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Capítulo Nove

O Senhor Encarna como Mohinī-mūrti

Este capítulo descreve como os demônios, sentindo-se encantados com a beleza da forma de Mohinī, concordaram em ceder o recipien­te de néctar a Mohinī-devī, que, com muito tato, entregou-o aos semideuses.

Quando os demônios haviam tomado posse da jarra de néctar, uma jovem mulher extraordinariamente bela apareceu diante deles. Todos os demônios foram cativados pela beleza da jovem e se apegaram­ a Ela. Então, visto que os demônios estavam lutando entre si para que se definisse quem deveria ficar com o néctar, eles escolheram essa bela mulher como mediadora da questão. Aproveitando-Se dessa fraqueza dos demônios, Mohinī, a encarnação da Suprema Personalidade de Deus, conseguiu fazer com que prometessem que não se recusariam a aceitar nenhuma decisão que Ela tomasse. Depois que os demônios fizeram essa promessa, a bela mulher, Mohinī-mūrti, solicitou que os semideuses e os demônios se sentassem em várias fileiras para que Ela pudesse distribuir o néctar. Ela sabia que os de­mônios eram muito indignos de beber o néctar. Portanto, enganan­do-os, ela distribuiu todo o néctar aos semideuses. Ao verem essa trapaça de Mohinī-mūrti, os demônios permaneceram silenciosos. Todavia, um deles, chamado Rāhu, vestiu-se como um semideus e se sentou na ala dos semideuses. Ele se sentou ao lado do Sol e da Lua. Ao perceber que Rāhu estava tentando enganá-lO, a Suprema Persona­lidade de Deus imediatamente cortou a cabeça do demônio. Rāhu, entretanto, já havia experimentado o néctar, e, portanto, embora decepada, sua cabeça permaneceu viva. Depois que os semideuses terminaram de beber o néctar, a Suprema Personalidade de Deus as­sumiu Sua própria forma. Śukadeva Gosvāmī conclui este capítulo descrevendo quão poderosa é a glorificação dos santos nomes, pas­satempos e parafernália da Suprema Personalidade de Deus.

Texto

śrī-śuka uvāca
te ’nyonyato ’surāḥ pātraṁ
harantas tyakta-sauhṛdāḥ
kṣipanto dasyu-dharmāṇa
āyāntīṁ dadṛśuḥ striyam

Sinônimos

śrī-śukaḥ uvāca — Śrī Śukadeva Gosvāmī disse; te — os demônios; anyonyataḥ — entre si; asurāḥ — os demônios; pātram — o recipiente de néctar; harantaḥ — agarrando uns dos outros; tyakta-sauhṛdāḥ — ficaram inimigos uns dos outros; kṣipantaḥ — às vezes, largando; dasyu-dharmāṇaḥ — às vezes, arrancando como ladrões; āyāntīm — adiantando-Se; dadṛśuḥ — viram; striyam — uma belíssima mulher atraente.

Tradução

Śukadeva Gosvāmī disse: Em seguida, os demônios desenvolveram inimizade entre si. Largando e agarrando o recipiente de néctar, eles destruíram seus laços de amizade. Nesse ínterim, avistaram uma belíssima jovem vindo em sua direção.

Texto

aho rūpam aho dhāma
aho asyā navaṁ vayaḥ
iti te tām abhidrutya
papracchur jāta-hṛc-chayāḥ

Sinônimos

aho — quão maravilhosa; rūpam — Sua beleza; aho — quão maravilhoso; dhāma — o brilho do Seu corpo; aho — quão maravilhosa; asyāḥ — da Sua; navam — nova; vayaḥ — bela idade; iti — dessa maneira; te — aqueles demônios; tām — à bela mulher; abhidrutya — indo ao Seu encontro rapidamente; papracchuḥ — perguntaram-Lhe; jāta-hṛt­-śayāḥ — seus corações estando cheios de luxúria, querendo desfrutar dEla.

Tradução

Ao verem a bela mulher, os demônios disseram: “Oh! Quão mara­vilhosa é a Sua beleza, quão maravilhoso o brilho do Seu corpo, e quão maravilhosa a beleza de Sua idade juvenil!” Falando dessa maneira, eles rapidamente abordaram-nA, cheios de desejos luxurio­sos de desfrutá-lA, e começaram a fazer-Lhe muitas perguntas.

Texto

kā tvaṁ kañja-palāśākṣi
kuto vā kiṁ cikīrṣasi
kasyāsi vada vāmoru
mathnatīva manāṁsi naḥ

Sinônimos

— quem; tvam — és Tu; kañja-palāśa-akṣi — tendo olhos como as pétalas de um lótus; kutaḥ — de onde; — ou; kim cikīrṣasi — qual o propósito que Te trouxe até aqui; kasya — de quem; asi — per­tences; vada — por favor, dize-nos; vāma-ūru — ó pessoa de coxas extraordinariamente belas; mathnatī — agitando; iva — como; manāṁsi — dentro de nossa mente; naḥ — nossas.

Tradução

Ó garota maravilhosamente bela! Teus olhos são tão belos que pa­recem as pétalas de uma flor de lótus. Quem és? De onde vens? Com que objetivo Tu vieste até aqui e a quem pertences? Ó pessoa de coxas extraordinariamente belas, nossa mente está ficando agita­da pelo simples fato de Te vermos.

Comentário

SIGNIFICADO—Os demônios perguntaram à garota maravilhosamente bela: “A quem pertences?” Supõe-se que a mulher pertença ao seu pai antes do casamento, ao seu esposo após o casamento, e aos seus filhos crescidos quando ela atingir a velhice. Com relação a essa pergunta, Śrīla Viśvanātha Cakravartī Ṭhākura diz que a pergunta “A quem pertences?” significa “De quem és filha?” Uma vez que os demônios puderam perceber que a bela garota ainda era solteira, todos desejavam casar-se com ela. Foi por isso que eles perguntaram: “De quem és filha?”

Texto

na vayaṁ tvāmarair daityaiḥ
siddha-gandharva-cāraṇaiḥ
nāspṛṣṭa-pūrvāṁ jānīmo
lokeśaiś ca kuto nṛbhiḥ

Sinônimos

na — não somos; vayam — nós; tvā — a ti; amaraiḥ — pelos semideuses; daityaiḥ — pelos demônios; siddha — pelos Siddhas; gandharva — pelos Gandharvas; cāraṇaiḥ — e pelos Cāraṇas; na — não; aspṛṣṭa­pūrvām — jamais desfrutada ou tocada por alguém; jānīmaḥ — conhecemos exatamente; loka-īśaiḥ — pelos vários diretores do universo; ca — também; kutaḥ — o que dizer de; nṛbhiḥ — pela sociedade humana.

Tradução

Se nem mesmo os semideuses, demônios, Siddhas, Gandharvas, Cāraṇas e os vários diretores do universo, os Prajāpatis, conseguiram Te tocar antes, o que dizer, então, dos seres humanos? Ninguém deve pensar que somos incapazes de compreender Tua iden­tidade.

Comentário

SIGNIFICADO—Mesmo os asuras seguiam a etiqueta de que, ao dirigir-se a uma mulher casada, não se deve ter luxúria. O grande ensaísta Cāṇakya Paṇḍita diz que mātṛvat para-dāreṣu: deve-se considerar a esposa alheia como sendo a própria mãe. Os asuras, os demônios, tomaram como verdade que a bela jovem, Mohinī-mūrti, que aparecera diante deles, obviamente não era casada. Portanto, eles admitiram que ninguém no mundo, incluindo os semideuses, os Gandharvas, os Cāraṇas e os Siddhas, jamais havia tocado nEla. Os demônios sabiam que a jovem era solteira e, portanto, ousaram dirigir-se a Ela. Eles supunham que a jovem, Mohinī-mūrti, tinha ido até ali porque queria encontrar um esposo entre todas as pessoas ali presentes (os Daityas, os semideuses, os Gandharvas e assim por diante).

Texto

nūnaṁ tvaṁ vidhinā subhrūḥ
preṣitāsi śarīriṇām
sarvendriya-manaḥ-prītiṁ
vidhātuṁ saghṛṇena kim

Sinônimos

nūnam — na verdade; tvam — Tu; vidhinā — pela Providência; su­-bhrūḥ — ó pessoa de sobrancelhas encantadoras; preṣitā — enviada; asi — decerto és assim; śarīriṇām — de todas as entidades vivas corporificadas; sarva — todos; indriya — dos sentidos; manaḥ — e da mente; prītim — o que agrada; vidhātum — para administrar; sa-ghṛṇena — ­por Sua imotivada misericórdia; kim — se.

Tradução

Ó formosa jovem de sobrancelhas encantadoras, decerto a Provi­dência, por Sua misericórdia imotivada, enviou-Te para satisfazer os sentidos e a mente de todos nós. Não é verdade?

Texto

sā tvaṁ naḥ spardhamānānām
eka-vastuni mānini
jñātīnāṁ baddha-vairāṇāṁ
śaṁ vidhatsva sumadhyame

Sinônimos

— que és como tal; tvam — Tu; naḥ — de todos nós, os demônios; spardhamānānām — daqueles que estão se tornando cada vez mais inimigos; eka-vastuni — em um impasse (a jarra de néctar); mānini — ­ó pessoa que é belíssima em Sua posição prestigiosa; jñātīnām­ — entre nossos membros familiares; baddha-vairāṇām — tornando-nos cada vez mais inimigos; śam — ventura; vidhatsva — deves executar; su-madhyame — ó bela mulher de cintura fina.

Tradução

Estamos todos envoltos em inimizade mútua devido à seguinte questão: a jarra de néctar. Embora tenhamos nasci­do na mesma família, estamo-nos tornando cada vez mais hostis. Ó mulher de cintura fina e tão bela em tua posição prestigio­sa, pedimos-Te, portanto, que nos favoreças e soluciones a nossa contenda.

Comentário

SIGNIFICADO—Os demônios compreenderam que a bela mulher havia atraído a atenção de todos eles. Portanto, eles unanimemente pediram a Ela que Se tornasse o árbitro para resolver a contenda que surgira entre eles.

Texto

vayaṁ kaśyapa-dāyādā
bhrātaraḥ kṛta-pauruṣāḥ
vibhajasva yathā-nyāyaṁ
naiva bhedo yathā bhavet

Sinônimos

vayam — todos nós; kaśyapa-dāyādāḥ — descendentes de Kaśyapa Muni; bhrātaraḥ — todos nós somos irmãos; kṛta-pauruṣāḥ — que somos todos capazes e competentes; vibhajasva — simplesmente divide; yathā-nyāyam — de acordo com a lei; na — não; eva — decerto; bhedaḥ — parcialidade; yathā — como; bhavet — deve, assim, tornar-se.

Tradução

Todos nós, os demônios e os semideuses, nascemos do mesmo pai, Kaśyapa, e, portanto, estamos relacionados como irmãos. Agora, no entanto, entramos em desavença e, neste contexto, estamos exibindo nosso poder pessoal. Portanto, pedimos-Te que finalizes nossa discórdia e dividas o néctar igualmente entre nós.

Texto

ity upāmantrito daityair
māyā-yoṣid-vapur hariḥ
prahasya rucirāpāṅgair
nirīkṣann idam abravīt

Sinônimos

iti — assim; upāmantritaḥ — sendo fervorosamente requisitada; daityaiḥ — pelos demônios; māyā-yoṣit — a mulher ilusória; vapuḥ hariḥ — a encarnação da Suprema Personalidade de Deus; prahasya — sorrindo; rucira — bela; apāṅgaiḥ — exibindo atrativos gestos femininos; nirīkṣan — olhando para eles; idam — essas palavras; abravīt — disse.

Tradução

Tendo recebido essa solicitação que Lhe foi feita pelos demônios, a Suprema Personalidade de Deus, que assumira a forma de uma bela mulher, começou a sorrir. Olhando para eles com atrativos gestos femininos, Ela lhes falou o seguinte.

Texto

śrī-bhagavān uvāca
kathaṁ kaśyapa-dāyādāḥ
puṁścalyāṁ mayi saṅgatāḥ
viśvāsaṁ paṇḍito jātu
kāminīṣu na yāti hi

Sinônimos

śrī-bhagavān uvāca — a Suprema Personalidade de Deus, sob a forma de Mohinī-mūrti, disse; katham — como é que; kaśyapa-­dāyādāḥ — todos sois descendentes de Kaśyapa Muni; puṁścalyām — a uma prostituta que agita a mente dos homens; mayi — a Mim; saṅgatāḥ — viestes ao Meu encontro; viśvāsam — fé; paṇḍitaḥ — aqueles que são eruditos; jātu — em tempo algum; kāminīṣu — em uma mulher; na — nunca; yāti — ocorre; hi — na verdade.

Tradução

A Suprema Personalidade de Deus, sob a forma de Mohinī, dirigiu-Se aos demônios: Ó filhos de Kaśyapa Muni, sou apenas uma prostituta. Como é que tendes tanta fé em Mim? Uma pessoa erudita jamais deposita sua fé em uma mulher.

Comentário

SIGNIFICADO—Cāṇakya Paṇḍita, o grande político e instrutor moral, disse que viśvāso naiva kartavyaḥ strīṣu rāja-kuleṣu ca: “Nunca deposites tua fé em uma mulher ou em um político.” Logo, a Suprema Persona­lidade de Deus, que Se fazia passar por uma mulher, advertiu os de­mônios de que não depositassem tanta fé nEla, pois Ela aparecera como uma mulher atraente com o objetivo final de enganá-los. In­diretamente revelando o propósito pelo qual aparecera diante deles, Ela disse aos filhos de Kaśyapa: “Como é isso? Todos vós nasces­tes de um grande ṛṣi, mas estais depositando vossa fé em uma mulher que, tal qual uma prostituta, perambula de um lugar a outro, desprotegida do pai e do esposo. As mulheres em geral não merecem confiança, e o que dizer de uma mulher que vagueia como uma pros­tituta?” A esse respeito, a palavra kāminī é significativa. As mulheres, especialmente as mulheres belas e jovens, invocam os desejos luxurio­sos que estavam dormentes no homem. Portanto, de acordo com a Manu-saṁhitā, toda mulher deve ser protegida, seja pelo esposo, seja pelo pai, seja pelos filhos crescidos. Sem esta proteção, a mulher será explorada. Na verdade, as mulheres gostam de ser exploradas pelos homens. Logo que é explorada pelo homem, a mulher se torna uma prostituta ordinária. Isso é explicado por Mohinī-mūrti, a Suprema Personalidade de Deus.

Texto

sālāvṛkāṇāṁ strīṇāṁ ca
svairiṇīnāṁ sura-dviṣaḥ
sakhyāny āhur anityāni
nūtnaṁ nūtnaṁ vicinvatām

Sinônimos

sālāvṛkāṇām — dos macacos, chacais e cães; strīṇām ca — e das mulheres; svairiṇīnām — em especial as mulheres que são independentes; sura-dviṣaḥ — ó demônios; sakhyāni — amizade; āhuḥ — está dito; ani­tyāni — temporária; nūtnam — novos amigos; nūtnam — novos amigos; vicinvatām — todos os quais estão pensando.

Tradução

Ó demônios, assim como os macacos, chacais e cães são instáveis em suas relações sexuais e sempre querem mudar de companheiras todos os dias, as mulheres que levam uma vida independente buscam novos parceiros diariamente. A amizade com essa classe de mulher jamais perdura. Esta é a opinião dos sábios eruditos.

Texto

śrī-śuka uvāca
iti te kṣvelitais tasyā
āśvasta-manaso ’surāḥ
jahasur bhāva-gambhīraṁ
daduś cāmṛta-bhājanam

Sinônimos

śrī-śukaḥ uvāca — Śrī Śukadeva Gosvāmī disse; iti — assim; te — aqueles demônios; kṣvelitaiḥ — falando em tom jocoso; tasyāḥ — de Mohinī-mūrti; āśvasta — gratos, com fé; manasaḥ — suas mentes; asurāḥ — todos os demônios; jahasuḥ — riram; bhāva-gambhīram — embora Mohinī-mūrti estivesse cheia de gravidade; daduḥ — entregaram; ca — também; amṛta-bhājanam — o recipiente de néctar.

Tradução

Śrī Śukadeva Gosvāmī prosseguiu: Após ouvirem as palavras de Mohinī-mūrti, que falara em tom jocoso, todos os demônios ficaram muito confiantes. Eles riram com muita prudência e, afinal, depositaram o recipiente de néctar nas mãos dEla.

Comentário

SIGNIFICADO—A Suprema Personalidade de Deus, sob Sua forma de Mohinī, decerto não estava brincando, senão que falava sério e com gravidade. Os demônios, entretanto, cativados pelos traços físicos de Mohinī-­mūrti, tomaram Suas palavras como sendo um gracejo e, com muita confiança, puseram o recipiente de néctar em Suas mãos. Portanto, Mohinī-mūrti assemelha-Se ao senhor Buddha, que apare­ceu sammohāya sura-dviṣām – para enganar os asuras. A palavra sura-dviṣām se refere àqueles que invejam os semideuses ou devotos. Às vezes, a Suprema Personalidade de Deus encarna para enganar, os ateístas. Assim, aqui vemos que, embora Mohinī-mūrti estivesse lhes falando a verdade, os asuras tomaram Suas palavras como brincalhonas. Com efeito, estavam tão confiantes na honestidade de Mohinī-mūrti que imediatamente passaram a jarra de néctar para Suas mãos, como se A autorizassem a fazer do néctar o que bem entendesse, ou seja, distribuí-lo, jogá-lo fora ou bebê-lo sozinha, sem dá-lo a eles.

Texto

tato gṛhītvāmṛta-bhājanaṁ harir
babhāṣa īṣat-smita-śobhayā girā
yady abhyupetaṁ kva ca sādhv asādhu vā
kṛtaṁ mayā vo vibhaje sudhām imām

Sinônimos

tataḥ — em seguida; gṛhītvā — apossando-Se de; amṛta-bhājanam — o pote contendo néctar; hariḥ — a Suprema Personalidade de Deus, Hari, sob a forma de Mohinī; babhāṣa — falou; īṣat — discretamente; smita-śobhayā girā — com beleza sorridente e com palavras; yadi — se; abhyupetam — prometido ser aceito; kva ca — seja o que for; sādhu asādhu vā — honesto ou desonesto; kṛtam mayā — é feito por Mim; vaḥ — a vós; vibhaje — Eu vos darei a devida partilha; sudhām — néctar; imām — este.

Tradução

Em seguida, a Suprema Personalidade de Deus, tendo Se apossado do recipiente de néctar, sorriu discretamente e proferiu algumas pa­lavras atraentes. Ela disse: Meus queridos demônios, se aceitais tudo o que Eu acaso possa fazer – seja um ato honesto, seja um ato desonesto –, posso então assumir a responsabilidade de repartir o néctar entre vós.

Comentário

SIGNIFICADO—A Suprema Personalidade de Deus jamais Se submete aos di­tames de alguém. Tudo o que Ele faz é absoluto. Os demônios, evidentemente, foram iludidos pela potência ilusória da Suprema Personalidade de Deus, e, assim, Mohinī-mūrti fez com que prometessem que acatariam tudo o que Ela fizesse.

Texto

ity abhivyāhṛtaṁ tasyā
ākarṇyāsura-puṅgavāḥ
apramāṇa-vidas tasyās
tat tathety anvamaṁsata

Sinônimos

iti — assim; abhivyāhṛtam — as palavras que foram faladas; tasyāḥ — a Ela; ākarṇya — após ouvirem; asura-puṅgavāḥ — os líderes dos demônios; apramāṇa-vidaḥ — porque todos eles eram tolos; tasyāḥ — dEla; tat — aquelas palavras; tathā — que seja assim; iti — assim; anvamaṁsata — concordaram em aceitar.

Tradução

Os líderes dos demônios não eram muito hábeis em tomar decisões. Ao ouvirem as doces palavras de Mohinī-mūrti, eles aquies­ceram imediatamente. “Sim”, responderam eles. “O que disseste está completamente certo.” Com isso, os demônios concordaram em aceitar Sua decisão.

Texto

athopoṣya kṛta-snānā
hutvā ca haviṣānalam
dattvā go-vipra-bhūtebhyaḥ
kṛta-svastyayanā dvijaiḥ
yathopajoṣaṁ vāsāṁsi
paridhāyāhatāni te
kuśeṣu prāviśan sarve
prāg-agreṣv abhibhūṣitāḥ

Sinônimos

atha — depois disso; upoṣya — jejuando; kṛta-snānāḥ — tomando banho; hutvā — fazendo oblações; ca — também; haviṣā — com man­teiga clarificada; analam — no fogo; dattvā — fazendo caridade; go-vipra-bhūtebhyaḥ — às vacas, aos brāhmaṇas e aos seres vivos em geral; kṛta-svastyayanāḥ — realizando cerimônias ritualísticas; dvijaiḥ — conforme determinavam os brāhmaṇas; yathā-upajoṣam — de acordo com o gosto da própria pessoa; vāsāṁsi — roupas; paridhāya — vestindo; āhatāni — excelentes e novas; te — todos eles; kuśe­ṣu — sobre assentos feitos de grama kuśa; prāviśan — sentando-se sobre eles; sarve — todos eles; prāk-agreṣu — voltados para o leste; abhibhūṣitāḥ — apropriadamente decorados com adornos.

Tradução

Os semideuses e demônios, então, jejuaram. Após se banharem, ofereceram no fogo manteiga clarificada e oblações e fizeram carida­de às vacas, aos brāhmaṇas e aos membros das outras ordens da sociedade, a saber, os kṣatriyas, os vaiśyas e os śūdras, todos os quais foram recompensados conforme mereciam. Em seguida, sob a dire­ção dos brāhmaṇas, os semideuses e demônios realizaram cerimô­nias ritualísticas. Depois, vestiram-se com roupas novas, escolhidas de acordo com o seu próprio gosto, decoraram seus corpos com adornos e, colocando-se em assentos feitos de grama kuśa, sen­taram-se com os rostos voltados para o leste.

Comentário

SIGNIFICADO—Os Vedas prescrevem que, antes de qualquer cerimônia ritualísti­ca, a pessoa deve primeiramente ficar limpa, banhando-se na água do Ganges ou do Yamunā ou no mar. Então, ela pode realizar a ce­rimônia ritualística e oferecer manteiga clarificada no fogo. Neste verso, as palavras paridhāya āhatāni são especialmente significativas. Um sannyāsī, ou qualquer pessoa em quem recai a responsabilidade de executar uma cerimônia ritualística, não deve vestir-se com roupas costuradas com agulha.

Texto

prāṅ-mukheṣūpaviṣṭeṣu
sureṣu ditijeṣu ca
dhūpāmodita-śālāyāṁ
juṣṭāyāṁ mālya-dīpakaiḥ
tasyāṁ narendra karabhorur uśad-dukūla-
śroṇī-taṭālasa-gatir mada-vihvalākṣī
sā kūjatī kanaka-nūpura-śiñjitena
kumbha-stanī kalasa-pāṇir athāviveśa

Sinônimos

prāk-mukheṣu — voltados para o leste; upaviṣṭeṣu — estando sentados em seus respectivos lugares; sureṣu — todos os semideuses; diti-jeṣu — os demônios; ca — também; dhūpa-āmodita-śālāyām — na arena, que estava cheia de fumaça de incenso; juṣṭāyām — plenamente decorada; mālya-dīpakaiḥ — com guirlandas de flores e lamparinas; tasyām — naquela arena; nara-indra — ó rei; karabha-ūruḥ — tendo coxas parecidas com as trombas de elefantes; uśat-dukūla — vestida com um belíssimo sári; śroṇī-taṭa — devido aos quadris volumosos; alasa-gatiḥ — caminhando muito vagarosamente; mada-vihvala-akṣī­ — cujos olhos eram inquietos devido ao orgulho juvenil; — Ela; kūjatī — tilintante; kanaka-nūpura — de sinos de tornozelo dourados; śiñjitena — com o som; kumbha-stanī — uma mulher cujos seios são como moringas d’água; kalasa-pāṇiḥ — segurando um cântaro em Sua mão; atha — assim; āviveśa — entrou na arena.

Tradução

Ó rei, enquanto os semideuses e os demônios sentavam-se com os rostos voltados para o leste, acomodando-se em uma arena plenamente decorada com guirlandas de flores e lamparinas e perfumada com fumaça de incensos, aquela mulher, vestida em um sári belíssimo e com Seus sinos de tornozelo tilintando, entrou na arena, cami­nhando muito vagarosamente devido aos Seus quadris volumosos e baixos. Seus olhos eram inquietos devido ao orgulho juvenil, Seus seios eram como jarras de água, Suas coxas pareciam trombas de elefantes, e Ela carregava um cântaro em Sua mão.

Texto

tāṁ śrī-sakhīṁ kanaka-kuṇḍala-cāru-karṇa-
nāsā-kapola-vadanāṁ para-devatākhyām
saṁvīkṣya sammumuhur utsmita-vīkṣaṇena
devāsurā vigalita-stana-paṭṭikāntām

Sinônimos

tām — a Ela; śrī-sakhīm — parecendo uma associada pessoal da deusa da fortuna; kanaka-kuṇḍala — com brincos de ouro; cāru — muito belo; karṇa — orelhas; nāsā — nariz; kapola — maçãs do rosto; vadanām — rosto; para-devatā-ākhyām — o Senhor Supremo, a Suprema Personalidade de Deus aparecendo naquela forma; saṁvīkṣya — olhan­do para Ela; sammumuhuḥ — todos eles ficaram encantados; utsmi­ta — sorrindo discretamente; vīkṣaṇena — lançando um olhar para eles; deva-asurāḥ — todos os semideuses e demônios; vigalita-stana­-paṭṭika-antām — a barra do sári logo abaixo dos seios moveu-se um pouco.

Tradução

Seu nariz atraente e encantadoras maçãs do rosto, bem como Suas orelhas adornadas com brincos de ouro, tornavam Seu rosto belíssimo. À medida que Ela Se movia, a barra do sári logo abaixo de Seus seios afastava-se um pouco. Quando os semideuses e demônios viram essa bela constituição de Mohinī-mūrti, que olhava para eles e sorria discretamente, todos ficaram completamente en­cantados.

Comentário

SIGNIFICADO—Aqui, Śrīla Viśvanātha Cakravartī Ṭhākura menciona que Mo­hinī-mūrti é a Suprema Personalidade de Deus em uma forma femi­nina e que a deusa da fortuna é Sua associada. Essa forma assumida pela Personalidade de Deus desafiava a deusa da fortuna. A deusa da fortuna é bela, mas, ao aceitar uma forma de mulher, o Senhor sobrepuja a deusa da fortuna em beleza. Não se deve pensar que, como é mulher, a deusa da fortuna é mais bela. O Senhor é tão belo que, ao assumir uma forma feminina, pode exceder toda beleza de qualquer deusa da fortuna.

Texto

asurāṇāṁ sudhā-dānaṁ
sarpāṇām iva durnayam
matvā jāti-nṛśaṁsānāṁ
na tāṁ vyabhajad acyutaḥ

Sinônimos

asurāṇām — dos demônios; sudhā-dānam — distribuição do néctar; sarpāṇām — de serpentes; iva — como; durnayam — cálculo errôneo; matvā — com isso em mente; jāti-nṛśaṁsānām — daqueles que, por natureza, são muito invejosos; na — não; tām — o néctar; vyabhajat — repartiu; acyutaḥ — a Suprema Personalidade de Deus, que nunca Se deixa enganar.

Tradução

Por natureza, os demônios são ardilosos como serpentes. Portanto, distribuir-lhes uma parte do néctar não era de modo algum reco­mendável, uma vez que isso poderia ser tão perigoso como fornecer leite a uma serpente. Analisando isso, a Suprema Personalidade de Deus, que nunca Se deixa enganar, não repartiu o néctar entre os demônios.

Comentário

SIGNIFICADO—Afirma-se que sarpaḥ krūraḥ khalaḥ krūraḥ sarpāt krūrataraḥ khalaḥ: “A serpente é muito traiçoeira e invejosa, e também o é a pessoa demoníaca.” Mantrauṣadhi-vaśaḥ sarpaḥ khalaḥ kena nivāryate: “Através de mantras, ervas e medicamentos, pode-se controlar uma serpente, mas uma pessoa invejosa e desonesta não pode ser controlada de maneira alguma.” Considerando essa lógica, a Su­prema Personalidade de Deus julgou imprudente distribuir néctar aos demônios.

Texto

kalpayitvā pṛthak paṅktīr
ubhayeṣāṁ jagat-patiḥ
tāṁś copaveśayām āsa
sveṣu sveṣu ca paṅktiṣu

Sinônimos

kalpayitvā — após dispor; pṛthak paṅktīḥ — diferentes assentos; ubhayeṣām — dos semideuses e dos demônios; jagat-patiḥ — o mestre do universo; tān — todos eles; ca — e; upaveśayām āsa — sentaram-se; sveṣu sveṣu — em seus respectivos lugares; ca — também; paṅktiṣu — todos em ordem.

Tradução

Sob a forma de Mohinī-mūrti, a Suprema Personalidade de Deus, o mestre do universo, dispôs os assentos em fileiras separadas e convidou os semideuses e demônios a se sentarem de acordo com as suas respectivas posições.

Texto

daityān gṛhīta-kalaso
vañcayann upasañcaraiḥ
dūra-sthān pāyayām āsa
jarā-mṛtyu-harāṁ sudhām

Sinônimos

daityān — os demônios; gṛhīta-kalasaḥ — o Senhor, que detinha a jarra de néctar; vañcayan — enganando; upasañcaraiḥ — com pala­vras doces; dūra-sthān — os semideuses, que estavam sentados em um lugar distante; pāyayām āsa — fê-los beber; jarā-mṛtyu-harām — que pode combater a invalidez, a velhice e a morte; sudhām — tal néctar.

Tradução

Colocando a jarra de néctar em Suas mãos, Ela primeiro aproximou-Se dos demônios, satisfê-los com palavras doces e, assim, enganou-os, não lhes dando sua parte do néctar. Então, ministrou o néctar aos se­mideuses, que estavam sentados em um lugar distante, a fim de livrá-los da invalidez, da velhice e da morte.

Comentário

SIGNIFICADO—Mohinī-mūrti, a Personalidade de Deus, colocou os semideuses sentados à distância. Então, aproximou-Se dos demônios e falou-lhes muito graciosamente, para que eles pudessem julgar-se muito afortunados de estar com Ela. Uma vez que Mohinī-mūrti deixara os semideuses sentados em um lugar distante, os demônios julgaram que os semideuses ganhariam apenas um pouco do néctar, e que Mohinī-mūrti estava tão satisfeita com os demônios que lhes daria todo o néctar. A expressão vañcayann upasañcaraiḥ indica que todo o estratage­ma do Senhor era enganar os demônios simplesmente lhes dirigindo palavras doces. Era intenção do Senhor distribuir o néctar somente aos semideuses.

Texto

te pālayantaḥ samayam
asurāḥ sva-kṛtaṁ nṛpa
tūṣṇīm āsan kṛta-snehāḥ
strī-vivāda-jugupsayā

Sinônimos

te — os demônios; pālayantaḥ — mantendo em ordem; samayam — o equilíbrio; asurāḥ — os demônios; sva-kṛtam — feita por eles; nṛpa — ó rei; tūṣṇīm āsan — permaneceram silenciosos; kṛta-snehāḥ — por terem desenvolvido apego a Mohinī-mūrti; strī-vivāda — discordando de uma mulher; jugupsayā — pois achavam que tal ação era abominável.

Tradução

Ó rei, uma vez que os demônios haviam prometido aceitar tudo o que a mulher fizesse, quer ela tomasse medidas justas, quer injustas, então, para manterem essa promessa, para mostrarem seu equilíbrio e pouparem-se de discutir com uma mulher, eles permaneceram em silêncio.

Texto

tasyāṁ kṛtātipraṇayāḥ
praṇayāpāya-kātarāḥ
bahu-mānena cābaddhā
nocuḥ kiñcana vipriyam

Sinônimos

tasyām — de Mohinī-mūrti; kṛta-ati-praṇayāḥ — devido à firme amizade; praṇaya-apāya-kātarāḥ — temendo o rompimento da amizade com que se sentiam ligados a Ela; bahu-mānena — por grande respei­to e honra; ca — também; ābaddhāḥ — sendo muito apegados a Ela; na — não; ūcuḥ — eles disseram; kiñcana — nem mesmo a menor pala­vra; vipriyam — devido à qual Mohinī-mūrti pudesse ficar insatisfeita com eles.

Tradução

Os demônios desenvolveram afeição por Mohinī-mūrti e passaram a ter alguma fé nEla, e temiam abalar essa relação. Portanto, eles demonstraram respeito e dignidade pelas palavras dEla e nada disse­ram que pudesse transtornar a amizade que tinham com Ela.

Comentário

SIGNIFICADO—Os demônios estavam tão cativados pelas artimanhas e palavras amistosas de Mohinī-mūrti que, embora os semideuses fossem servidos primeiro, os demônios acabaram apaziguando-se com meras pala­vras doces. O Senhor disse aos demônios: “Os semideuses são muito avarentos e estão excessivamente ávidos por tomar o néctar primei­ro. Então, que eles o tomem primeiro. Uma vez que não sois como eles, podeis esperar mais um pouco. Sois todos heróis e estais satis­feitos coMigo. É melhor esperardes que os semideuses bebam.”

Texto

deva-liṅga-praticchannaḥ
svarbhānur deva-saṁsadi
praviṣṭaḥ somam apibac
candrārkābhyāṁ ca sūcitaḥ

Sinônimos

deva-liṅga praticchannaḥ — cobrindo-se com as vestes de um semi­deus; svarbhānuḥ — Rāhu (que ataca o Sol e a Lua, provocando-lhes o eclipse); deva-saṁsadi — no grupo dos semideuses; praviṣṭaḥ — tendo-se introduzido; somam — o néctar; apibat — bebeu; candra-arkābhyām — tanto pelo Sol quanto pela Lua; ca — e; sūcitaḥ — foi detectado.

Tradução

Rāhu, o demônio que causa o eclipse do Sol e da Lua, colocou as vestes de um semideus e, dessa maneira, entrou na assembleia dos semi­deuses e bebeu o néctar sem ser detectado por ninguém, nem mesmo pela Suprema Personalidade de Deus. Entretanto, a Lua e o Sol, devido à permanente inimizade com Rāhu, perceberam a situação. Rāhu, então, foi identificado.

Comentário

SIGNIFICADO—A Suprema Personalidade de Deus, Mohinī-mūrti, foi capaz de desorientar todos os demônios, mas Rāhu foi tão astuto que não se deixou enganar. Rāhu pôde perceber que Mohinī-mūrti esta­va enganando os demônios e, portanto, mudou de roupa, disfarçou-­se de um semideus e sentou-se na assembleia dos semideuses. Neste ponto, talvez se pergunte por que a Suprema Personalidade de Deus não pôde detectar Rāhu. A razão é que o Senhor queria mostrar o que aconteceria àquele que bebesse o néctar. Isso será revelado nos próximos versos. A Lua e o Sol, entretanto, estavam sempre alertas com relação a Rāhu. Assim, quando Rāhu entrou na assembleia dos semideuses, a Lua e o Sol detecta­ram-no de imediato, e, então, a Suprema Personalidade de Deus também Se conscientizou de sua presença.

Texto

cakreṇa kṣura-dhāreṇa
jahāra pibataḥ śiraḥ
haris tasya kabandhas tu
sudhayāplāvito ’patat

Sinônimos

cakreṇa — pelo disco; kṣura-dhāreṇa — que era afiado como uma navalha; jahāra — decepada; pibataḥ — enquanto bebia o néctar; śiraḥ — a cabeça; hariḥ — a Suprema Personalidade de Deus; tasya — desse Rāhu; kabandhaḥ tu — exceto o corpo decapitado; sudhayā — pelo néctar; aplāvitaḥ — sem ser tocado; apatat — tombou imediata­mente.

Tradução

A Suprema Personalidade de Deus, Hari, usando o Seu disco, que era afiado como uma navalha, imediatamente decapitou Rāhu. Quando a cabeça de Rāhu foi decepada do seu corpo, o corpo, não tendo sido tocado pelo néctar, não conseguiu sobreviver.

Comentário

SIGNIFICADO—Quando a Personalidade de Deus, Mohinī-mūrti, decapitou Rāhu, a cabeça permaneceu viva, apesar do corpo morrer. Rāhu havia colocado o néctar em sua boca, e, antes que o néctar alcançasse seu corpo, sua cabeça foi cortada. Em razão disso, a cabeça de Rāhu con­tinuou viva, ao passo que seu corpo faleceu. Esse maravilhoso ato executado pelo Senhor destinava-se a mostrar que o néctar é uma ambrosia milagrosa.

Texto

śiras tv amaratāṁ nītam
ajo graham acīkḷpat
yas tu parvaṇi candrārkāv
abhidhāvati vaira-dhīḥ

Sinônimos

śiraḥ — a cabeça; tu — evidentemente; amaratām — imortalidade; nītam — tendo obtido; ajaḥ — senhor Brahmā; graham — como um dos planetas; acīkḷpat — reconheceu; yaḥ — o mesmo Rāhu; tu — na verdade; parvaṇi — durante os períodos de lua cheia e lua nova; candra-arkau — tanto a Lua quanto o Sol; abhidhāvati — persegue; vaira-dhīḥ — devido à inimizade.

Tradução

A cabeça de Rāhu, entretanto, tendo sido tocada pelo néctar, tornou-se imortal. Então, o senhor Brahmā aceitou a cabeça de Rāhu como um dos planetas. Visto que é um eterno inimigo da Lua e do Sol, Rāhu sempre tenta atacá-los nas noites de lua cheia e lua nova.

Comentário

SIGNIFICADO—Uma vez que Rāhu se tornou imortal, o senhor Brahmā o aceitou como um dos grahas, ou planetas, colocando-o em nível equivalen­te ao da Lua e do Sol. Rāhu, entretanto, sendo um eterno inimigo do Sol e da Lua, ataca-os periodicamente durante as noites de lua cheia e lua nova.

Texto

pīta-prāye ’mṛte devair
bhagavān loka-bhāvanaḥ
paśyatām asurendrāṇāṁ
svaṁ rūpaṁ jagṛhe hariḥ

Sinônimos

pīta-prāye — quando tinha sido bebido quase totalmente; amṛte — o néctar; devaiḥ — pelos semideuses; bhagavān — a Suprema Personalidade de Deus sob a forma de Mohinī-mūrti; loka-bhāvanaḥ — o mantenedor e benquerente dos três mundos; paśyatām — na presença de; asura­-indrāṇām — todos os demônios, com os seus líderes; svam — própria; rūpam — forma; jagṛhe — manifestou; hariḥ — a Suprema Personalidade de Deus.

Tradução

A Suprema Personalidade de Deus é o melhor amigo e benquerente dos três mundos. Então, quando os semideuses tinham praticamente acabado de beber o néctar, o Senhor, na presença de todos os demô­nios, revelou Sua forma original.

Texto

evaṁ surāsura-gaṇāḥ sama-deśa-kāla-
hetv-artha-karma-matayo ’pi phale vikalpāḥ
tatrāmṛtaṁ sura-gaṇāḥ phalam añjasāpur
yat-pāda-paṅkaja-rajaḥ-śrayaṇān na daityāḥ

Sinônimos

evam — assim; sura — os semideuses; asura-gaṇāḥ — e os demônios; sama — igual; deśa — lugar; kāla — tempo; hetu — causa; artha — objetivo; karma — atividades; matayaḥ — ambição; api — embora os mesmos; phale — no resultado; vikalpāḥ — não igual; tatra — a este respeito; amṛtam — néctar; sura-gaṇāḥ — os semideuses; phalam — o resultado; añjasā — fácil, total ou diretamente; āpuḥ — alcançaram; yat — em de­corrência de; pāda-paṅkaja — da Suprema Personalidade de Deus; rajaḥ — da poeira açafroada; śrayaṇāt — devido ao fato de terem recebido as bênçãos ou buscado o refúgio; na — não; daityāḥ — os demônios.

Tradução

O lugar, o tempo, a causa, o propósito, a atividade e a ambição eram todos os mesmos para os semideuses e os demônios, mas os semideuses alcançaram um resultado, e os demônios, outro. Porque sempre estão sob o refúgio da poeira dos pés de lótus do Senhor, os semideuses puderam muito facilmente beber o néctar e obter os efeitos por ele produzido. Os demônios, entretanto, não tendo buscado refúgio nos pés de lótus do Senhor, foram incapazes de alcan­çar o resultado que desejavam.

Comentário

SIGNIFICADO—Na Bhagavad-gītā (4.11), afirma-se que ye yathā māṁ prapadyante tāṁs tathaiva bhajāmy aham: a Suprema Personalidade de Deus é o juiz supremo que recompensa ou pune as pessoas de acordo com o grau com que elas se rendem aos Seus pés de lótus. Portanto, pode-se ver de fato que, embora estejam ao mesmo tempo trabalhando no mesmo lugar, empregando a mesma energia e sentindo a mesma ambição, os karmīs e os bhaktas alcançarão resultados diferentes. Os karmīs, sujeitando-se ao ciclo de nascimentos e mortes, transmigram através de diferentes corpos, ora subindo, ora descendo, de modo que sofrem no karma-cakra, o ciclo de nascimentos e mortes, os resultados de suas ações. Os devotos, entretanto, porque se renderam ple­namente aos pés de lótus do Senhor, jamais fracassam em suas tentativas. Embora aparentemente trabalhem como os karmīs, os devotos voltam ao lar, voltam ao Supremo, e são bem-sucedidos em todos os seus esforços. Os demônios ou ateístas têm muita fé em seus próprios esforços, mas, embora passem o dia e a noite traba­lhando arduamente, conseguem obter apenas aquilo que seu destino lhes reserva. Os devotos, entretanto, podem superar as reações do karma e alcançar resultados maravilhosos, mesmo sem esforço. Também se diz que phalena paricīyate: o sucesso ou fracasso em qualquer atividade é conhecido pelos resultados. Existem muitos karmīs vestidos de devotos, mas a Suprema Personalidade de Deus pode detectar os propósitos deles. Os karmīs querem explorar a propriedade do Senhor para seu gozo sensorial egoísta, enquanto o devoto procura usar a propriedade do Senhor para prestar serviço ao Senhor. Portanto, o devoto sempre é diferente dos karmīs, embora os karmīs possam vestir-se de devotos. Como se confirma na Bhagavad-gītā (3.9), yajñārthāt karmaṇo ’nyatra loko ’yaṁ karma-bandhanaḥ. Aquele que trabalha para o Senhor Viṣṇu liberta-se deste mundo material e, após abandonar o seu corpo material, volta ao lar, volta ao Supremo. O karmī, entretanto, embora externamente trabalhe como um devoto, está enredado em sua atividade não-devocional e, dessa maneira, sofre as tribulações da existência material. Logo, através dos resultados alcançados pelos karmīs e devotos, pode-se entender a participação da Suprema Personalidade de Deus, que age com os karmīs e jñānīs diferentemente da maneira como age com os devotos. O autor do Śrī Caitanya-caritāmṛta, portanto, diz:

kṛṣṇa-bhakta — niṣkāma, ataeva ‘śānta’
bhukti-mukti-siddhi-kāmī — sakali ‘aśānta’

Os karmīs, que desejam o gozo dos sentidos; os jñānīs, que aspiram à liberação ou imersão na existência do Supremo, e os yogīs, que buscam o sucesso material do poder místico, são todos inquietos e, por fim, encontram-se com a frustração. Mas o devoto, que não anseia por benefício pessoal e cuja única ambição é divulgar as glórias da Suprema Personalidade de Deus, é abençoado com todos os resultados auspiciosos do bhakti-yoga sem que precise executar algum trabalho árduo para isso.

Texto

yad yujyate ’su-vasu-karma-mano-vacobhir
dehātmajādiṣu nṛbhis tad asat pṛthaktvāt
tair eva sad bhavati yat kriyate ’pṛthaktvāt
sarvasya tad bhavati mūla-niṣecanaṁ yat

Sinônimos

yat — tudo o que; yujyate — seja realizado; asu — para a proteção da vida de alguém; vasu — proteção da riqueza; karma — atividades; manaḥ — pelos atos da mente; vacobhiḥ — pelas ações verbais; deha­-ātma-ja-ādiṣu — em prol do corpo ou da família da pessoa etc., sendo tomado como referência o corpo; nṛbhiḥ — pelos seres huma­nos; tat — isto; asat — impermanente, transitório; pṛthaktvāt — devi­do ao fato de não incluir a Suprema Personalidade de Deus; taiḥ — pelas mesmas atividades; eva — na verdade; sat bhavati — torna-se real e permanente; yat — que; kriyate — é realizado; apṛthaktvāt — devido à inclusão; sarvasya — para todos; tat bhavati — torna-se benéfico; mūla-niṣecanam — exatamente como regar a raiz de uma árvore; yat — que.

Tradução

Na sociedade humana, existem várias atividades que, realizadas através de palavras, da mente e das ações, servem para proteger a riqueza e a vida da pessoa em questão, mas todas elas são executadas visando ao gozo dos sentidos, restrito ou amplificado, cujo ponto de referência é o corpo da própria pessoa. Todas essas atividades fracassam porque estão desprovidas de serviço devocional. Porém, quando se realizam as mesmas atividades para a satisfação do Senhor, os resultados benéficos são distribuídos entre todos, assim como a água derramada na raiz de uma árvore se espalha por toda a árvore.

Comentário

SIGNIFICADO—Eis a diferença entre atividades materialistas e atividades realizadas em consciência de Kṛṣṇa. O mundo inteiro é ativo, e isso inclui os karmīs, os jñānīs, os yogīs e os bhaktas. Entretanto, todas as ati­vidades, exceto aquelas executadas pelos bhaktas, pelos devotos, terminam em fracasso e desperdício de tempo e energia. Moghāśā mogha-karmāṇo mogha-jñānā vicetasaḥ: se alguém não é devoto, suas esperanças, suas atividades e seu conhecimento são todos frustrados­. O não-devoto trabalha para o gozo de seus próprios sentidos, ou em prol do gozo de sua família, sociedade, comunidade ou nação, mas, como todas essas atividades estão desvinculadas da Suprema Personalidade de Deus, são consideradas asat. A palavra asat signi­fica “temporário” ou “ruim”, e sat significa “permanente” ou “bom”. As atividades realizadas para a satisfação de Kṛṣṇa são permanentes e boas, mas as atividades asat, embora às vezes apresentadas como filantro­pia, altruísmo, nacionalismo, este “ismo” ou aquele “ismo”, jamais produzirão algum resultado permanente e, portanto, são muito desventurosas. Entretanto, quando executado em consciência de Kṛṣṇa, qualquer trabalho, por pequeno que seja, redundará em um bem permanente e é muitíssimo favorável porque é feito para Kṛṣṇa, a boníssima Suprema Personalidade de Deus, que é o amigo de todos (suhṛdaṁ sarva-bhūtānām). A Suprema Personalidade de Deus é o único desfrutador e proprietário de tudo (bhoktāraṁ yajña-tapasāṁ sarva-loka-maheśvaram). Portanto, toda atividade realizada para o Senhor Supremo é permanente. Como resultado dessas atividades, aquele que as executa é imediatamente reconhecido. Na ca tasmān manuṣyeṣu kaścin me priya-kṛttamaḥ. Tal devoto, devido ao fato de conhecer na íntegra a Suprema Personalidade de Deus, logo passa a ser transcendental, embora aparentemente esteja ocupado em ati­vidades materiais. A única diferença entre as atividades materiais e as atividades espirituais é que as atividades materiais são realizadas somente para satisfazer os próprios sentidos da pessoa, ao passo que as ativida­des espirituais servem para satisfazer os sentidos transcendentais da Suprema Personalidade de Deus. Através de atividades espirituais, todos realmente se beneficiam, mas, através de atividades materiais, ninguém é favorecido; ao contrário, a pessoa enreda-se nas leis do karma.

Neste ponto, encerram-se os Significados Bhaktivedanta do oita­vo canto, nono capítulo, do Śrīmad-Bhāgavatam, intitulado: “O Senhor Encarna como Mohinī-mūrti”.