CAPÍTULO QUARENTA E CINCO
Kṛṣṇa Resgata o Filho de Seu Mestre
Este capítulo descreve como o Senhor Kṛṣṇa consolou Devakī, Vasudeva e Nanda Mahārāja e instalou Ugrasena como rei. Relata também como Kṛṣṇa e Balarāma completaram Sua educação, recuperaram o filho morto de Seu guru e, em seguida, voltaram para casa.
Notando que Seus pais – Vasudeva e Devakī – haviam percebido Sua verdadeira posição como Deus, Śrī Kṛṣṇa expandiu Sua yogamāyā para de novo fazê-los pensar nEle como seu filho querido. Então, com o Senhor Balarāma, Kṛṣṇa aproximou-Se deles e disse como estava infeliz por Ele e Seus pais não terem podido desfrutar a satisfação mútua de pais e filhos que vivem juntos. Então, Ele disse: “Nem mesmo com uma duração de vida de cem anos, pode um filho pagar, em algum momento, a dívida que tem para com seus pais, de quem ele recebe o próprio corpo. Qualquer filho apto que deixe de amparar seus pais será forçado, na vida seguinte, a comer sua própria carne. De fato, qualquer um que não mantenha e sustente seus dependentes – filhos, esposa, mestres espirituais, brāhmaṇas, pais idosos e assim por diante – não passa de um morto-vivo. Foi por medo de Kaṁsa que não pudemos servir-vos, então agora, por favor, perdoai-Nos.” Vasudeva e Devakī, dominados pela emoção ao ouvir estas palavras de Śrī Kṛṣṇa, abraçaram seus dois filhos e, em êxtase, derramaram uma torrente de lágrimas.
Tendo satisfeito assim Sua mãe e Seu pai, o Senhor Kṛṣṇa ofereceu o reino de Kaṁsa a Seu avô materno, Ugrasena, após o que providenciou para que todos os membros de Sua família que haviam fugido por temor a Kaṁsa retornassem para suas casas. Protegidos pelos poderosos braços de Kṛṣṇa e Balarāma, os Yādavas passaram a desfrutar de suprema bem-aventurança.
Kṛṣṇa e Balarāma, em seguida, aproximaram-Se de Nanda Mahārāja e louvaram-no por ter cuidado dEles, filhos alheios, com tanto amor. Kṛṣṇa, então, disse a Nanda: “Querido pai, por favor, volta para Vraja. Sabendo o quanto tua pessoa e Nossos outros parentes estais sofrendo por saudade de Nós, Eu e Balarāma iremos ver-vos logo que tivermos satisfeito vossos amigos aqui em Mathurā.” Depois dessas palavras, Kṛṣṇa adorou Nanda com várias oferendas, e Nanda ficou dominado de amor por seus filhos. Depois de abraçar Kṛṣṇa e Balarāma com lágrimas nos olhos, ele partiu para Vraja levando os vaqueiros consigo. A seguir, Vasudeva solicitou a seus sacerdotes que celebrassem o ritual de segundo nascimento de seus filhos, a iniciação bramânica. Kṛṣṇa e Balarāma, então, foram ter com Garga Muni para aceitar o voto de brahmacarya, celibato. Depois disso, Kṛṣṇa e Balarāma, embora oniscientes, quiseram residir na escola de um mestre espiritual, de modo que foram morar com Sāndīpani Muni em Avantīpura.
Para ensinarem a maneira correta de respeitar o próprio guru, Kṛṣṇa e Balarāma serviram Seu mestre espiritual com grande devoção, como o fariam com a Deidade do próprio Senhor Supremo. Sāndīpani Muni, satisfeito com o serviço dEles, transmitiu-Lhes conhecimento detalhado acerca de todos os Vedas, bem como de seus seis corolários e das Upaniṣads. Kṛṣṇa e Balarāma só precisavam ouvir cada assunto uma vez para assimilá-lo por completo, e assim, em sessenta e quatro dias, Eles aprenderam as sessenta e quatro artes tradicionais.
Antes de Se despedirem de Seu guru, os dois Senhores ofereceram a Sāndīpani Muni qualquer presente que ele quisesse. O sábio Sāndīpani, vendo a espantosa potência dEles, pediu-Lhes que trouxessem de volta seu filho, que morrera no oceano em Prabhāsa.
Kṛṣṇa e Balarāma montaram em uma quadriga e foram para Prabhāsa, onde Se aproximaram da margem e adoraram a deidade que rege o oceano. Kṛṣṇa pediu que o oceano devolvesse o filho de Seu mestre espiritual, e o senhor do oceano respondeu que um demônio chamado Pāñcajana, que morava no oceano, levara embora o menino. Ouvindo isso, Śrī Kṛṣṇa entrou no oceano, matou aquele demônio e tomou o búzio que crescera de seu corpo. Contudo, por não encontrar o filho de Seu guru dentro do ventre do demônio, Kṛṣṇa foi para o planeta de Yamarāja, o senhor da morte. Ao ouvir Kṛṣṇa soar o búzio Pāñcajanya, Yamarāja apresentou-se diante dEle e adorou-O com devoção. O Senhor Kṛṣṇa, então, pediu a Yamarāja o filho de Sāndīpani Muni, e Yamarāja de imediato o entregou aos dois Senhores.
Kṛṣṇa e Balarāma, então, voltaram para Seu mestre espiritual e deram-lhe seu filho como presente, pedindo-lhe que escolhesse mais um favor. Sāndīpani Muni, porém, respondeu que, por ter obtido discípulos tais como Eles, todos os seus desejos estavam satisfeitos. Então, ele Os instruiu a voltarem para casa.
Kṛṣṇa e Balarāma viajaram de quadriga para Sua casa, e, ao chegarem, todos os cidadãos sentiram ilimitado êxtase por vê-lOs, assim como pessoas que recuperam um tesouro perdido.
Texto
pitarāv upalabdhārthau
viditvā puruṣottamaḥ
mā bhūd iti nijāṁ māyāṁ
tatāna jana-mohinīm
Sinônimos
śrī-śukaḥ uvāca — Śukadeva Gosvāmī disse; pitarau — Seus pais; upalabdha — tendo compreendido; arthau — a ideia (de Sua posição opulenta como Deus); viditvā — sabendo; puruṣa-uttamaḥ — a Suprema Personalidade; mā bhūt iti — “isso não deve ser”; nijām — Sua pessoal; māyām — potência ilusória; tatāna — Ele expandiu; jana — Seus devotos; mohinīm — que confunde.
Tradução
Śukadeva Gosvāmī disse: Compreendendo que Seus pais estavam ficando cientes de Suas opulências transcendentais, a Suprema Personalidade de Deus julgou correto não permitir que isso acontecesse. Assim, Ele expandiu Sua yogamāyā, que confunde os devotos.
Comentário
SIGNIFICADO—Se Vasudeva e Devakī tivessem visto Kṛṣṇa como o Deus onipotente, seu intenso amor por Ele como filho teria sido arruinado. O Senhor Kṛṣṇa não queria isso. Em vez disso, o Senhor queria desfrutar com eles o amor extático de vātsalya-rasa, a relação entre pais e filhos. Como Śrīla Prabhupāda costumava salientar, embora normalmente pensemos em Deus como o pai supremo, na consciência de Kṛṣṇa podemos entrar nos passatempos do Senhor e fazer o papel de pais dEle, intensificando, dessa maneira, o nosso amor por Ele.
Śrīla Viśvanātha Cakravartī Ṭhākura ressalta que a palavra jana pode ser traduzida nesta passagem como “devotos”, tal como no verso dīyamānaṁ na gṛhṇanti vinā mat-sevanaṁ janaḥ. (Śrīmad-Bhāgavatam 3.29.13) Ele explica ainda que jana também pode ser traduzido como “pais”, pois jana deriva do verbo jan, que, na forma causativa (janayate), significa “gerar ou dar à luz”. Neste sentido da palavra (como em jananī ou janakau), o termo jana-mohinī indica que o Senhor estava para expandir Sua potência ilusória interna para que Vasudeva e Devakī voltassem a amá-lO como seu querido filho.
Texto
sāgrajaḥ sātvatarṣabhaḥ
praśrayāvanataḥ prīṇann
amba tāteti sādaram
Sinônimos
uvāca — Ele disse; pitarau — a Seus pais; etya — aproximando-Se deles; sa — junto de; agra-jaḥ — Seu irmão mais velho, o Senhor Balarāma; sātvata — da dinastia Sātvata; ṛṣabhaḥ — o mais eminente herói; praśraya — com humildade; avanataḥ — prostrando-Se; prīṇan — satisfazendo-os; amba tāta iti — “Minha querida mãe, Meu querido pai”; sa-ādaram — com respeito.
Tradução
O Senhor Kṛṣṇa, o mais eminente dos Sātvatas, aproximou-Se de Seus pais junto com Seu irmão mais velho. Inclinando humildemente a cabeça e satisfazendo-os com expressões respeitosas tais como “Minha querida mãe” e “Meu querido pai”, Kṛṣṇa disse as seguintes palavras.
Texto
nityotkaṇṭhitayor api
bālya-paugaṇḍa-kaiśorāḥ
putrābhyām abhavan kvacit
Sinônimos
na — não; asmattaḥ — por causa de Nós; yuvayoḥ — para vós dois; tāta — ó querido pai; nitya — sempre; utkaṇṭhitayoḥ — que estivestes em ansiedade; api — de fato; bālya — (os prazeres da) idade de bebê; paugaṇḍa — meninice; kaiśorāḥ — e adolescência; putrābhyām — por causa de teus dois filhos; abhavan — houve; kvacit — absolutamente.
Tradução
[O Senhor Kṛṣṇa disse:] Querido pai, por causa de Nós, teus dois filhos, tu e mãe Devakī permanecestes sempre ansiosos e jamais pudestes gozar Nossa infância, meninice ou adolescência.
Comentário
SIGNIFICADO—Śrīla Viśvanātha Cakravartī discute este verso da seguinte maneira: “Talvez alguém objete que, neste ponto, o Senhor Kṛṣṇa, na verdade, ainda não passara da fase kaiśora [dos dez aos quinze anos de idade], pois as mulheres de Mathurā haviam afirmado que kva cāti-sukumārāṅgau kiśorau nāpta-yauvanau: ‘Kṛṣṇa e Balarāma têm membros corpóreos muito delicados, por estarem ainda na fase kaiśora, não tendo alcançado a adolescência.’ (Śrīmad-Bhāgavatam 10.44.8) A definição das diferentes fases do crescimento é dada a seguir:
paugaṇḍaṁ daśamāvadhi
kaiśoram ā-pañcadaśād
yauvanaṁ tu tataḥ param
‘A fase kaumāra dura até os cinco anos, paugaṇḍa dura até os dez, e kaiśora dura até os quinze anos. Daí em diante, chama-se yauvana.’ De acordo com esta afirmação, o período kaiśora termina aos quinze anos de idade. Kṛṣṇa tinha apenas onze anos quando matou Kaṁsa, segundo as palavras de Uddhava, ekādaśa-samās tatra gūḍhārciḥ sa-balo ’vasat: ‘Como uma chama encoberta, o Senhor Kṛṣṇa permaneceu ali incógnito com Balarāma durante onze anos.’ (Śrīmad-Bhāgavatam 3.2.26) E visto que Kṛṣṇa e Balarāma nunca receberam a iniciação bramânica em Vrajabhūmi, foi na ocasião [em que Eles foram para Mathurā] quando Sua fase kaiśora começou, e não quando terminou.
“Esta objeção à afirmação do Senhor Kṛṣṇa no presente verso – de que Seus pais não puderam desfrutar Sua fase kaiśora – baseia-se na contagem comum de idade. Mas devemos considerar a seguinte afirmação:
rāmaḥ kṛṣṇaś ca go-vraje
aghṛṣṭa-jānubhiḥ padbhir
vicakramatur añjasā
‘Ó rei Parīkṣit, dentro de pouquíssimo tempo, Rāma e Kṛṣṇa começaram a caminhar muito facilmente em Gokula sobre Suas pernas, com Sua própria força, sem a necessidade de engatinhar.’ (Bhāgavatam 10.8.26) Às vezes, vemos que o filho de um rei, mesmo em sua fase paugaṇḍa de vida, desenvolve excepcional força física e exibe atividades próprias de um kaiśora. Então, o que se dizer do Senhor Kṛṣṇa, cujo crescimento excepcional está estabelecido no Vaiṣṇava-toṣaṇī, Bhakti-rasāmṛta-sindhu, Ānanda-vṛndavana-campū e outras obras?
“Os três anos e quatro meses que o Senhor Kṛṣṇa ficou em Mahāvana foram o equivalente a cinco anos para uma criança comum, e assim, naquele período, Ele completou Sua fase kaumāra da infância. O período que vai desde então até os seis anos e oito meses de idade, durante os quais Ele viveu em Vṛndāvana, constitui Sua fase paugaṇḍa. E o período que vai dos seis anos e oito meses até a idade de dez anos, em que Ele viveu em Nandīśvara [Nandagrāma], constitui Sua fase kaiśora. Então, com a idade de dez anos e sete meses, no décimo primeiro dia da quinzena da lua nova do mês de Caitra, Ele foi para Mathurā e, depois, no décimo quarto dia, Ele matou Kaṁsa. Dessa forma, Ele completou Seu período kaiśora aos dez anos, e permanece eternamente nessa idade. Em outras palavras, devemos entender que, deste ponto em diante, o Senhor permanece para sempre um kiśora.”
Assim, Śrīla Viśvanātha Cakravartī analisa as complexidades deste verso.
Texto
vāso nau bhavad-antike
yāṁ bālāḥ pitṛ-geha-sthā
vindante lālitā mudam
Sinônimos
na — não; labdhaḥ — obtida; daiva — pelo destino; hatayoḥ — que fomos privados; vāsaḥ — residência; nau — por Nós; bhavat-antike — tua presença; yām — que; bālāḥ — filhos; pitṛ — de seus pais; geha — no lar; sthāḥ — permanecendo; vindante — experimentam; lālitāḥ — mimados; mudam — felicidade.
Tradução
Privados pelo destino, não pudemos viver contigo e gozar da mimada felicidade que a maioria das crianças desfruta na casa dos pais.
Comentário
SIGNIFICADO—O Senhor Kṛṣṇa ressalta nesta passagem que não só Seus pais sofreram com a separação dEle e de Balarāma, senão que os dois meninos também sofreram por estarem separados de Seus pais.
Texto
janitaḥ poṣito yataḥ
na tayor yāti nirveśaṁ
pitror martyaḥ śatāyuṣā
Sinônimos
sarva — de todas; artha — as metas da vida; sambhavaḥ — a fonte; dehaḥ — o corpo; janitaḥ — nascido; poṣitaḥ — mantido; yataḥ — de quem; na — não; tayoḥ — a eles; yāti — consegue-se; nirveśam — pagar a dívida; pitroḥ — aos pais; martyaḥ — um mortal; śata — de cem (anos); āyuṣā — com uma duração de vida.
Tradução
Com o corpo, podemos lograr todas as metas da vida, e são nossos pais que proporcionam nascimento e sustento ao corpo. Portanto, nenhum homem mortal pode pagar a dívida que tem para com os pais, mesmo que os sirva por toda uma vida de cem anos.
Comentário
SIGNIFICADO—Depois de afirmar que “tanto vós, Nossos pais, como Nós sofremos por causa de Nossa separação”, agora Kṛṣṇa diz que os princípios religiosos dEle e de Balarāma foram arruinados por Sua deficiência em corresponder Seus pais.
Texto
ātmanā ca dhanena ca
vṛttiṁ na dadyāt taṁ pretya
sva-māṁsaṁ khādayanti hi
Sinônimos
yaḥ — quem; tayoḥ — deles; ātma-jaḥ — um filho; kalpaḥ — capaz; ātmanā — com seus recursos físicos; ca — e; dhanena — com sua riqueza; ca — também; vṛttim — sustento; na dadyāt — não dá; tam — a ele; pretya — depois de morrer; sva — sua própria; māṁsam — carne; khādayanti — fazem comer; hi — de fato.
Tradução
Um filho que, embora capaz de fazê-lo, deixa de amparar seus pais com os próprios recursos físicos e riquezas, é forçado a comer a própria carne depois da morte.
Texto
bhāryāṁ sādhvīṁ sutam śiśum
guruṁ vipraṁ prapannaṁ ca
kalpo ’bibhrac chvasan-mṛtaḥ
Sinônimos
mātaram — a própria mãe; pitaram — e pai; vṛddham — idosos; bhāryām — a esposa; sādhvīm — casta; sutam — filho; śiśum — muito jovem; gurum — o mestre espiritual; vipram — um brāhmaṇa; prapannam — uma pessoa que recorreu a alguém em busca de abrigo; ca — e; kalpaḥ — capaz; abibhrat — não mantendo; śvasan — respirando; mṛtaḥ — morto.
Tradução
Um homem que, embora capaz de fazê-lo, deixa de sustentar seus pais idosos, esposa casta, filho pequeno ou mestre espiritual, ou que despreza um brāhmaṇa ou qualquer um que recorra a ele em busca de abrigo, é considerado morto, embora respire.
Texto
nityam udvigna-cetasoḥ
mogham ete vyatikrāntā
divasā vām anarcatoḥ
Sinônimos
tat — por isso; nau — de Nós dois; akalpayoḥ — que estávamos incapazes; kaṁsāt — por causa de Kaṁsa; nityam — sempre; udvigna — perturbadas; cetasoḥ — cujas mentes; mogham — inutilmente; ete — estes; vyatikrāntāḥ — passados; divasāḥ — dias; vām — a vós; anarcatoḥ — não honrando.
Tradução
Incapazes como estávamos de honrar-vos de maneira conveniente porque Nossas mentes viviam perturbadas pelo temor a Kaṁsa, desperdiçamos assim todos esses dias.
Comentário
SIGNIFICADO—O Senhor Kṛṣṇa continua a reconduzir Vasudeva e Devakī a seus sentimentos normais de pais em relação a Ele e Balarāma. Uma criança comum teria medo de um rei cruel e tirânico como Kaṁsa, e o Senhor Kṛṣṇa aqui faz o papel de semelhante criança, evocando a compaixão parental de Vasudeva e Devakī dessa maneira.
Texto
mātar nau para-tantrayoḥ
akurvator vāṁ śuśrūṣāṁ
kliṣṭayor durhṛdā bhṛśam
Sinônimos
tat — isto; kṣantum — de perdoar; arhathaḥ — fazei o favor; tāta — ó pai; mātaḥ — ó mãe; nau — de Nossa parte; para-tantrayoḥ — que estamos sob o controle alheio; akurvatoḥ — não executando; vām — vosso; śuśrūṣām — serviço; kliṣṭayoḥ — obrigados a sofrer; durhṛdā — pelo (Kaṁsa) de coração de pedra; bhṛśam — grandemente.
Tradução
Queridos pai e mãe, por favor, perdoai-Nos por não vos termos servido. Não somos independentes e fomos muito importunados pelo cruel Kaṁsa.
Comentário
SIGNIFICADO—Segundo a gramática sânscrita, os termos para-tantrayoḥ e kliṣṭayoḥ podem referir-se também a Vasudeva e Devakī. De fato, Vasudeva e Devakī estavam sob o controle da Providência e foram perturbados pelas atividades de Kaṁsa, ao passo que Śrī Kṛṣṇa é sempre a absoluta Personalidade de Deus.
Texto
iti māyā-manuṣyasya
harer viśvātmano girā
mohitāv aṅkam āropya
pariṣvajyāpatur mudam
Sinônimos
śrī-śukaḥ uvāca — Śukadeva Gosvāmī disse; iti — assim; māyā — por Sua potência ilusória interna; manuṣyasya — dEle que aparece como um ser humano; hareḥ — o Senhor Śrī Hari; viśva — do universo; ātmanaḥ — a Alma; girā — pelas palavras; mohitau — confundidos; aṅkam — sobre seus colos; āropya — erguendo; pariṣvajya — abraçando; āpatuḥ — ambos experimentaram; mudam — alegria.
Tradução
Śukadeva Gosvāmī disse: Iludidos assim pelas palavras do Senhor Hari, a Alma Suprema do universo, que parecia um ser humano devido à Sua potência ilusória interna, Seus pais alegremente puseram-nO em seus colos e abraçaram-nO.
Texto
sneha-pāśena cāvṛtau
na kiñcid ūcatū rājan
bāṣpa-kaṇṭhau vimohitau
Sinônimos
siñcantau — derramando; aśru — de lágrimas; dhārābhiḥ — chuvas; sneha — da afeição; pāśena — pela corda; ca — e; āvṛtau — envolvidos; na — não; kiñcit — nada; ūcatuḥ — falaram; rājan — ó rei (Parīkṣit); bāṣpa — (cheias de) lágrimas; kaṇṭhau — cujas gargantas; vimohitau — perplexos.
Tradução
Derramando uma chuva de lágrimas sobre o Senhor, Seus pais, que estavam atados pela corda da afeição, não conseguiram falar. Eles ficaram perplexos, ó rei, e suas gargantas, embargadas pelo choro e lágrimas.
Texto
bhagavān devakī-sutaḥ
mātāmahaṁ tūgrasenaṁ
yadūnām akaron ṇṛpam
Sinônimos
evam — dessa maneira; āśvāsya — assegurando; pitarau — Seus pais; bhagavān — o Senhor Supremo; devakī-sutaḥ — o filho de Devakī; mātāmaham — Seu avô materno; tu — e; ugrasenam — Ugrasena; yadūnām — dos Yadus; akarot — Ele fez; nṛpam — rei.
Tradução
Tendo assim confortado Sua mãe e Seu pai, a Suprema Personalidade de Deus, que apareceu como o filho de Devakī, instalou Seu avô materno, Ugrasena, como o rei dos Yadus.
Texto
prajāś cājñaptum arhasi
yayāti-śāpād yadubhir
nāsitavyaṁ nṛpāsane
Sinônimos
āha — Ele (o Senhor Kṛṣṇa) disse; ca — e; asmān — a Nós; mahā-rāja — ó grande rei; prajāḥ — teus súditos; ca — também; ājñaptum arhasi — por favor, comanda; yayāti — do antigo rei Yayāti; śāpāt — por causa da maldição; yadubhiḥ — os Yadus; na āsitavyam — não devem sentar-se; nṛpa — real; āsane — no trono.
Tradução
O Senhor lhe disse: Ó poderoso rei, somos teus súditos, então, por favor, comanda-Nos. De fato, por causa da maldição de Yayāti, nenhum Yadu pode sentar-se no trono real.
Comentário
SIGNIFICADO—Ugrasena talvez dissesse ao Senhor: “Meu querido Senhor, na verdade, és Tu que deves ocupar o trono.” Antecipando-Se a essa afirmação, o Senhor Kṛṣṇa disse a Ugrasena que, por causa da antiga maldição de Yayāti, os príncipes da dinastia Yadu tecnicamente não podiam sentar-se no trono real, de modo que Kṛṣṇa e Balarāma não eram idôneos para essa posição. É evidente que Ugrasena também podia ser considerado parte da dinastia Yadu, mas, pela ordem do Senhor, ele pôde assumir o trono real. Em conclusão, esses eram todos passatempos que o Senhor Supremo desfrutava enquanto fazia o papel de ser humano.
Texto
bhavato vibudhādayaḥ
baliṁ haranty avanatāḥ
kim utānye narādhipāḥ
Sinônimos
mayi — quando Eu; bhṛtye — como servo; upāsīne — estou presente em atitude de serviço; bhavataḥ — a ti; vibudha — os semideuses; ādayaḥ — e assim por diante; balim — tributo; haranti — trarão; avanatāḥ — prostrados em humildade; kim uta — então, o que se dizer de; anye — outros; nara — de homens; adhipāḥ — governantes.
Tradução
Visto que estou presente em teu séquito como teu assistente pessoal, todos os semideuses e outras eminentes personalidades virão de cabeça inclinada oferecer-te tributo. Então, o que dizer dos governantes dos homens?
Comentário
SIGNIFICADO—O Senhor Kṛṣṇa volta a garantir a Ugrasena que ele deve assumir o trono com confiança.
Texto
digbhyaḥ kaṁsa-bhayākulān
yadu-vṛṣṇy-andhaka-madhu
dāśārha-kukurādikān
videśāvāsa-karśitān
nyavāsayat sva-geheṣu
vittaiḥ santarpya viśva-kṛt
Sinônimos
sarvān — todos; svān — os Seus; jñāti — parentes próximos; sambandhān — e outros familiares; digbhyaḥ — de todas as direções; kaṁsa-bhaya — por temor a Kaṁsa; ākulān — perturbados; yadu-vṛṣṇi-andhaka-madhu-dāśārha kukura-ādikān — os Yadus, Vṛṣṇis, Andhakas, Madhus, Dāśārhas, Kukuras etc.; sabhājitān — honrados; samāśvāsya — consolando-os; videśa — em regiões estrangeiras; āvāsa — de viver; karśitān — abatidos; nyavāsayat — Ele estabeleceu; sva — em suas próprias; geheṣu — casas; vittaiḥ — com presentes valiosos; santarpya — satisfazendo; viśva — do universo; kṛt — o criador.
Tradução
O Senhor, então, trouxe de volta todos os Seus parentes próximos e outros familiares dos vários lugares para onde eles haviam fugido por temor a Kaṁsa. Ele recebeu os Yadus, Vṛṣṇis, Andhakas, Madhus, Dāśārhas, Kukuras e outros clãs com a devida honra, e também os consolou, pois terem morado em terras estrangeiras foi algo que os havia consumido. Em seguida, o Senhor Kṛṣṇa, o criador do universo, restabeleceu-os em suas casas e deu-lhes valiosos presentes.
Texto
guptā labdha-manorathāḥ
gṛheṣu remire siddhāḥ
kṛṣṇa-rāma-gata-jvarāḥ
mukunda-vadanāmbujam
nityaṁ pramuditaṁ śrīmat
sa-daya-smita-vīkṣaṇam
Sinônimos
kṛṣṇa-saṅkarṣaṇa — de Kṛṣṇa e Balarāma; bhujaiḥ — pelos braços; guptāḥ — protegidos; labdha — obtendo; manaḥ-rathāḥ — seus desejos; gṛheṣu — em seus lares; remire — desfrutavam; siddhāḥ — perfeitamente satisfeitos; kṛṣṇa-rāma — por causa de Kṛṣṇa e Balarāma; gata — cessada; jvarāḥ — a febre (da vida material); vīkṣantaḥ — vendo; ahaḥ ahaḥ — dia após dia; prītāḥ — amorosos; mukunda — do Senhor Kṛṣṇa; vadana — o rosto; ambujam — semelhante ao lótus; nityam — sempre; pramuditam — jovial; śrīmat — belos; sa-daya — misericordiosos; smita — sorridentes; vīkṣaṇam — cujos olhares.
Tradução
Os membros desses clãs, protegidos pelos braços do Senhor Kṛṣṇa e do Senhor Saṅkarṣaṇa, sentiam que todos os seus desejos estavam satisfeitos. Assim, enquanto viviam em casa com suas famílias, desfrutavam de uma felicidade perfeita. Devido à presença de Kṛṣṇa e Balarāma, eles não mais sofriam da febre da existência material. Todo dia, esses amorosos devotos podiam ver o sempre jovial rosto de lótus de Mukunda, o qual era adornado por olhares belos, misericordiosos e sorridentes.
Texto
yuvāno ’ti-balaujasaḥ
pibanto ’kṣair mukundasya
mukhāmbuja-sudhāṁ muhuḥ
Sinônimos
tatra — lá (em Mathurā); pravayasaḥ — os mais velhos; api — mesmo; āsan — eram; yuvānaḥ — jovens; ati — tendo abundante; bala — força; ojasaḥ — e vitalidade; pibantaḥ — bebendo; akṣaiḥ — com os olhos; mukundasya — do Senhor Kṛṣṇa; mukha-ambuja — do rosto de lótus; sudhām — o néctar; muhuḥ — repetidamente.
Tradução
Até os mais idosos habitantes da cidade pareciam jovens e cheios de força e vitalidade, porque, com os olhos, eles bebiam constantemente o elixir do rosto de lótus do Senhor Mukunda.
Texto
bhagavān devakī-sutaḥ
saṅkarṣaṇaś ca rājendra
pariṣvajyedam ūcatuḥ
Sinônimos
atha — então; nandam — de Nanda Mahārāja; samāsādya — aproximando-Se; bhagavān — o Senhor Supremo; devakī-sutaḥ — Kṛṣṇa, o filho de Devakī; saṅkarṣaṇaḥ — o Senhor Balarāma; ca — e; rāja-indra — ó excelso rei (Parīkṣit); pariṣvajya — abraçando-o; idam — isto; ūcatuḥ — disseram.
Tradução
Então, ó excelso rei Parīkṣit, o Supremo Senhor Kṛṣṇa, o filho de Devakī, junto do Senhor Balarāma, aproximaram-Se de Nanda Mahārāja. Os dois Senhores abraçaram-no e, então, disseram-lhe o seguinte.
Texto
poṣitau lālitau bhṛśam
pitror abhyadhikā prītir
ātmajeṣv ātmano ’pi hi
Sinônimos
pitaḥ — ó pai; yuvābhyām — por vós ambos; snigdhābhyām — afetuosos; poṣitau — mantidos; lālitau — mimados; bhṛśam — completamente; pitroḥ — para os pais; abhyadhikā — maior; prītiḥ — amor; ātmajeṣu — pelos filhos; ātmanaḥ — do que por si próprios; api — mesmo; hi — de fato.
Tradução
[Kṛṣṇa e Balarāma disseram:] Ó pai, tu e mãe Yaśodā mantivestes-Nos com muita afeição e cuidaram muitíssimo de Nós! De fato, os pais têm mais amor pelos filhos do que têm por suas próprias vidas.
Texto
yau puṣṇītāṁ sva-putra-vat
śiśūn bandhubhir utsṛṣṭān
akalpaiḥ poṣa-rakṣaṇe
Sinônimos
saḥ — ele; pitā — pai; sā — ela; ca — e; jananī — mãe; yau — os quais; puṣṇītām — nutrem; sva — seus próprios; putra — filhos; vat — como; śiśūn — crianças; bandhubhiḥ — por sua família; utsṛṣṭān — abandonadas; akalpaiḥ — que são incapazes; poṣa — de manter; rakṣaṇe — e proteger.
Tradução
Verdadeiros pai e mãe são aqueles que cuidam, como se fossem os próprios filhos, de crianças abandonadas pelos parentes incapazes de sustentá-los e protegê-los.
Texto
vayaṁ ca sneha-duḥkhitān
jñātīn vo draṣṭum eṣyāmo
vidhāya suhṛdāṁ sukham
Sinônimos
yata — ide, por favor; yūyam — todos vós (vaqueiros); vrajam — para Vraja; tāta — Meu querido pai; vayam — Nós; ca — e; sneha — devido à amorosa afeição; duḥkhitān — desditosos; jñātīn — parentes; vaḥ — vós; draṣṭum — ver; eṣyāmaḥ — iremos; vidhāya — depois de conceder; suhṛdām — a vossos amorosos amigos; sukham — felicidade.
Tradução
Agora, querido pai, todos vós deveis regressar a Vraja. Faremos uma visita a vós, Nossos queridos parentes que sofreis devido à saudade de Nós, logo que tivermos dado alguma felicidade a vossos amigos benquerentes.
Comentário
SIGNIFICADO—O Senhor indica nesta passagem o Seu desejo de satisfazer Seus queridos devotos de Mathurā – Vasudeva, Devakī e outros membros da dinastia Yadu –, os quais, durante Sua longa estada em Vṛndāvana, não tiveram a Sua companhia.
Texto
nandaṁ sa-vrajam acyutaḥ
vāso-’laṅkāra-kupyādyair
arhayām āsa sādaram
Sinônimos
evam — desta maneira; sāntvayya — consolando; bhagavān — a Suprema Personalidade de Deus; nandam — o rei Nanda; sa-vrajam — junto com os outros homens de Vraja; acyutaḥ — o Senhor infalível; vāsaḥ — com roupas; alaṅkāra — joias; kupya — vasilhas feitas de metais que não ouro nem prata; ādyaiḥ — e assim por diante; arhayām āsa — Ele os honrou; sa-ādaram — respeitosamente.
Tradução
Consolando assim Nanda Mahārāja e os outros homens de Vraja, o infalível Senhor Supremo honrou-os respeitosamente dando-lhes de presente roupas, joias, utensílios domésticos e assim por diante.
Texto
nandaḥ praṇaya-vihvalaḥ
pūrayann aśrubhir netre
saha gopair vrajaṁ yayau
Sinônimos
iti — assim; uktaḥ — falado; tau — a Eles dois; pariṣvajya — abraçando; nandaḥ — Nanda Mahārāja; praṇaya — pela afeição; vihvalaḥ — dominado; pūrayan — enchendo-se; aśrubhiḥ — de lágrimas; netre — seus olhos; saha — junto com; gopaiḥ — os vaqueiros; vrajam — para Vraja; yayau — foi.
Tradução
Nanda Mahārāja ficou dominado pela afeição ao ouvir as palavras de Kṛṣṇa, e seus olhos encheram-se de lágrimas quando abraçou os dois Senhores. Então, voltou para Vraja com os vaqueiros.
Comentário
SIGNIFICADO—Śrīla Viśvanātha Cakravartī escreveu um extenso significado para este verso, analisando com detalhes esta seção dos passatempos do Senhor Kṛṣṇa. Assim como um homem coloca seu ouro precioso no fogo para revelar sua pureza, o Senhor colocou Seus mais amados devotos, os residentes de Vṛndāvana, no fogo da separação dEle a fim de que manifestassem seu supremo amor. Esta é a essência dos comentários do ācārya Viśvanātha.
Texto
putrayoḥ samakārayat
purodhasā brāhmaṇaiś ca
yathāvad dvija-saṁskṛtim
Sinônimos
atha — então; śūra-sutaḥ — o filho de Śūrasena (Vasudeva); rājan — ó rei (Parīkṣit); putrayoḥ — de seus dois filhos; samakārayat — mandou fazer; purodhasā — por um sacerdote; brāhmaṇaiḥ — por brāhmaṇas; ca — e; yathā-vat — como convém; dvija-saṁskṛtim — iniciação bramânica.
Tradução
Meu querido rei, em seguida, Vasudeva, o filho de Śūrasena, providenciou que um sacerdote e outros brāhmaṇas realizassem a iniciação de segundo nascimento de seus dois filhos.
Texto
rukma-mālāḥ sv-alaṅkṛtāḥ
sv-alaṅkṛtebhyaḥ sampūjya
sa-vatsāḥ kṣauma-mālinīḥ
Sinônimos
tebhyaḥ — a eles (os brāhmaṇas); adāt — deu; dakṣiṇāḥ — presentes como remuneração; gāvaḥ — vacas; rukma — de ouro; mālāḥ — com colares; su — bem; alaṅkṛtāḥ — ornamentadas; su-alaṅkṛtebhyaḥ — aos bem ornamentados (brāhmaṇas); sampūjya — adorando-os; sa — tendo; vatsāḥ — bezerros; kṣauma — de linho; mālinīḥ — usando guirlandas.
Tradução
Vasudeva honrou esses brāhmaṇas adorando-os e dando-lhes ornamentos finos e vacas bem adornadas acompanhadas de seus bezerros. Todas essas vacas usavam colares de ouro e guirlandas de linho.
Texto
mano-dattā mahā-matiḥ
tāś cādadād anusmṛtya
kaṁsenādharmato hṛtāḥ
Sinônimos
yāḥ — as quais (vacas); kṛṣṇa-rāma — de Kṛṣṇa e Balarāma; janmarkṣe — no dia do nascimento; manaḥ — em sua mente; dattāḥ — dadas em caridade; mahā-matiḥ — o magnânimo (Vasudeva); tāḥ — a elas; ca — e; ādadāt — deu; anusmṛtya — lembrando; kaṁsena — por Kaṁsa; adharmataḥ — impiedosamente; hṛtāḥ — levadas embora.
Tradução
O magnânimo Vasudeva lembrou-se, então, das vacas que havia dado mentalmente por ocasião do nascimento de Kṛṣṇa e Balarāma. Kaṁsa roubara aquelas vacas, e Vasudeva agora as recuperou e deu-as também em caridade.
Comentário
SIGNIFICADO—Na ocasião do aparecimento de Kṛṣṇa, Vasudeva fora aprisionado por Kaṁsa, que havia roubado todas as suas vacas. Mesmo assim, Vasudeva ficara tão jubiloso com o nascimento do Senhor que havia doado mentalmente dez mil de suas vacas aos brāhmaṇas.
Agora, após a morte de Kaṁsa, Vasudeva tomou de volta todas as suas vacas do rebanho do rei falecido e deu dez mil delas, segundo os princípios religiosos, aos dignos brāhmaṇas.
Texto
dvijatvaṁ prāpya su-vratau
gargād yadu-kulācāryād
gāyatraṁ vratam āsthitau
Sinônimos
tataḥ — então; ca — e; labdha — tendo recebido; saṁskārau — iniciação (Kṛṣṇa e Balarāma); dvijatvam — a condição de duas vezes nascidos; prāpya — alcançando; su-vratau — sinceros em Seus votos; gargāt — de Garga Muni; yadu-kula — da dinastia Yadu; ācāryāt — do mestre espiritual; gāyatram — de celibato; vratam — o voto; āsthitau — assumido.
Tradução
Após atingirem, através da iniciação, a condição de duas vezes nascidos, os Senhores, sinceros em Seus votos, aceitaram ainda de Garga Muni, o mestre espiritual dos Yadus, o voto de celibato.
Comentário
SIGNIFICADO—Tanto Śrīdhara Svāmī quanto Viśvanātha Cakravartī Ṭhākura explicam o termo gāyatraṁ vratam como o voto de brahmacarya, ou celibato na vida estudantil. Kṛṣṇa e Balarāma estavam fazendo o papel de estudantes perfeitos no caminho da autorrealização. É claro que, na degradada era moderna, a vida estudantil tornou-se algo selvagem e animalesco, repleto de sexo ilícito e drogas.
Texto
sarva-jñau jagad-īśvarau
nānya-siddhāmalaṁ jñānaṁ
gūhamānau narehitaiḥ
icchantāv upajagmatuḥ
kāśyaṁ sāndīpaniṁ nāma
hy avanti-pura-vāsinam
Sinônimos
prabhavau — Eles que eram a origem; sarva — de todas as variedades; vidyānām — de conhecimento; sarva-jñau — oniscientes; jagat-īśvarau — os Senhores do universo; na — não; anya — de alguma outra fonte; siddha — conseguido; amalam — impecável; jñānam — conhecimento; gūhamānau — escondendo; nara — semelhantes a humanas; īhitaiḥ — por Suas atividades; atha u — então; guru — do mestre espiritual; kule — na escola; vāsam — residência; icchantau — desejando; upajagatuḥ — Eles Se aproximaram; kāśyam — o nativo de Kāśī (Benares); sāndīpanim nāma — chamado Sāndīpani; hi — de fato; avanti-pura — na cidade de Avantī (hoje Ujjain); vāsinam — que morava.
Tradução
Ocultando Seu perfeito conhecimento inato por meio de Suas atividades aparentemente humanas, aqueles dois oniscientes Senhores do universo, sendo Eles mesmos a origem de todos os ramos do conhecimento, desejaram, em seguida, residir na escola de um mestre espiritual. Por isso, aproximaram-Se de Sāndīpani Muni, um nativo de Kāśi que morava na cidade de Avantī.
Texto
gurau vṛttim aninditām
grāhayantāv upetau sma
bhaktyā devam ivādṛtau
Sinônimos
yathā — de modo conveniente; upasādya — obtendo; tau — a Eles; dāntau — que eram autocontrolados; gurau — ao mestre espiritual; vṛttim — serviço; aninditām — irrepreensível; grāhayantau — fazendo que outros adotassem; upetau — aproximando-Se para servir; sma — de fato; bhaktyā — som devoção; devam — ao Senhor Supremo; iva — como se; ādṛtau — respeitados (pelo guru).
Tradução
Sāndīpani tinha em altíssima estima estes dois discípulos autocontrolados, que ele obtivera de forma tão imprevista. Servindo-o com tanta devoção como alguém serviria ao próprio Senhor Supremo, Eles mostraram aos outros um exemplo irrepreensível de adoração ao mestre espiritual.
Texto
śuddha-bhāvānuvṛttibhiḥ
provāca vedān akhilān
sāṅgopaniṣado guruḥ
Sinônimos
tayoḥ — dEles; dvija-varaḥ — o melhor dos brāhmaṇas (Sāndīpani); tuṣṭaḥ — satisfeito; śuddha — puro; bhāva — com amor; anuvṛttibhiḥ — pelos atos submissos; provāca — falou; vedān — os Vedas; akhilān — todos; sa — junto com; aṅga — os (seis) textos corolários; upaniṣadaḥ — e as Upaniṣads; guruḥ — o mestre espiritual.
Tradução
Por estar satisfeito com o comportamento submisso dEles, aquele melhor dos brāhmaṇas, o mestre espiritual Sāndīpani, ensinou-Lhes os Vedas por inteiro, junto de seus seis corolários e as Upaniṣads.
Texto
dharmān nyāya-pathāṁs tathā
tathā cānvīkṣikīṁ vidyāṁ
rāja-nītiṁ ca ṣaḍ-vidhām
Sinônimos
sa-rahasyam — junto de sua porção confidencial; dhanuḥ-vedam — a ciência das armas militares; dharmān — as doutrinas da lei humana; nyāya — de lógica; pathān — os métodos; tathā — também; tathā ca — e igualmente; ānvīkṣikīm — de debate filosófico; vidyām — o ramo de conhecimento; rāja-nītim — a ciência política; ca — e; ṣaṭ-vidhām — em seis aspectos.
Tradução
Ele também Lhes ensinou o dhanur-veda, com seus segredos mais confidenciais; os livros normativos de lei; os métodos de raciocínio lógico e debate filosófico, bem como a ciência política, que é dividida em seis ramos.
Comentário
SIGNIFICADO—Śrīla Śrīdhara Svāmī explica que a parte confidencial do dhanurveda, a ciência militar, inclui o conhecimento a respeito dos mantras apropriados e das deidades que regem a guerra. Dharmān refere-se à Manu-saṁhitā e outros livros normativos de lei (dharma-śāstras). Nyāya-pathān refere-se à doutrina de karma-mīmāṁsā e outras teorias semelhantes. Ānvīkṣikīm é o conhecimento das técnicas de argumento lógico (tarka). As seis divisões da ciência política são bastante pragmáticas e incluem: (1) sandhi, fazer a paz; (2) vigraha, guerrear; (3) yāna, marchar; (4) āsana, determinar-se a não ceder ao inimigo; (5) dvaidha, dividir as forças, e (6) saṁśaya, buscar a proteção de um governante mais poderoso.
Texto
sarva-vidyā-pravartakau
sakṛn nigada-mātreṇa
tau sañjagṛhatur nṛpa
saṁyattau tāvatīḥ kalāḥ
guru-dakṣiṇayācāryaṁ
chandayām āsatur nṛpa
Sinônimos
sarvam — tudo; nara-vara — dos homens de primeira classe; śreṣṭhau — os melhores; sarva — de todos; vidyā — os ramos de conhecimento; pravartakau — os iniciadores; sakṛt — uma vez; nigada — sendo relatados; matreṇa — apenas; tau — Eles; sañjagṛhatuḥ — assimilaram por completo; nṛpa — ó rei (Parīkṣit); ahaḥ — em dias; rātraiḥ — e noites; catuḥ-ṣaṣṭyā — sessenta e quatro; saṁyattau — fixos em concentração; tāvatīḥ — tantas; kalāḥ — artes; guru-dakṣiṇayā — com o presente tradicional ao mestre espiritual antes de deixá-lo; ācāryam — Seu mestre; chandayām āsatuḥ — satisfizeram; nṛpa — ó rei.
Tradução
Ó rei, aquelas excelentíssimas pessoas, Kṛṣṇa e Balarāma, sendo Eles mesmos os promulgadores originais de todas as variedades de conhecimento, puderam assimilar de imediato toda e qualquer matéria depois de ouvi-la ser explicada apenas uma vez. Assim, com concentração fixa, Eles aprenderam as sessenta e quatro artes e ofícios durante o mesmo número de dias e noites. Depois, ó rei, Eles satisfizeram Seu mestre espiritual oferecendo-lhe guru-dakṣiṇā.
Comentário
SIGNIFICADO—A seguinte lista compreende as sessenta e quatro matérias aprendidas pelo Senhor Kṛṣṇa e o Senhor Balarāma em sessenta e quatro dias. Informações adicionais podem ser encontradas na obra Kṛṣṇa, a Suprema Personalidade de Deus, de Śrīla Prabhupāda.
Os Senhores aprenderam a: (1) gītam, cantar; (2) vādyam, tocar instrumentos musicais; (3) nṛtyam, dançar; (4) nāṭyam, encenar; (5) ālekhyam, pintar; (6) viśeṣaka-cchedyam, pintar o rosto e o corpo com unguentos e cosméticos coloridos; (7) taṇḍula-kusuma-bali-vikārāḥ, preparar desenhos auspiciosos no chão com arroz e flores; (8) puṣpāstaraṇam, fazer um leito de flores; (9) daśana-vasanāṅga-rāgāḥ, colorir as roupas, dentes e membros do corpo; (10) maṇi-bhūmikā-karma, incrustar joias no assoalho; (11) śayyā-racanam, arrumar a cama; (12) udaka-vādyam, reproduzir sons em cântaros com água; (13) udaka-ghātaḥ, borrifar com água; (14) citra-yogāḥ, misturar cores; (15) mālya-grathana-vikalpāḥ, preparar guirlandas; (16) śekharāpīḍa-yojanam, colocar um elmo na cabeça; (17) nepathya-yogāḥ, vestir trajes em um camarim; (18) karṇa-patra-bhaṅgāḥ, enfeitar o lóbulo da orelha; (19) sugandha-yuktiḥ, aplicar perfumes; (20) bhūṣaṇa-yojanam, decorar com joias; (21) aindrajālam, fazer malabarismo; (22) kaucumāra-yogaḥ, praticar a arte do disfarce; (23) hasta-lāghavam, fazer prestidigitações; (24) citra-śākāpūpa-bhakṣya-vikāra-kriyaḥ, preparar variedades de salada, pão, bolo e outras comidas deliciosas; (25) pānaka-rasa-rāgāsava-yojanam, preparar bebidas saborosas e tingir as bebidas com cor vermelha; (26) sūcī-vāya-karma, bordar e tecer; (27) sūtra-krīḍā, fazer marionetes dançarem através da manipulação de fios finos; (28) vīṇā-ḍamarukavādyāni, tocar alaúde e um tamborzinho em forma de xis; (29) prahelikā, elaborar e resolver enigmas; (29a) pratimālā, recitação alternada de versos, ou recitar verso por verso de um poema como exercício de memória ou habilidade; (30) durvacaka-yogāḥ, fazer perguntas difíceis de responder; (31) pustaka-vācanam, recitar livros, e (32) nāṭikākhyāyikā-darśanam, representar peças curtas e escrever anedotas.
Kṛṣṇa e Balarāma também aprenderam a: (33) kāvya-samasyā-pūraṇam, decifrar versos enigmáticos; (34) paṭṭikā-vetra-bāṇa-vikalpāḥ, fazer um arco a partir de um pedaço de tecido e uma vara; (35) tarku-karma, fiar com um fuso; (36) takṣaṇam, exercer o ofício de carpinteiro; (37) vāstu-vidyā, arquitetar; (38) raupya-ratna-parīkṣā, testar prata e joias; (39) dhātu-vādaḥ, trabalhar com metais; (40) maṇi-rāga-jñānam, tingir joias com várias cores; (41) ākara-jñānam, extrair minerais; (42) vṛkṣāyur-veda-yogāḥ, aplicar ervas medicinais; (43) meṣa-kukkuṭalāvaka-yuddha-vidhiḥ, treinar e ocupar carneiros, galos e codornizes em lutar; (44) śuka-śārikā-pralāpanam, saber treinar papagaios machos e fêmeas para falar e responder a perguntas de seres humanos; (45) utsādanam, curar uma pessoa com unguentos; (46) keśa-mārjana-kauśalam, fazer penteados; (47) akṣara-muṣṭikā-kathanam, dizer o que está escrito em um livro sem vê-lo e dizer o que está escondido na mão de alguém; (48) mlecchita-kutarka-vikalpāḥ, criar sofismas bárbaros ou estrangeiros; (49) deśa-bhāṣā-jñānam, conhecer dialetos provinciais; (50) puṣpa-śakaṭikā-nirmiti-jñānam, saber construir carrinhos de brinquedo com flores; (51) yantra-mātṛkā, compor quadrados mágicos, arranjos de números que somem o mesmo total em todas as direções; (52) dhāraṇa-mātṛkā, fazer uso de amuletos; (53) saṁvācyam, palestrar; (54) mānasī-kāvya-kriyā, compor versos mentalmente; (55) kriyā-vikalpāḥ, idealizar uma obra literária ou um remédio; (56) chalitaka-yogāḥ, construir santuários; (57) abhidhāna-koṣa-cchando-jñānam, lexicografar e conhecer métricas poéticas; (58) vastra-gopanam, disfarçar uma espécie de tecido para parecer outra; (59) dyūta-viśeṣam, conhecer várias formas de jogos de azar; (60) ākarṣa-krīḍa, jogar dados; (61) bālaka-krīḍanakam, divertir-se com brinquedos de crianças; (62) vaināyikī vidyā, impor disciplina mediante o poder místico; (63) vaijayikī vidyā, conquistar a vitória, e (64) vaitālikī vidyā, despertar o mestre com música ao amanhecer.
Texto
saṁlokṣya rājann ati-mānusīṁ matim
sammantrya patnyā sa mahārṇave mṛtaṁ
bālaṁ prabhāse varayāṁ babhūva ha
Sinônimos
dvijaḥ — o brāhmaṇa erudito; tayoḥ — dos dois; tam — aquela; mahimānam — grandeza; adbhutam — surpreendente; saṁlakṣya — observando bem; rājan — ó rei; ati-mānuṣīm — além da capacidade humana; matim — inteligência; sammantrya — após consultar; patnyā — sua esposa; saḥ — ele; mahā-arṇave — no grande oceano; mṛtam — que morrera; bālam — seu filho; prabhāse — no lugar santo de Prabhāsa; varayām babhūva ha — escolheu.
Tradução
Ó rei, o erudito brāhmaṇa Sāndīpani analisou com atenção as gloriosas e surpreendentes qualidades dos dois Senhores e a inteligência sobre-humana dEles. Então, depois de consultar sua esposa, ele escolheu como remuneração a volta de seu jovem filho, que morrera no oceano em Prabhāsa.
Comentário
SIGNIFICADO—Segundo Śrīla Viśvanātha Cakravartī, o menino fora capturado pelo demônio búzio enquanto brincava em Mahā-śiva-kṣetra.
Texto
prabhāsam āsādya duranta-vikramau
velām upavrajya niṣīdatuḥ kṣanaṁ
sindhur viditvārhanam āharat tayoḥ
Sinônimos
tathā — assim seja; iti — dizendo isto; atha — então; āruhya — montando; mahā-rathau — os dois notáveis quadrigários; ratham — em uma quadriga; prabhāsam — em Prabhāsa-tīrtha; āsādya — chegando; duranta — sem limite; vikramau — cuja potência; velām — até a praia; upavrajya — andando; niṣīdatuḥ — sentaram-Se; kṣaṇam — por um momento; sindhuḥ — o (semideus que rege) o oceano; viditvā — reconhecendo; arhaṇam — oferenda respeitosa; āharat — trouxe; tayoḥ — para Eles.
Tradução
“Assim seja”, responderam aqueles dois notáveis quadrigários de poder ilimitado. E, montando logo em Sua quadriga, partiram para Prabhāsa. Ao chegarem naquele lugar, caminharam até a praia e sentaram-Se. Após um momento, a deidade do oceano, reconhecendo que Eles eram os Senhores Supremos, aproximou-se dEles com oferendas de tributo.
Comentário
SIGNIFICADO—Os estudiosos ocidentais às vezes pensam que as referências à deidade do oceano, à deidade do Sol etc., encontradas nos livros milenares de sabedoria, revelam um modo de pensar mítico e primitivo. Eles costumam dizer que os homens primitivos pensam que o oceano é um deus ou que o Sol e a Lua são deuses. De fato, referências tais como a palavra sindhu neste verso, significando “o oceano”, indicam a pessoa que governa este aspecto da natureza fenomenal.
Podemos apresentar vários exemplos contemporâneos. Nas Nações Unidas, podemos dizer: “Os Estados Unidos votam ‘Sim’, e a União Soviética vota ‘Não’.” É difícil que achemos que os países físicos ou os edifícios que existem neles votaram. Queremos dizer que determinada pessoa, representando aquela entidade política e geográfica, votou. Os jornais, entretanto, dirão apenas: “Os Estados Unidos votaram, decidiram etc.”, e todos sabem o que significa isso.
De modo semelhante, no mundo dos negócios, podemos dizer: “Um grande conglomerado absorveu uma firma menor.” É claro que não achamos que os edifícios, equipamento de escritório etc. absorveram fisicamente outro edifício cheio de trabalhadores e equipamento de escritório. Queremos dizer que as pessoas autorizadas praticaram um determinado ato em nome de suas respectivas entidades empresariais.
Infelizmente, os estudiosos modernos estão ansiosos por confirmar suas teorias favoritas de que a antiga sabedoria espiritual é primitiva, mítica e amplamente suplantada por modos de pensar mais modernos, exemplificados por suas próprias eloquentes observações. Porém, muita coisa na erudição moderna deve ser repensada à luz da consciência de Kṛṣṇa.
Texto
guru-putraḥ pradīyatām
yo ’sāv iha tvayā grasto
bālako mahatormiṇā
Sinônimos
tam — a ele; āha — disse; bhagavān — o Senhor Supremo; āśu — rapidamente; guru — de Meu mestre espiritual; putraḥ — o filho; pradīyatām — deve ser apresentado; yaḥ — que; asau — ele; iha — neste lugar; tvayā — por ti; grastaḥ — apanhado; bālakaḥ — um menininho; mahatā — poderosa; ūrmiṇā — por tua onda.
Tradução
O Supremo Senhor Kṛṣṇa dirigiu-Se ao senhor do oceano: Traze agora mesmo o filho de Meu guru – aquele que apanhaste aqui com tuas ondas poderosas.
Texto
na cāhārṣam ahaṁ deva
daityaḥ pañcajano mahān
antar-jala-caraḥ kṛṣṇa
śaṅkha-rūpa-dharo ’suraḥ
Sinônimos
śrī-samudraḥ uvāca — o oceano personificado disse; na — não; ca — e; ahārṣam — levei(-o) embora; aham — eu; deva — o Senhor; daityaḥ — um descendente de Diti; pañcajanaḥ — chamado Pañcajana; mahān — poderoso; antaḥ — dentro; jala — d’água; caraḥ — que anda; kṛṣṇa — ó Kṛṣṇa; śaṅkha — de um búzio; rūpa — a forma; dharaḥ — assumindo; asuraḥ — o demônio.
Tradução
O oceano respondeu: Ó Senhor Kṛṣṇa, não fui eu quem o raptou, senão que foi um demoníaco descendente de Diti chamado Pañcajana, que viaja pelas águas sob a forma de búzio.
Comentário
SIGNIFICADO—Evidentemente, o demônio Pañcajana era poderoso demais para o oceano o controlar; do contrário, o oceano teria impedido tal atividade ilícita.
Texto
tac chrutvā satvaraṁ prabhuḥ
jalam āviśya taṁ hatvā
nāpaśyad udare ’rbhakam
Sinônimos
āste — ele está lá; tena — por ele, Pañcajana; āhṛtaḥ — levado embora; nūnam — de fato; tat — isto; śrutvā — ouvindo; satvaram — com pressa; prabhuḥ — o Senhor; jalam — na água; āviśya — entrando; tam — a ele, o demônio; hatvā — matando; na apaśyat — não viu; udare — em seu abdômen; arbhakam — o menino.
Tradução
“De fato”, disse o oceano, “aquele demônio levou-o embora”. Ouvindo isso, o Senhor Kṛṣṇa entrou no oceano, encontrou Pañcajana e o matou. O Senhor, todavia, não encontrou o menino dentro do ventre do demônio.
Texto
ādāya ratham āgamat
tataḥ saṁyamanīṁ nāma
yamasya dayitāṁ purīm
pradadhmau sa-halāyudhaḥ
śaṅkha-nirhrādam ākarṇya
prajā-saṁyamano yamaḥ
cakre bhakty-upabṛṁhitām
uvācāvanataḥ kṛṣṇaṁ
sarva-bhūtāśayālayam
līlā-manuṣyayor viṣṇo
yuvayoḥ karavāma kim
Sinônimos
tat — dele (do demônio); aṅga — do corpo; prabhavam — crescido; śaṅkham — o búzio; ādāya — apanhando; ratham — para a quadriga; āgamat — retornou; tataḥ — então; saṁyamanīm nāma — conhecida como Saṁyamanī; yamasya — do Senhor Yamarāja; dayitām — amada; purīm — à cidade; gatvā — indo; jana-ardanaḥ — o Senhor Kṛṣṇa, a morada de todas as pessoas; śaṅkham — o búzio; pradadhmau — soprou alto; sa — acompanhado por; hala-āyudhaḥ — o Senhor Balarāma, cuja arma é um arado; śaṅkha — do búzio; nirhrādam — o ressoar; ākarṇya — ouvindo; prajā — aqueles que nascem; saṁyamanaḥ — o que refreia; yamaḥ — Yamarāja; tayoḥ — dEles; saparyām — adoração; mahatīm — elaborada; cakre — executou; bhakti — de devoção; upabṛṁhitām — transbordando; uvāca — disse; avanataḥ — prostrando-se humildemente; kṛṣṇam — ao Senhor Kṛṣṇa; sarva — de todos; bhūta — os seres vivos; āśaya — as mentes; ālayam — cuja residência; līlā — como Vosso passatempo; manuṣyayoḥ — aparecendo como seres humanos; viṣṇo — ó Supremo Senhor Viṣṇu; yuvayoḥ — para Vós dois; karavāma — devo fazer; kim — o quê.
Tradução
O Senhor Janārdana apanhou o búzio que crescera ao redor do corpo do demônio e voltou para a quadriga. Então, seguiu viagem para Saṁyamanī, a amada capital de Yamarāja, o Senhor da morte. Ao chegar lá com o Senhor Balarāma, Ele soprou bem alto Seu búzio, e Yamarāja, que mantém as almas condicionadas sob controle, logo que ouviu a ressoante vibração, veio a Seu encontro. Yamarāja meticulosamente adorou os dois Senhores com grande devoção e, em seguida, dirigiu-se ao Senhor Kṛṣṇa, que vive no coração de todos: “Ó Supremo Senhor Viṣṇu, o que devo fazer por Vós e pelo Senhor Balarāma, que estais representando o papel de seres humanos comuns?”
Comentário
SIGNIFICADO—O búzio que o Senhor retirou de Pañcajana, chamado Pāñcajanya, é o mesmo que Ele tocou no início da Bhagavad-gītā. Segundo os ācāryas, o Pañcajana tornara-se um demônio de maneira semelhante à de Jaya e Vijaya. Em outras palavras, embora aparecesse na forma de um demônio, ele era, na verdade, um devoto do Senhor. O Skanda Purāṇa, Avanti-khaṇḍa, descreve as coisas maravilhosas que aconteceram quando o Senhor Kṛṣṇa soou Seu búzio:
śīrṇa-patram ajāyata
rauravaṁ nāma narakam
arauravam abhūt tada
abhairavaṁ bhairavākhyaṁ
kumbhī-pākam apācakam
“O inferno conhecido como Asipatra-vana perdeu as folhas afiadas como espadas que nascem em suas árvores, e o inferno chamado Raurava se viu livre de seus animais ruru. O inferno Bhairava deixou de ser aterrador, e todo o cozimento parou no inferno Kumbhīpāka.”
O Skanda Purāṇa afirma ainda:
vimuktā nārakā narāḥ
padam avyayam āsādya
“Erradicadas suas reações pecaminosas, todos os habitantes do inferno alcançaram a liberação e aproximaram-se do mundo espiritual.”
Texto
guru-putram ihānītaṁ
nija-karma-nibandhanam
ānayasva mahā-rāja
mac-chāsana-puraskṛtaḥ
Sinônimos
śrī-bhagavān uvāca — o Senhor Supremo disse; guru-putram — o filho de Meu mestre espiritual; iha — aqui; ānītam — trazido; nija — de suas próprias; karma — reações de atividades passadas; nibandhanam — sofrendo o cativeiro; ānayasva — por favor, traze; mahā-rāja — ó grande rei; mat — Minha; śāsana — à ordem; puraḥ-kṛtaḥ — dando prioridade máxima.
Tradução
A Suprema Personalidade de Deus disse: Sofrendo o enredamento decorrente de sua atividade passada, o filho de Meu mestre espiritual foi trazido aqui para ti. Ó grande rei, obedece a Minha ordem e traze este menino para Mim sem demora.
Texto
guru-putraṁ yadūttamau
dattvā sva-gurave bhūyo
vṛṇīṣveti tam ūcatuḥ
Sinônimos
tathā — assim seja; iti — (Yamarāja) assim dizendo; tena — por ele; upānītam — trazido para a frente; guru-putram — o filho do mestre espiritual; yadu-uttamau — os melhores dos Yadus, Kṛṣṇa e Balarāma; dattvā — dando; sva-gurave — a Seu guru; bhūyaḥ — de novo; vṛṇīṣva — por favor, escolhe; iti — assim; tam — a ele; ūcatuḥ — disseram.
Tradução
Yamarāja disse: “Assim seja”, e trouxe o filho do guru. Então, aqueles dois excelentíssimos Yadus apresentaram o menino a Seu mestre espiritual e disseram-lhe: “Por favor, escolhe outra dádiva.”
Texto
samyak sampādito vatsa
bhavadbhyāṁ guru-niṣkrayaḥ
ko nu yuṣmad-vidha-guroḥ
kāmānām avaśiṣyate
Sinônimos
śrī-guruḥ uvāca — Seu mestre espiritual, Sāndīpani Muni, disse; samyak — na íntegra; sampāditaḥ — cumprida; vatsa — meu querido menino; bhavadbhyām — por Vós dois; guru-niṣkrayaḥ — a remuneração do guru; kaḥ — qual; nu — de fato; yuṣmat-vidha — de pessoas como Vós; guroḥ — para o mestre espiritual; kāmānām — de seus desejos; avaśiṣyate — resta.
Tradução
O mestre espiritual disse: Meus queridos meninos, Vós dois cumpristes na íntegra a obrigação do discípulo de recompensar seu mestre espiritual. De fato, com discípulos como Vós, que outros desejos um guru poderia ter?
Texto
kīrtir vām astu pāvanī
chandāṁsy ayāta-yāmāni
bhavantv iha paratra ca
Sinônimos
gacchatam — por favor, ide; sva-gṛham — para Vosso lar; vīrau — ó heróis; kīrtiḥ — fama; vām — Vossa; astu — que seja; pāvanī — purificante; chandāṁsi — hinos védicos; ayāta-yāmāni — sempre vivos; bhavantu — que haja; iha — nesta vida; paratra — na próxima vida; ca — e.
Tradução
Ó heróis, agora, por favor, voltai para casa. Que Vossa fama santifique o mundo, e que os hinos védicos estejam sempre vivos em Vossas mentes, tanto nesta vida como na próxima.
Texto
rathenānila-raṁhasā
āyātau sva-puraṁ tāta
parjanya-ninadena vai
Sinônimos
guruṇā — por Seu mestre espiritual; evam — desta maneira; anujñātau — sendo dispensados; rathena — em Sua quadriga; anila — como o vento; raṁhasā — cuja velocidade; āyātau — foram; sva — para Sua; puram — cidade (Mathurā); tāta — meu querido (rei Parīkṣit); parjanya — como uma nuvem; ninadena — cuja reverberação; vai — de fato.
Tradução
Recebendo assim a permissão do guru para partir, os dois Senhores voltaram para Sua cidade em Sua quadriga, que se movia com a velocidade do vento e ressoava como uma nuvem.
Texto
dṛṣṭvā rāma-janārdanau
apaśyantyo bahv ahāni
naṣṭa-labdha-dhanā iva
Sinônimos
samanandan — rejubilaram-se; prajāḥ — os cidadãos; sarvāḥ — todos; dṛṣṭvā — vendo; rāma-janārdanau — Balarāma e Kṛṣṇa; apaśyantyaḥ — não tendo visto; bahu — por muitos; ahāni — dias; naṣṭa — perdida; labdha — e recuperada; dhanāḥ — aqueles cuja riqueza; iva — como.
Tradução
Todos os cidadãos regozijaram-se ao ver Kṛṣṇa e Balarāma, a quem não tinham visto por muitos dias. As pessoas sentiam-se exatamente como alguém que perdeu sua riqueza e depois a recuperou.
Comentário
Neste ponto, encerram-se os significados apresentados pelos humildes servos de Sua Divina Graça A.C. Bhaktivedanta Swami Prabhupāda referentes ao décimo canto, quadragésimo quinto capítulo, do Śrīmad-Bhāgavatam, intitulado “Kṛṣṇa Resgata o Filho de Seu Mestre”.