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CAPÍTULO OITENTA E SETE

As Orações dos Vedas Personificados

Este capítulo apresenta as orações dos Vedas personificados em glorificação aos aspectos pessoal e impessoal do Senhor Nārāyaṇa.

O rei Parīkṣit perguntou a Śrīla Śukadeva Gosvāmī como os Vedas podem referir-se diretamente à Suprema Verdade Absoluta, Brahman, já que os Vedas tratam do reino material governado pelos três modos da natureza e Brahman é completamente transcendental a esses modos. Em resposta, Śukadeva Gosvāmī descreveu um antigo encontro entre Śrī Nārāyaṇa Ṛṣi e Nārada Muni em Badarikāśrama. Viajando para aquele eremitério sagrado, Nārada encontrou o Senhor rodeado de elevados residentes da vila próxima dali, chamada Kalāpa. Depois de prostrar-se diante de Nārāyaṇa Ṛṣi e Seus companheiros, Nārada apresentou-Lhe esta mesma questão. Em resposta, Nārāyaṇa Ṛṣi relatou uma narração de como esta mesma pergunta fora discutida muito tempo atrás entre os grandes sábios que viviam em Janaloka. Certa vez, esses sábios, sentindo interesse em conhecer a natureza da Verdade Absoluta, escolheram Sanandana Kumāra para falar sobre o assunto. Sanandana contou-lhes como os numerosos Vedas personificados, que apareceram como as primeiras emanações da respiração do Senhor Nārāyaṇa, recitaram orações para Sua glorificação pouco antes da criação. Sanandana, então, passou a recitar essas preces primorosas.

Os residentes de Janaloka ficaram perfeitamente satisfeitos ao ouvirem Sanandana recitar as orações dos Vedas personificados, que os iluminaram sobre a verdadeira natureza da Suprema Verdade Abso­luta, e, com sua adoração, honraram Sanandana. Nārada Muni ficou igualmente satisfeito de ouvir essa narração relatada por Śrī Nārāyaṇa Ṛṣi. Depois disso, ofereceu suas reverências ao Senhor e, então, foi ver seu discípulo Vedavyāsa, a quem explicou tudo o que ouvira.

VERSO 1:
Śrī Parīkṣit disse: Ó brāhmaṇa, como os Vedas podem descre­ver diretamente a Suprema Verdade Absoluta, que não pode ser descrita com palavras? Os Vedas limitam-se a descrever as qualidades da natureza material, mas o Supremo é destituído dessas qualidades, sendo transcendental a todas as manifestações mate­riais e a suas causas.
VERSO 2:
Śukadeva Gosvāmī disse: O Senhor Supremo manifestou a inteligência, sentidos, mente e ar vital materiais das entidades vivas para que estas pudessem satisfazer seus desejos de gozo dos sentidos, nascerem repetidas vezes para se ocuparem em atividades fruitivas, tornarem-se elevadas em vidas futuras e, por fim, alcançarem a liberação.
VERSO 3:
Aqueles que vieram até mesmo antes de nossos antigos prede­cessores meditaram nesse mesmo conhecimento confidencial a respeito da Verdade Absoluta. De fato, qualquer um que se con­centrar com fé neste conhecimento ficará livre dos apegos mate­riais e alcançará a meta última da vida.
VERSO 4:
A esse respeito, compartilharei contigo uma história sobre o Supremo Senhor Nārāyaṇa. Trata-se de uma conversa que aconteceu certa vez entre Śrī Nārāyaṇa Ṛṣi e Nārada Muni.
VERSO 5:
Certa vez, viajando entre os vários planetas do universo, Nārada, o amado devoto do Senhor, foi visitar o sábio primordial Nārāyaṇa em Seu āśrama.
VERSO 6:
Desde o começo do dia de Brahmā, o Senhor Nārāyaṇa Ṛṣi tem se submetido a austeras penitências nesta terra de Bhārata enquanto cumpre com perfeição os deveres religiosos e exemplifica o conhecimento espiritual e o autocontrole – tudo para o bene­fício dos seres humanos tanto neste quanto no outro mundo.
VERSO 7:
Ali, Nārada se aproximou do Senhor Nārāyaṇa Ṛṣi, que estava sentado entre sábios da vila de Kalāpa. Depois de prostrar-se diante do Senhor, ó herói dos Kurus, Nārada perguntou-Lhe o mesmo que me perguntaste.
VERSO 8:
Enquanto os sábios ouviam, o Senhor Nārāyaṇa Ṛṣi contou a Nārada uma antiga discussão sobre a Verdade Absoluta ocorrida entre os residentes de Janaloka.
VERSO 9:
A Personalidade de Deus disse: Ó filho do autógeno Brahmā, muito tempo atrás, em Janaloka, sábios que residiam ali executaram um grande sacrifício para a Verdade Absoluta vibrando sons transcendentais. Esses sábios, filhos da mente de Brahmā, eram todos perfeitos celibatários.
VERSO 10:
Naquela ocasião, aconteceu de estares visitando o Senhor em Śvetadvīpa – aquele Senhor Supremo em quem os Vedas repousam para descansar durante o período da aniquilação universal. Surgiu uma animada discussão entre os sábios de Janaloka sobre a natureza da Suprema Verdade Absoluta. De fato, levantou-se, então, a mesma questão que Me estás perguntando agora.
VERSO 11:
Embora aqueles sábios fossem todos igualmente qualificados em termos de estudo védico e austeridade, e embora todos eles vissem amigos, inimigos e pessoas neutras com igualdade, eles escolheram um dentre os sábios para ser o orador, e o restante formou um atento auditório.
VERSOS 12-13:
Śrī Sanandana respondeu: Depois que recolheu o universo que havia criado anteriormente, o Senhor Supremo deitou-Se por algum tempo como se houvesse adormecido, e todas as Suas energias ficaram dormentes dentro dEle. Quando chegou a ocasião da próxima criação, os Vedas personificados O despertaram cantando Suas glórias, assim como os poetas que servem um rei aproxi­mam-se dele de manhã e o acordam recitando seus feitos heroicos.
VERSO 14:
Os śrutis disseram: Vitória, vitória a Vós, ó invencível! Por Vossa própria natureza, sois perfeitamente pleno em todas as opu­lências; portanto, por favor, derrotai o eterno poder da ilusão, que assume o controle dos modos da natureza para criar dificul­dades para as almas condicionadas. Ó Vós que despertais todas as energias dos seres corporificados móveis e inertes, às vezes os Vedas podem reconhecer-Vos enquanto Vos divertis com Vossas potências material e espiritual.
VERSO 15:
Este mundo perceptível é idêntico ao Supremo porque o Brahman Supremo é a base última de toda a existência, permanecen­do inalterado enquanto todas as coisas criadas são geradas a partir dele e acabam dissolvidas nele, assim como a argila permanece inal­terada pelos produtos feitos dela e de novo imersos nela. Assim, é para Vós somente que os sábios védicos dirigem todos os seus pensamentos, palavras e atos. Afinal, como poderiam os passos dos homens deixar de tocar a terra sobre a qual eles vivem?
VERSO 16:
Portanto, ó mestre dos três mundos, os sábios livram-se de todo o sofrimento mergulhando fundo no nectáreo oceano dos tópicos que tratam de Vós, o qual purifica toda a contaminação do universo. O que se dizer, então, daqueles que, tendo pela força espiritual livra­do suas mentes de maus hábitos e livrado a si mesmos do tempo, são capazes de adorar Vossa verdadeira natureza, ó supremo, encontrando nela bem-aventurança ininterrupta?
VERSO 17:
Apenas quando se tornam Vossos fiéis seguidores é que aqueles que respiram estão de fato vivos; do contrário, sua respiração é como a de um fole. É apenas por Vossa misericórdia que os elementos, a começar do mahat-tattva e falso ego, criaram este universo ovoi­de. Entre as manifestações conhecidas como anna-maya e assim por diante, sois a última delas, que entra nas coberturas mate­riais juntamente com a entidade viva e assume as mesmas formas que esta aceita. Distinto das manifestações materiais grosseiras e sutis, sois a realidade subjacente a todas elas.
VERSO 18:
Dentre os seguidores dos métodos estabelecidos por grandes sábios, aqueles com visão menos refinada adoram o Supremo como presente na região do abdômen, enquanto os Āruṇis adoram-nO como presente no coração, no centro sutil do qual emanam todos os canais prânicos. Dali, ó Senhor ilimitado, esses adoradores elevam sua consciência até o topo da cabeça, onde podem perce­ber-Vos diretamente. Então, atravessando o topo da cabeça rumo ao destino supremo, eles alcançam aquele lugar do qual jamais voltarão a cair neste mundo, na boca da morte.
VERSO 19:
Aparentemente entrando nas várias espécies de seres vivos que criastes, Vós os inspirais a agir, manifestando-Vos segundo suas posições superiores e inferiores, assim como o fogo se manifesta de maneiras diferentes segundo a forma daquilo que ele queima. Portanto, pessoas de inteligência imaculada, que estão completamente livres de apegos materiais, compreendem que Vosso eu indiferenciado e imutável é a realidade permanente entre todas estas impermanentes formas de vida.
VERSO 20:
O ser vivo individual, embora habite os corpos materiais que criou para si mesmo por meio de seu karma, de fato não é coberto nem pela matéria sutil nem pela grosseira. Isso acontece assim porque, como descrevem os Vedas, ele é parte integrante de Vós, o possuidor de todas as potências. Tendo determinado que esta é a posição da entidade viva, os sábios eruditos ficam imbuídos de fé e adoram Vossos pés de lótus, aos quais se ofere­cem todos os sacrifícios védicos neste mundo e que são a fonte da liberação.
VERSO 21:
Meu Senhor, algumas almas afortunadas obtiveram alívio da fadiga da vida material mergulhando no vasto oceano de néctar de Vossos passatempos, que encenais quando manifestais Vossas formas pessoais para propagar a insondável ciência do eu. Essas almas raras, indiferentes até mesmo à liberação, renunciam à felicidade do lar e da família por causa de sua associação com devo­tos que são como bandos de cisnes a se deleitarem próximo ao lótus de Vossos pés.
VERSO 22:
Quando é usado para Vosso serviço devocional, este corpo humano age como o próprio eu, amigo e amado da pessoa. Mas desafortunadamente, embora sempre mostreis misericórdia para com as almas condicionadas e afetuosamente as ajudeis de todas as maneiras, e embora sejais o verdadeiro eu delas, as pessoas em geral deixam de deleitar-se em Vós. Em vez disso, cometem suicídio espiritual ao adorarem a ilusão. Oh! Porque persistem em aspi­rar por sucesso em sua devoção ao irreal, elas continuam a vagar por este terribilíssimo mundo, assumindo vários corpos degra­dados.
VERSO 23:
Pelo simples fato de pensar sempre nEle, os inimigos do Senhor alcançaram a mesma Verdade Suprema que sábios fixos em yoga adoram mediante o controle da respiração, mente e sentidos. De igual modo, nós, śrutis, que em geral Vos vemos como onipene­trante, conseguiremos o mesmo néctar de Vossos pés de lótus que Vossas esposas são capazes de saborear por causa de sua atração amorosa por Vossos poderosos braços serpentinos, pois conside­rais a nós e a Vossas esposas da mesma maneira.
VERSO 24:
Todos neste mundo nasceram há pouco tempo e logo morre­rão. Logo, como é que alguém aqui pode conhecer àquele que existia antes de tudo o mais e que deu origem ao primeiro sábio erudito, Brahmā, e a todos os semideuses subsequentes, tanto inferiores quanto superiores? Quando Ele Se deita e recolhe tudo para dentro de Si, nada mais permanece – nem matéria grossei­ra ou sutil, nem corpos compostos destas, nem a força do tempo, nem a escritura revelada.
VERSO 25:
Supostas autoridades que declaram que a matéria é a origem da existência, que as qualidades permanentes da alma podem ser destruídas, que o eu se compõe de aspectos separados de espírito e matéria, ou que as transações materiais constituem a realidade – todas estas autoridades baseiam seus ensinamentos em ideias equivocadas e que escondem a verdade. O conceito dualista de que a entidade viva é produto dos três modos da natureza não passa de mero resultado da ignorância. Tal concepção não tem base real em Vós, pois sois transcendental a toda ilusão e sempre des­frutais de uma consciência total e perfeita.
VERSO 26:
Os três modos da natureza material englobam tudo neste mundo – dos fenômenos mais simples até o complexo corpo hu­mano. Embora pareçam reais, esses fenômenos não passam de um falso reflexo da realidade espiritual, sendo uma superimposi­ção da mente sobre Vós. Ainda assim, aqueles que conhecem o Eu Supremo consideram real a criação material inteira, visto ser esta não diferente do Eu. Assim como objetos feitos de ouro de fato não devem ser rejeitados, já que sua substância é ouro ver­dadeiro, da mesma maneira este mundo é, sem dúvida, não dife­rente do Senhor que o criou e, então, entrou nele.
VERSO 27:
Os devotos que Vos adoram como o refúgio de todos os seres desprezam a Morte e pisam sobre sua cabeça. Porém, com as pala­vras dos Vedas, amarrais os não-devotos como animais, embora eles sejam estudiosos de vasta erudição. Só Vossos devotos afetuo­sos é que podem purificar a si e aos outros, e não aqueles que são hostis a Vós.
VERSO 28:
Embora não tenhais sentidos materiais, Vós sois o sustentador autorrefulgente dos poderes sensoriais de todos. Os semideuses e a própria natureza material oferecem-Vos tributo, enquanto também desfrutam o tributo que lhes oferecem seus adoradores, assim como governantes subordinados dos vários distritos de um reino oferecem tributo a seu senhor, o proprietário supremo da terra, e, ao mesmo tempo, também desfrutam o tributo que seus súditos lhes pagam. Desta maneira, por medo de Vós, os criado­res universais executam fielmente seus serviços prescritos.
VERSO 29:
Ó Senhor transcendental e eternamente liberado, Vossa energia material provoca o aparecimento das várias espécies de vida mó­veis e inertes mediante a ativação de seus desejos materiais, mas só quando e se brincais com ela lançando-lhe um breve olhar. Vós, a Suprema Personalidade de Deus, não vedes ninguém como amigo íntimo nem como estranho, assim como o céu etéreo não tem conexão com qualidades perceptíveis. Nesse sentido, pareceis um vazio.
VERSO 30:
Se as incontáveis entidades vivas fossem onipenetrantes e pos­suíssem formas que nunca mudassem, não poderíeis ser o go­vernante absoluto delas, ó imutável. Mas como elas são Vossas expansões localizadas e suas formas estão sujeitas a mudança, sois Vós que as controlais. De fato, aquilo que fornece os ingre­dientes para a produção de algo é necessariamente seu controlador, visto que um produto jamais existe separado de sua causa constituinte. É mera ilusão alguém pensar que conhece o Senhor Supremo, que está igualmente presente em cada uma de Suas ex­pansões, pois qualquer conhecimento que se obtenha por meios materiais é certamente imperfeito.
VERSO 31:
Nem a natureza material nem a alma que tenta desfrutá-la nascem em tempo algum. Ainda assim, os corpos vivos vêm a existir quando estes dois se combinam, assim como bolhas se formam quando a água se encontra com o ar. E assim como os rios fundem-se no oceano ou o néctar de muitas flores diferentes se mistura no mel, da mesma forma todos esses seres condicionados terminam fun­dindo-se outra vez em Vós, o Supremo, juntamente com seus vários nomes e qualidades.
VERSO 32:
As almas sábias que compreendem como Vossa māyā enga­na todos os seres humanos prestam poderoso serviço amoroso a Vós, que sois a fonte de liberação dos nascimentos e mortes. Como, de fato, o medo da vida material pode afetar Vossos fiéis servos? Por outro lado, Vossas sobrancelhas franzidas – a roda do tempo, a qual tem três aros – aterrorizam repetidamente aqueles que se recusam a abrigar-se em Vós.
VERSO 33:
A mente é como um cavalo impetuoso que nem mesmo pessoas que regularam os sentidos e a respiração podem controlar. Aque­les neste mundo que tentam domar a mente descontrolada, mas que abandonam os pés de seu mestre espiritual, deparam-se com centenas de obstáculos em seu cultivo de várias práticas penosas. Ó Senhor não-nascido, eles são como mercadores em um barco no oceano que não contrataram um timoneiro.
VERSO 34:
Para aqueles que se refugiam em Vós, revelais-Vos como a Superalma, a personificação de todo o prazer transcendental. De que servem para tais devotos seus servos, filhos, corpos, espo­sas, dinheiro, casas, terra, boa saúde ou veículos? E para aqueles que não conseguem apreciar a verdade sobre Vós e continuam atrás dos prazeres da vida sexual, o que poderia haver em todo este mundo – um lugar inerentemente condenado à destruição e destituído de significado – que lhes pudesse dar verdadeira felicidade?
VERSO 35:
Os sábios livres de falso orgulho vivem nesta Terra a frequen­tar os locais sagrados de peregrinação e aqueles lugares onde o Senhor Supremo exibiu Seus passatempos. Porque esses devotos conservam Vossos pés de lótus em seus corações, a água que lava seus pés destrói todos os pecados. Qualquer um que ao menos uma vez volta sua mente para Vós, a sempre bem-aventurada Alma de toda a existência, não mais se dedica a servir a vida fa­miliar no lar, o que simplesmente rouba as boas qualidades de um homem.
VERSO 36:
Pode-se propor que este mundo é permanentemente real porque é gerado a partir da realidade permanente, mas tal argumento está sujeito à refutação lógica. Algumas vezes, de fato, a não-diferença aparente de uma causa e seu efeito deixa de se confirmar, e outras vezes o produto de algo real é ilusório. Além disso, este mundo não pode ser permanentemente real, pois ele partilha das natu­rezas não somente da realidade absoluta, mas também da ilusão que encobre aquela realidade. Na verdade, as formas visíveis deste mundo são apenas um arranjo imaginário ao qual recorre uma sucessão de pessoas ignorantes a fim de facilitar seus assuntos ma­teriais. Com seus vários sentidos e implicações, as palavras eru­ditas dos Vedas confundem todas as pessoas cujas mentes foram embrutecidas por ouvirem os encantamentos dos rituais sacrificatórios.
VERSO 37:
Visto que este universo não existia antes de sua criação e não existirá mais depois de sua aniquilação, concluímos que, neste ínterim, ele não é mais do que uma manifestação que se imagina ser visível dentro de Vós, cujo prazer espiritual jamais muda. Comparamos este universo à transformação de várias substâncias materiais em diversas formas. Com certeza aqueles que acredi­tam que esta invenção da imaginação é substancialmente real são menos inteligentes.
VERSO 38:
A natureza material ilusória incita o diminuto ser vivo a abraçá-la, e, como resultado, ele assume formas compostas de suas qua­lidades. Subsequentemente, ele perde todas as suas qualidades espirituais e tem de sujeitar-se a repetidas mortes. Vós, toda­via, evitais a energia material da mesma maneira que uma cobra abandona sua pele velha. Glorioso em Vossa posse das oito perfeições místicas, Vós desfrutais ilimitadas opulências.
VERSO 39:
Os membros da ordem renunciada que não conseguem erra­dicar os últimos vestígios do desejo material de seus corações permanecem impuros, razão pela qual não permitis que eles Vos com­preendam. Embora estejais presente em seus corações, para eles sois como uma joia usada no pescoço de um homem que esqueceu totalmente que ela está ali. Ó Senhor, aqueles que praticam yoga apenas para o gozo dos sentidos devem ser castigados tanto nesta vida quanto na próxima: pela morte, que não os deixará, e por Vós, cujo reino eles não poderão alcançar.
VERSO 40:
Quando alguém Vos compreende, ele não se preocupa mais com sua boa ou má fortuna decorrente de atos passados piedosos ou pecaminosos, já que sois Vós apenas que controlais essa boa ou má fortuna. Semelhante devoto realizado também desconsidera o que os seres vivos comuns dizem sobre ele. Todos os dias, ele enche os ouvidos com Vossas glórias, que são recitadas em cada era pela sucessão ininterrupta dos descendentes de Manu, e assim tornais­-Vos para ele a salvação última.
VERSO 41:
Porque sois ilimitado, nem os senhores do céu nem mesmo Vós podeis jamais alcançar o limite de Vossas glórias. Os incontáveis universos, cada qual envolvido em seu invólucro, são impelidos pela roda do tempo a vaguear dentro de Vós, como partículas de poeira a voar pelo céu. Seguindo seu método de eliminação de tudo o que é separado do Supremo, os śrutis tornam-se bem-­sucedidos ao revelar-Vos como a sua conclusão máxima.
VERSO 42:
O Senhor Supremo, Śrī Nārāyaṇa Ṛṣi, disse: Tendo ouvido essas instruções sobre o Eu Supremo, a Personalidade de Deus, os filhos de Brahmā entenderam, então, o seu destino final. Eles ficaram perfeitamente satisfeitos e, com sua adoração, honraram Sanandana.
VERSO 43:
Assim, os santos antigos que viajam nos céus superiores destilaram esta essência nectárea e confidencial de todos os Vedas e Purāṇas.
VERSO 44:
E enquanto vagueias pela Terra livremente, Meu querido filho de Brahmā, deves meditar com fé nestas instruções a respeito da ciência do Eu, as quais queimam por completo os desejos materiais de todos os homens.
VERSO 45:
Śukadeva Gosvāmī disse: Quando Śrī Nārāyaṇa Ṛṣi lhe deu essa ordem, o autocontrolado sábio Nārada, cujo voto é tão heroi­co como o de um guerreiro, aceitou-a com firme fé. Então, bem­-sucedido em todos os seus propósitos, ele pensou no que ouvira, ó rei, e respondeu o seguinte ao Senhor.
VERSO 46:
Śrī Nārada disse: Ofereço Minhas reverências a Ele, que tem fama imaculada, o Supremo Senhor Kṛṣṇa, que manifesta Suas expansões pessoais todo-atrativas para que todos os seres vivos possam alcançar a liberação.
VERSO 47:
[Śukadeva Gosvāmī continuou:] Depois de dizer essas pala­vras, Nārada prostrou-se diante de Śrī Nārāyaṇa Ṛṣi, o principal dos sábios, e também diante de Seus discípulos santos. Então, re­gressou ao eremitério de meu pai, Dvaipāyana Vyāsa.
VERSO 48:
Vyāsadeva, a encarnação da Personalidade de Deus, saudou Nārada Muni respeitosamente e ofereceu-lhe um assento, que ele aceitou. Nārada, então, descreveu a Vyāsa o que ouvira da boca de Śrī Nārāyaṇa Ṛṣi.
VERSO 49:
Respondi assim à pergunta que me fizeste, ó rei, sobre como a mente pode ter acesso à Verdade Absoluta, que é indescritível por palavras materiais e destituída de qualidades materiais.
VERSO 50:
Ele é o Senhor que protege eternamente este universo, que existe antes, durante e depois de sua manifestação. Ele é o amo tanto da energia material imanifesta quanto da alma espiritual. Depois de gerar a criação, Ele entra nela, acompanhando cada entidade viva. Ali, Ele cria os corpos materiais e, então, permanece como seu regulador. Rendendo-se a Ele, pode-se escapar do abra­ço da ilusão, assim como uma pessoa ao sonhar esquece o próprio corpo. Quem deseja libertar-se do medo deve meditar incessantemente nEle, o Senhor Hari, que está sempre na plataforma da perfeição e, por isso, jamais Se sujeita ao nascimento material.