Capítulo Onze
O Rei Indra Aniquila os Demônios
Como se descreve neste capítulo, o grande santo Nārada Muni, sentindo muita compaixão dos demônios que foram mortos pelos semideuses, proibiu os semideuses de continuarem a matá-los. Foi então que Śukrācārya, através de seu poder místico, devolveu a vida a todos os demônios.
Tendo sido agraciados pela Suprema Personalidade de Deus, os semideuses, estando revigorados, voltaram a lutar contra os demônios. O rei Indra disparou o seu raio contra Bali, e, quando Bali caiu, seu amigo Jambhāsura atacou Indra, que, com seu raio, decapitou Jambhāsura. Ao tomar conhecimento de que Jambhāsura fora morto, Nārada Muni transmitiu a notícia aos parentes de Jambhāsura – Namuci, Bala e Pāka –, que se dirigiram então ao campo de batalha e atacaram os semideuses. Indra, o rei dos céus, decapitou Bala e Pāka e arremessou a arma conhecida como kuliśa, o raio, no ombro de Namuci. O raio, entretanto, não foi bem-sucedido, motivo pelo qual Indra ficou melancólico. Naquele momento, uma voz de alguém invisível veio do céu. A voz declarava: “Nenhuma arma seca ou úmida pode matar Namuci.” Ao ouvir essa voz, Indra começou a pensar em como Namuci poderia ser morto. Pensou, então, em usar espuma, que é algo que não é seco nem molhado. Usando uma arma de espuma, conseguiu matar Namuci. Assim, Indra e os outros semideuses mataram muitos demônios. Então, a pedido do senhor Brahmā, Nārada foi ter com os semideuses e os proibiu de continuar matando os demônios. Todos os semideuses, então, retornaram às suas moradas. Seguindo as instruções de Nārada, todos os demônios sobreviventes no campo de batalha levaram Bali Mahārāja até a montanha Asta. Ali, através do toque da mão de Śukrācārya, Bali Mahārāja recobrou seus sentidos e sua consciência, e aqueles demônios cujas cabeças e corpos não haviam sido completamente destroçados foram ressuscitados pelo poder místico de Śukrācārya.
Texto
atho surāḥ pratyupalabdha-cetasaḥ
parasya puṁsaḥ parayānukampayā
jaghnur bhṛśaṁ śakra-samīraṇādayas
tāṁs tān raṇe yair abhisaṁhatāḥ purā
Sinônimos
śrī-śukaḥ uvaca — Śrī Śukadeva Gosvāmī disse; atho — em seguida; surāḥ — todos os semideuses; pratyupalabdha-cetasaḥ — sendo vivificados novamente pelo reviver de sua consciência; parasya — do Supremo; puṁsaḥ — da Personalidade de Deus; parayā — suprema; anukampayā — pela misericórdia; jaghnuḥ — começaram a baterem; bhṛśam — repetidas vezes; śakra — Indra; samīraṇa — Vāyu; ādayaḥ — e outros; tān tān — para aqueles demônios; raṇe — na luta; yaiḥ — por quem; abhisaṁhatāḥ — eles foram agredidos; purā — antes.
Tradução
Śukadeva Gosvāmī disse: Depois disso, pela suprema graça da Suprema Personalidade de Deus, Śrī Hari, todos os semideuses, encabeçados por Indra e Vāyu, reviveram. Uma vez vivificados, os semideuses começaram a agredir severamente os mesmíssimos demônios que os haviam derrotado.
Texto
bhagavān pāka-śāsanaḥ
udayacchad yadā vajraṁ
prajā hā heti cukruśuḥ
Sinônimos
vairocanāya — contra Bali Mahārāja (simplesmente para matá-lo); saṁrabdhaḥ — estando muito irado; bhagavān — o poderosíssimo; pāka-śāsanaḥ — Indra; udayacchat — colocou em sua mão; yadā — naquele momento; vajram — o raio; prajāḥ — todos os demônios; hā hā — ai de nós, ai de nós; iti — assim; cukruśuḥ — começaram a proferir.
Tradução
Quando o poderosíssimo Indra ficou irado e pegou do seu raio para matar Mahārāja Bali, os demônios começaram a lamentar-se: “Ai de nós! Ai de nós!”
Texto
tiraskṛtya puraḥ-sthitam
manasvinaṁ susampannaṁ
vicarantaṁ mahā-mṛdhe
Sinônimos
vajra-pāṇiḥ — Indra, que sempre carrega o raio em sua mão; tam — a Bali Mahārāja; āha — dirigiu-se; idam — dessa maneira; tiraskṛtya — castigando-o; puraḥ-sthitam — postado diante dele; manasvinam — muito sóbrio e tolerante; su-sampannam — bem equipado com parafernália bélica; vicarantam — locomovendo-se; mahā-mṛdhe — no grande campo de batalha.
Tradução
Sóbrio e tolerante e bem equipado com parafernália bélica, Bali Mahārāja se colocou diante de Indra no grande campo de batalha. O rei Indra, que sempre carrega o raio em sua mão, dirigiu a Bali Mahārāja a seguinte repreensão.
Texto
māyeśān no jigīṣasi
jitvā bālān nibaddhākṣān
naṭo harati tad-dhanam
Sinônimos
naṭa-vat — como um trapaceiro ou ladrão; mūḍha — seu patife; māyābhiḥ — exibiu truques; māyā-īśān — sobre os semideuses, que podem controlar todas essas manifestações ilusórias; naḥ — sobre nós; jigīṣasi — estás tentando sair vitorioso; jitvā — dominando; bālān — criancinhas; nibaddha-akṣān — tapando os olhos; na laḥ — um trapaceiro; naṭaḥ — arrebata; tat-dhanam — a propriedade possuída por uma criança.
Tradução
Indra disse: Ó patife, assim como um trapaceiro às vezes venda os olhos de uma criança e arrebata-lhe as posses, estás também tentando derrotar-nos apresentando certos poderes místicos, embora saibas que somos os mestres de todos esses poderes místicos.
Texto
utsisṛpsanti ye divam
tān dasyūn vidhunomy ajñān
pūrvasmāc ca padād adhaḥ
Sinônimos
ārurukṣanti — pessoas que desejam ir aos sistemas planetários superiores; māyābhiḥ — pelo suposto poder místico ou pelo avanço científico material; utsisṛpsanti — ou querem libertar-se através dessas falsas tentativas; ye — essas pessoas que; divam — o sistema planetário superior conhecido como Svargaloka; tān — esses velhacos desordeiros; dasyūn — esses ladrões; vidhunomi — eu forço a sair; ajñān — patifes; pūrvasmāt — anterior; ca — também; padāt — da posição; adhaḥ — para baixo.
Tradução
Aqueles tolos e patifes que, através do poder místico ou de meios mecânicos, querem elevar-se ao sistema planetário superior, ou que até mesmo se esforçam por ultrapassar os planetas superiores e alcançar o mundo espiritual ou a liberação, faço com que sejam enviados à mais baixa região do universo.
Comentário
SIGNIFICADO—Sem dúvida, existem diferentes sistemas planetários reservados a diferentes pessoas. Como se afirma na Bhagavad-gītā (14.18), ūrdhvaṁ gacchanti sattva-sthāḥ: as pessoas no modo da bondade podem ir aos planetas superiores. Entretanto, aqueles que estão nos modos da escuridão e da paixão não têm permissão para entrar nos planetas superiores. A palavra divam se refere ao sistema planetário superior conhecido como Svargaloka. Indra, o rei do sistema planetário superior, tem o poder de afastar qualquer alma condicionada que, partindo dos planetas inferiores, tenta ir aos superiores, embora não possua as qualificações necessárias. A tentativa moderna através da qual se busca ir à Lua também é uma tentativa em que os homens inferiores querem ir a Svargaloka através de meios mecânicos artificiais. Semelhante tentativa não pode ser exitosa. Portanto, a afirmativa de Indra parece indicar que todo aquele que tente ir aos sistemas planetários superiores por meios mecânicos, que são aqui chamados de māyā, é condenado a precipitar-se para os planetas infernais, situados na parte inferior do universo. Para ir ao sistema planetário superior, a pessoa precisa ter virtudes em quantidade o bastante. Uma pessoa pecaminosa, situada no modo da ignorância e viciada em bebidas, consumo de carne e prática de sexo ilícito jamais entrará nos planetas superiores por meios mecânicos.
Texto
vajreṇa śata-parvaṇā
śiro hariṣye mandātman
ghaṭasva jñātibhiḥ saha
Sinônimos
saḥ — sou a mesma pessoa poderosa; aham — eu; durmāyinaḥ — de ti, que, com ilusões, podes realizar tantos truques; te — tua; adya — hoje; vajreṇa — com o raio; śata-parvaṇā — que tem centenas de bordas afiadas; śiraḥ — a cabeça; hariṣye — separarei; manda-ātman — ó pessoa de pobre fundo de conhecimento; ghaṭasva — simplesmente tenta manter-te neste campo de batalha; jñātibhiḥ saha — com teus parentes e assistentes.
Tradução
Hoje, com meu raio, que tem centenas de bordas afiadas, eu, a mesma pessoa poderosa, deceparei tua cabeça, separando-a de teu corpo. Embora possas produzir tantos truques ilusórios, és dotado de um pobre fundo de conhecimento. Então, tenta persistir neste campo de batalha com teus amigos e parentes.
Texto
saṅgrāme vartamānānāṁ
kāla-codita-karmaṇām
kīrtir jayo ’jayo mṛtyuḥ
sarveṣāṁ syur anukramāt
Sinônimos
śrī-baliḥ uvaca — Bali Mahārāja disse; saṅgrāme — no campo de batalha; vartamānānām — de todas as pessoas aqui presentes; kāla-codita — influenciadas pelo fator tempo; karmaṇām — para pessoas ocupadas em lutar ou em quaisquer outras atividades; kīrtiḥ — reputação; jayaḥ — vitória; ajayaḥ — derrota; mṛtyuḥ — morte; sarveṣām — de todas elas; syuḥ — devem ser feitas; anukramāt — uma após outra.
Tradução
Bali Mahārāja respondeu: Todos que estão presentes neste campo de batalha decerto estão sob a influência do tempo eterno e, de acordo com as atividades que lhes são designadas, estão destinados a obter, consecutivamente, fama, vitória, derrota e morte.
Comentário
SIGNIFICADO—Se alguém sai vitorioso na batalha, torna-se famoso, mas, se ele não é vitorioso e sai derrotado, pode até mesmo morrer. Existe tanto a possibilidade de vitória quanto a possibilidade de derrota, seja em um campo de batalha como esse, seja no campo de batalha da luta pela existência. Tudo ocorre de acordo com as leis da natureza (prakṛteḥ kriyamāṇāni guṇaiḥ karmāṇi sarvaśaḥ). Uma vez que todos, sem exceção, estão sujeitos aos modos da natureza material, quer alguém saia vitorioso, quer saia derrotado, ele não é independente, senão que está sob o controle da natureza material. Bali Mahārāja, portanto, era muito sensato. Ele sabia que a luta fora determinada pelo tempo eterno e que, sob a influência do tempo, todos devem aceitar os resultados de suas próprias atividades. Portanto, embora Indra estivesse ameaçando matar Bali Mahārāja disparando o raio, Bali Mahārāja não estava temeroso de modo algum. Este é o espírito do kṣatriya: yuddhe cāpy apalāyanam (Bhagavad-gītā 18.43). O kṣatriya deve ser tolerante em todas as circunstâncias, especialmente no campo de batalha. Logo, Bali Mahārāja afirmou que não estava temeroso da morte de maneira alguma, embora fosse ameaçado por uma personalidade tão grandiosa como o rei dos céus.
Texto
jagat paśyanti sūrayaḥ
na hṛṣyanti na śocanti
tatra yūyam apaṇḍitāḥ
Sinônimos
tat — portanto; idam — todo este mundo material; kāla-raśanam — está se movendo devido ao tempo eterno; jagat — movendo-se para adiante (todo este universo); paśyanti — observam; sūrayaḥ — aqueles que são inteligentes porque admitem a verdade; na — não; hṛṣyanti — tornam-se jubilosos; na — nem; śocanti — lamentam-se; tatra — nisso; yūyam — todos vós, semideuses; apaṇḍitāḥ — não muito eruditos (tendo-se esquecido de que estais agindo sob a influência do tempo eterno).
Tradução
Vendo as ações do tempo, aqueles que conhecem a verdade incontestável jamais se rejubilam ou se lamentam em virtude de diferentes circunstâncias. Portanto, como estás jubiloso devido à tua vitória, não deves ser considerado muito sábio.
Comentário
SIGNIFICADO—Bali Mahārāja sabia que Indra, o rei dos céus, era extremamente poderoso – mais poderoso do que ele próprio. Entretanto, Bali Mahārāja desafiou Indra, dizendo que Indra não era muito erudito. Na Bhagavad-gītā (2.11), Kṛṣṇa repreendeu Arjuna dizendo:
prajñā-vādāṁś ca bhāṣase
gatāsūn agatāsūṁś ca
nānuśocanti paṇḍitāḥ
“Enquanto falas palavras cultas, estás lamentando pelo que não é digno de pesar. Sábios são aqueles que não se lamentam nem pelos vivos nem pelos mortos.” Assim, da mesma maneira que Kṛṣṇa desafiou Arjuna, dizendo que ele não era um paṇḍita, ou uma pessoa erudita, também Bali Mahārāja desafiou o rei Indra e seus associados. Neste mundo material, tudo acontece sob a influência do tempo. Consequentemente, para a pessoa erudita que percebe como os fenômenos transcorrem, está fora de cogitação ficar aflita ou feliz devido às ondas da natureza material. Afinal, uma vez que estamos sendo arrastados por essas ondas, qual o significado de ficarmos tristes ou alegres? Aquele que é plenamente versado nas leis da natureza nunca se alegra ou se entristece devido às atividades da natureza. Na Bhagavad-gītā (2.14), Kṛṣṇa aconselha que sejamos tolerantes: tāṁs titikṣasva bhārata. Seguindo esse conselho de Kṛṣṇa, ninguém deve ficar melancólico ou infeliz em decorrência das mudanças circunstanciais. Esse é o sintoma de um devoto. O devoto executa o seu dever em consciência de Kṛṣṇa e jamais é infeliz em circunstâncias adversas. Ele tem fé plena de que, nessas circunstâncias, Kṛṣṇa protege o Seu devoto. Portanto, o devoto jamais se desvia de seu dever prescrito, o serviço devocional. As qualidades materiais de júbilo e melancolia estão presentes até mesmo nos semideuses, que estão bem elevadamente situados no sistema planetário superior. Portanto, quando alguém não se deixa perturbar pelas aparentes circunstâncias favoráveis ou desfavoráveis deste mundo material, deve-se compreender que ele é brahma-bhūta, ou autorrealizado. Como se afirma na Bhagavad-gītā (18.54), brahma-bhūtaḥ prasannātmā na śocati na kāṅkṣati: “Aquele que está situado nessa posição transcendental compreende de imediato o Brahman Supremo e torna-se completamente feliz.” Quando alguém não se deixa perturbar pelas circunstâncias materiais, deve ser considerado como estando em uma fase transcendental, acima da reação dos três modos da natureza material.
Texto
ātmānaṁ tatra sādhanam
giro vaḥ sādhu-śocyānāṁ
gṛhṇīmo marma-tāḍanāḥ
Sinônimos
na — não; vayam — nós; manyamānānām — que estamos considerando; ātmānam — o eu; tatra — na vitória ou na derrota; sādhanam — a causa; giraḥ — as palavras; vaḥ — vossas; sādhu-śocyānām — que merecem a compaixão por parte das pessoas santas; gṛhṇīmaḥ — aceitamos; marma- tāḍanāḥ — que afligem o coração.
Tradução
Vós, semideuses, pensais que vós mesmos sois a causa mediante a qual conquistais fama e vitória. Devido à vossa ignorância, as pessoas santas se compadecem de vós. Portanto, embora vossas palavras aflijam o coração, não as aceitamos.
Texto
ity ākṣipya vibhuṁ vīro
nārācair vīra-mardanaḥ
ākarṇa-pūrṇair ahanad
ākṣepair āha taṁ punaḥ
Sinônimos
śrī-śukaḥ uvāca — Śrī Śukadeva Gosvāmī disse; iti — assim; ākṣipya — castigando; vibhum — ao rei Indra; vīraḥ — o valente Bali Mahārāja; nārācaiḥ — com as flechas chamadas nārācas; vīra-mardanaḥ — Bali Mahārāja, que podia subjugar até mesmo grandes heróis; ākarṇa-pūrṇaiḥ — puxadas até o ouvido; ahanat — atacou; ākṣepaiḥ — com palavras repreensivas; āha — disse; tam — a ele; punaḥ — novamente.
Tradução
Śukadeva Gosvāmī disse: Após dirigir a Indra, o rei dos céus, essas palavras cortantes, Bali Mahārāja, que podia subjugar qualquer outro herói, retesou seu arco e, puxando até o seu ouvido as flechas conhecidas como nārācas, lançou-as na direção de Indra. Então, ele voltou a castigar Indra com fortes palavras.
Texto
vairiṇā tathya-vādinā
nāmṛṣyat tad-adhikṣepaṁ
totrāhata iva dvipaḥ
Sinônimos
evam — assim; nirākṛtaḥ — sendo derrotado; devaḥ — rei Indra; vairiṇā — por seu inimigo; tathya-vādinā — que era competente em falar a verdade; na — não; amṛṣyat — lamentou-se; tat — dele (Bali); adhikṣepam — o castigo; totra — pelo cetro ou bastão; āhataḥ — sendo golpeado; iva — assim como; dvipaḥ — um elefante.
Tradução
Como os insultos que partiram de Mahārāja Bali diziam a verdade, o rei Indra não se ofendeu de modo algum, assim como um elefante açoitado pelo bastão de seu condutor não fica agitado.
Texto
amoghaṁ para-mardanaḥ
sayāno nyapatad bhūmau
chinna-pakṣa ivācalaḥ
Sinônimos
prāharat — infligiu; kuliśam — raio parecido com um cetro; tasmai — a ele (Bali Mahārāja); amogham — infalível; para-mardanaḥ — Indra, que é hábil em derrotar o inimigo; sa-yānaḥ — com seu aeroplano; nyapatat — caiu; bhūmau — no solo; chinna-pakṣaḥ — cujas asas foram removidas; iva — como; acalaḥ — uma montanha.
Tradução
Quando Indra, o derrotador dos inimigos, estando desejoso de matar Bali Mahārāja, disparou contra este o seu infalível raio e cetro, Bali Mahārāja de fato caiu ao solo com o seu aeroplano, como uma montanha com suas asas cortadas.
Comentário
SIGNIFICADO—Em muitas descrições encontradas na literatura védica, menciona-se que as montanhas aladas também voam no céu. Ao morrerem, essas montanhas caem ao solo, onde permanecem como enormes cadáveres.
Texto
jambho bali-sakhaḥ suhṛt
abhyayāt sauhṛdaṁ sakhyur
hatasyāpi samācaran
Sinônimos
sakhāyam — seu amigo íntimo; patitam — tendo caído; dṛṣṭvā — após ver; jambhaḥ — o demônio Jambha; bali-sakhaḥ — um amigo muito íntimo de Bali Mahārāja; suhṛt — e constante benquerente; abhyayāt — entrou em cena; sauhṛdam — amizade muito compassiva; sakhyuḥ — a seu amigo; hatasya — que fora ferido e caíra; api — embora; samācaran — simplesmente para realizar seus deveres de amigo.
Tradução
Ao ver que o seu amigo Bali havia caído, o demônio Jambhāsura apareceu diante de Indra, o inimigo, simplesmente para prestar a Bali Mahārāja seu serviço amistoso.
Texto
gadām udyamya raṁhasā
jatrāv atāḍayac chakraṁ
gajaṁ ca sumahā-balaḥ
Sinônimos
saḥ — Jambhāsura; siṁha-vāhaḥ — sendo carregado por um leão; āsādya — apresentando-se diante do rei Indra; gadām — sua maça; udyamya — empunhando; raṁhasā — com muita força; jatrau — na base do pescoço; atāḍayat — golpeou; śakram — Indra; gajam ca — bem como seu elefante; su-mahā-balaḥ — o poderosíssimo Jambhāsura.
Tradução
O poderosíssimo Jambhāsura, carregado por um leão, aproximou-se de Indra e, com sua maça, golpeou-o fortemente no ombro. Ele também atingiu o elefante de Indra.
Texto
bhṛśaṁ vihvalito gajaḥ
jānubhyāṁ dharaṇīṁ spṛṣṭvā
kaśmalaṁ paramaṁ yayau
Sinônimos
gadā-prahāra-vyathitaḥ — estando machucado devido ao golpe da maça de Jambhāsura; bhṛśam — muito; vihvalitaḥ — agitado; gajaḥ — o elefante; jānubhyām — com seus dois joelhos; dharaṇīm — a terra; spṛṣṭvā — tocando; kaśmalam — inconsciência; paramam — última; yayau — entrou em.
Tradução
Sendo golpeado pela maça de Jambhāsura, o elefante de Indra ficou confuso e ferido. Então, tocou seus joelhos no chão e perdeu a consciência.
Texto
haribhir daśa-śatair vṛtaḥ
ānīto dvipam utsṛjya
ratham āruruhe vibhuḥ
Sinônimos
tataḥ — em seguida; rathaḥ — quadriga; mātalinā — pelo seu quadrigário, chamado Mātali; haribhiḥ — com cavalos; daśa-śataiḥ — dez vezes cem (mil); vṛtaḥ — atrelada; ānītaḥ — sendo trazida; dvipam — o elefante; utsṛjya — deixando de lado; ratham — a quadriga; āruruhe — montou em; vibhuḥ — o grande Indra.
Tradução
Em seguida, Mātali, o quadrigário de Indra, trouxe a quadriga de Indra, que era puxada por mil cavalos. Então, Indra deixou seu elefante e subiu na quadriga.
Texto
yantur dānava-sattamaḥ
śūlena jvalatā taṁ tu
smayamāno ’hanan mṛdhe
Sinônimos
tasya — de Mātali; tat — aquele serviço (trazer a quadriga para Indra); pūjayan — apreciando; karma — esse serviço ao mestre; yantuḥ — do quadrigário; dānava-sat-tamaḥ — o melhor dos demônios, a saber, Jambhāsura; śūlena — com seu tridente; jvalatā — que ardia como fogo; tam — Mātali; tu — na verdade; smayamānaḥ — sorrindo; ahanat — golpeou; mṛdhe — na batalha.
Tradução
Apreciando o serviço de Mātali, Jambhāsura, o melhor dos demônios, sorriu. Entretanto, ele atingiu Mātali na batalha, acertando-lhe um tridente de fogo abrasador.
Texto
sattvam ālambya mātaliḥ
indro jambhasya saṅkruddho
vajreṇāpāharac chiraḥ
Sinônimos
sehe — tolerou; rujam — a dor; su-durmarṣām — intolerável; sattvam — paciência; ālambya — refugiando-se na; mātaliḥ — o quadrigário Mātali; indraḥ — rei Indra; jambhasya — do grande demônio Jambha; saṅkruddhaḥ — estando muito irado contra ele; vajreṇa — com seu raio; apāharat — separou; śiraḥ — a cabeça.
Tradução
Embora a dor fosse extremamente severa, Mātali tolerou-a com grande paciência. Indra, no entanto, que ficou deveras irado com Jambhāsura, golpeou-o com seu raio e, então, decepou-lhe a cabeça.
Texto
jñātayo nāradād ṛṣeḥ
namuciś ca balaḥ pākas
tatrāpetus tvarānvitāḥ
Sinônimos
jambham — Jambhāsura; śrutvā — após ficarem sabendo; hatam — fora morto; tasya — seus; jñātayaḥ — amigos e parentes; nāradāt — por intermédio de Nārada; ṛṣeḥ — do grande santo; namuciḥ — o demônio Namuci; ca — também; balaḥ — o demônio Bala; pākaḥ — o demônio Pāka; tatra — lá; āpetuḥ — chegaram imediatamente; tvarā-anvitāḥ — com muita pressa.
Tradução
Quando Nārada Ṛṣi informou aos amigos e parentes de Jambhāsura que este fora morto, os três demônios chamados Namuci, Bala e Pāka apressaram-se em chegar ao campo de batalha.
Texto
ardayanto ’sya marmasu
śarair avākiran meghā
dhārābhir iva parvatam
Sinônimos
vacobhiḥ — com palavras ásperas; paruṣaiḥ — muito rudes e cruéis; indram — rei Indra; ardayantaḥ — castigando, ofendendo; asya — de Indra; marmasu — no coração etc.; śaraiḥ — com flechas; avākiran — coberto em toda a volta; meghāḥ — nuvens; dhārābhiḥ — com torrentes de chuva; iva — assim como; parvatam — uma montanha.
Tradução
Repreendendo Indra com palavras ásperas e cruéis que machucavam o coração, esses demônios lançaram nele uma saraivada de flechas, assim como torrentes de chuva que lavam uma grande montanha.
Texto
haryaśvasya balaḥ śaraiḥ
tāvadbhir ardayām āsa
yugapal laghu-hastavān
Sinônimos
harīn — cavalos; dośa-śatāni — dez vezes cem (mil); ājau — no campo de batalha; haryaśvasya — do rei Indra; balaḥ — o demônio Bala; śaraiḥ — com flechas; tāvadbhiḥ — com o mesmo número; ardayām āsa — atribulou; yugapat — simultaneamente; laghu-hastavān — com rápido domínio.
Tradução
Dominando rapidamente a situação no campo de batalha, o demônio Bala causou tribulações a todos os mil cavalos de Indra, simultaneamente despedaçando todos eles com o mesmo número de flechas.
Texto
rathaṁ sāvayavaṁ pṛthak
sakṛt sandhāna-mokṣeṇa
tad adbhutam abhūd raṇe
Sinônimos
śatābhyām — com duzentas flechas; mātalim — contra o quadrigário Mātali; pākaḥ — o demônio chamado Pāka; ratham — a quadriga; sa-avayavam — com toda a parafernália; pṛthak — separadamente; sakṛt — de uma vez; sandhāna — ajustando as flechas ao arco; mokṣeṇa — e disparando; tat — tal ação; adbhutam — maravilhosa; abhūt — tornou-se então; raṇe — no campo de batalha.
Tradução
Pāka, outro demônio, atacou tanto a quadriga, com toda a sua parafernália, quanto o quadrigário Mātali, ajustando duas mil flechas a seu arco e disparando todas elas de uma só vez. Esse ato no campo de batalha foi de fato maravilhoso.
Texto
svarṇa-puṅkhair maheṣubhiḥ
āhatya vyanadat saṅkhye
satoya iva toyadaḥ
Sinônimos
namuciḥ — o demônio chamado Namuci; pañca-daśabhiḥ — com quinze; svarṇa-puṅkhaiḥ — às quais estavam presas penas douradas; mahā-iṣubhiḥ — flechas muito poderosas; āhatya — penetrantes; vyanadat — ressoaram; saṅkhye — no campo de batalha; sa-toyaḥ — carregado de água; iva — como; toya-daḥ — uma nuvem carregada.
Tradução
Então, Namuci, outro demônio, atacou Indra e o feriu com quinze poderosíssimas flechas de pena dourada, que rugiam como uma nuvem cheia de água.
Texto
śakraṁ saratha-sārathim
chādayām āsur asurāḥ
prāvṛṭ-sūryam ivāmbudāḥ
Sinônimos
sarvataḥ — em toda a volta; śara-kūṭena — por uma densa nuvem de flechas; śakram — Indra; sa-ratha — com sua quadriga; sārathim — e com seu quadrigário; chādayām āsuḥ — cobriram; asurāḥ — todos os demônios; prāvṛṭ — na estação das chuvas; sūryam — o Sol; iva — como; ambu-dāḥ — nuvens.
Tradução
Outros demônios alvejaram Indra, juntamente com sua quadriga e o seu quadrigário, com incessantes chuvas de flechas, assim como as nuvens cobrem o Sol na estação das chuvas.
Texto
vicukruśur deva-gaṇāḥ sahānugāḥ
anāyakāḥ śatru-balena nirjitā
vaṇik-pathā bhinna-navo yathārṇave
Sinônimos
alakṣayantaḥ — sendo incapazes de ver; tam — o rei Indra; atīva — ferozmente; vihvalāḥ — confusos; vicukruśuḥ — começaram a lamentar-se; deva-gaṇāḥ — todos os semideuses; saha-anugāḥ — com seus seguidores; anāyakāḥ — sem nenhum capitão ou líder; śatru-balena — pelo poder superior de seus inimigos; nirjitāḥ — severamente oprimidos; vaṇik-pathāḥ — mercadores; bhinna-navaḥ — cuja nau está avariada; yathā arṇave — como no meio do oceano.
Tradução
Os semideuses, sendo severamente oprimidos por seus inimigos e incapazes de ver Indra no campo de batalha, ficaram muito ansiosos. Não tendo capitão ou líder, começaram a se lamentar, como mercadores em uma nau que sofre avarias no meio do oceano.
Comentário
SIGNIFICADO—Através desta afirmativa, parece que, no sistema planetário superior, há navegação, e que lá os navegadores têm esse dever ocupacional. Às vezes, como neste planeta, esses mercadores naufragam no meio do oceano. Tudo indica que, mesmo no sistema planetário superior, tais calamidades acontecem ocasionalmente. O sistema planetário superior criado pelo Senhor decerto não é vazio nem desprovido de entidades vivas. Consta do Śrīmad-Bhāgavatam que, assim como a Terra, todos os planetas estão cheios de entidades vivas. Não há razão para alguém aceitar que não existem seres vivos em outros planetas.
Texto
vinirgataḥ sāśva-ratha-dhvajāgraṇīḥ
babhau diśaḥ khaṁ pṛthivīṁ ca rocayan
sva-tejasā sūrya iva kṣapātyaye
Sinônimos
tataḥ — depois disso; turāṣāt — outro nome de Indra; iṣu-baddha-pañjarāt — da gaiola formada pela rede de flechas; vinirgataḥ — libertando-se; sa — com; aśva — cavalos; ratha — quadriga; dhvaja — bandeira; agraṇīḥ — e quadrigário; babhau — tornou-se; diśaḥ — todas as direções; kham — o céu; pṛthivīm — a Terra; ca — e; rocayan — satisfazendo toda parte; sva-tejasā — com sua refulgência pessoal; sūryaḥ — o Sol; iva — como; kṣapā-atyaye — no final da noite.
Tradução
Depois disso, Indra libertou-se da gaiola formada pela rede de flechas. Aparecendo com sua quadriga, bandeira, cavalo e quadrigário e, assim, satisfazendo o céu, a Terra e todas as direções, ele brilhava com muito fulgor, tal qual o Sol depois que a noite termina. Todos viram que Indra estava belo e resplandecente.
Texto
parair abhyarditāṁ raṇe
udayacchad ripuṁ hantuṁ
vajraṁ vajra-dharo ruṣā
Sinônimos
nirīkṣya — após observar; pṛtanām — seus próprios soldados; devaḥ — o semideus Indra; paraiḥ — pelos inimigos; abhyarditām — postos em grandes dificuldades ou oprimidos; raṇe — no campo de batalha; udayacchat — pegou de; ripum — os inimigos; hantum — para matar; vajram — o raio; vajra-dharaḥ — o portador do raio; ruṣā — com muita ira.
Tradução
Ao ver que seus próprios soldados estavam sendo bastante oprimidos pelos inimigos no campo de batalha, Indra, que é conhecido como Vajra-dhara, o portador do raio, ficou muito irado. Foi então que ele empunhou seu raio para matar os inimigos.
Texto
śirasī bala-pākayoḥ
jñātīnāṁ paśyatāṁ rājañ
jahāra janayan bhayam
Sinônimos
saḥ — ele (Indra); tena — com isto; eva — na verdade; aṣṭa-dhāreṇa — com o raio; śirasī — as duas cabeças; bala-pākayoḥ — dos dois demônios conhecidos como Bala e Pāka; jñātīnām paśyatām — enquanto seus parentes e soldados observavam; rājan — ó rei; jahāra — (Indra) cortou; janayan — criando; bhayam — medo (entre eles).
Tradução
Ó rei Parīkṣit, o rei Indra usou seu raio para cortar a cabeça de Bala e Pāka na presença de todos os seus parentes e seguidores. Dessa maneira, ele criou uma atmosfera muito amedrontadora no campo de batalha.
Texto
śokāmarṣa-ruṣānvitaḥ
jighāṁsur indraṁ nṛpate
cakāra paramodyamam
Sinônimos
namuciḥ — o demônio Namuci; tat — daqueles dois demônios; vadham — o massacre; dṛṣṭvā — após ver; śoka-amarṣa — lamentação e pesar; ruṣā-anvitaḥ — estando muito irado com isso; jighāṁsuḥ — quis matar; indram — rei Indra; nṛ-pate — ó Mahārāja Parīkṣit; cakāra — fez; parama — um grande; udyamam — esforço.
Tradução
Ó rei, ao ver o extermínio de Bala e Pāka, Namuci, outro demônio, ficou cheio de pesar e lamentação. Então, com muita ira, tentou seriamente matar Indra.
Texto
ghaṇṭāvad dhema-bhūṣaṇam
pragṛhyābhyadravat kruddho
hato ’sīti vitarjayan
prāhiṇod deva-rājāya
ninadan mṛga-rāḍ iva
Sinônimos
aśmasāra-mayam — de aço; śūlam — uma lança; ghaṇṭā-vat — à qual estavam presos alguns sinos; hema-bhūṣaṇam — decorada com ornamentos de ouro; pragṛhya — empunhando; abhyadravat — dirigiu-se com arrojo; kruddhaḥ — em um temperamento de ira; hataḥ asi iti — agora, morrerás; vitarjayan — rugindo dessa maneira; prāhiṇot — arremessou; deva-rājāya — contra o rei Indra; ninadan — bramindo; mṛga-rāṭ — um leão; iva — como.
Tradução
Estando irado e rugindo como um leão, o demônio Namuci empunhou uma lança de aço, à qual estavam presos alguns sinos e que estava decorada com ornamentos de ouro. Ele gritou muito alto: “Agora, morrerás!” Então, apresentando-se diante de Indra para matá-lo, Namuci disparou sua arma.
Texto
vicicchide harir iṣubhiḥ sahasradhā
tam āhanan nṛpa kuliśena kandhare
ruṣānvitas tridaśa-patiḥ śiro haran
Sinônimos
tadā — naquele momento; apatat — caindo como um meteoro; gagana-tale — sob o céu ou no chão; mahā-javam — extremamente poderosa; vicicchide — despedaçou; hariḥ — Indra; iṣubhiḥ — com suas flechas; sahasradhā — em milhares de pedaços; tam — aquele Namuci; āhanat — golpeou; nṛpa — ó rei; kuliśena — com seu raio; kandhare — no ombro; ruṣā-anvitaḥ — estando muito irado; tridaśa-patiḥ — Indra, o rei dos semideuses; śiraḥ — a cabeça; haran — para separar.
Tradução
Ó rei, ao ver essa poderosíssima lança caindo ao chão como um meteoro abrasador, Indra, o rei dos céus, imediatamente a despedaçou com suas flechas. Então, estando muito irado, golpeou o ombro de Namuci com seu raio a fim de decepar sua cabeça.
Texto
bibheda yaḥ sura-patinaujaseritaḥ
tad adbhutaṁ param ativīrya-vṛtra-bhit
tiraskṛto namuci-śirodhara-tvacā
Sinônimos
na — não; tasya — dele (Namuci); hi — na verdade; tvacam api — nem mesmo a pele; vajraḥ — o raio; ūrjitaḥ — muito poderoso; bibheda — pôde trespassar; yaḥ — a arma que; sura-patinā — pelo rei dos semideuses; ojasā — muito impetuosamente; īritaḥ — foi arremessada; tat — portanto; adbhutam param — era muito surpreendente; ativīrya-vṛtra-bhit — tão poderosa que podia dilacerar o corpo do poderosíssimo Vṛtrāsura; tiraskṛtaḥ — (agora, passado algum tempo) que havia sido repelida; namuci-śirodhara-tvacā — pela pele do pescoço de Namuci.
Tradução
Embora o rei Indra arremessasse com muita força o seu raio contra Namuci, não pôde nem mesmo trespassar sua pele. É muito surpreendente que o famoso raio que havia varado o corpo de Vṛtrāsura nem mesmo pôde ferir levemente a pele do pescoço de Namuci.
Texto
vajraḥ pratihato yataḥ
kim idaṁ daiva-yogena
bhūtaṁ loka-vimohanam
Sinônimos
tasmāt — portanto; indraḥ — o rei dos céus; abibhet — ficou muito amedrontado; śatroḥ — do inimigo (Namuci); vajraḥ — o raio; pratihataḥ — foi incapaz de ferir e retornou; yataḥ — porque; kim idam — o que é isso; daiva-yogena — devido a alguma força superior; bhūtam — isso aconteceu; loka-vimohanam — tão maravilhoso para as pessoas em geral.
Tradução
Ao perceber que o raio ricocheteou após alcançar o inimigo, Indra ficou com muito medo e começou a se perguntar se isso havia acontecido em razão de algum poder miraculoso superior.
Comentário
SIGNIFICADO—O raio de Indra é invencível, de modo que, ao ver que o raio regressara sem causar nenhum ferimento em Namuci, Indra decerto ficou muito temeroso.
Texto
pakṣa-cchedaḥ prajātyaye
kṛto niviśatāṁ bhāraiḥ
patattraiḥ patatāṁ bhuvi
Sinônimos
yena — com o mesmo raio; me — por mim; pūrvam — outrora; adrīṇām — das montanhas; pakṣa-cchedaḥ — o ato de cortar as asas; prajā-atyaye — quando havia morte das pessoas em geral; kṛtaḥ — foi feito; niviśatām — daquelas montanhas que entravam; bhāraiḥ — devido ao grande peso; patattraiḥ — com asas; patatām — caindo; bhuvi — no chão.
Tradução
Indra pensou: Outrora, quando muitas montanhas aladas voavam no céu e caíam ao chão, matando as pessoas, eu cortava suas asas com este mesmo raio.
Texto
vṛtro yena vipāṭitaḥ
anye cāpi balopetāḥ
sarvāstrair akṣata-tvacaḥ
Sinônimos
tapaḥ — austeridades; sāra-mayam — poderosíssimas; tvāṣṭram — realizadas por Tvaṣṭā; vṛtraḥ — Vṛtrāsura; yena — pelo qual; vipāṭitaḥ — foi morto; anye — outros; ca — também; api — na verdade; bala-upetāḥ — pessoas muito poderosas; sarva — todas as categorias; astraiḥ — por armas; akṣata — não ficando ferida; tvacaḥ — a pele deles.
Tradução
Vṛtrāsura era a essência das austeridades a que Tvaṣṭā se submeteu, apesar do que o raio o matou. Na verdade, não apenas ele, mas também muitos outros heróis intrépidos, cuja pele não podia ser ferida por nenhuma classe de armas, foram mortos pelo mesmo raio.
Texto
mayā mukto ’sure ’lpake
nāhaṁ tad ādade daṇḍaṁ
brahma-tejo ’py akāraṇam
Sinônimos
saḥ ayam — portanto, este raio; pratihataḥ — repelido; vajraḥ — raio; mayā — por mim; muktaḥ — arremessado; asure — contra aquele demônio; alpake — menos importante; na — não; aham — eu; tat — isto; ādade — segurar; daṇḍam — agora ele é como um mero bastão; brahma-tejaḥ — tão poderoso como um brahmāstra; api — embora; akāraṇam — agora ele é inútil.
Tradução
Mas agora, embora tenha sido arremessado contra um demônio menos importante, o mesmo raio não surtiu efeito. Portanto, embora ele estivesse na mesma categoria de um brahmāstra, tornou-se inútil como um bastão ordinário. Por conseguinte, deixarei de mantê-lo em minha posse.
Texto
āha vāg aśarīriṇī
nāyaṁ śuṣkair atho nārdrair
vadham arhati dānavaḥ
Sinônimos
iti — dessa maneira; śakram — a Indra; viṣīdantam — lamentando-se; āha — falou; vāk — uma voz; aśarīriṇī — sem nenhum corpo, ou vinda do céu; na — não; ayam — isto; śuṣkaiḥ — por nada seco; atho — também; na — nem; ārdraiḥ — por nada úmido; vadham — aniquilação; arhati — está sujeito a; dānavaḥ — este demônio (Namuci).
Tradução
Śukadeva Gosvāmī continuou: Enquanto Indra estava taciturno e lamentava-se dessa maneira, ouviu-se uma voz sentenciosa proferir no céu as seguintes palavras: “Este demônio Namuci não pode ser aniquilado por nada seco nem úmido.”
Texto
mṛtyur naivārdra-śuṣkayoḥ
ato ’nyaś cintanīyas te
upāyo maghavan ripoḥ
Sinônimos
mayā — por mim; asmai — a ele; yat — porque; varaḥ — uma bênção; dattaḥ — foi concedida; mṛtyuḥ — morte; na — não; eva — na verdade; ārdra — quer por algo úmido; śuṣkayoḥ — ou por algo seco; ataḥ — portanto; anyaḥ — algum outro método; cintanīyaḥ — deve ser descoberto; te — por ti; upāyaḥ — meio; maghavan — ó Indra; ripoḥ — do teu inimigo.
Tradução
A voz também disse: “Ó Indra, porque dei a esse demônio a bênção de que ele jamais será morto por alguma arma seca ou úmida, deves descobrir outra maneira de matá-lo.”
Texto
maghavān susamāhitaḥ
dhyāyan phenam athāpaśyad
upāyam ubhayātmakam
Sinônimos
tām — aquela; daivīm — agourenta; giram — voz; ākarṇya — após ouvir; maghavān — senhor Indra; su-samāhitaḥ — ficando muito cauteloso; dhyāyan — meditando; phenam — aparência de espuma; atha — depois disso; apaśyat — ele viu; upāyam — o meio; ubhaya-ātmakam — simultaneamente seca e molhada.
Tradução
Após ouvir a voz agourenta, Indra, com muita atenção, começou a meditar em como matar o demônio. Foi então que ele deduziu que deveria usar a espuma, visto que ela não é nem seca nem molhada.
Texto
jahāra namuceḥ śiraḥ
taṁ tuṣṭuvur muni-gaṇā
mālyaiś cāvākiran vibhum
Sinônimos
na — nem; śuṣkeṇa — por meios secos; na — nem; ca — também; ārdreṇa — com uma arma molhada; jahāra — ele separou; namuceḥ — de Namuci; śiraḥ — a cabeça; tam — a ele (Indra); tuṣṭuvuḥ — satisfizeram; muni-gaṇāḥ — todos os sábios; mālyaiḥ — com guirlandas de flores; ca — também; avākiran — cobriram; vibhum — aquela grande personalidade.
Tradução
Assim, Indra, o rei dos céus, decepou a cabeça de Namuci com uma arma de espuma, que não era nem seca nem molhada. Então, todos os sábios satisfizeram Indra, a excelsa personalidade, derramando flores e guirlandas sobre ele, encobrindo-o quase completamente.
Comentário
SIGNIFICADO—Com relação a isso, os śruti-mantras dizem que apāṁ phenena namuceḥ śira indro ’dārayat: Indra matou Namuci com uma espuma aquosa, a qual não é nem seca, nem molhada.
Texto
viśvāvasu-parāvasū
deva-dundubhayo nedur
nartakyo nanṛtur mudā
Sinônimos
gandharva-mukhyau — os dois líderes dos Gandharvas; jagatuḥ — começaram a cantar belas canções; viśvāvasu — chamado Viśvāvasu; parāvasū — chamado Parāvasu; deva-dundubhayaḥ — os timbales tocados pelos semideuses; neduḥ — faziam seu som; nartakyaḥ — as dançarinas conhecidas como Apsarās; nanṛtuḥ — começaram a dançar; mudā — com grande felicidade.
Tradução
Viśvāvasu e Parāvasu, os dois líderes dos Gandharvas, cantaram com grande felicidade. Os timbales dos semideuses ressoaram, e as Apsarās dançaram com alegria.
Texto
vāyv-agni-varuṇādayaḥ
sūdayām āsur asurān
mṛgān kesariṇo yathā
Sinônimos
anye — outros; api — também; evam — dessa maneira; pratidvandvān — o grupo oposto de beligerantes; vāyu — o semideus conhecido como Vāyu; agni — o semideus conhecido como Agni; varuṇa-ādayaḥ — o semideus conhecido como Varuṇa e outros; sūdayām āsuḥ — começaram a matar vigorosamente; asurān — todos os demônios; mṛgān — veado; kesariṇaḥ — leões; yathā — assim como.
Tradução
Assim como leões matam veados em uma floresta, Vāyu, Agni, Varuṇa e outros semideuses começaram a matar os demônios que se opunham a eles.
Texto
devarṣir nārado nṛpa
vārayām āsa vibudhān
dṛṣṭvā dānava-saṅkṣayam
Sinônimos
brahmaṇā — pelo senhor Brahmā; preṣitaḥ — enviado; devān — aos semideuses; deva-ṛṣiḥ — o grande sábio dos planetas celestiais; nāradaḥ — Nārada Muni; nṛpa — ó rei; vārayām āsa — proibiu; vibudhān — todos os semideuses; dṛṣṭvā — após ver; dānava-saṅkṣayam — a aniquilação total dos demônios.
Tradução
Ó rei, ao ver que era iminente a total aniquilação dos demônios, o senhor Brahmā enviou uma mensagem através de Nārada, que se apresentou perante os semideuses para fazê-los descontinuarem a luta.
Texto
bhavadbhir amṛtaṁ prāptaṁ
nārāyaṇa-bhujāśrayaiḥ
śriyā samedhitāḥ sarva
upāramata vigrahāt
Sinônimos
śrī-nāradaḥ uvāca — Nārada Muni pediu aos semideuses; bhavadbhiḥ — por todos vós; amṛtam — néctar; prāptam — foi obtido; nārāyaṇa — da Suprema Personalidade de Deus; bhuja-āśrayaiḥ — sendo protegidos pelos braços; śriyā — por toda a fortuna; samedhitāḥ — prosperastes; sarve — todos vós; upāramata — agora cessai; vigrahāt — esta luta.
Tradução
O grande sábio Nārada disse: Todos vós, semideuses, sois protegidos pelos braços de Nārāyaṇa, a Suprema Personalidade de Deus, e, por Sua graça, obtivestes o néctar. Pela graça da deusa da fortuna, sois gloriosos em todos os sentidos. Portanto, por favor, cessai esta luta.
Texto
saṁyamya manyu-saṁrambhaṁ
mānayanto muner vacaḥ
upagīyamānānucarair
yayuḥ sarve triviṣṭapam
Sinônimos
śrī-śukaḥ uvāca — Śrī Śukadeva Gosvāmī disse; saṁyamya — controlando; manyu — da ira; saṁrambham — a exacerbação; mānayantaḥ — aceitando; muneḥ vacaḥ — as palavras de Nārada Muni; upagīyamāna — sendo louvados; anucaraiḥ — por seus seguidores; yayuḥ — retornaram; sarve — todos os semideuses; triviṣṭapam — aos planetas celestiais.
Tradução
Śrī Śukadeva Gosvāmī disse: Aceitando as palavras de Nārada, os semideuses abrandaram sua ira e pararam de lutar. Louvados por seus seguidores, eles retornaram aos seus planetas celestiais.
Texto
nāradānumatena te
baliṁ vipannam ādāya
astaṁ girim upāgaman
Sinônimos
ye — alguns dos demônios que; avaśiṣṭāḥ — permaneceram; raṇe — nas lutas; tasmin — naquela; nārada-anumatena — por ordem de Nārada; te — todos eles; balim — Mahārāja Bali; vipannam — em situação adversa; ādāya — pegando; astam — chamada Asta; girim — à montanha; upāgaman — foram.
Tradução
Seguindo as ordens de Nārada Muni, todos os demônios que permaneceram no campo de batalha pegaram Bali Mahārāja, que estava em uma situação precária, e o levaram à colina conhecida como Astagiri.
Texto
vidyamāna-śirodharān
uśanā jīvayām āsa
saṁjīvanyā sva-vidyayā
Sinônimos
tatra — naquela colina; avinaṣṭa-avayavān — os demônios que foram mortos, mas não haviam perdido as partes de seu corpo; vidyamāna-śirodharān — cujas cabeças ainda permaneciam em seus corpos; uśanāḥ — Śukrācārya; jīvayām āsa — ressuscitou; saṁjīvanyā — através do mantra Saṁjīvanī; sva-vidyayā — por seu próprio mérito.
Tradução
Ali naquela colina, Śukrācārya ressuscitou todos os soldados demoníacos que, embora mortos, não houvessem perdido a cabeça, o tronco e os membros. Ele conseguiu isso através de seu mantra pessoal, conhecido como Saṁjīvanī.
Texto
pratyāpannendriya-smṛtiḥ
parājito ’pi nākhidyal
loka-tattva-vicakṣaṇaḥ
Sinônimos
baliḥ — Mahārāja Bali; ca — também; uśanasā — por Śukrācārya; spṛṣṭaḥ — sendo tocado; pratyāpanna — foi trazida de volta; indriya-smṛtiḥ — percepção das ações dos sentidos e da memória; parājitaḥ — ele foi derrotado; api — embora; na akhidyat — ele não se lamentou; loka-tattva-vicakṣaṇaḥ — porque era muito experiente nos afazeres universais.
Tradução
Bali Mahārāja era muito experiente nos afazeres universais. Quando, pela graça de Śukrācārya, recobrou seus sentidos e sua memória, pôde entender tudo o que havia acontecido. Portanto, embora tenha sido derrotado, não ficou lamentando-se.
Comentário
SIGNIFICADO—É expressivo que Bali Mahārāja seja aqui definido como muito experiente. Embora derrotado, ele não ficou pesaroso de modo algum, pois sabia que nada podia acontecer sem a sanção da Suprema Personalidade de Deus. Porque era um devoto, ele aceitou sua derrota e não se lamentou. Como a Suprema Personalidade de Deus afirma na Bhagavad-gītā (2.47): karmaṇy evādhikāras te mā phaleṣu kadācana. Todas as pessoas em consciência de Kṛṣṇa devem executar o seu dever, sem se preocuparem com a vitória ou com a derrota. Todos devem executar o seu dever conforme a ordem de Kṛṣṇa ou de Seu representante, o mestre espiritual. Ānukūlyena kṛṣṇānuśīlanaṁ bhaktir uttamā. No serviço devocional perfeito, sempre são acatadas as ordens e a vontade de Kṛṣṇa.
Neste ponto, encerram-se os Significados Bhaktivedanta do oitavo canto, décimo primeiro capítulo, do Śrīmad-Bhāgavatam, intitulado “O Rei Indra Aniquila os Demônios”.