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Capítulo Vinte e Dois

Bali Mahārāja Entrega Sua Vida

O resumo deste vigésimo segundo capítulo é o seguinte. A Su­prema Personalidade de Deus estava satisfeito com o comportamento de Bali Mahārāja. Por isso, o Senhor o colocou no planeta Sutala, onde, após conceder-lhe bênçãos, o Senhor concordou em tornar-Se seu porteiro.

Bali Mahārāja era extremamente veraz. Sendo incapaz de cumprir sua promessa, ele ficou muito temeroso, pois sabia que alguém que se desvia da veracidade é insignificante aos olhos da sociedade. Uma pessoa virtuosa prefere sofrer os rigores da vida infernal a ser acusada de ter-se desviado da verdade. Por isso, Bali Mahārāja con­cordou com grande prazer em aceitar a punição que lhe foi imposta pela Suprema Personalidade de Deus. Na dinastia de Bali Mahārāja, havia muitos asuras que, devido à sua inimizade com Viṣṇu, alcançaram um destino mais sublime do que o destino de muitos yogīs místicos. Bali Mahārāja, especificamente, lembrou-se da determinação de Prahlāda Mahārāja no serviço devocional. Considerando todos esses pontos, ele decidiu dar em caridade sua cabeça, colocando-a como o lugar para o terceiro passo de Viṣṇu. Bali Mahārāja também analisou como grandes personalidades abandonam suas relações familiares e posses materiais para satisfazer a Suprema Personalidade de Deus. Algumas vezes, na verdade, elas sacrificam até mesmo suas vidas para a satisfação do Senhor, simplesmente para tornarem-se Seus servos pessoais. Igualmente, seguindo os passos dos ācāryas e devotos anteriores, Bali Mahārāja sentiu-se exitoso.

Enquanto Bali Mahārāja, tendo sido preso pelas cordas de Varuṇa, oferecia orações ao Senhor, seu avô, Prahlāda Mahārāja, apareceu diante dele e descreveu como a Suprema Personalidade de Deus libertara Bali Mahārāja tirando suas posses através de uma manobra astuta. Enquanto Prahlāda Mahārāja estava presente, o senhor Brahmā e a esposa de Bali, Vindhyāvali, glorificaram a supremacia do Senhor Supremo. Uma vez que Bali Mahārāja havia dado tudo ao Senhor, eles oraram por sua libertação. Então, o Senhor descreveu como, nas mãos de um não-devoto, a riqueza é algo perigoso, ao passo que a opulência de um devoto é uma bênção do Senhor. Então, estan­do satisfeito com Bali Mahārāja, o Senhor Supremo ofereceu o Seu disco para proteger Bali Mahārāja e prometeu permanecer com ele.

VERSO 1:
Śukadeva Gosvāmī disse: Ó rei, embora, superficialmente, tenha parecido que a Suprema Personalidade de Deus agiu com o propósito de prejudicar Bali Mahārāja, esse permanecia fixo em sua determinação. Julgando não ter cumprido sua promessa, ele falou as seguintes palavras.
VERSO 2:
Bali Mahārāja disse: Ó excelente Personalidade de Deus, ó pessoa adorabilíssima para todos os semideuses, se julgais que minha promessa se tornou falsa, decerto retificarei qualquer equívoco para mostrar que ela é verdadeira. Não posso permitir que minha pro­messa seja falsa. Portanto, por favor, colocai sobre minha cabeça o Vosso terceiro passo de lótus.
VERSO 3:
Não temo perder todas as minhas posses, viver uma vida infernal, ser preso devido à pobreza pelas cordas de Varuṇa ou ser punido por Vós tanto quanto eu temo ser difamado.
VERSO 4:
Embora o pai, a mãe, um irmão ou amigo possam às vezes punir alguém como um benquerente, eles nunca aplicam a seus subordinados uma punição como esta. Porém, como sois o Senhor adorabilíssimo, considero muito sublime a posição que me infligistes.
VERSO 5:
Uma vez que Vossa Onipotência é indiretamente o maior benque­rente de nós demônios, agis para o nosso máximo bem-estar fazendo-Vos passar por nosso inimigo. Visto que demônios como nós sempre aspiramos a uma posição de falso prestígio, castigando­-nos, Vós nos dais os olhos com os quais podemos ver o caminho correto.
VERSOS 6-7:
Muitos demônios que continuamente eram Vossos inimigos acaba­ram alcançando a perfeição própria de grandes yogīs místicos. Vossa Onipotência pode, através de uma única atividade, satisfazer muitos propósitos, e, consequentemente, embora me tenhais punido de tantas maneiras, não me sinto envergonhado de ter sido preso pelas cordas de Varuṇa, tampouco me sinto lesado.
VERSO 8:
Meu avô Prahlāda Mahārāja é famoso e é celebrado por todos os Vossos devotos. Embora afligido de tantas maneiras pelo seu pai, Hiraṇyakaśipu, mesmo assim, permaneceu fiel, refugiando-se em Vossos pés de lótus.
VERSO 9:
Qual a utilidade do corpo material, que fatalmente será deixado pelo seu proprietário no fim da vida? E qual a utilidade de todos os membros familiares, os quais, na verdade, são saqueadores que arrebatam o dinheiro que poderia ser utilizado a serviço da Senhor para gerar opulência espiritual? Qual a utilidade da esposa? Ela é apenas a fonte para a intensificação de condições materiais. E qual a utilidade da família, lar, nação e comunidade? O apego a eles apenas desperdiça a valiosa energia manifesta ao longo da du­ração de vida da pessoa.
VERSO 10:
Meu avô, o melhor de todos os homens, que alcançou conhecimento ilimitado e era adorável a todos, temia os homens comuns deste mundo. Estando plenamente convicto da estabilidade oferecida pelo refúgio a Vossos pés de lótus, ele se abrigou a Vossos pés de lótus, ainda que, para isso, tenha agido contra o desejo de seu pai e amigos demoníacos, que foram mortos por não outrem senão Vós.
VERSO 11:
É somente pela providência que, forçosamente, fui trazido aos Vossos pés de lótus e fiquei privado de toda a minha opulência. Devido à ilusão criada pela opulência temporária, as pessoas em geral, que vivem em condições materiais, deparando-se a cada momento com a morte inesperada, não entendem que esta vida é temporária. Somente pela providência fui salvo dessa condição.
VERSO 12:
Śukadeva Gosvāmī disse: Ó melhor dos Kurus, enquanto Bali Mahārāja descrevia dessa maneira sua posição afortunada, o mais querido devoto do Senhor, Prahlāda Mahārāja, apareceu ali, tal qual a Lua que surge à noite.
VERSO 13:
Então, Bali Mahārāja viu seu avô Prahlāda Mahārāja, a mais afor­tunada personalidade, cujo corpo escuro parecia unguento negro para os olhos. Sua figura alta e elegante estava vestida com roupas amarelas; ele tinha braços longos, e seus belos olhos eram como pétalas de lótus. Ele era muito querido e agradável a todos.
VERSO 14:
Estando amarrado pelas cordas de Varuṇa, Bali Mahārāja não pôde oferecer a Prahlāda Mahārāja respeitos adequados, como fizera antes. Ao contrário, simplesmente ofereceu respeitosas reverências com sua cabeça; seus olhos ficaram inundados de lágrimas, e seu rosto curvou-se de vergonha.
VERSO 15:
Ao ver que o Senhor Supremo estava sentado ali, cercado e adorado por Seus associados íntimos, tais como Sunanda, a grande personalidade Prahlāda Mahārāja inundou-se de lágrimas de júbilo. Aproximando-se do Senhor e caindo ao chão, ele prostrou sua cabeça para oferecer reverências ao Senhor.
VERSO 16:
Prahlāda Mahārāja disse: Meu Senhor, foi Vossa Onipotência quem deu a este Bali uma enorme opulência, entregando-lhe o posto de rei celestial, mas agora, no dia de hoje, Vós mesmo tirastes tudo dele. Creio que agistes com igual retidão em ambos os casos. Porque sua elevada posição de rei dos céus estava colocando-o na escuridão da ignorância, fizestes-lhe um misericordiosíssimo favor ao privá-lo de todas as opulências.
VERSO 17:
A opulência material desorienta tão fortemente que faz até mesmo um homem erudito e autocontrolado esquecer-se de buscar a meta da autorreali­zação. Mas, por Sua vontade, a Suprema Personalidade de Deus, Nārāyaṇa, o Senhor do universo, pode ver tudo. Portanto, ofere­ço-Lhe minhas respeitosas reverências.
VERSO 18:
Śukadeva Gosvāmī continuou: Ó rei Parīkṣit, o senhor Brahmā, então, começou a dirigir a palavra à Suprema Personalidade de Deus. O que ele falava podia ser ouvido por Prahlāda Mahārāja, que, ali perto, per­manecia de mãos postas.
VERSO 19:
Foi então que a casta esposa de Bali Mahārāja, temerosa e aflita vendo que seu esposo estava preso, imediatamente ofereceu reverên­cias ao Senhor Vāmanadeva [Upendra]. De mãos postas, ela falou as seguintes palavras.
VERSO 20:
Śrīmatī Vindhyāvali disse: Ó meu Senhor, criastes todo o universo para desfrutardes dos Vossos passatempos pessoais, mas os homens tolos e sem inteligência reivindicam o direito de gozo material. Sem dúvida, não são nada além de agnósticos desavergonhados. Falsamente alegando-se proprietários, pensam que podem fazer caridade e desfrutar. Nessas condições, que bem eles poderão fazer a Vós, que, agindo de maneira indepen­dente, criais, mantendes e aniquilais este universo?
VERSO 21:
O senhor Brahmā disse: Ó benquerente e mestre de todas as entidades vivas, ó Deidade adorável de todos os semideuses, ó onipenetrante Personalidade de Deus, acabastes de infligir a este homem a devida punição, pois lhe tirastes tudo. Agora, podeis libertá-lo. Ele não merece continuar sendo punido.
VERSO 22:
Bali Mahārāja já ofereceu tudo à Vossa Onipotência. Sem hesita­ção, ofereceu sua terra, os planetas e tudo o que ganhou através de suas atividades piedosas. Ofereceu até mesmo o seu próprio corpo.
VERSO 23:
Oferecendo mesmo água, gramíneas recém-desenvolvidas ou botões de flores a Vossos pés de lótus, aqueles que não carregam consigo uma mentalidade dúplice podem alcançar a mais elevada posição dentro do mundo espiritual. Este Bali Mahārāja, sem duplicidade, acaba de oferecer tudo nos três mundos. Então, como ele pode merecer ficar aprisionado?
VERSO 24:
A Suprema Personalidade de Deus disse: Meu querido senhor Brahmā, devido à opulência material, pessoas tolas tornam-se estúpidas e loucas. Assim, não respeitam ninguém dentro dos três mundos e desafiam até mesmo Minha autoridade. A essas pessoas, Eu mostro um favor especial, tirando primeiro todas as suas posses.
VERSO 25:
Enquanto gira no ciclo de repetidos nascimentos e mortes, passando por diferentes espécies de vida por causa de suas próprias atividades fruitivas, a entidade viva dependente, por boa fortuna, às vezes pode tornar-se um ser humano. Esse nascimento humano é muito rara­mente obtido.
VERSO 26:
Se um ser humano nasce em família aristocrática ou em família cujo status de vida é superior, se ele realiza atividades maravilhosas, se é jovem, se tem beleza pessoal, boa educação e muita riqueza, e se, mesmo assim, não se orgulha de suas opulências, deve-se enten­der que ele é especialmente favorecido pela Suprema Personalidade de Deus.
VERSO 27:
Embora um nascimento aristocrático e outras opulências semelhan­tes sejam impedimentos ao avanço em serviço devocional porque são causas de falso prestígio e orgulho, essas opulências jamais per­turbam um devoto puro da Suprema Personalidade de Deus.
VERSO 28:
Bali Mahārāja tornou-se o mais famoso entre os demônios e descrentes, pois, embora destituído de todas as opulências mate­riais, permaneceu fixo em seu serviço devocional.
VERSOS 29-30:
Embora privado de suas riquezas, caído de sua posição original, derrotado e preso por seus inimigos, recriminado e desertado por seus amigos e parentes, embora sofrendo a dor de ser amarrado e embora censurado e amaldiçoado por seu mestre espiritual, Bali Mahārāja, estando fixo em seu voto, não abandonou sua veracidade. Foi certamente de maneira mentirosa que falei sobre os princípios religiosos, mas ele não se afastou dos princípios religiosos, pois manteve-se fiel à sua palavra.
VERSO 31:
O Senhor prosseguiu: Devido à sua grande tolerância, dei-lhe um lugar inacessível até mesmo aos semideuses. Durante o período do Manu conhecido como Sāvarṇi, ele se tornará o rei dos planetas celestiais.
VERSO 32:
Enquanto não se estabelece na posição de rei dos céus, Bali Mahārāja viverá no planeta Sutala, que foi feito por Viśvakarmā, de acordo com Minha ordem. Porque é especialmente protegido por Mim, esse planeta está livre dos sofrimentos mentais e corpóreos, da fadiga, da tontura, da derrota e de todos os outros distúrbios. Bali Mahārāja, podes agora viver ali pacificamente.
VERSO 33:
Ó Bali Mahārāja [Indrasena], podes então ir para o planeta Sutala, que é desejado até mesmo pelos semideuses. Reside ali pacificamente, cercado por teus amigos e parentes. Desejo-te toda boa fortuna!
VERSO 34:
No planeta Sutala, se nem mesmo as deidades predominantes de outros planetas serão capazes de vencer-te, o que falar, então, das pessoas comuns? Quanto aos demônios, se transgredirem tuas leis, serão mortos pelo Meu disco.
VERSO 35:
Ó grande herói, sempre estarei contigo e, em todos os sentidos, protegerei tanto a ti quanto aos teus associados e parafernália. Além disso, sempre serás capaz de ver-Me ali.
VERSO 36:
Porque, nesse lugar, verás o Meu poder supremo, imediatamente se dissiparão tuas ideias e ansiedades materiais, surgidas de tua associação com os demônios e Dānavas.