādavas desejavam que Ele derrotasse Jarāsandha, o Senhor Kṛṣṇa pediu a Seu sábio ministro Uddhava que determinasse qual dos dois assuntos em consideração – a derrota de Jarāsandha ou o sacrifício Rājasūya – deveria ser atendido primeiro.

Texto

śrī-śuka uvāca
athoṣasy upavṛttāyāṁ
kukkuṭān kūjato ’śapan
gṛhīta-kaṇṭhyaḥ patibhir
mādhavyo virahāturāḥ

Sinônimos

śrī-śukaḥ uvāca — Śukadeva Gosvāmī disse; atha — então; uṣasi — a aurora; upavṛttāyām — enquanto se aproximava; kukkuṭān — os galos; kūjataḥ — que estavam cantando; aśapan — amaldiçoavam; gṛhīta — sendo mantidos; kaṇṭhyaḥ — cujos pescoços; patibhiḥ — pelos esposos delas (o Senhor Kṛṣṇa em Suas múltiplas manifestações); mādhavyaḥ — as esposas do Senhor Kṛṣṇa; viraha — pela separação; āturāḥ — ­agitadas.

Tradução

Śukadeva Gosvāmī disse: Ao aproximar-se a aurora, as espo­sas do Senhor Mādhava, cada qual abraçada ao redor do pescoço por seu marido, amaldiçoavam os galos que cantavam. As damas ficavam perturbadas porque agora teriam de se separar dEle.

Comentário

SIGNIFICADO—Esta descrição das atividades diárias do Senhor Kṛṣṇa principia com o cantar do galo. As esposas do Senhor Kṛṣṇa sabiam que Ele, por uma questão de dever, não deixaria de levantar-Se e executaria Seus rituais matutinos prescritos. Dessa maneira, agitadas com o fato de que logo iriam ter de se separar dEle, elas amaldiçoavam os galos.

Texto

vayāṁsy aroruvan kṛṣṇaṁ
bodhayantīva vandinaḥ
gāyatsv aliṣv anidrāṇi
mandāra-vana-vāyubhiḥ

Sinônimos

vayāṁsi — aves; aroruvan — cantavam alto; kṛṣṇam — o Senhor Kṛṣṇa; bodhayanti — despertando; iva — como se; vandinaḥ — trovadores; gāyatsu — enquanto cantavam; aliṣu — abelhas; anidrāṇi — des­pertadas do sono; mandāra — das árvores pārijātas; vana — do jardim; vāyubhiḥ — pela brisa.

Tradução

O zumbido das abelhas, provocado pela fragrante brisa vinda do jardim de pārijātas, acordava as aves. E quando estas começavam a cantar alto, despertavam o Senhor Kṛṣṇa assim como poetas cortesãos a recitar Suas glórias.

Texto

muhūrtaṁ taṁ tu vaidarbhī
nāmṛṣyad ati-śobhanam
parirambhaṇa-viśleṣāt
priya-bāhv-antaraṁ gatā

Sinônimos

muhūrtam — horário do dia; tam — aquele; tu — mas; vaidarbhī — a rainha Rukmiṇī; na amṛṣyat — não gostava; ati — muito; śobhanam — auspicioso; parirambhaṇa — de Seu abraço; viśleṣāt — por causa da perda; priya — de seu amado; bāhu — os braços; antaram — entre; ga­tā — situada.

Tradução

Recostada nos braços de seu amado, a rainha Vaidarbhī não gostava deste auspiciosíssimo horário, pois ele lhe indicava a perda do abraço de seu Senhor.

Comentário

SIGNIFICADO—Śrīla Śrīdhara Svāmī explica que a reação da rainha Vaidarbhī, Rukmiṇī-devī, mostra a atitude de todas as rainhas.

Texto

brāhme muhūrta utthāya
vāry upaspṛśya mādhavaḥ
dadhyau prasanna-karaṇa
ātmānaṁ tamasaḥ param
ekaṁ svayaṁ-jyotir ananyam avyayaṁ
sva-saṁsthayā nitya-nirasta-kalmaṣam
brahmākhyam asyodbhava-nāśa-hetubhiḥ
sva-śaktibhir lakṣita-bhāva-nirvṛtim

Sinônimos

brāhme muhūrte — durante o período mais conveniente do dia para a atividade espiritual: antes do nascer do Sol; utthāya — levantando-Se; vāri — a água; upaspṛśya — tocando; mādhavaḥ — o Senhor Kṛṣṇa; dadhyau — meditava; prasanna — clara; karaṇaḥ — Sua mente; ātmānam — sobre Si mesmo; tamasaḥ — ignorância; param — além de; ekam — exclusivo; svayam-jyotiḥ — autoluminoso; ananyam — sem outro; avyayam — infalível; sva-saṁsthayā — por Sua própria natureza; nitya — perpetuamente; nirasta — dissipando; kalmaṣam — contaminação; brahma-ākhyam — conhecido como Brahman, a Verdade Absoluta; asya — deste (universo); udbhava — da criação; nāśa — e destruição; hetubhiḥ — pelas causas; sva — Suas próprias; śaktibhiḥ — energias; lakṣita — manifesta; bhāva — existência; nirvṛtim — alegria.

Tradução

O Senhor Mādhava levantava-Se durante o período brāhma-­muhūrta e tocava um pouco de água. Então, com a mente límpida, meditava em Si mesmo, a única, autoluminosa, incomparável e infalível Verdade Suprema, conhecida como Brahman, que, por Sua pró­pria natureza, sempre dissipa toda a contaminação e que, através de Suas energias pessoais, que provocam a criação e destruição deste universo, manifesta Sua própria existência pura e bem­-aventurada.

Comentário

SIGNIFICADO—Viśvanātha Cakravartī Ṭhākura salienta que a palavra bhāva neste verso indica os seres criados. Por conseguinte, a palavra composta lakṣita-bhāva-nirvṛtim significa que o Senhor Kṛṣṇa concede prazer aos seres criados através de Suas várias energias. É claro que a alma jamais é criada, mas nossa existência material condicionada é criada pela interação das energias do Senhor.

Quem é favorecido pela potência interna do Senhor pode compreender a natureza da Verdade Absoluta; esta compreensão chama­-se consciência de Kṛṣṇa. Na Bhagavad-gītā, o Senhor Kṛṣṇa explica que Suas energias dividem-se em potências inferior e superior, ou material e espiritual. A Brahma-saṁhitā explica ainda que a potência material age como uma sombra, seguindo os movimentos da realidade espiritual, que é o próprio Senhor e Sua potência espiritual. Quando alguém é favorecido pelo Senhor Kṛṣṇa, Ele Se revela à alma rendi­da, e assim a mesma criação que antes encobria a alma torna-se um estímulo para a iluminação espiritual.

Texto

athāpluto ’mbhasy amale yathā-vidhi
kriyā-kalāpaṁ paridhāya vāsasī
cakāra sandhyopagamādi sattamo
hutānalo brahma jajāpa vāg-yataḥ

Sinônimos

atha — então; āplutaḥ — tendo-Se banhado; ambhasi — na água; amale — pura; yathā-vidhi — segundo as regras védicas; kriyā — de rituais; kalāpam — toda a sequência; paridhāya — após vestir-Se; vāsasī — com roupas inferiores e superiores; cakāra — executava; sandhyā-upaga­ma — a adoração na madrugada; ādi — etc.; sat-tamaḥ — a mais santa das personalidades; huta — tendo oferecido; analaḥ — ao fogo sagra­do; brahma — o mantra dos Vedas (isto é, o Gāyatrī); jajāpa — recita­va em voz baixa; vāk — a fala; yataḥ — controlando.

Tradução

Aquela santíssima personalidade, então, banhava-Se em água santificada, vestia-Se com trajes inferiores e superiores e exe­cutava toda a sequência de rituais prescritos, a começar com a adoração na madrugada. Depois de oferecer oblações ao fogo sa­grado, o Senhor Kṛṣṇa recitava em voz baixa o mantra Gāyatrī.

Comentário

SIGNIFICADO—Śrīdhara Svāmī assinala que, como pertencia à sucessão discipular de Kaṇva Muni, o Senhor Kṛṣṇa oferecia oblações ao fogo antes do nascer do Sol. Então, cantava o mantra Gāyatrī.

Texto

upasthāyārkam udyantaṁ
tarpayitvātmanaḥ kalāḥ
devān ṛṣīn pitṝn vṛddhān
viprān abhyarcya cātmavān
dhenūnāṁ rukma-śṛṅgīnāṁ
sādhvīnāṁ mauktika-srajām
payasvinīnāṁ gṛṣṭīnāṁ
sa-vatsānāṁ su-vāsasām
dadau rūpya-khurāgrāṇāṁ
kṣaumājina-tilaiḥ saha
alaṅkṛtebhyo viprebhyo
badvaṁ badvaṁ dine dine

Sinônimos

upasthāya — adorando; arkam — o Sol; udyantam — nascente; tarpayitvā — apaziguando; ātmanaḥ — Suas próprias; kalāḥ — expansões; devān — os semideuses; ṛṣīn — sábios; pitṝn — e antepassados; vṛddhān — Seus superiores; viprān — e brāhmaṇas; abhyarcya — ado­rando; ca — e; ātma-vān — autocontrolado; dhenūnām — de vacas; rukma — (cobertos de) ouro; śṛṅgīnām — cujos chifres; sādhvīnām — de boa índole; mauktika — de pérolas; srajām — com colares; payasvinīnām — que davam leite; gṛṣṭīnām — tendo parido apenas uma vez; sa-vatsānām — com seus bezerros; su-vāsasām — com belas roupas; dadau — Ele dava; rūpya — (cobertos de) prata; khura — de seus cascos; agrāṇām — as frentes; kṣauma — linho; ajina — peles de veados; ti­laiḥ — e sementes de gergelim; saha — com; alaṅkṛtebhyaḥ — que haviam recebido ornamentos; viprebhyaḥ — aos brāhmaṇas eruditos; badvam badvam — (cento e sete) rebanhos de 13.084 (totalizando assim 1.400.000); dine dine — todos os dias.

Tradução

Todos os dias, o Senhor adorava o sol nascente e satisfazia os semideuses, sábios e antepassados, que são todos expansões dEle. O Senhor autocontrolado, em seguida, adorava com toda a aten­ção Seus superiores e os brāhmaṇas. Àqueles brāhmaṇas bem vestidos, Ele oferecia rebanhos de mansas vacas com chifres fo­lheados a ouro e ornadas com colares de pérolas. Essas vacas também estavam enfeitadas com tecidos finos, e a parte dianteira de seus cascos era revestida de prata. Fornecedoras de abundan­te quantidade de leite, cada uma delas só parira uma vez e estava acompanhada de seu bezerro. Diariamente, o Senhor dava aos brāhmaṇas eruditos muitos rebanhos de 13.084 vacas, junto com linho, peles de veado e sementes de gergelim.

Comentário

SIGNIFICADO—Śrīdhara Svāmī cita várias escrituras védicas para mostrar que, no contexto ritual védico, um badva aqui se refere a 13.084 vacas. As palavras badvaṁ badvaṁ dine dine indicam que o Senhor Kṛṣṇa dava diariamente aos eruditos brāhmaṇas muitos de tais rebanhos de vacas. Śrīdhara Svāmī apresenta ainda evidência de que, em eras anteriores, era prática usual dos grandes reis santos dar 107 de tais badvas, ou rebanhos de 13.084 vacas. Dessa maneira, o número de vacas dadas neste sacrifício, conhecido como Mañcāra, totaliza 14 lakhs, ou 1.400.000.

As palavras alaṅkṛtebhyo viprebhyaḥ indicam que, no reino do Senhor Kṛṣṇa, os brāhmaṇas ganhavam belas roupas e ornamentos e, em razão disso, andavam bem vestidos.

Em Kṛṣṇa, a Suprema Personalidade de Deus, Śrīla Prabhupāda escreve, com profunda e notável agudeza de percepção, sobre esses passatempos do Senhor Kṛṣṇa. Recomendamos fortemente ao leitor o estudo desse livro, que contém uma valiosa riqueza de informa­ções e comentários sobre os passatempos descritos no décimo canto do Śrīmad-Bhāgavatam. Esta nossa humilde tentativa jamais pode­rá igualar-se à pureza e proficiência consumadas de nosso formidá­vel mestre. Mesmo assim, como um serviço oferecido a seus pés de lótus, estamos simplesmente apresentando o texto sânscrito original do décimo canto, o significado das palavras, uma tradução clara e o comentário essencial, na maior parte com base no que disseram os grandes mestres espirituais de nossa linha.

Texto

go-vipra-devatā-vṛddha-
gurūn bhūtāni sarvaśaḥ
namaskṛtyātma-sambhūtīr
maṅgalāni samaspṛśat

Sinônimos

go — às vacas; viprabrāhmaṇas; devatā — semideuses; vṛddha — mais velhos; gurūn — e mestres espirituais; bhūtāni — aos seres vivos; sarvaśaḥ — todos; namaskṛtya — oferecendo reverências; ātma — a Suas próprias; sambhūtīḥ — manifestações expandidas; maṅgalāni — coisas auspiciosas (tais como uma vaca castanha); samaspṛśat — tocava.

Tradução

O Senhor Kṛṣṇa oferecia reverências às vacas, brāhmaṇas e semideuses, a Seus superiores e mestres espirituais, e a todos os seres vivos – todos os quais são expansões de Sua suprema personalidade. Depois, Ele tocava coisas auspiciosas.

Texto

ātmānaṁ bhūṣayām āsa
nara-loka-vibhūṣaṇam
vāsobhir bhūṣaṇaiḥ svīyair
divya-srag-anulepanaiḥ

Sinônimos

ātmānam — a Si próprio; bhūṣayām āsa — decorava; nara-loka­ — da sociedade; vibhūṣaṇam — o próprio ornamento; vāsobhiḥ — com roupas; bhūṣaṇaiḥ — e joias; svīyaiḥ — que Lhe pertenciam; divya — divinas; srak — com guirlandas de flores; anulepanaiḥ — e unguentos.

Tradução

Ele adornava Seu corpo, o próprio ornamento da sociedade humana, com Suas roupas e joias especiais e com divinas guirlandas de flores e unguentos.

Comentário

SIGNIFICADO—Śrīdhara Svāmī indica que “as roupas e ornamentos pessoais” do Senhor incluem Suas bem conhecidas roupas amarelas, a joia Kaustubha etc.

Texto

avekṣyājyaṁ tathādarśaṁ
go-vṛṣa-dvija-devatāḥ
kāmāṁś ca sarva-varṇānāṁ
paurāntaḥ-pura-cāriṇām
pradāpya prakṛtīḥ kāmaiḥ
pratoṣya pratyanandata

Sinônimos

avekṣya — olhando; ājyam — para a manteiga purificada; tathā — e também; ādarśam — para um espelho; go — vacas; vṛṣa — touros; dvijabrāhmaṇas; devatāḥ — e semideuses; kāmān — objetos desejados; ca — e; sarva — todos; varṇānām — aos membros das classes sociais; paura — na cidade; antaḥ-pura — e no palácio; cāriṇām — que viviam; pradāpya — providenciando para dar; prakṛtīḥ — Seus ministros; kāmaiḥ — com a realização de seus desejos; pratoṣya — satisfa­zendo plenamente; pratyanandata — saudava-os.

Tradução

Então, Ele olhava para um pote de ghī, um espelho, as vacas e touros, os brāhmaṇas e semideuses e encarregava-Se de que os membros de todas as classes sociais residentes no palácio e em toda a cidade ficassem satisfeitos com o recebimento de presen­tes. Depois disso, saudava Seus ministros, agradando-lhes através da realização de todos os seus desejos.

Texto

saṁvibhajyāgrato viprān
srak-tāmbūlānulepanaiḥ
suhṛdaḥ prakṛtīr dārān
upāyuṅkta tataḥ svayam

Sinônimos

saṁvibhajya — distribuindo; agrataḥ — primeiro; viprān — os brāhmaṇas; srak — guirlandas; tāmbūla — noz de bétel; anulepanaiḥ — e pasta de sândalo; suhṛdaḥ — a Seus amigos; prakṛtīḥ — a Seus minis­tros; dārān — a Suas esposas; upāyuṅkta — partilhava; tataḥ — então; svayam — Ele mesmo.

Tradução

Depois de distribuir guirlandas de flores, pān e pasta de sân­dalo primeiro aos brāhmaṇas, Ele dava esses presentes a Seus amigos, ministros e esposas, e, por fim, Ele mesmo os aceitava.

Texto

tāvat sūta upānīya
syandanaṁ paramādbhutam
sugrīvādyair hayair yuktaṁ
praṇamyāvasthito ’grataḥ

Sinônimos

tāvat — então; sūtaḥ — Seu quadrigário; upānīya — tendo trazido; syan­danam — Sua quadriga; parama — sumamente; adbhutam — maravilho­sa; sugrīva-ādyaiḥ — chamados Sugrīva e assim por diante; hayaiḥ — a Seus cavalos; yuktam — atrelada; praṇamya — reverenciando; avas­thitaḥ — postando-se; agrataḥ — diante dEle.

Tradução

Então, o quadrigário do Senhor trazia Sua quadriga sumamen­te maravilhosa atrelada a Sugrīva e aos outros cavalos. Seu quadrigário reverenciava-O e, depois, postava-se diante dEle.

Texto

gṛhītvā pāṇinā pāṇī
sārathes tam athāruhat
sātyaky-uddhava-saṁyuktaḥ
pūrvādrim iva bhāskaraḥ

Sinônimos

gṛhītvā — tomando; pāṇinā — com Sua mão; pāṇī — as mãos; sāratheḥ — de Seu quadrigário; tam — nela; atha — então; āruhat — montava; sātyaki-uddhava — por Sātyaki e Uddhava; saṁyuktaḥ — acom­panhado; pūrva — do oriente; adrim — a montanha; iva — como se; bhāskaraḥ — o Sol.

Tradução

Segurando as mãos de Seu quadrigário, o Senhor Kṛṣṇa montava na quadriga, juntamente com Sātyaki e Uddhava, assim como o Sol nascendo sobre a montanha no horizonte oriental.

Comentário

SIGNIFICADO—Os ācāryas assinalam que o quadrigário do Senhor postava-se de mãos juntas e que o Senhor, segurando as mãos dele com Sua mão direita, montava na quadriga.

Texto

īkṣito ’ntaḥ-pura-strīṇāṁ
sa-vrīḍa-prema-vīkṣitaiḥ
kṛcchrād visṛṣṭo niragāj
jāta-hāso haran manaḥ

Sinônimos

īkṣitaḥ — olhado; antaḥ-pura — do palácio; strīṇām — das mulheres; sa-vrīḍa — tímidos; prema — e amorosos; vīkṣitaiḥ — pelos olhares; kṛcchrāt — com dificuldade; visṛṣṭaḥ — livrando-Se; niragāt — saía; jāta — aparecido; hāsaḥ — um sorriso; haran — retirando; manaḥ — a mente delas.

Tradução

As damas do palácio contemplavam o Senhor Kṛṣṇa com olhares tímidos e amorosos, e por isso Ele conseguia livrar-Se delas somente a muito custo. Ele, então, partia com Seu rosto sorridente a ca­tivar-lhes a mente.

Comentário

SIGNIFICADO—Śrīla Viśvanātha Cakravartī descreve assim esta cena: “Os olha­res tímidos e amorosos das damas do palácio, os quais insinuavam a agitação delas, davam a entender: ‘Como podemos tolerar o tormento de nos separarmos de Ti?’ A ideia aqui é que, por estar cativado pela afeição delas, o Senhor sorria, indicando: ‘Minhas queridas damas inquietas, estais tão abatidas devido a este pouco tempo de separação. Voltarei hoje mais tarde para desfrutar convosco.’ E então, com Seu sorriso a cativar-lhes a mente, Ele só conseguia sair a muito custo, depois de desvencilhar-Se do cativeiro provocado por seus olhares amorosos.”

Texto

sudharmākhyāṁ sabhāṁ sarvair
vṛṣṇibhiḥ parivāritaḥ
prāviśad yan-niviṣṭānāṁ
na santy aṅga ṣaḍ ūrmayaḥ

Sinônimos

sudharmā-ākhyām — conhecido como Sudharmā; sabhām — o salão real de assembleias; sarvaiḥ — por todos; vṛṣṇibhiḥ — os Vṛṣṇis; parivāritaḥ — rodeado; prāviśat — entrava; yat — no qual; niviṣṭānām — para aqueles que entraram; na santi — não acontecem; aṅga — meu querido rei (Parīkṣit); ṣaṭ — as seis; ūrmayaḥ — ondas.

Tradução

O Senhor, rodeado por todos os Vṛṣṇis, entrava no salão de assembleias Sudharmā, que protege contra as seis ondas da vida material os que nele entram, querido rei.

Comentário

SIGNIFICADO—Śrīla Prabhupāda escreve: “Deve-se lembrar que o salão de assembleias Sudharmā foi arrebatado dos planetas celestiais e restabelecido na cidade de Dvārakā. A característica especial do salão de assembleias era que qualquer um que nele entrasse se livraria das seis espécies de tormentos materiais, a saber, fome, sede, lamenta­ção, ilusão, velhice e morte. Esses são os açoites da existência mate­rial, e enquanto alguém permanecesse naquele salão de assembleias, não seria afetado por esses seis açoites materiais.”

Com relação a este verso, Śrīdhara Svāmī e Viśvanātha Cakravartī explicam que, quando o Senhor Kṛṣṇa saía separadamente de cada um de Seus muitos palácios, cada forma individual era visível às pessoas presentes naquela área específica do palácio e aos residentes da vizinhança, mas não aos outros. Então, no caminho da entrada do salão de assembleias Sudharmā, todas as formas do Senhor fundiam­se em uma forma única, e assim Ele entrava no salão.

Texto

tatropavistaḥ paramāsane vibhur
babhau sva-bhāsā kakubho ’vabhāsayan
vṛto nṛ-siṁhair yadubhir yadūttamo
yathoḍu-rājo divi tārakā-gaṇaiḥ

Sinônimos

tatra — lá; upaviṣṭaḥ — sentado; parama-āsane — em Seu elevado trono; vibhuḥ — o onipotente Senhor Supremo; babhau — brilhava; sva — com Sua; bhāsā — refulgência; kakubhaḥ — todos os cantos do céu; avabhāsayan — fazendo brilhar; vṛtaḥ — rodeado; nṛ — entre homens; siṁhaiḥ — por leões; yadubhiḥ — pelos Yadus; yadu-uttamaḥ — o mais excelente dos Yadus; yathā — como; uḍu-rājaḥ — a Lua; divi­ — no céu; tārakā-gaṇaiḥ — (rodeada) pelas estrelas.

Tradução

Ao sentar-Se em Seu trono elevado ali no salão de assembleias, o onipotente Senhor Supremo brilhava com Seu fulgor inigualável, iluminando todos os cantos do espaço. Rodeado pelos Yadus, leões entre os homens, aquele melhor dos Yadus parecia a Lua entre muitas estrelas.

Texto

tatropamantriṇo rājan
nānā-hāsya-rasair vibhum
upatasthur naṭācāryā
nartakyas tāṇḍavaiḥ pṛthak

Sinônimos

tatra — lá; upamantriṇaḥ — os bobos da corte; rājan — ó rei; nānā — com várias; hāsya — divertidas; rasaiḥ — atitudes; vibhum — ao Senhor Supremo; upatasthuḥ — serviam; naṭa-ācāryāḥ —artistas peritos; nartakyaḥ — bailarinas; tāṇḍavaiḥ — com danças vigorosas; pṛthak — separadamente.

Tradução

E lá, ó rei, bobos da corte entretinham o Senhor com a exibi­ção de várias atitudes cômicas, atores peritos encenavam para Ele, e bailarinas dançavam com muita energia.

Comentário

SIGNIFICADO—Śrīla Viśvanātha Cakravartī assinala que a palavra naṭācāryāḥ refere-se, entre outras coisas, a mágicos peritos. Todos esses diferentes artistas, um após o outro, apresentavam-se para o Senhor na assem­bleia dos grandes reis.

Texto

mṛdaṅga-vīṇā-muraja-
veṇu-tāla-dara-svanaiḥ
nanṛtur jagus tuṣṭuvuś ca
sūta-māgadha-vandinaḥ

Sinônimos

mṛdaṅga — de tambores mṛdaṅga; vīṇāvīṇās; muraja — e de murajas, outra espécie de tambor; veṇu — de flautas; tāla — címbalos; dara — e búzios; svanaiḥ — com os sons; nanṛtuḥ — dançavam; jaguḥ — cantavam; tuṣṭuvuḥ — ofereciam louvor; ca — e; sūta — trovadores; māga­dha — recitadores de história; vandinaḥ — e panegiristas.

Tradução

Esses artistas dançavam e cantavam ao som de mṛdaṅgas, vīṇās, murajas, flautas, címbalos e búzios, enquanto poetas profissionais, cronistas e panegiristas recitavam as glórias do Senhor.

Texto

tatrāhur brāhmaṇāḥ kecid
āsīnā brahma-vādinaḥ
pūrveṣāṁ puṇya-yaśasāṁ
rājñāṁ cākathayan kathāḥ

Sinônimos

tatra — lá; āhuḥ — falavam; brāhmaṇāḥbrāhmaṇas; kecit — alguns; āsīnāḥ — sentados; brahma — nos Vedas; vādinaḥ — fluentes; pūrveṣām — daqueles do passado; puṇya — piedosa; yaśasām — cuja fama; rājñām — de reis; ca — e; ākathayan — contavam; kathāḥ — histórias.

Tradução

Alguns brāhmaṇas sentados naquele salão de assembleias cantavam com fluência os mantras védicos, enquanto outros recontavam histórias de célebres reis piedosos do passado.

Texto

tatraikaḥ puruṣo rājann
āgato ’pūrva-darśanaḥ
vijñāpito bhagavate
pratīhāraiḥ praveśitaḥ

Sinônimos

tatra — lá; ekaḥ — uma; puruṣaḥ — pessoa; rājan — ó rei (Parīkṣit); āgataḥ — veio; apūrva — nunca antes; darśanaḥ — cujo aparecimento; vijñāpitaḥ — anunciado; bhagavate — ao Senhor Supremo; pratīhāraiḥ — pelos porteiros; praveśitaḥ — introduzido.

Tradução

Certa vez, chegou à assembleia uma pessoa, ó rei, que jamais fora vista ali. Os porteiros anunciaram-no ao Senhor e, então, conduziram-no ao interior da assembleia.

Texto

sa namaskṛtya kṛṣṇāya
pareśāya kṛtāñjaliḥ
rājñām āvedayad duḥkhaṁ
jarāsandha-nirodha-jam

Sinônimos

saḥ — ele; namaskṛtya — após prostrar-se; kṛṣṇāya — diante do Senhor Kṛṣṇa; para-īśāya — a Suprema Personalidade de Deus; kṛta-añjaliḥ — de mãos postas; rājñām — dos reis; āvedayat — apresentou; duḥkham — o sofrimento; jarāsandha — feito por Jarāsandha; nirodha-jam — devi­do ao aprisionamento.

Tradução

Aquele homem prostrou-se diante de Kṛṣṇa, a Suprema Personalidade de Deus, e, de mãos postas, descreveu ao Senhor como muitos reis estavam sofrendo porque Jarāsandha os aprisionara.

Texto

ye ca dig-vijaye tasya
sannatiṁ na yayur nṛpāḥ
prasahya ruddhās tenāsann
ayute dve girivraje

Sinônimos

ye — aqueles que; ca — e; dik-vijaye — durante a conquista de todas as direções; tasya — por ele (Jarāsandha); sannatim — subordinação completa; na yayuḥ — não aceitaram; nṛpāḥ — reis; prasahya — à força; ruddhāḥ — aprisionados; tena — por ele; āsan — foram; ayute — dez mil; dve — dois; giri-vraje — na fortaleza conhecida como Girivraja.

Tradução

Vinte mil reis que se recusaram a submeter-se absolutamente a Jarāsandha durante sua conquista do mundo foram aprisiona­dos à força por ele na fortaleza chamada Girivraja.

Comentário

SIGNIFICADO—Śrīla Viśvanātha Cakravartī assinala que esses reis se recusaram a pagar tributo e a aceitar outras formas de submissão a Jarāsandha. Além disso, existe uma famosa narração no Mahābhārata e em outros textos segundo a qual Jarāsandha queria adorar Mahā-bhairava oferecendo-lhe em sacrifício a vida de cem mil reis.

Texto

rājāna ūcuḥ
kṛṣṇa kṛṣṇāprameyātman
prapanna-bhaya-bhañjana
vayaṁ tvāṁ śaraṇaṁ yāmo
bhava-bhītāḥ pṛthag-dhiyaḥ

Sinônimos

rājānaḥ — os reis; ūcuḥ — disseram; kṛṣṇa kṛṣṇa — ó Kṛṣṇa, ó Kṛṣṇa; aprameya-ātman — ó Espírito incomensurável; prapanna — daqueles que são rendidos; bhaya — o medo; bhañjana — ó Vós que destruís; vayam — nós; tvām — a Vós; śaraṇam — em busca do abrigo; yāmaḥ — viemos; bhava — da existência material; bhītāḥ — com medo; pṛthak — separada; dhiyaḥ — cuja mentalidade.

Tradução

Os reis disseram [conforme relatou seu mensageiro]: Ó Kṛṣṇa, ó Kṛṣṇa, Espírito incomensurável, destruís o medo daqueles que se renderam a Vós. Apesar de nossa atitude separatista, nós, por medo da existência material, viemos buscar Vosso abrigo.

Comentário

SIGNIFICADO—Śrīdhara Svāmī explica que os reis apresentam sua súplica neste e nos cinco versos seguintes. Neste verso, eles se refugiam no Senhor, nos três seguintes descrevem seu medo, e nos dois últimos fazem seu pedido súplice.

Texto

loko vikarma-nirataḥ kuśale pramattaḥ
karmaṇy ayaṁ tvad-udite bhavad-arcane sve
yas tāvad asya balavān iha jīvitāśāṁ
sadyaś chinatty animiṣāya namo ’stu tasmai

Sinônimos

lokaḥ — o mundo inteiro; vikarma — a atividades pecaminosas; nirataḥ — sempre apegado; kuśale — que são para o seu benefício; pramat­taḥ — confundido; karmaṇi — quanto a deveres; ayam — este (mundo); tvat — por Vós; udite — falada; bhavat — de Vós; arcane — a adoração; sve — seu próprio (empenho benéfico); yaḥ — quem; tāvat — porquan­to; asya — deste (mundo); bala-vān — poderoso; iha — nesta vida; jīvi­ta — de longevidade; āśām — esperança; sadyaḥ — de repente; chinat­ti — decepa; animiṣāya — ao tempo que “não pisca”; namaḥ — reve­rências; astu — que haja; tasmai — a Ele.

Tradução

As pessoas neste mundo estão sempre ocupadas em atividades pecaminosas e, assim, confundem-se quanto a seu verdadeiro dever, que consiste em adorar-Vos segundo Vossos mandamentos. O cumprimento deste dever, em verdade, traria boa fortuna para as pessoas neste mundo. Ofereçamos nossas reverências ao Senhor onipotente, que apare­ce como o tempo e de repente decepa nossa obstinada esperança de uma longa vida neste mundo.

Comentário

SIGNIFICADO—O Senhor Kṛṣṇa afirma na Bhagavad-gītā (9.27):

yat karoṣi yad aśnāsi
yaj juhoṣi dadāsi yat
yat tapasyasi kaunteya
tat kuruṣva mad-arpaṇam

“Tudo o que fizeres, tudo o que comeres, tudo o que ofereceres ou deres, e quaisquer austeridades que executares – faze isto, ó filho de Kuntī, como uma oferenda a Mim.”

Este é o mandamento do Senhor Supremo, mas as pessoas em geral estão desorientadas e negligenciam essa atividade auspiciosa, preferindo, em vez disso, praticar atividades pecaminosas que as levam a terríveis sofrimentos. O movimento da consciência de Kṛṣṇa está trabalhando para iluminar o mundo sobre esta essencialíssima atividade: o serviço amoroso ao Senhor.

Texto

loke bhavāñ jagad-inaḥ kalayāvatīrṇaḥ
sad-rakṣaṇāya khala-nigrahaṇāya cānyaḥ
kaścit tvadīyam atiyāti nideśam īśa
kiṁ vā janaḥ sva-kṛtam ṛcchati tan na vidmaḥ

Sinônimos

loke — a este mundo; bhavān — Vós; jagat — do universo; inaḥ — o predominador; kalayā — com Vossa expansão, Baladeva, ou com Vossa potência, o tempo; avatīrṇaḥ — tendo descido; sat — os santos; rakṣaṇāya — para proteger; khala — os perversos; nigrahaṇāya — para subjugar; ca — e; anyaḥ — outro; kaścit — alguém; tvadīyam — Vossa; atiyāti — infringe; nideśam — a lei; īśa — ó Senhor; kim vā — ou então; janaḥ — uma pessoa; sva — por si mesma; kṛtam — criado; ṛcchati — obtém; tat — aquilo; na vidmaḥ — não compreendemos.

Tradução

Sois o predominante Senhor do universo e descestes a este mundo com Vosso poder pessoal para proteger os santos e reprimir os perversos. Não podemos compreender, ó Senhor, como alguém pode transgredir Vossa lei e ainda continuar a gozar os frutos de seu trabalho.

Comentário

SIGNIFICADO—Śrīdhara Svāmī explica que os reis estavam perplexos com o sofrimento que lhes sobreviera. Visto ter o Senhor descido a este mundo para proteger os piedosos e punir os perversos, eles perguntam, nesta passagem, como é que Jarāsandha, que descaradamente trans­grediu a ordem do Senhor, continuava a praticar suas atividades per­versas, ao passo que os reis eram postos em uma condição deplorável? Viśvanātha Cakravartī Ṭhākura igualmente esclarece que os reis não podiam compreender como é que Jarāsandha, que molestava os de­votos santos e nutria os invejosos, podia continuar a prosperar, en­quanto os reis estavam sendo atormentados pelo perverso Jarāsandha. De maneira semelhante, Śrīla Prabhupāda, em Kṛṣṇa, a Suprema Personalidade de Deus, cita os reis da seguinte maneira: “Meu querido Senhor, sois o proprietário de todos os mundos, e encarnastes juntamente com o Senhor Balarāma, Vossa expansão plenária. Afirma-se que apareceis nesta encarnação com o propósito de proteger os fiéis e destruir os canalhas. Nessas circunstâncias, como é possível que canalhas como Jarāsandha possam colocar-nos, contra a Vossa autori­dade, em condições de vida tão deploráveis? Estamos perplexos com essa situação e não podemos compreender como isso é possível. Pode ser que Jarāsandha tenha sido encarregado de nos causar tal sofri­mento devido a nossas más ações passadas, mas, através das escritu­ras reveladas, ouvimos que todo aquele que se rende a Vossos pés de lótus de imediato fica imune às reações da vida pecaminosa... Portanto, entregamo-nos de todo o coração ao Vosso refúgio e espera­mos que Vossa Onipotência agora nos dê plena proteção.”

Texto

svapnāyitaṁ nṛpa-sukhaṁ para-tantram īśa
śaśvad-bhayena mṛtakena dhuraṁ vahāmaḥ
hitvā tad ātmani sukhaṁ tvad-anīha-labhyaṁ
kliśyāmahe ’ti-kṛpaṇās tava māyayeha

Sinônimos

svapnāyitam — como um sonho; nṛpa — dos reis; sukham — a felicidade; para-tantram — condicional; īśa — ó Senhor; śaśvat — perpetuamente; bhayena — cheio de medo; mṛtakena — com este cadáver; dhuram — fardo; vahāmaḥ — carregamos; hitvā — rejeitando; tat — aque­la; ātmani — dentro do eu; sukham — felicidade; tvat — feitas para Vós; anīha — por obras abnegadas; labhyam — a ser obtida; kliśyāmahe — sofremos; ati — extremamente; kṛpaṇāḥ — deploráveis; tava — Vossa; māyayā — com a energia ilusória; iha — neste mundo.

Tradução

Ó Senhor, com este corpo semelhante a um cadáver, sempre cheios de medo, carregamos o fardo da felicidade relativa dos reis, que é tal qual um sonho. Dessa maneira, rejeitamos a ver­dadeira felicidade da alma, que vem para aquele que Vos presta serviço abnegado. Sendo tão deploráveis, apenas sofremos nesta vida sob o encanto de Vossa energia ilusória.

Comentário

SIGNIFICADO—Após expressarem suas dúvidas no verso anterior, os reis aqui admitem que de fato estão sofrendo devido a sua própria tolice, visto terem rejeitado a eterna felicidade da alma em troca da temporária felicidade condicionada da pretensa posição régia. Muita gente comete erro semelhante ao desejar riqueza, poder, prestígio, família aristocrática etc. em troca de sua alma. Os reis admitem que caíram sob o encanto da energia ilusória do Senhor e equivocadamente confun­diram a imensa ansiedade da liderança política com felicidade.

Texto

tan no bhavān praṇata-śoka-harāṅghri-yugmo
baddhān viyuṅkṣva magadhāhvaya-karma-pāśāt
yo bhū-bhujo ’yuta-mataṅgaja-vīryam eko
bibhrad rurodha bhavane mṛga-rāḍ ivāvīḥ

Sinônimos

tat — portanto; naḥ — a nós; bhavān — Vós; praṇata — daqueles que se renderam; śoka — a aflição; hara — que retiram; aṅghri — de pés; yugmaḥ — cujo par; baddhān — presos; viyuṅkṣva — por favor, soltai; magadha-āhvaya — chamado Magadha (Jarāsandha); karma — de trabalho fruitivo; pāśāt — dos grilhões; yaḥ — que; bhū-bhujaḥ — reis; ayuta — dez mil; matam — enlouquecidos; gaja — de elefantes; vīryam — a façanha; ekaḥ — sozinho; bibhrat — mantendo; rurodha — aprisionados; bhavane — em sua residência; mṛga-rāṭ — o leão, rei dos animais; iva — bem como; avīḥ — ovelhas.

Tradução

Portanto, já que Vossos pés aliviam o sofrimento dos que se rendem a eles, por favor, libertai estes prisioneiros que Vos falam, quebrando nossos grilhões do karma, manifestos como o rei de Magadha. Controlando sozi­nho a valentia de dez mil elefantes enlouquecidos, ele nos prendeu em sua casa assim como um leão captura ovelhas.

Comentário

SIGNIFICADO—Aqui, os reis suplicam ao Senhor que os liberte do cativeiro do karma criado pela potência material do Senhor. Os reis deixam claro que Jarāsandha é tão poderoso que não há esperança de que eles escapem por seu próprio poder.

Texto

yo vai tvayā dvi-nava-kṛtva udātta-cakra
bhagno mṛdhe khalu bhavantam ananta-vīryam
jitvā nṛ-loka-nirataṁ sakṛd ūḍha-darpo
yuṣmat-prajā rujati no ’jita tad vidhehi

Sinônimos

yaḥ — quem; vai — de fato; tvayā — por Vós; dvi — duas vezes; nava — nove; kṛtvaḥ — vezes; udātta — erguida; cakra — ó Vós cuja arma disco; bhagnaḥ — esmagado; mṛdhe — em batalha; khalu — com certeza; bhavantam — Vós; ananta — ilimitado; vīryam — cujo poder; jitvā — derro­tando; nṛ-loka — em assuntos humanos; niratam — absorto; sakṛt — só uma vez; ūḍha — inflado; darpaḥ — cujo orgulho; yuṣmat — Vossos; prajāḥ — súditos; rujati — atormenta; naḥ — a nós; ajita — ó invencí­vel; tat — isto; vidhehi — por favor, corrigi.

Tradução

Ó portador do disco! Vossa força é ilimitada, e, por isso, subjugastes Jarāsandha em combate dezesse­te vezes. Mas depois, absor­to em afazeres humanos, permitistes que ele Vos derrotasse uma vez. Agora ele está tão cheio de orgulho que ousa atormentar-nos, Vossos súditos. Ó invencível, por favor, retificai esta situação.

Comentário

SIGNIFICADO—A palavra nṛ-loka-niratam indica que o Senhor estava absorto em encenar no mundo dos seres humanos. Assim, enquanto agia como um rei humano, Ele permitiu que Jarāsandha fosse vitorioso em uma única batalha depois que o Senhor o subjugara dezessete vezes. Su­bentende-se pelas palavras dos reis que Jarāsandha está molestando-os sobretudo por eles serem almas rendidas ao Senhor Kṛṣṇa. Portan­to, eles suplicam ao Senhor: “Ó Vós que mantendes erguida a arma cakra, por favor, fazei o arranjo necessário.”

Śrīla Prabhupāda exprime os sentimentos dos reis da seguinte maneira: “Meu querido Senhor, já lutastes com Jarāsandha dezoito vezes consecutivas, das quais o derrotastes dezessete vezes, superando a ex­traordinária posição poderosa dele. Em Vossa décima oitava luta, no entanto, exibistes Vosso comportamento humano, e assim pareceu que fostes derrotado. Meu querido Senhor, sabemos muito bem que Jarāsandha não pode derrotar-Vos em tempo algum, porque Vosso poder, força, recursos e autoridade são todos ilimitados. Ninguém pode igualar­-Vos ou superar-Vos. A aparente derrota infligida por Jarāsandha no décimo oitavo combate não passa de uma exibição de comportamen­to humano. Desafortunadamente, o tolo Jarāsandha não pôde com­preender Vossos truques, e desde então ficou arrogante devido a seu poder material e prestígio. Especificamente, ele nos prendeu e apri­sionou, sabendo muito bem que, como Vossos devotos, estamos sujeitos a Vossa soberania.”

Texto

dūta uvāca
iti māgadha-saṁruddhā
bhavad-darśana-kaṅkṣiṇaḥ
prapannāḥ pāda-mūlaṁ te
dīnānāṁ śaṁ vidhīyatām

Sinônimos

dūtaḥ uvāca — o mensageiro disse; iti — assim; māgadha — por Jarāsandha; saṁruddhāḥ — aprisionados; bhavat — de Vós; darśana — a visão; kāṅkṣiṇaḥ — aguardando ansiosos; prapannāḥ — rendidos; pāda — dos pés; mūlam — à base; te — Vossos; dīnānām — aos dignos de compaixão; śam — benefício; vidhīyatām — por favor, concedei.

Tradução

O mensageiro continuou: Esta é a mensagem dos reis aprisionados por Jarāsandha, todos os quais anseiam por Vossa au­diência, tendo-se rendido a Vossos pés. Por favor, concedei boa fortuna àquelas pobres almas.

Texto

śrī-śuka uvāca
rāja-dūte bruvaty evaṁ
devarṣiḥ parama-dyutiḥ
bibhrat piṅga-jaṭā-bhāraṁ
prādurāsīd yathā raviḥ

Sinônimos

śrī-śukaḥ uvāca — Śukadeva Gosvāmī disse; rāja — dos reis; dūte­ — o mensageiro; bruvati — tendo falado; evam — dessa maneira; deva — dos semideuses; ṛṣiḥ — o sábio (Nārada Muni); parama — suprema; dyutiḥ — cuja refulgência; bibhrat — usando; piṅga — amarelados; jaṭā — de cachos entrelaçados; bhāram — uma massa; prādurāsīt — apareceu; yathā — como; raviḥ — o Sol.

Tradução

Śukadeva Gosvāmī disse: Depois que o mensageiro dos reis falara essas palavras, Nārada, o sábio entre os semideuses, de repente apareceu. Tendo no alto da cabeça uma massa de dourados cachos de cabelos entrelaçados, o refulgentíssimo sábio entrou no salão tal qual o Sol brilhante.

Texto

taṁ dṛṣṭvā bhagavān kṛṣṇaḥ
sarva-lokeśvareśvaraḥ
vavanda utthitaḥ śīrṣṇā
sa-sabhyaḥ sānugo mudā

Sinônimos

tam — a ele; dṛṣṭvā — vendo; bhagavān — o Senhor Supremo; kṛṣṇaḥ — Kṛṣṇa; sarva — de todos; loka — os mundos; īśvara — dos controladores; īśvaraḥ — o controlador supremo; vavanda — ofereceu respeitos; utthitaḥ — levantando-Se; śīrṣṇā — com a cabeça; sa — juntamente com; sabhyaḥ — os membros da assembleia; sa — juntamente com; anugaḥ — Seus seguidores; mudā — alegremente.

Tradução

O Senhor Kṛṣṇa é o mestre adorável até mesmo dos governan­tes dos planetas, tais como o senhor Brahmā e o senhor Śiva; contudo, logo que viu Nārada Muni chegar, Ele, juntamente com Seus ministros e secretários, levantou-Se alegremente para receber o eminente sábio e oferecer Suas respeitosas reverências curvando a cabeça.

Comentário

SIGNIFICADO—Esta tradução baseia-se em Kṛṣṇa, a Suprema Personalidade de Deus, de Śrīla Prabhupāda. A palavra mudā indica que o Senhor Kṛṣṇa deleitou-Se ao ver que Nārada havia chegado.

Texto

sabhājayitvā vidhi-vat
kṛtāsana-parigraham
babhāṣe sunṛtair vākyaiḥ
śraddhayā tarpayan munim

Sinônimos

sabhājayitvā — adorando; vidhi-vat — de acordo com os preceitos das escrituras; kṛta — a ele (Nārada) que havia feito; āsana — de um assento; parigraham — aceitação; babhāṣe — Ele (o Senhor Kṛṣṇa) falou; su-nṛtaiḥ — verdadeiras e agradáveis; vākyaiḥ — com palavras; śraddhayā — com reverência; tarpayan — satisfazendo; munim — o sábio.

Tradução

Depois que Nārada havia aceitado o assento oferecido a ele, o Senhor Kṛṣṇa honrou o sábio segundo os preceitos das escrituras e, satisfazendo-o com Sua reverência, disse as seguintes palavras gentis e verdadeiras.

Texto

api svid adya lokānāṁ
trayāṇām akuto-bhayam
nanu bhūyān bhagavato
lokān paryaṭato guṇaḥ

Sinônimos

api svit — decerto; adya — hoje; lokānām — dos mundos; trayāṇām — três; akutaḥ-bhayam — sem nenhum medo; nanu — de fato; bhūyān — for­midável; bhagavataḥ — da poderosa personalidade; lokān — através de todos os sistemas planetários; paryaṭataḥ — que viaja; guṇaḥ — a qua­lidade.

Tradução

[O Senhor Kṛṣṇa disse:] É certo que hoje os três mundos libertaram-se de todo o medo, pois esta é a influência de uma perso­nalidade tão formidável como tu, que viajas à vontade por todos os mundos.

Texto

na hi te ’viditaṁ kiñcil
lokeṣv īśvara-kartṛṣu
atha pṛcchāmahe yuṣmān
pāṇḍavānāṁ cikīrṣitam

Sinônimos

na — não; hi — de fato; te — para ti; aviditam — desconhecido; kiñcit — nada; lokeṣu — dentro dos mundos; īśvara — o Senhor Supremo; kartṛṣu — cujo criador; atha — assim; pṛcchāmahe — deixa-Nos inquirir; yuṣmān — de ti; pāṇḍavānām — dos filhos de Pāṇḍu; cikīrṣitam — sobre as intenções.

Tradução

Não há nada que desconheças na criação de Deus. Portanto, por favor, dize-Nos o que os Pāṇḍavas pretendem fazer.

Texto

śrī-nārada uvāca
dṛṣṭā māyā te bahuśo duratyayā
māyā vibho viśva-sṛjaś ca māyinaḥ
bhūteṣu bhūmaṁś carataḥ sva-śaktibhir
vahner iva cchanna-ruco na me ’dbhutam

Sinônimos

śrī-nāradaḥ uvāca — Śrī Nārada disse; dṛṣṭā — visto; mayā — por mim; te — Teu; bahuśaḥ — muitas vezes; duratyayā — insuperável; māyā — poder de ilusão; vibho — ó onipotente; viśva — do universo; sṛjaḥ — do criador (o senhor Brahmā); ca — e; māyinaḥ — do desorientador (Tu); bhūteṣu — entre os seres criados; bhūman — ó Tu que en­globas tudo; carataḥ — (de Ti) que Te moves; sva — Tuas; śaktibhiḥ — pelas energias; vahneḥ — do fogo; iva — como; channa — coberta; ru­caḥ — cuja luz; na — não; me — para mim; adbhutam — surpreendente.

Tradução

Śrī Nārada disse: Tenho visto muitas vezes o insuperável poder de Tua māyā, ó Onipotente, com a qual confundes até mesmo Brahmā, o criador do universo. Ó Senhor em quem tudo repou­sa, não me surpreende que Te disfarces com Tuas próprias ener­gias enquanto Te moves entre os seres criados, assim como o fogo cobre sua própria luz com fumaça.

Comentário

SIGNIFICADO—Quando o Senhor Kṛṣṇa perguntou a Nārada Muni sobre as intenções dos Pāṇḍavas, o sábio respondeu que o próprio Senhor é todo-poderoso e onisciente, até mesmo a ponto de poder confundir o criador do universo, Brahmā. Nārada compreendeu que o Senhor Kṛṣṇa desejava matar Jarāsandha e, por isso, estava começando a fazer os preparativos para esse passatempo, perguntando a Nārada sobre as intenções dos Pāṇḍavas. Compreendendo a própria intenção do Senhor Kṛṣṇa, Nārada não se admirou quando Ele humildemente lhe pediu informações.

Texto

tavehitaṁ ko ’rhati sādhu vedituṁ
sva-māyayedaṁ sṛjato niyacchataḥ
yad vidyamānātmatayāvabhāsate
tasmai namas te sva-vilakṣaṇātmane

Sinônimos

tava — Teu; īhitam — propósito; kaḥ — quem; arhati — é capaz; sādhu — propriamente; veditum — de compreender; sva — por Tua própria; māyayā — energia material; idam — este (universo); sṛjataḥ — que crias; niyacchataḥ — e recolhes; yat — que; vidyamāna — existir; ātmatayā — por relação a Ti, a Superalma; avabhāsate — parece; tasmai — a Ele; namaḥ — reverências; te — a Ti; sva — por Tua natureza; vilakṣaṇa-ātmane — inconcebível.

Tradução

Quem pode compreender adequadamente Teu propósito? Com Tua energia material, expandes e também recolhes esta criação, a qual, em virtude disso, parece ter uma existência substancial. Reverências a Ti, cuja posição transcendental é inconcebível.

Comentário

SIGNIFICADO—Śrīla Prabhupāda explica a realização de Nārada da seguinte maneira: “Meu querido Senhor, através de Tuas potências inconcebíveis, crias esta manifestação cósmica, manténs e tornas a dissolvê-la. É só por força de Tua potência inconcebível que este mundo material, em­bora uma obscura representação do mundo espiritual, parece ser real. Ninguém pode entender o que planejas fazer no futuro. Tua posição transcendental é sempre inconcebível para todos. Quanto a mim, só me resta oferecer-Te minhas respeitosas reverências muitas e muitas vezes.”

A palavra sva-vilakṣaṇātmane também indica que o Senhor Kṛṣṇa tem Sua natureza e características singulares. Ninguém é igual ou superior a Deus.

Texto

jīvasya yaḥ saṁsarato vimokṣaṇaṁ
na jānato ’nartha-vahāc charīrataḥ
līlāvatāraiḥ sva-yaśaḥ pradīpakaṁ
prājvālayat tvā tam ahaṁ prapadye

Sinônimos

jīvasya — para o ser vivo condicionado; yaḥ — Ele (o Senhor Supremo) que; saṁsarataḥ — (a alma condicionada) presa no ciclo de nascimentos e mortes; vimokṣaṇam — liberação; na jānataḥ — não sabendo; anartha — coisas indesejadas; vahāt — que traz; śarīrataḥ — do corpo material; līlā — para passatempos; avatāraiḥ — por Seus aparecimentos neste mundo; sva — Sua; yaśaḥ — fama; pradīpakam — o ar­chote; prājvālayat — aceso; tvā — Tu; tam — daquele Senhor; aham — eu; prapadye — aproximo-me em busca de abrigo.

Tradução

O ser vivo capturado no ciclo de nascimentos e mortes não sabe como livrar-se do corpo material, que lhe traz tantos proble­mas. Mas Tu, o Senhor Supremo, desces a este mundo em várias formas pessoais e, mediante a execução de Teus passatempos, ilu­minas o caminho da alma com o archote brilhante de Tua fama. Por isso, rendo-me a Ti.

Comentário

SIGNIFICADO—Śrīla Prabhupāda escreve: “[Nārada disse:] Dotados apenas de conhecimento relacionado com o corpo, todos são conduzidos pelos desejos materiais e, assim, desenvolvem novos corpos materiais um após outro no ciclo de nascimentos e mortes. Estando absorta em tal conceito de existência, a pessoa não sabe como sair do encarcera­mento do corpo material. Por causa de Tua misericórdia imotivada, meu Senhor, desces a fim de exibir Teus diferentes passatempos transcendentais, que são iluminadores e plenos de glória. Portanto, não tenho alternativa senão oferecer-Te minhas respeitosas reverências. Meu querido Senhor, és o Supremo Parabrahman, e Teus passatempos como um ser humano comum são outro recurso táti­co, exatamente como uma peça no palco, em que um ator representa papéis diferentes de sua própria identidade.”

Texto

athāpy āśrāvaye brahma
nara-loka-viḍambanam
rājñaḥ paitṛ-ṣvasreyasya
bhaktasya ca cikīrṣitam

Sinônimos

atha api — não obstante; āśrāvaye — direi; brahma — ó Verdade Suprema; nara-loka — da sociedade humana; viḍambanam — (a Ti) que imitas; rājñaḥ — do rei (Yudhiṣṭhira); paitṛ — de Teu pai; svasreya­sya — do filho da irmã; bhaktasya — Teu devoto; ca — e; cikīrṣitam — as intenções.

Tradução

Não obstante, ó Verdade Suprema a interpretar o papel de um ser humano, eu Te direi o que Teu devoto Yudhiṣṭhira Mahārāja, o sobrinho de Teu pai, intenciona fazer.

Texto

yakṣyati tvāṁ makhendreṇa
rājasūyena pāṇḍavaḥ
pārameṣṭhya-kāmo nṛpatis
tad bhavān anumodatām

Sinônimos

yakṣyati — executará sacrifício; tvām — para Ti; makha — dos sacrifícios de fogo; indreṇa — com o maior; rājasūyena — conhecido como Rājasūya; pāṇḍavaḥ — o filho de Pāṇḍu; pārameṣṭhya — domínio in­contestado; kāmaḥ — desejando; nṛ-patiḥ — o rei; tat — isso; bhavān — Tu; anumodatām — por favor, sanciona.

Tradução

Desejando soberania incomparável, o rei Yudhiṣṭhira pretende adorar-Te com o mais formidável sacrifício de fogo, o Rājasūya. Por favor, abençoa seu esforço.

Comentário

SIGNIFICADO—Aqui se descreve o rei Yudhiṣṭhira como pārameṣṭhya-kāma, ou “desejoso de pārameṣṭhya”. A palavra pārameṣṭhya significa “supremacia incomparável” e também indica “a Suprema Personalidade de Deus, que Se encontra no mais elevado plano de toda a existên­cia”. Por isso, Śrīla Prabhupāda traduz a mensagem de Nārada da seguinte maneira: “No papel de benquerente, perguntaste sobre os Pāṇḍavas, Teus primos, e por isso vou informar-Te de suas intenções. Agora, por favor, ouve-me. Em primeiro lugar, posso informar-Te que o rei Yudhiṣṭhira tem todas as opulências materiais que se podem obter no mais elevado sistema planetário, Brahmaloka. Ele não tem opulência material alguma a que aspirar, mas, ainda assim, deseja executar o sacrifício Rājasūya somente para obter a Tua companhia e Te agradar... Ele quer adorar-Te a fim de alcançar Tua misericórdia imotivada, solicito que satisfaças os desejos dele.”

Uma vez que a palavra pārameṣṭhya também pode indicar a posição do senhor Brahmā, Śrīla Prabhupāda toma a palavra pārameṣṭhya-kāma nesta passagem como indicação não só de que o rei Yudhiṣṭhira desejava a associação do Senhor Kṛṣṇa e Sua misericórdia, mas também de que o próprio rei Yudhiṣṭhira possuía pārameṣṭhya, todas as opulências do senhor Brahmā.

Texto

tasmin deva kratu-vare
bhavantaṁ vai surādayaḥ
didṛkṣavaḥ sameṣyanti
rājānaś ca yaśasvinaḥ

Sinônimos

tasmin — naquele; deva — ó Senhor; kratu — dos sacrifícios; vare — melhor; bhavantam — a Ti; vai — de fato; sura — semideuses; ādayaḥ — e outras elevadas personalidades; didṛkṣavaḥ — ávidos por ver; same­ṣyanti — irão todos; rājānaḥ — reis; ca — também; yaśasvinaḥ — gloriosos.

Tradução

Ó Senhor, semideuses elevados e reis gloriosos, ávidos por Te ver, irão todos àquele melhor dos sacrifícios.

Comentário

SIGNIFICADO—Os ācāryas explicam que, nesta passagem, Nārada quer dizer que, como todas as eminentes personalidades irão sobretudo para ver o Senhor Kṛṣṇa, Ele também deve ir àquele sacrifício.

Texto

śravaṇāt kīrtanād dhyānāt
pūyante ’nte-vasāyinaḥ
tava brahma-mayasyeśa
kim utekṣābhimarśinaḥ

Sinônimos

śravaṇāt — por ouvir; kīrtanāt — cantar; dhyānāt — e meditar; pūyante — purificam-se; ante-vasāyinaḥ — os párias; tava — sobre Ti; brahma-­mayasya — a manifestação completa da Verdade Absoluta; īśa — ó Senhor; kim uta — o que se dizer então de; īkṣā — aqueles que veem; abhimarśinaḥ — e tocam.

Tradução

Ó Senhor, se até mesmo os párias se purificam por ouvir e cantar Tuas glórias e meditar em Ti, a Verdade Absoluta, o que se dizer, então, daqueles que Te veem e tocam?

Comentário

SIGNIFICADO—Śrīla Śrīdhara Svāmī interpreta a palavra brahma-mayasya como significando brahma-ghana-mūrteḥ, “da forma concentrada da Ver­dade Absoluta”.

Texto

yasyāmalaṁ divi yaśaḥ prathitaṁ rasāyāṁ
bhūmau ca te bhuvana-maṅgala dig-vitānam
mandākinīti divi bhogavatīti cādho
gaṅgeti ceha caraṇāmbu punāti viśvam

Sinônimos

yasya — cuja; amalam — imaculada; divi — no céu; yaśaḥ — fama; prathitam — disseminada; rasāyām — na região subterrânea; bhūmau — na terra; ca — e; te — Tua; bhuvana — para todos os mundos; maṅgala — ó criador da boa fortuna; dik — dentro ou fora das direções universais; vitānam — a expansão, ou dossel decorativo; mandākinī iti — chamado Mandākinī; divi — no céu; bhogavatī iti — chamado Bhogavatī; ca — e; adhaḥ — embaixo; gaṅgā iti — chamado Gaṅgā; ca — e; iha — aqui, na Terra; caraṇa — de Teus pés; ambu — a água; punāti — purifica; viśvam — o universo inteiro.

Tradução

Meu querido Senhor, és o símbolo de tudo o que é auspicioso. Tua fama e nome transcendentais estendem-se como um dossel sobre todo o universo, incluindo os sistemas planetários superiores, intermediários e inferiores. A água transcendental que lava Teus pés de lótus é conhecida nos sistemas planetários superiores como o rio Mandākinī, nos sistemas planetários inferiores como o Bhogavatī e, neste sistema planetário terrestre, como o Ganges. Esta água sagrada e transcendental corre por todo o universo, purificando todos os lugares por onde passa.

Comentário

SIGNIFICADO—Esta tradução baseia-se em Kṛṣṇa, de Śrīla Prabhupāda. Śrīdhara Svāmī menciona que a palavra dig-vitānam indica que as glórias transcendentais do Senhor Kṛṣṇa se estendem por todo o universo como um dossel refrescante sobre as direções universais. Em outras palavras, o mundo inteiro pode encontrar abrigo sob a sombra refrescante dos pés de lótus do Senhor. Por isso, o Senhor é bhuvana-maṅgala, o símbolo de tudo o que é auspicioso para este mundo.

Texto

śrī-śuka uvāca
tatra teṣv ātma-pakṣeṣv a-
gṛṇatsu vijigīṣayā
vācaḥ peśaiḥ smayan bhṛtyam
uddhavaṁ prāha keśavaḥ

Sinônimos

śrī-śukaḥ uvāca — Śukadeva Gosvāmī disse; tatra — ali; teṣu — eles (os Yādavas); ātma — Seus; pakṣeṣu — partidários; agṛṇatsu — não concordando; vijigīṣayā — por causa de seu desejo de vencer (Jarāsandha); vācaḥ — da fala; peśaiḥ — com um uso encantador; smayan — sorrin­do; bhṛtyam — a Seu servo; uddhavam — Śrī Uddhava; prāha — falou; keśavaḥ — o Senhor Kṛṣṇa.

Tradução

Śukadeva Gosvāmī disse: Quando Seus partidários, os Yādavas, objetaram a esta proposta devido à avidez de derrotar Jarāsandha, o Senhor Keśava voltou-Se para Seu servo Uddhava e, sorrindo, dirigiu-Se a ele com belas palavras.

Comentário

SIGNIFICADO—Śrīla Prabhupāda explica: “Pouco antes do grande sábio Nārada chegar ao salão de assembleias Sudharmā, em Dvārakā, o Senhor Kṛṣṇa e Seus ministros e secretários estiveram analisando como atacar o reino de Jarāsandha. Por estarem ponderando com seriedade este assunto, a proposta de Nārada para que o Senhor Kṛṣṇa fosse a Hastināpura participar do grande sacrifício Rājasūya de Mahārāja Yudhiṣṭhira não lhes atraía muito. O Senhor Kṛṣṇa podia entender as intenções de Seus companheiros porque é o governante até mesmo do senhor Brahmā. Portanto, a fim de tranquilizá-los, Ele [Se dirigiu] a Uddhava sorrindo.”

Śrīla Viśvanātha Cakravartī assinala que o Senhor sorriu porque estava para demonstrar que Uddhava tinha a brilhante capacidade de dar conselhos em situações difíceis.

Texto

śrī-bhagavān uvāca
tvaṁ hi naḥ paramaṁ cakṣuḥ
suhṛn mantrārtha-tattva-vit
athātra brūhy anuṣṭheyaṁ
śraddadhmaḥ karavāma tat

Sinônimos

śrī-bhagavān uvāca — a Personalidade de Deus disse; tvam — tu; hi — de fato; naḥ — Nosso; paramam — supremo; cakṣuḥ — olho; suhṛt — amigo benquerente; mantra — de conselho; artha — o valor; tattva­-vit — que sabe perfeitamente; atha — assim; atra — a este respeito; brūhi — por favor, dize; anuṣṭheyam — o que deve ser feito; śradda­dhmaḥ — confiamos; karavāma — executaremos; tat — aquilo.

Tradução

A Personalidade de Deus disse: És de fato Nosso melhor olho e amigo mais íntimo, porque conheces perfeitamente o valor relativo de várias espécies de conselho. Portanto, por favor, dize-Nos o que deve ser feito nesta situação. Confiamos em teu julgamento e faremos o que disseres.

Texto

ity upāmantrito bhartrā
sarva-jñenāpi mugdha-vat
nideśaṁ śirasādhāya
uddhavaḥ pratyabhāṣata

Sinônimos

iti — assim; upāmantritaḥ — solicitado; bhartrā — por seu mestre; sarva-jñena — onisciente; api — muito embora; mugdha — perplexo; vat — como se; nideśam — a ordem; śirasa — sobre sua cabeça; ādhāya — aceitando; uddhavaḥ — Uddhava; pratyabhāṣata — respondeu.

Tradução

[Śukadeva Gosvāmī continuou:] Solicitado assim por seu mestre, que, embora onisciente, agia como se estivesse perplexo, Uddha­va aceitou essa ordem sobre sua cabeça e respondeu o seguinte.

Comentário

Neste ponto, encerram-se os significados apresentados pelos humildes servos de Sua Divina Graça A.C. Bhaktivedanta Swami Prabhu­pāda referentes ao décimo canto, septuagésimo capítulo do Śrīmad-­Bhāgavatam, intitulado “As Atividades Diárias do Senhor Kṛṣṇa”.