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CAPÍTULO ONZE

Os Passatempos Infantis de Kṛṣṇa

Este capítulo descreve como os habitantes de Gokula deixaram Gokula e foram para Vṛndāvana e como Kṛṣṇa matou Vatsāsura e Bakāsura.

Ao caírem, as árvores yamala-arjuna fizeram um estrondo, como nuvens que trovejam. Surpresos, o pai de Kṛṣṇa, Nanda, e os outros habitantes mais velhos de Gokula foram até o local, onde viram as árvores caídas e Kṛṣṇa situado entre elas, amarrado ao ulūkhala, o pilão de madeira. Eles não puderam entender por que as árvores haviam caído nem o que Kṛṣṇa estava fazendo ali. Eles acharam que aquilo poderia ser obra de outro asura que encontrara Kṛṣṇa naquele lugar, e perguntaram aos amiguinhos de Kṛṣṇa como foi que todo o inci­dente se dera. As crianças descreveram adequadamente como tudo aconteceu, mas as pessoas mais velhas não puderam acreditar na história. Algumas delas, entretanto, pensaram que a história poderia ser verdade, uma vez que já haviam visto muitos incidentes maravi­lhosos relacionados com Kṛṣṇa. De qualquer modo, Nanda Mahārāja imediatamente libertou Kṛṣṇa das cordas.

Dessa maneira, Kṛṣṇa, a cada dia e a cada momento, vivia epi­sódios maravilhosos para aumentar a afeição parental de Nanda Mahārāja e Yaśodā, que assim sentiam surpresa e júbilo. Partir yamala-arjuna foi um desses passatempos maravilhosos.

Certo dia, uma vendedora de frutas se aproximou da casa de Nanda Mahārāja, e Kṛṣṇa juntou alguns grãos alimentícios com as palminhas de Suas mãos e foi até a vendedora para trocar os grãos por frutas. No caminho, quase todos os grãos caíram das palmas de Suas mãos, restando apenas um ou dois grãos, mas a vendedora de frutas, sentindo muita afeição, aceitou esses grãos em troca de todas as frutas que Kṛṣṇa pudesse levar. Logo que ela agiu dessa maneira, sua cesta ficou cheia de ouro e joias.

Depois disso, todos os gopas mais velhos decidiram deixar Gokula porque viram que sempre havia alguma perturbação em Gokula. Eles decidiram ir para Vṛndāvana, Vraja-dhāma, e todos partiram no dia seguinte. Em Vṛndāvana, Kṛṣṇa e Balarāma, após concluírem Seus passatempos infantis, começaram a cuidar dos bezerros e levá-los aos campos de pastagem (go-canaṇa). Foi então que um demônio chamado Vatsāsura infiltrou-se entre os bezerros e foi morto, e outro asura, assumindo a forma de um grande pato, também foi morto. Os amiguinhos de Kṛṣṇa narraram todas essas histórias às suas mães. As mães não acreditaram em seus filhos, mas os companheiros de Kṛṣṇa, devido à afeição intensa, deleitavam­-se com essas narrações das atividades de Kṛṣṇa.

Texto

śrī-śuka uvāca
gopā nandādayaḥ śrutvā
drumayoḥ patato ravam
tatrājagmuḥ kuru-śreṣṭha
nirghāta-bhaya-śaṅkitāḥ

Sinônimos

śrī-śukaḥ uvāca — Śrī Śukadeva Gosvāmī disse; gopāḥ — todos os vaqueiros; nanda-ādayaḥ — encabeçados por Nanda Mahārāja; śru­tvā — ouvindo; drumayoḥ — das duas árvores; patatoḥ — caindo; ra­vam — o barulho, tão terrível como o trovão; tatra — ali, no lugar; ājagmuḥ — foram; kuru-śreṣṭha — ó Mahārāja Parīkṣit; nirghāta-bhaya­śaṅkitāḥ — que estavam com medo de trovões.

Tradução

Śukadeva Gosvāmī prosseguiu: Ó Mahārāja Parīkṣit, quando as árvores yamala-arjuna caíram, todos os vaqueiros da vizinhança, ouvindo o barulho e com medo de trovões, foram até o local.

Texto

bhūmyāṁ nipatitau tatra
dadṛśur yamalārjunau
babhramus tad avijñāya
lakṣyaṁ patana-kāraṇam

Sinônimos

bhūmyām — no chão; nipatitau — que caíram; tatra — ali; dadṛśuḥ — todos viram; yamala-arjunau — as árvores gêmeas arjuna; babhra­muḥ — eles ficaram confusos; tat — isto; avijñāya — mas não puderam determinar; lakṣyam — embora pudessem perceber diretamente que as árvores haviam caído; patana-kāraṇam — a causa de sua queda (como isso poderia ter acontecido tão subitamente?).

Tradução

Ali, eles viram as árvores yamala-arjuna caídas no chão, mas fica­ram confusos porque, muito embora pudessem perceber diretamente que as árvores haviam caído, não conseguiam determinar a causa dessa queda.

Comentário

SIGNIFICADO—Considerando todas as circunstâncias, teria isso sido feito por Kṛṣṇa? Ele estava no local, e Seus amiguinhos descreveram que aquilo fora feito por Ele. Kṛṣṇa teria realmente feito isso, ou eram meras histórias? Essa era a causa da confusão.

Texto

ulūkhalaṁ vikarṣantaṁ
dāmnā baddhaṁ ca bālakam
kasyedaṁ kuta āścaryam
utpāta iti kātarāḥ

Sinônimos

ulūkhalam — o pilão de madeira; vikarṣantam — arrastando; dāmnā — com a corda; baddham ca — e amarrado pela barriga; bālakam — Kṛṣṇa; kasya — de quem; idam — isto; kutaḥ — de onde; āścaryam — esses acontecimentos maravilhosos; utpātaḥ — perturbação; iti — assim; kātarāḥ — eles estavam muito agitados.

Tradução

Kṛṣṇa estava amarrado pela corda ao ulūkhala, o pilão, que Ele arrastava. Mas como Ele poderia ter derrubado as árvores? Quem realmente fizera aquilo? Onde estava a fonte desse incidente? Conside­rando todos esses fatos espantosos, os vaqueiros estavam indecisos e confusos.

Comentário

SIGNIFICADO—Os vaqueiros estavam muito agitados porque, afinal de contas, a criança Kṛṣṇa estivera entre as duas árvores, e se por acaso as árvores tivessem caído sobre Ele, Ele teria sido esmagado. Mas Ele não foi em nada afetado, e mesmo assim haviam acontecido tais fenômenos – então, quem havia feito tudo aquilo? Como esses eventos poderiam ter acontecido de maneira tão maravilhosa? Essas conside­rações constituíam algumas das razões pelas quais eles estavam agi­tados e confusos. Eles pensavam, entretanto, que acontecera de Kṛṣṇa ter sido salvo por Deus, daí Ele ter ficado ileso.

Texto

bālā ūcur aneneti
tiryag-gatam ulūkhalam
vikarṣatā madhya-gena
puruṣāv apy acakṣmahi

Sinônimos

bālāḥ — todos os outros meninos; ūcuḥ — disseram; anena — por Ele (Kṛṣṇa); iti — assim; tiryak — atravessado; gatam — que ficara; ulūkhalam — o pilão de madeira; vikarṣatā — por Kṛṣṇa, que estava arrastando; madhya-gena — passando entre as duas árvores; puruṣau — duas belas pessoas; api — também; acakṣmahi — vimos com nossos próprios olhos.

Tradução

Então, todos os vaqueirinhos disseram: Foi Kṛṣṇa quem fez isso. Quando Ele estava entre as duas árvores, o pilão tombou, ficando transversal às árvores. Kṛṣṇa arrastou o pilão, e as duas árvores caíram. Depois disso, dois belos homens emergiram das árvores. Vimos isso com nossos próprios olhos.

Comentário

SIGNIFICADO—Os companheiros de Kṛṣṇa queriam informar o pai de Kṛṣṇa com precisão acerca do que havia acontecido, explicando que as árvores não apenas se quebraram, senão que, a partir das árvores quebradas, emergiram dois belos jovens. “Tudo isso aconteceu”, disseram eles. “Nós vimos com nossos próprios olhos.”

Texto

na te tad-uktaṁ jagṛhur
na ghaṭeteti tasya tat
bālasyotpāṭanaṁ tarvoḥ
kecit sandigdha-cetasaḥ

Sinônimos

na — não; te — todos os gopas; tat-uktam — sendo interpelados pelos meninos; jagṛhuḥ — aceitariam; na ghaṭeta — não pode ser; iti — assim; tasya — de Kṛṣṇa; tat — a atividade; bālasya — de um menininho como Kṛṣṇa; utpāṭanam — a derrubada; tarvoḥ — das duas árvores; kecit — alguns deles; sandigdha-cetasaḥ — ficaram com dúvidas sobre o que poderia ser feito (porque Garga Muni predissera que essa criança seria igual a Nārāyaṇa).

Tradução

Devido à intensa afeição paterna, os vaqueiros, encabeçados por Nanda, não podiam acreditar que Kṛṣṇa tivesse conseguido arrancar as árvores de uma maneira tão maravilhosa. Portanto, não podiam depositar sua fé nas palavras dos meninos. Alguns dos homens, en­tretanto, ficaram indecisos. “Uma vez que se predisse que Kṛṣṇa era igual a Nārāyaṇa”, pensaram eles, “talvez Ele tenha feito isso.”

Comentário

SIGNIFICADO—Segundo um dos pontos de vista, era impossível que um menini­nho como aquele tivesse feito essa proeza de derrubar as árvores. Mas havia dúvidas, pois se predissera que Kṛṣṇa seria igual a Nārāyaṇa. Portanto, os vaqueiros estavam em um dilema.

Texto

ulūkhalaṁ vikarṣantaṁ
dāmnā baddhaṁ svam ātmajam
vilokya nandaḥ prahasad-
vadano vimumoca ha

Sinônimos

ulūkhalam — o pilão de madeira; vikarṣantam — arrastando; dām­nā — pela corda; baddham — amarrado; svam ātmajam — seu próprio filho Kṛṣṇa; vilokya — vendo; nandaḥ — Mahārāja Nanda; prahasat-­vadanaḥ — cujo rosto começou a sorrir quando viu a maravilhosa criança; vimumoca ha — libertou-O de Suas amarras.

Tradução

Ao ver seu filho amarrado com cordas ao pilão de ma­deira e arrastando-o, Nanda Mahārāja sorriu e libertou Kṛṣṇa de Suas amarras.

Comentário

SIGNIFICADO—Nanda Mahārāja ficou surpreso de que Yaśodā, a mãe de Kṛṣṇa, pudesse ter amarrado seu amado filho daquela maneira. Kṛṣṇa estava reciprocando amor com ela. Como, então, ela teria sido tão cruel a ponto de amarrá-lo ao pilão de madeira? Nanda Mahārāja entendia essa reciprocidade amorosa e, portanto, sorriu e libertou Kṛṣṇa. Em outras palavras, assim como Kṛṣṇa, a Suprema Personalidade de Deus, amarra a entidade viva às atividades fruitivas, Ele amarra mãe Yaśodā e Nanda Mahārāja à afeição parental. Assim é o Seu passa­tempo.

Texto

gopībhiḥ stobhito ’nṛtyad
bhagavān bālavat kvacit
udgāyati kvacin mugdhas
tad-vaśo dāru-yantravat

Sinônimos

gopībhiḥ — pelas gopīs (através de agrados e oferecimento de prêmios); stobhitaḥ — encorajado, induzido; anṛtyat — o pequeno Kṛṣṇa dançava; bhagavān — embora Ele fosse a Suprema Personali­dade de Deus; bāla-vat — exatamente como uma criança humana; kvacit — às vezes; udgāyati — Ele cantava bem alto; kvacit — às vezes; mugdhaḥ — ficando espantado; tat-vaśaḥ — sob o controle delas; dāru­-yantra-vat — como um boneco de madeira.

Tradução

As gopīs costumavam dizer: “Se dançares, meu querido Kṛṣṇa, eu te darei, então, metade de um doce.” Dizendo essas palavras ou ba­tendo palmas, todas as gopīs encorajavam Kṛṣṇa de diferentes ma­neiras. Nessas ocasiões, embora Ele fosse a supremamente poderosa Personalidade de Deus, Ele sorria e dançava de acordo com o desejo delas, como se fosse um boneco de madeira em suas mãos. Às vezes, Ele cantava bem alto, a convite delas. Dessa maneira, Kṛṣṇa ficava sob o completo controle das gopīs.

Texto

bibharti kvacid ājñaptaḥ
pīṭhakonmāna-pādukam
bāhu-kṣepaṁ ca kurute
svānāṁ ca prītim āvahan

Sinônimos

bibharti — Kṛṣṇa simplesmente ficava em pé e tocava os artigos como se fosse incapaz de erguê-los; kvacit — às vezes; ājñaptaḥ — sendo ordenado; pīṭhaka-unmāna — o assento de madeira e o pote de madeira próprio para medir; pādukam — trazendo os tamancos; bāhu-kṣepam ca — batendo no corpo com os braços; kurute — faz; svānām ca — de Seus próprios parentes, as gopīs e outros amigos ín­timos; prītim — o prazer; āvahan — convidando.

Tradução

Às vezes, mãe Yaśodā e suas amigas gopīs diziam a Kṛṣṇa: “Traze esse artigo” ou “Traze aquele artigo”. Algumas vezes, elas ordenavam que trouxesse uma tábua, tamancos ou um pote de madeira próprio para medir, e Kṛṣṇa, quando recebia essas ordens das mães, tentava cumpri-las. Certas vezes, entretanto, como se fosse incapaz de erguer o que Ele tinha que pegar, Ele o tocava e ali permanecia. Apenas para agradar Seus parentes, Ele batia em Seu corpo com Seus braços para mostrar que tinha força o suficiente.

Texto

darśayaṁs tad-vidāṁ loka
ātmano bhṛtya-vaśyatām
vrajasyovāha vai harṣaṁ
bhagavān bāla-ceṣṭitaiḥ

Sinônimos

darśayan — mostrando; tat-vidām — para as pessoas que podem entender as atividades de Kṛṣṇa; loke — no mundo todo; ātmanaḥ — dEle próprio; bhṛtya-vaśyatām — como Ele concorda em executar as ordens de Seus servos, Seus devotos; vrajasya — de Vrajabhūmi; uvāha — executou; vai — na verdade; harṣam — prazer; bhagavān — a Suprema Personalidade de Deus; bāla-ceṣṭitaiḥ — através de Suas ati­vidades como as de uma criança que tenta fazer muitas coisas.

Tradução

Para os devotos puros no mundo inteiro que podiam entender Suas atividades, a Suprema Personalidade de Deus, Kṛṣṇa, mostrou o quanto pode ser subjugado pelos Seus devotos, Seus servos. Dessa maneira, através de Suas atividades infantis, Ele aumentou o prazer dos Vrajavāsīs.

Comentário

SIGNIFICADO—Foi outro gesto transcendental Kṛṣṇa ter realizado ativida­des infantis para aumentar o prazer de Seus devotos. Ele manifes­tou essas atividades não apenas para os habitantes de Vrajabhūmi, mas também para outros, que foram cativados pela Sua potência externa e pela Sua opulência. Tanto os devotos íntimos, que estavam simplesmente absortos em amor por Kṛṣṇa, quanto os devotos reve­rentes, que estavam cativados por Sua potência ilimitada, foram informados de que Kṛṣṇa deseja ser submisso aos Seus servos.

Texto

krīṇīhi bhoḥ phalānīti
śrutvā satvaram acyutaḥ
phalārthī dhānyam ādāya
yayau sarva-phala-pradaḥ

Sinônimos

krīṇīhi — por favor, vinde e adquiri; bhoḥ — ó habitantes da vizinhança; phalāni — frutos maduros; iti — assim; śrutva — ouvindo; satvaram — muito rapidamente; acyutaḥ — Kṛṣṇa; phala-arthī — como se Ele quisesse algu­mas frutas; dhānyam ādāya — pegando alguns grãos de arroz; yayau­ — dirigiu-Se à vendedora de frutas; sarva-phala-pradaḥ — a Suprema Personalidade de Deus, que pode dar todas as classes de frutas a todos, agora necessitava de frutas.

Tradução

Certa vez, uma mulher que vendia frutas convidava: “Ó habitan­tes de Vrajabhūmi, se quereis adquirir frutas, vinde até aqui!” Ao ouvir isso, Kṛṣṇa imediatamente apanhou alguns grãos e foi negociar, como se precisasse de algumas frutas.

Comentário

SIGNIFICADO—De um modo geral, os aborígenes vão vender frutas aos moradores das vilas. Descreve-se aqui o quanto os aborígenes eram apegados a Kṛṣṇa. Kṛṣṇa, para mostrar Seu favor aos aborígenes, imediatamente foi adquirir frutas, negociando com os grãos de arroz que trazia em Sua mão, como havia visto outros fazerem.

Texto

phala-vikrayiṇī tasya
cyuta-dhānya-kara-dvayam
phalair apūrayad ratnaiḥ
phala-bhāṇḍam apūri ca

Sinônimos

phala-vikrayiṇī — a vendedora de frutas aborígene, que era uma mulher idosa; tasya — de Kṛṣṇa; cyuta-dhānya — tendo caído a maior parte do arroz que Ele trouxe para negociar; kara-dvayam — palmas das mãos; phalaiḥ apūrayat — a vendedora de frutas encheu as pal­minhas de Suas mãos com frutas; ratnaiḥ — em troca de joias e ouro; phala-bhāṇḍam — o cesto de frutas; apūri ca — encheu.

Tradução

Enquanto Kṛṣṇa Se dirigia muito rapidamente à vendedora de frutas, a maior parte dos grãos que segurava caiu. Entretanto, a vendedora encheu as mãos de Kṛṣṇa com frutas, e seu cesto de frutas imediata­mente se encheu de joias e ouro.

Comentário

SIGNIFICADO—Na Bhagavad-gītā (9.26), Kṛṣṇa diz:

patraṁ puṣpaṁ phalaṁ toyaṁ
yo me bhaktyā prayacchati
tad ahaṁ bhakty-upahṛtam
aśnāmi prayatātmanaḥ

Kṛṣṇa é tão bondoso que se qualquer pessoa Lhe oferecer folhas, frutas, flores ou um pouco de água, Ele imediatamente as aceitará. A única condição é que tudo isso deve ser oferecido com bhakti (yo me bhaktyā prayacchati). De outro modo, se alguém se deixa envaide­cer pelo falso prestígio, pensando: “Tenho tanta opulência, e agora estou dando algo a Kṛṣṇa”, sua oferenda não será aceita por Kṛṣṇa. A vendedora de frutas, embora fosse uma mulher pertencente à pobre classe aborígene, tratou Kṛṣṇa com muita afeição, dizendo: “Kṛṣṇa, procuraste-me para pegar algumas frutas em troca de grãos. Todos os grãos caíram, mas, mesmo assim, podes levar o que quise­res.” Assim, ela encheu as palmas das mãos de Kṛṣṇa com todas as frutas que Ele pudesse carregar. Em troca, Kṛṣṇa encheu-lhe todo o cesto com joias e ouro.

Através deste incidente, todos devem aprender que, por tudo aquilo que é oferecido a Kṛṣṇa com amor e afeição, Kṛṣṇa pode retribuir muitos milhões de vezes mais, tanto material quanto espiritualmente. O princípio básico envolvido é uma troca de amor. Portanto, Kṛṣṇa ensina na Bhagavad-gītā (9.27):

yat karoṣi yad aśnāsi
yaj juhoṣi dadāsi yat
yat tapasyasi kaunteya
tat kuruṣva mad-arpaṇam

“Tudo o que fizeres, tudo o que comeres, tudo o que ofereceres ou deres para os outros, e quaisquer austeridades que executares – faze isto, ó filho de Kuntī, como uma oferenda a Mim.” Com amor e afeição, a pessoa deve valer-se de sua própria fonte de renda para tentar dar algo a Kṛṣṇa. Então, sua vida será exitosa. Kṛṣṇa é pleno de todas as opulências; Ele não precisa que ninguém Lhe dê algo. Contudo, se alguém está disposto a dar algo a Kṛṣṇa, isso é para o seu próprio benefício. A esse respeito, apresenta-se o exemplo de que quando o rosto de alguém é enfeitado, o reflexo de seu rosto é enfeitado automati­camente. De igual modo, se tentamos servir a Kṛṣṇa com todas as nossas opulências, nós, como partes integrantes ou reflexos de Kṛṣṇa, ficaremos felizes em troca disso. Kṛṣṇa está sempre feliz, pois Ele é ātmā­rāma, plenamente satisfeito com Sua própria opulência.

Texto

sarit-tīra-gataṁ kṛṣṇaṁ
bhagnārjunam athāhvayat
rāmaṁ ca rohiṇī devī
krīḍantaṁ bālakair bhṛśam

Sinônimos

sarit-tīra — à margem do rio; gatam — que haviam ido; kṛṣṇan — a Kṛṣṇa; bhagna-arjunam — depois do passatempo de quebrar as árvores yamala-arjuna; atha — então; āhvayat — chamou; rāmam ca — bem como Balarāma; rohiṇī — a mãe de Balarāma; devī — a deusa da fortuna; krīḍantam — que estavam ocupados em brincar; bālakaiḥ — com muitos outros meninos; bhṛśam — com muita atenção.

Tradução

Certa vez, após a derrubada das árvores yamala-arjuna, Rohiṇī­devī foi chamar Rāma e Kṛṣṇa, que haviam ido à margem do rio e estavam muito absortos em brincar com os outros meninos.

Comentário

SIGNIFICADO—Mãe Yaśodā era mais apegada a Kṛṣṇa e Balarāma do que o era Rohiṇīdevī, embora Rohiṇīdevī fosse a mãe de Balarāma. Mãe Yaśo­dā pediu que Rohiṇīdevī fosse chamar Rāma e Kṛṣṇa, tirando-Os de Sua brincadeira, uma vez que era chegada a hora do almoço. Portanto, Rohiṇīdevī foi chamá-lOs, interrompendo Sua diversão.

Texto

nopeyātāṁ yadāhūtau
krīḍā-saṅgena putrakau
yaśodāṁ preṣayām āsa
rohiṇī putra-vatsalām

Sinônimos

na upeyātām — não voltavam para casa; yadā — quando; āhūtau — eles foram chamados para voltarem da brincadeira; krīḍā-saṅgena — por estarem tão apegados a brincar com os outros meninos; putrakau — os dois filhos (Kṛṣṇa e Balarāma); yaśodām preṣayām āsa — enviou mãe Yaśodā para chamá-lOs; rohiṇī — mãe Rohiṇī; putra-vatsalām — porque mãe Yaśodā era uma mãe mais afetuosa para Kṛṣṇa e Balarāma.

Tradução

Por estarem muito apegados a brincar com os outros meninos, Kṛṣṇa e Balarāma não retornaram ao serem chamados por Rohiṇī. Por isso, Rohiṇī pediu que mãe Yaśodā Os chamasse para voltarem, porque mãe Yaśodā tinha mais afeição por Kṛṣṇa e Balarāma.

Comentário

SIGNIFICADO—Yaśodāṁ preṣayām āsa. Estas palavras mostram que, como Kṛṣṇa e Balarāma não deram ouvidos à ordem de Rohiṇī, Rohiṇī pensou que, se Yaśodā fosse chamá-lOs, Eles teriam de retornar, pois Yaśodā tinha mais afeição por Kṛṣṇa e Balarāma.

Texto

krīḍantaṁ sā sutaṁ bālair
ativelaṁ sahāgrajam
yaśodājohavīt kṛṣṇaṁ
putra-sneha-snuta-stanī

Sinônimos

krīḍantam — ocupado em brincar; — mãe Yaśodā; sutam — seu filho; bālaiḥ — com os outros meninos; ati-velam — embora fosse muito tarde; saha-agrajam — que estava brincando com Seu irmão mais velho, Balarāma; yaśodā — mãe Yaśodā; ajohavīt — chamou (“Kṛṣṇa e Balarāma, vinde aqui!”); kṛṣṇam — a Kṛṣṇa: putra­-sneha-snuta-stanī — enquanto ela Os chamava, o leite escorria de seu seio devido ao seu amor e afeição extáticos.

Tradução

Kṛṣṇa e Balarāma, estando apegados à Sua brincadeira, divertiam-­Se com os outros meninos, embora fosse muito tarde. Portanto, mãe Yaśodā mandou-Os voltar para o almoço. Devido ao seu amor e afeição extáticos por Kṛṣṇa e Balarāma, o leite fluía de seus seios.

Comentário

SIGNIFICADO—A palavra ajohavīt significa “chamando-Os repetidas vezes”. “Kṛṣṇa e Balarāma”, chamou ela, “por favor, voltem. Vocês estão atrasados para o Seu almoço. Vocês já brincaram bastante. Voltem.”

Texto

kṛṣṇa kṛṣṇāravindākṣa
tāta ehi stanaṁ piba
alaṁ vihāraiḥ kṣut-kṣāntaḥ
krīḍā-śrānto ’si putraka

Sinônimos

kṛṣṇa kṛṣṇa aravinda-akṣa — ó Kṛṣṇa, meu filho, Kṛṣṇa de olhos de lótus; tāta — ó querido; ehi — vem aqui; stanam — o leite do meu seio; piba — bebe; alam vihāraiḥ — depois disso, não há necessidade de brincar; kṣut-kṣāntaḥ — cansado devido à fome; krīḍā-śrāntaḥ — fatigado por tanto brincar; asi — deves estar; putraka — ó meu filho.

Tradução

Mãe Yaśodā disse: Meu querido filho Kṛṣṇa, Kṛṣṇa de olhos de lótus, vem aqui e bebe o leite do meu seio. Meu queridinho, deves estar muito cansado devido à fome e à fadiga que sobrevêm a alguém que brinca por tanto tempo. Não precisas continuar brincando!

Texto

he rāmāgaccha tātāśu
sānujaḥ kula-nandana
prātar eva kṛtāhāras
tad bhavān bhoktum arhati

Sinônimos

he rāma — meu querido filho Balarāma; āgaccha — por favor, vem aqui; tāta — meu queridinho; āśu — imediatamente; sa-anujaḥ — com Teu irmão mais novo; kula-nandana — a grande esperança de nossa família; prātaḥ eva — decerto, pela manhã; kṛta-āhāraḥ — tomastes Vosso desjejum; tat — portanto; bhavān — Vós; bhoktum — comer algo mais; arhati — mereceis.

Tradução

Meu querido Baladeva, melhor de nossa família, por favor, vem imediatamente com Teu irmão mais novo, Kṛṣṇa. Ambos comestes pela manhã, e agora precisais voltar a comer.

Texto

pratīkṣate tvāṁ dāśārha
bhokṣyamāṇo vrajādhipaḥ
ehy āvayoḥ priyaṁ dhehi
sva-gṛhān yāta bālakāḥ

Sinônimos

pratīkṣate — está esperando; tvām — por ambos (Kṛṣṇa e Balarāma); dāśārha — ó Balarāma; bhokṣyamāṇaḥ — desejando comer; vraja-­adhipaḥ — o rei de Vraja, Nanda Mahārāja; ehi — vem aqui; āvayoḥ — nosso; priyam — prazer; dhehi — simplesmente considera; sva-gṛhān — aos seus respectivos lares; yāta — que eles vão; bālakaḥ — os outros meninos.

Tradução

Nanda Mahārāja, o rei de Vraja, agora está esperando para comer. Ó meu querido filho Balarāma, ele está esperando por Ti. Portanto, retorna para agradar-nos. Todos os meninos que estão brincando conTigo e com Kṛṣṇa devem agora ir para as suas respectivas casas.

Comentário

SIGNIFICADO—Parece que Nanda Mahārāja regularmente comia com seus dois filhos, Kṛṣṇa e Balarāma. Yaśodā disse aos outros meninos: “Agora, deveis partir para vossos lares.” Em geral, o pai e o filho sentam-se juntos, por isso mãe Yaśodā pediu que Kṛṣṇa e Balarāma retornas­sem, e aconselhou os outros meninos a voltarem para casa de modo que seus pais não precisassem ficar esperando por eles.

Texto

dhūli-dhūsaritāṅgas tvaṁ
putra majjanam āvaha
janmarkṣaṁ te ’dya bhavati
viprebhyo dehi gāḥ śuciḥ

Sinônimos

dhūli-dhūsarita-aṅgaḥ tvam — todo o Teu corpo ficou coberto de poeira e areia; putra — meu querido filho; majjanam āvaha — agora vem aqui, toma um banho e fica limpo; janma-ṛkṣam — a auspicio­sa estrela do Teu nascimento; te — de Ti; adya — hoje; bhavati — é; viprebhyaḥ — aos brāhmaṇas puros; dehi — dá em caridade; gāḥ­vacas; śuciḥ — purificando-Te.

Tradução

Em seguida, mãe Yaśodā disse a Kṛṣṇa: Meu querido filho, por brincares o dia inteiro, Teu corpo ficou coberto de poeira e areia. Portanto, volta, banha-Te e faz Tua higiene. Hoje, a Lua faz conjunção com a auspiciosa estrela do Teu nascimento. Portanto, purifica-Te e dá vacas em caridade aos brāhmaṇas.

Comentário

SIGNIFICADO—Na cultura védica, sempre que há alguma cerimônia auspiciosa, a pessoa costuma dar vacas valiosas em caridade aos brāhmaṇas. Portanto, mãe Yaśodā pediu a Kṛṣṇa: “Em vez de teres entusias­mo para brincar, agora, por favor, vem e Te entusiasma para a carida­de.” Yajña-dāna-tapaḥ-karma na tyājyaṁ kāryam eva tat. Como se aconselha na Bhagavad-gītā (18.5), sacrifício, caridade e austeri­dade nunca devem ser abandonados. Yajño dānaṁ tapaś caiva pāvanāni manīṣiṇām: Mesmo que alguém seja muito avançado em vida espiritual, ele não deve abandonar esses três deveres. Para observar a cerimônia de seu aniversário, a pessoa deve cumprir pelo menos um destes três itens (yajña, dāna ou tapaḥ), ou todos eles juntos.

Texto

paśya paśya vayasyāṁs te
mātṛ-mṛṣṭān svalaṅkṛtān
tvaṁ ca snātaḥ kṛtāhāro
viharasva svalaṅkṛtaḥ

Sinônimos

paśya paśya — vê só, vê só; vayasyān — meninos de Tua idade; te — Teus; mātṛ-mṛṣṭān — limpos por suas mães; su-alaṅkṛtān — decora­dos com belos adornos; tvam ca — Tu também; snātaḥ — após tomar um banho; kṛta-āhāraḥ — e comer Teu almoço; viharasva — desfruta com eles; su-alaṅkṛtaḥ — plenamente decorado como eles.

Tradução

Vê só como todos os Teus coleguinhas de Tua mesma idade estão limpos e foram enfeitados com belos adornos por suas mães. Deves vir aqui e, depois de tomares Teu banho, almoçares e Te adornares, podes voltar a brincar com os Teus amigos.

Comentário

SIGNIFICADO—De um modo geral, os meninos são competitivos. Se um amigo faz algo, outro amigo também quer fazer aquilo. Portanto, mãe Yaśo­dā observou como os colegas de Kṛṣṇa estavam enfeitados, para que Kṛṣṇa pudesse ser induzido a enfeitar-Se como eles.

Texto

itthaṁ yaśodā tam aśeṣa-śekharaṁ
matvā sutaṁ sneha-nibaddha-dhīr nṛpa
haste gṛhītvā saha-rāmam acyutaṁ
nītvā sva-vāṭaṁ kṛtavaty athodayam

Sinônimos

ittham — dessa maneira; yaśodā — mãe Yaśodā; tam aśeṣa-śekharam — a Kṛṣṇa, que estava no topo de tudo o que era auspicioso, sem possibilidade de sujeira ou imundície; matvā — considerando; sutam — como seu filho; sneha-nibaddha-dhīḥ — devido a um inten­so espírito de amor; nṛpa — ó rei (Mahārāja Parīkṣit); haste — pela mão; gṛhītvā — pegando; saha-rāmam — com Balarāma; acyutam — Kṛṣṇa, o infalível; nītvā — levando; sva-vāṭam — para casa; kṛtavatī — realizou; atha — agora; udayam — brilho por banhá-lO, vesti-lO e adorná-lO.

Tradução

Meu querido Mahārāja Parīkṣit, devido ao intenso amor e afeição, mãe Yaśodā, a mãe de Kṛṣṇa, considerava Kṛṣṇa, que estava no topo de todas as opulências, como sendo seu próprio filho. Assim, ela pegou Kṛṣṇa pela mão, juntamente com Balarāma, e levou-Os para casa, onde desempenhou seus deveres, banhando-Os completamente, vestindo-Os e alimentando-Os.

Comentário

SIGNIFICADO—Kṛṣṇa é sempre limpo, asseado e opulento e não precisa ser lava­do, banhado ou vestido, mas mãe Yaśodā, devido à afeição, considerava-O seu filho comum e cumpria seus deveres para manter seu filho brilhando.

Texto

śrī-śuka uvāca
gopa-vṛddhā mahotpātān
anubhūya bṛhadvane
nandādayaḥ samāgamya
vraja-kāryam amantrayan

Sinônimos

śrī-śukaḥ uvāca — Śrī Śukadeva Gosvāmī disse; gopa-vṛddhāḥ — os vaqueiros mais velhos; mahā-utpātān — perturbações enormes; anubhūya — após experimentarem; bṛhadvane — no lugar conhecido como Bṛhadvana; nanda-ādayaḥ — os vaqueiros, encabeçados por Nanda Mahārāja; samāgamya — reuniram-se, encontraram-se; vraja-kāryam — a questão de Vrajabhūmi; amantrayan — deliberaram sobre como impedir as incessantes calamidades em Mahāvana.

Tradução

Śrī Śukadeva Gosvāmī continuou: Então, certa vez, tendo visto as grandes perturbações que ocorriam em Bṛhadvana, todos os vaqueiros mais velhos, encabeçados por Nanda Mahārāja, reuniram-se e começaram a considerar o que poderiam fazer para impedir as incessantes calamidades de Vraja.

Texto

tatropananda-nāmāha
gopo jñāna-vayo-’dhikaḥ
deśa-kālārtha-tattva-jñaḥ
priya-kṛd rāma-kṛṣṇayoḥ

Sinônimos

tatra — na assembleia; upananda-nāmā — chamado Upananda (o irmão mais velho de Nanda Mahārāja); āha — disse; gopaḥ — o vaqueiro; jñāna-vayaḥ-adhikaḥ — que, por conhecimento e idade, era o mais velho de todos; deśa-kāla-artha-tattva-jñaḥ — muito experien­te, de acordo com tempo, lugar e circunstância; priya-kṛt — simples­mente para o benefício; rāma-kṛṣṇayoḥ — de Balarāma e Kṛṣṇa, a Suprema Personalidade de Deus.

Tradução

Naquele encontro de todos os habitantes de Gokula, um vaqueiro chamado Upananda, que era o mais maduro em idade e conheci­mento e muito experiente de acordo com tempo, circunstâncias e lugar, apresentou essa sugestão para o benefício de Rāma e Kṛṣṇa.

Texto

utthātavyam ito ’smābhir
gokulasya hitaiṣibhiḥ
āyānty atra mahotpātā
bālānāṁ nāśa-hetavaḥ

Sinônimos

utthātavyam — agora, este lugar deve ser deixado; itaḥ — daqui, de Gokula; asmābhiḥ — por todos nós; gokulasya — deste lugar, Go­kula; hita-eṣibhiḥ — pelas pessoas que desejam o bem para este lugar; āyānti — estão acontecendo; atra — aqui; mahā-utpātāḥ — perturba­ções muito grandes; bālānām — para os meninos, tais como Rāma e Kṛṣṇa; nāśa-hetavaḥ — tendo definitivamente o propósito de matá-lO.

Tradução

Ele disse: Meus queridos amigos vaqueiros, para o bem deste lugar, Gokula, devemos deixá-lo, porque aqui sempre estão ocorrendo tantas perturbações simplesmente com o propósito de matar Rāma e Kṛṣṇa.

Texto

muktaḥ kathañcid rākṣasyā
bāla-ghnyā bālako hy asau
harer anugrahān nūnam
anaś copari nāpatat

Sinônimos

muktaḥ — foi liberto; kathañcit — de alguma maneira; rākṣa­syāḥ — das mãos da Rākṣasī Pūtanā; bāla-ghnyāḥ — que estava determi­nada a matar criancinhas; bālakaḥ — especialmente a criança Kṛṣṇa; hi — porque; asau — Ele; hareḥ anugrahāt — pela misericórdia da Su­prema Personalidade de Deus; nūnam — na verdade; anaḥ ca — e o carro de mão; upari — em cima da criança; na — não; apatat — caiu.

Tradução

O pequeno Kṛṣṇa, simplesmente pela misericórdia da Suprema Personalidade de Deus, de alguma maneira foi salvo das mãos da Rākṣasī Pūtanā, que estava determinada a matar a criança. Depois, também pela misericórdia da Divindade Suprema, quando caiu o carro de mão, esse não acertou a criança.

Texto

cakra-vātena nīto ’yaṁ
daityena vipadaṁ viyat
śilāyāṁ patitas tatra
paritrātaḥ sureśvaraiḥ

Sinônimos

cakra-vātena — pelo demônio sob a forma de um furacão (Tṛṇā­varta); nītaḥ ayam — Kṛṣṇa foi levado; daityena — pelo demônio; vi­padam — perigoso; viyat — ao céu; śilāyām — sobre um bloco de pedra; patitaḥ — tendo caído; tatra — ali; paritrātaḥ — foi salvo; sura-īśva­raiḥ — pela misericórdia do Senhor Viṣṇu ou de Seus associados.

Tradução

Depois foi a vez de o demônio Tṛṇāvarta, sob a forma de um furacão, pegar o menino e erguê-lO perigosamente até o céu para matá-lO, mas o demônio caiu sobre um bloco de pedra. Também neste caso, pela misericórdia do Senhor Viṣṇu ou de Seus associa­dos, a criança foi salva.

Texto

yan na mriyeta drumayor
antaraṁ prāpya bālakaḥ
asāv anyatamo vāpi
tad apy acyuta-rakṣaṇam

Sinônimos

yat — então novamente; na mriyeta — não morreu; drumayoḥ an­taram — entre as duas árvores; prāpya — embora Ele estivesse entre; bālakaḥ asau — essa criança, Kṛṣṇa; anyatamaḥ — outra criança; api — ou; tat api acyuta-rakṣaṇam — também nesse caso, Ele foi salvo pela Suprema Personalidade de Deus.

Tradução

Além disso, ainda há poucos dias, Kṛṣṇa e Seus amiguinhos es­caparam da morte quando as duas árvores caíram, embora as crianças estives­sem perto das árvores ou mesmo entre elas. Isso também deve ser tido como a misericórdia da Suprema Personalidade de Deus.

Texto

yāvad autpātiko ’riṣṭo
vrajaṁ nābhibhaved itaḥ
tāvad bālān upādāya
yāsyāmo ’nyatra sānugāḥ

Sinônimos

yāvat — enquanto; autpātikaḥ — perturbando; ariṣṭaḥ — o demônio; vrajam — este Gokula Vrajabhūmi; na — não; abhibhavet itaḥ — sairmos deste lugar; tāvat — enquanto; bālān upādāya — para o benefício dos meninos; yāsyāmaḥ — iremos; anyatra — para algum outro lugar; sa-­anugāḥ — com nossos seguidores.

Tradução

Todos esses incidentes estão sendo causados por algum demônio desconhecido. Antes que ele venha aqui para criar outra pertur­bação, é nosso dever rumarmos para algum outro lugar com os meninos até que deixe de haver distúrbios.

Comentário

SIGNIFICADO—Upananda aconselhou: “Pela misericórdia do Senhor Viṣṇu, Kṛṣṇa sempre foi salvo de muitos incidentes perigosos. Então, está na hora de deixarmos este lugar e irmos a algum lugar onde possamos tran­quilamente adorar o Senhor Viṣṇu, e assim evite-se ocorrerem mortes provocadas por algum demônio que venha atacar-nos.” O devoto deseja apenas poder prestar serviço devocional sem ser perturba­do. Entretanto, vemos que, na verdade, mesmo durante a presença de Kṛṣṇa, quando Nanda Mahārāja e os outros vaqueiros tinham a Su­prema Personalidade de Deus ao lado deles, havia distúrbios. Evidentemente, em todos os casos, Kṛṣṇa saía vitorioso. A instrução que podemos extrair disso é que não devemos nos deixar abalar com as aparentes perturbações. Tem havido muitas perturbações para o nosso movimento da consciência de Kṛṣṇa, mas não podemos interromper nossa marcha progressiva. Em vez disso, em todo o mundo, as pessoas estão recebendo este movimento com muito entusiasmo, e estão adquirindo a literatura sobre a consciência de Kṛṣṇa com energia redobrada. Logo, existem estímulos e perturbações. E isso se dava mesmo na época de Kṛṣṇa.

Texto

vanaṁ vṛndāvanaṁ nāma
paśavyaṁ nava-kānanam
gopa-gopī-gavāṁ sevyaṁ
puṇyādri-tṛṇa-vīrudham

Sinônimos

vanam — outra floresta; vṛndāvanam nāma — chamada Vṛndāvana; paśavyam — um lugar muito adequado para a manutenção das vacas e de outros animais; nava-kānanam — existem muitos novos lugares ajardinados; gopa-gopī-gavām — para todos os vaqueiros, os membros de suas famílias e as vacas; sevyam — um lugar muito adequado e muito feliz; puṇya-adri — há belas montanhas; tṛṇa — plantas; vīru­dham — e trepadeiras.

Tradução

Entre Nandeśvara e Mahāvana, há um lugar chamado Vṛndāvana. Esse lugar nos é muito propício porque é rico em gramados, plantas e trepadeiras para as vacas e outros animais. Ele tem belos jardins e altas montanhas e está repleto de condições favoráveis à felicidade de todos os gopas, gopīs e nossos animais.

Comentário

SIGNIFICADO—Vṛndāvana está situada entre Nandeśvara e Mahāvana. Anterior­mente, os vaqueiros haviam se mudado para Mahāvana, mas, mesmo assim, as perturbações continuaram. Por isso, os vaqueiros optaram por Vṛndāvana, que ficava entre as duas vilas, e decidiram ir para lá.

Texto

tat tatrādyaiva yāsyāmaḥ
śakaṭān yuṅkta mā ciram
godhanāny agrato yāntu
bhavatāṁ yadi rocate

Sinônimos

tat — portanto; tatra — para lá; adya eva — hoje mesmo; yāsyāmaḥ — vamos; śakaṭān — todos os carros; yuṅkta — aprontados; mā ciram — sem demora; go-dhanāni — todas as vacas; agrataḥ — adiante; yāntu — que elas vão; bhavatām — de todos vós; yadi — caso; rocate — convém aceitar isso.

Tradução

Portanto, vamos hoje, imediatamente. Não é preciso continuar es­perando. Se concordardes com minha proposta, preparemos todos os carros de boi, ponhamos as vacas à nossa frente e sigamos para lá.

Texto

tac chrutvaika-dhiyo gopāḥ
sādhu sādhv iti vādinaḥ
vrajān svān svān samāyujya
yayū rūḍha-paricchadāḥ

Sinônimos

tat śrutvā — ouvindo este conselho de Upananda; eka-dhiyaḥ — votando unanimemente; gopāḥ — todos os vaqueiros; sādhu sādhu — muito bom, muito bom; iti — assim; vādinaḥ — falando, declarando; vrajān — vacas; svān svān — próprias, respectivas; samāyujya — reunindo; yayuḥ — partiram; rūḍha-paricchadāḥ — todas as roupas e para­fernália tendo sido guardadas nas carroças.

Tradução

Ao ouvirem esse conselho de Upananda, os vaqueiros concorda­ram unanimemente. “Muito bom”, disseram. “Muito bom.” Assim, eles distribuíram seus afazeres domésticos, puseram suas roupas e outros artigos nas carroças, e imediatamente partiram para Vṛndāvana.

Texto

vṛddhān bālān striyo rājan
sarvopakaraṇāni ca
anaḥsv āropya gopālā
yattā ātta-śarāsanāḥ
godhanāni puraskṛtya
śṛṅgāṇy āpūrya sarvataḥ
tūrya-ghoṣeṇa mahatā
yayuḥ saha-purohitāḥ

Sinônimos

vṛddhān — primeiro, todos os anciãos; bālān — crianças; striyaḥ — mulheres; rājan — ó rei Parīkṣit; sarva-upakaraṇāni ca — depois, todas as classes de artigos essenciais e todos os pertences que tinham; anaḥsu — os carros de boi; āropya — mantendo; gopālāḥ — todos os vaqueiros; yattāḥ — com muito cuidado; ātta-śara-asanāḥ — plenamente equipados com arcos e flechas; go-dhanāni — todas as vacas; puras­kṛtya — mantendo na frente; śṛṅgāṇi — cornetas ou chifres; āpūrya — vibrando; sarvataḥ — em toda a volta; tūrya-ghoṣeṇa — com o ressoar das cornetas; mahatā — alto; yayuḥ — partiram; saha-purohitāḥ — com os sacerdotes.

Tradução

Mantendo todos os anciãos, mulheres, crianças e parafernália doméstica nos carros de boi e mantendo todas as vacas na frente, os vaqueiros apanharam seus arcos e flechas com muito cuidado e toca­ram cornetas feitas de chifre. Ó rei Parīkṣit, dessa maneira, enquanto as cornetas vibravam por todos os lados, os vaqueiros, acompanhados de seus sacerdotes, começaram sua viagem.

Comentário

SIGNIFICADO—Com relação a isso, deve-se notar que, embora em sua maioria fossem vaqueiros e agricultores, os habitantes de Gokula sabiam como defender-se do perigo e como proteger as mulheres, os anciãos, as vacas e as crianças, bem como os purohitas bramânicos.

Texto

gopyo rūḍha-rathā nūtna-
kuca-kuṅkuma-kāntayaḥ
kṛṣṇa-līlā jaguḥ prītyā
niṣka-kaṇṭhyaḥ suvāsasaḥ

Sinônimos

gopyaḥ — todas as vaqueiras; rūḍha-rathāḥ — enquanto viajavam nos carros de boi; nūtna-kuca-kuṅkuma-kāntayaḥ — seus corpos, especialmente seus seios, estavam decorados com kuṅkuma fresca; kṛṣṇa-līlāḥ — os passatempos de Kṛṣṇa; jaguḥ — elas cantavam; prītyā — com grande prazer; niṣka-kaṇṭhyaḥ — enfeitadas com medalhões em seus pescoços; su-vāsasaḥ — muito bem vestidas.

Tradução

As vaqueiras, montadas nos carros de boi, estavam muito bem vestidas com roupas excelentes, e seus corpos, especialmente seus seios, estavam decorados com pó de kuṅkuma fresco. Durante a viagem, elas começaram a cantar com grande prazer os passatem­pos de Kṛṣṇa.

Texto

tathā yaśodā-rohiṇyāv
ekaṁ śakaṭam āsthite
rejatuḥ kṛṣṇa-rāmābhyāṁ
tat-kathā-śravaṇotsuke

Sinônimos

tathā — bem como; yaśodā-rohiṇyau — tanto mãe Yaśodā quanto mãe Rohiṇī; ekam śakaṭam — em um carro de boi; āsthite — sentados; rejatuḥ — muito belos; kṛṣṇa-rāmābhyām — Kṛṣṇa e Balarāma, juntamente com Suas mães; tat-kathā — acerca dos passatempos de Kṛṣṇa e Balarāma; śravaṇa-utsuke — estando situadas em ouvir com grande prazer transcendental.

Tradução

Sentindo então muito prazer em ouvir os passatempos de Kṛṣṇa e Balarāma, mãe Yaśodā e Rohiṇīdevī, para evitarem separar-se de Kṛṣṇa e Balarāma por um momento sequer, subiram com Eles em um carro de boi. Nessa situação, todos eles pareciam muito belos.

Comentário

SIGNIFICADO—Parece que mãe Yaśodā e Rohiṇī não podiam separar-se de Kṛṣṇa e Balarāma por um momento sequer. Elas costumavam passar seu tempo ou cuidando de Kṛṣṇa e Balarāma, ou recitando Seus passatempos. Assim, mãe Yaśodā e Rohiṇī pareciam muito belas.

Texto

vṛndāvanaṁ sampraviśya
sarva-kāla-sukhāvaham
tatra cakrur vrajāvāsaṁ
śakaṭair ardha-candravat

Sinônimos

vṛndāvanam — o lugar sagrado chamado Vṛndāvana; sampravi­śya — após entrarem em; sarva-kāla-sukha-āvaham — onde é agradável viver em todas as estações; tatra — lá; cakruḥ — fizeram; vraja-āvāsam — habitação de Vraja; śakaṭaiḥ — com os carros de boi; ardha-candra­vat — formando um semicírculo, como uma meia lua.

Tradução

Dessa maneira, eles entraram em Vṛndāvana, onde sempre é agra­dável viver em todas as estações. Eles construíram uma habitação temporária, dispondo os carros de boi à sua volta de modo a formar uma meia lua.x

Comentário

SIGNIFICADO—Como se afirma no Viṣṇu Purāṇa:

śakaṭī-vāṭa-paryantaś
candrārdha-kāra-saṁsthite

E como se afirma no Hari-vaṁśa:

kaṇṭakībhiḥ pravṛddhābhis
tathā kaṇṭakībhir drumaiḥ
nikhātocchrita-śākhābhir
abhiguptaṁ samantataḥ

Não havia necessidade de se fazerem cercas em volta. Um lado já estava defendido por árvores espinhentas, e assim as árvores espinhentas, os carros de boi e os animais circundavam a residência temporária dos habitantes.

Texto

vṛndāvanaṁ govardhanaṁ
yamunā-pulināni ca
vīkṣyāsīd uttamā prītī
rāma-mādhavayor nṛpa

Sinônimos

vṛndāvanam — o lugar conhecido como Vṛndāvana; govardhanam — juntamente com a colina Govardhana; yamunā-pulināni ca — e as margens do rio Yamunā; vīkṣya — vendo essa situação; āsīt — permaneceu ou se sentiu; uttamā prītī — prazer extraordinário; rāma-­mādhavayoḥ — de Kṛṣṇa e Balarāma; nṛpa — ó rei Parīkṣit.

Tradução

Ó rei Parīkṣit, ao verem Vṛndāvana, Govardhana e as margens do rio Yamunā, Rāma e Kṛṣṇa sentiram grande prazer.

Texto

evaṁ vrajaukasāṁ prītiṁ
yacchantau bāla-ceṣṭitaiḥ
kala-vākyaiḥ sva-kālena
vatsa-pālau babhūvatuḥ

Sinônimos

evam — dessa maneira; vraja-okasām — a todos os habitantes de Vraja; prītim — prazer; yacchantau — dando; bāla-ceṣṭitaiḥ — através das atividades e passatempos realizados na infância; kala-vākyaiḥ — e através da dulcíssima linguagem entrecortada; sva-kālena — no decorrer do tempo; vatsa-pālau — para cuidar dos bezerros; babhūva­tuḥ — estavam crescidos.

Tradução

Dessa maneira, Kṛṣṇa e Balarāma, agindo como menininhos e fa­lando em linguagem um pouco entrecortada, deram transcendental prazer a todos os habitantes de Vraja. No decorrer do tempo, chegaram à idade de cuidar dos bezerros.

Comentário

SIGNIFICADO—Logo que cresceram um pouco, Kṛṣṇa e Balarāma foram incum­bidos de cuidar dos bezerros. Muito embora nascidos em uma família muito próspera, Eles tinham de cuidar dos bezerros. Esse era o sistema de educação. Aqueles que não nasciam em famílias de brāhmaṇas não se destinavam à educação acadêmica. Os brāhmaṇas eram treinados em educação acadêmica e literária, os kṣatriyas eram treinados para cuidar do Estado, e os vaiśyas aprendiam a cultivar a terra e cuidar das vacas e bezerros. Não era preciso desperdiçar tempo indo à escola para receber uma assim chamada educação para que, mais tarde, aumentasse o número de desempregados. Kṛṣṇa e Balarāma ensina­ram-nos através de Seu comportamento pessoal. Kṛṣṇa tomava conta das vacas e tocava Sua flauta, e Balarāma cuidava das atividades agrícolas, portando um arado em Sua mão.

Texto

avidūre vraja-bhuvaḥ
saha gopāla-dārakaiḥ
cārayām āsatur vatsān
nānā-krīḍā-paricchadau

Sinônimos

avidūre — não muito longe das residências dos Vrajavāsīs; vraja­-bhuvaḥ — da terra conhecida como Vraja; saha gopāla-dārakaiḥ — com outros meninos que executavam a mesma atividade (vaquei­rinhos); cārayām āsatuḥ — apascentavam; vatsān — os bezerrinhos; nānā — vários; krīḍā — divertindo-Se; paricchadau — muito bens vestidos de diferentes maneiras e com apetrechos.

Tradução

Não muito longe de Suas residências, Kṛṣṇa e Balarāma, com todas as classes de brinquedos, divertiam-Se com outros vaqueirinhos e começavam a apascentar os bezerros menores.

Texto

kvacid vādayato veṇuṁ
kṣepaṇaiḥ kṣipataḥ kvacit
kvacit pādaiḥ kiṅkiṇībhiḥ
kvacit kṛtrima-go-vṛṣaiḥ
vṛṣāyamāṇau nardantau
yuyudhāte parasparam
anukṛtya rutair jantūṁś
ceratuḥ prākṛtau yathā

Sinônimos

kvacit — às vezes; vādayataḥ — soprando; veṇum — a flauta; kṣepa­ṇaiḥ — com um dispositivo de corda para atirar; kṣipataḥ — atirando pedras para derrubar frutas; kvacit — às vezes; kvacit pādaiḥ — às vezes com as pernas; kiṅkiṇībhiḥ — com o som dos sinos de tornozelo; kvacit — às vezes; kṛtrima-go-vṛṣaiḥ — como se fossem vacas e bois; vṛṣāyamāṇau — imitando os animais; nardantau — rugindo bem alto; yuyudhāte — ambos costumavam lutar; parasparam — um com o outro; anukṛtya — imitando; rutaiḥ — pelo ressoar; jantūn — todos os animais; ceratuḥ — Eles costumavam perambular; prākṛtau — duas crianças humanas comuns; yathā — como.

Tradução

Às vezes, Kṛṣṇa e Balarāma tocavam Suas flautas; algumas vezes, atiravam cordas e pedras com o propósito de derrubar frutas das árvores; outras vezes, atiravam apenas pedras, e outras vezes, enquanto Seus sinos de tornozelo tilintavam, Eles jogavam futebol com frutas como bael e āmalakī. Às vezes, Eles Se cobriam com mantos e, imitando vacas e touros, lutavam um com o outro, rugindo bem alto, e às vezes imitavam as vozes dos animais. Dessa maneira, Eles Se di­vertiam exatamente como duas crianças humanas comuns.

Comentário

SIGNIFICADO—Vṛndāvana é repleta de pavões. Kūjat-kokila-haṁsa-sārasa-gaṇākīrṇe mayūrākule. A floresta de Vṛndāvana sempre está cheia de cucos, patos, cisnes, pavões, grous e também macacos, touros e vacas. Assim, Kṛṣṇa e Balarāma costumavam imitar os sons desses animais e desfrutavam da brincadeira.

Texto

kadācid yamunā-tīre
vatsāṁś cārayatoḥ svakaiḥ
vayasyaiḥ kṛṣṇa-balayor
jighāṁsur daitya āgamat

Sinônimos

kadācit — às vezes; yamunā-tīre — às margens do Yamunā; vatsān — os bezerros; cārayatoḥ — quando Eles estavam apascentando; sva­kaiḥ — Seus próprios; vayasyaiḥ — com outros companheiros; kṛṣṇa-­balayoḥ — Kṛṣṇa e Balarāma; jighāṁsuḥ — desejando matá-lOs; dai­tyaḥ — outro demônio; āgamat — chegou ali.

Tradução

Certo dia, enquanto Rāma e Kṛṣṇa, juntamente com Seus com­panheiros de recreação, apascentavam as vacas às margens do rio Yamunā, outro demônio apareceu ali, desejando matá-lOs.

Texto

taṁ vatsa-rūpiṇaṁ vīkṣya
vatsa-yūtha-gataṁ hariḥ
darśayan baladevāya
śanair mugdha ivāsadat

Sinônimos

tam — ao demônio; vatsa-rūpiṇam — assumindo a forma de um bezerro; vīkṣya — vendo; vatsa-yūtha-gatam — quando o demônio se infiltrou no grupo de todos os outros bezerros; hariḥ — a Suprema Personalidade de Deus, Kṛṣṇa; darśayan — indicando; baladevāya — a Baladeva; śanaiḥ — muito vagarosamente; mugdhaḥ iva — como se Ele não entendesse nada; āsadat — aproximou-se do demônio.

Tradução

Ao perceber que o demônio assumira a forma de um bezerro e se infiltrara entre os outros bezerros, a Suprema Personalidade de Deus dirigiu-Se a Baladeva: “Por aqui há outro demônio.” Então, Ele Se aproximou do demônio muito vagarosamente, como se não soubesse as intenções deste.

Comentário

SIGNIFICADO—A importância das palavras mugdha iva é que, embora saiba de tudo, Kṛṣṇa fingia não entender por que o demônio se infiltrara entre os bezerros, e informou Baladeva através de um sinal.

Texto

gṛhītvāpara-pādābhyāṁ
saha-lāṅgūlam acyutaḥ
bhrāmayitvā kapitthāgre
prāhiṇod gata-jīvitam
sa kapitthair mahā-kāyaḥ
pātyamānaiḥ papāta ha

Sinônimos

gṛhītvā — agarrando; apara-pādābhyām — com as pernas traseiras; saha — juntamente com; lāṅgūlam — a cauda; acyutaḥ — Kṛṣṇa, a Suprema Personalidade de Deus; bhrāmayitvā — girando com muito vigor; kapittha-agre — contra o topo de uma árvore kapittha; prāhi­ṇot — atirou-o; gata-jīvitam — corpo sem vida; saḥ — aquele demônio; kapitthaiḥ — com as árvores kapittha; mahā-kāyaḥ — assumiu um grande corpo; pātyamānaiḥ — e enquanto a árvore caía; papāta ha — ele caiu morto no chão.

Tradução

Em seguida, Śrī Kṛṣṇa agarrou o demônio pelas pernas traseiras e pela cauda e, com muito ímpeto, girou todo o corpo do demônio até que o demônio morresse, e o atirou contra o topo de uma árvore kapittha, que então caiu juntamente com o corpo do demônio, que assumira uma forma gigantesca.

Comentário

SIGNIFICADO—Kṛṣṇa matou o demônio de tal modo a fazer os frutos kapittha caírem, para que Ele, Balarāma e os outros meninos aproveitassem a oportunidade e os comessem. Algumas vezes, a kapittha é chamada de kṣatbelphala. A polpa dessa fruta é muito saborosa. Ela é doce e azeda, e todos gostam dela.

Texto

taṁ vīkṣya vismitā bālāḥ
śaśaṁsuḥ sādhu sādhv iti
devāś ca parisantuṣṭā
babhūvuḥ puṣpa-varṣiṇaḥ

Sinônimos

tam — este incidente; vīkṣya — observando; vismitāḥ — muito espantados; bālāḥ — todos os outros meninos; śaśaṁsuḥ — louvaram bastante; sādhu sādhu iti — exclamando: “Ótimo, ótimo”; devāḥ ca — e todos os semideuses dos planetas celestiais; parisantuṣṭāḥ — estando muito satisfeitos; babhūvuḥ — ficaram; puṣpa-varṣiṇaḥ — derramaram flores sobre Kṛṣṇa.

Tradução

Ao verem o corpo morto do demônio, todos os vaqueirinhos exclamaram: “Muito bem, Kṛṣṇa! Ótimo, ótimo! Muito obrigado.”­ No sistema planetário superior, todos os semideuses ficaram satisfeitos, em razão do que derramaram flores sobre a Suprema Personalidade de Deus.

Texto

tau vatsa-pālakau bhūtvā
sarva-lokaika-pālakau
saprātar-āśau go-vatsāṁś
cārayantau viceratuḥ

Sinônimos

tau — Kṛṣṇa e Balarāma; vatsa-pālakau — como se estivessem cuidando dos bezerros; bhūtvā — assim tornando-Se; sarva-loka-eka-­pālakau — embora sejam os mantenedores de todos os seres vivos de todo o universo; sa-prātaḥ-āśau — terminando o desjejum mati­nal; go-vatsān — todos os bezerros; cāruyantau — apascentando; vice­ratuḥ — vagavam de um lugar a outro.

Tradução

Após o extermínio do demônio, Kṛṣṇa e Balarāma terminaram Seu desjejum matinal, e enquanto continuavam a cuidar dos bezer­ros, Eles perambulavam de um lugar a outro. Kṛṣṇa e Balarāma, as Supremas Personalidades de Deus que mantêm toda a criação, agora cuidavam dos bezerros como se fossem vaqueirinhos.

Comentário

SIGNIFICADO—Paritrāṇāya sādhūnāṁ vināśāya ca duṣkṛtām. A atividade que Kṛṣṇa desempenhava diariamente aqui neste mundo material era matar os duṣkṛtīs. Isso não interferia em Seus afazeres diários, pois esse era um trabalho de rotina. Enquanto Ele apascentava os bezerros às margens do rio Yamunā, dois ou três episódios ocorriam todos os dias, e embora fossem acontecimentos graves, matar os demônios um após o outro parecia-Lhes um trabalho de rotina.

Texto

svaṁ svaṁ vatsa-kulaṁ sarve
pāyayiṣyanta ekadā
gatvā jalāśayābhyāśaṁ
pāyayitvā papur jalam

Sinônimos

svam svam — próprio, respectivo; vatsa-kulam — o grupo de bezerros; sarve — todos os meninos e Kṛṣṇa e Balarāma; pāyayiṣyantaḥ — desejando que eles bebessem; ekadā — certo dia; gatvā — indo; jala-­āśaya-abhyāśam — para perto do tanque de água; pāyayitvā — após deixarem os animais beber água; papuḥ jalam — eles também bebe­ram água.

Tradução

Certo dia, todos os meninos, incluindo Kṛṣṇa e Balarāma, cada um deles conduzindo seu próprio grupo de bezerros, levaram os bezerros a um reservatório de água, pois queriam que eles bebessem. Depois que os animais beberam a água, os meninos também beberam.

Texto

te tatra dadṛśur bālā
mahā-sattvam avasthitam
tatrasur vajra-nirbhinnaṁ
gireḥ śṛṅgam iva cyutam

Sinônimos

te — eles; tatra — lá; dadṛśuḥ — observaram; bālāḥ — todos os meninos; mahā-sattvam — um corpo gigantesco; avasthitam — situada; tatrasuḥ — ficaram com medo; vajra-nirbhinnam — partido por um raio; gireḥ śṛṅgam — o pico de uma montanha; iva — como; cyutam — caído ali.

Tradução

Bem próximo ao reservatório, os meninos viram um corpo gigan­tesco, parecido com um pico de montanha quebrado e atingido por um raio. A mera visão desse enorme ser vivo era suficiente para amedrontá-los.

Texto

sa vai bako nāma mahān
asuro baka-rūpa-dhṛk
āgatya sahasā kṛṣṇaṁ
tīkṣṇa-tuṇḍo ’grasad balī

Sinônimos

saḥ — aquela criatura; vai — na verdade; bakaḥ nāma — chamada Bakāsura; mahān asuraḥ — um demônio grandioso e gigantesco; baka­-rūpa-dhṛk — assumiu a forma corpórea de um enorme pato; āgatya — chegando ali; sahasā — subitamente; kṛṣṇam — Kṛṣṇa; tīkṣṇa-tuṇḍaḥ — bico afiado; agrasat — engoliu; balī — muito poderoso.

Tradução

Aquele demônio de corpo enorme chamava-se Bakāsura. Ele assu­miu o corpo de um pato cujo bico era muito afiado. Uma vez ali, Bakāsura imediatamente engoliu Kṛṣṇa.

Texto

kṛṣṇaṁ mahā-baka-grastaṁ
dṛṣṭvā rāmādayo ’rbhakāḥ
babhūvur indriyāṇīva
vinā prāṇaṁ vicetasaḥ

Sinônimos

kṛṣṇam — a Kṛṣṇa; mahā-baka-grastam — engolido pelo grande pato; dṛṣṭvā — vendo este incidente; rāma-ādayaḥ arbhakāḥ — todos os outros meninos, encabeçados por Balarāma; babhūvuḥ — ficaram domina­dos; indriyāṇi — sentidos; iva — como; vinā — sem; prāṇam — vida; vi­cetasaḥ — muito perplexos, quase inconscientes.

Tradução

Ao verem que Kṛṣṇa fora devorado por aquele pato gigantesco, Balarāma e os outros meninos ficaram quase inconscientes, como sentidos sem vida.

Comentário

SIGNIFICADO—Embora Balarāma possa fazer tudo, Ele ficou momentaneamente perplexo devido à intensa afeição por Seu irmão. Afirma-se que fenômeno semelhante aconteceu em relação ao rukmiṇī-haraṇa, o rapto de Rukmiṇī. Quando Kṛṣṇa, após raptar Rukmiṇī, foi atacado por todos os reis, Rukmiṇī ficou momentaneamente confusa, até que o Senhor interveio como necessário.

Texto

taṁ tālu-mūlaṁ pradahantam agnivad
gopāla-sūnuṁ pitaraṁ jagad-guroḥ
caccharda sadyo ’tiruṣākṣataṁ bakas
tuṇḍena hantuṁ punar abhyapadyata

Sinônimos

tam — Kṛṣṇa; tālu-mūlam — a raiz da garganta; pradahantam — queimando; agni-vat — como fogo; gopāla-sūnum — Kṛṣṇa, o filho de um vaqueiro; pitaram — o pai; jagat-guroḥ — do senhor Brahmā; cac­charda — saiu de sua boca; sadyaḥ — imediatamente; ati-ruṣā — com muita ira; akṣatam — ileso; bakaḥ — Bakāsura; tuṇḍena — com seu bico afiado; hantum — matar; punaḥ — novamente; abhyapadyata — empenhou-se em.

Tradução

Kṛṣṇa, que era o pai do senhor Brahmā, mas agia como filho de um vaqueiro, tornou-Se como o fogo, queimando o interior da gar­ganta do demônio, e o demônio Bakāsura imediatamente O expeliu. Ao ver que Kṛṣṇa, embora tendo sido engolido, não estava machu­cado, o demônio logo voltou a atacar Kṛṣṇa com seu bico afiado.

Comentário

SIGNIFICADO—Embora Kṛṣṇa sempre seja tão suave como um lótus, Ele criou dentro da garganta de Bakāsura a sensação de que era mais quente do que o fogo. Embora todo o corpo de Kṛṣṇa seja mais doce do que o açúcar-cande, Bakāsura sentiu um gosto amargo, motivo pelo qual vomitou Kṛṣṇa imediatamente. Como se afirma na Bhagavad-gītā (4.11), ye yathā māṁ prapadyante tāṁs tathaiva bhajāmy aham. Quando Kṛṣṇa é aceito como um inimigo, Ele Se torna o objeto mais intolerável para o não-devoto, que não pode suportar Kṛṣṇa nem dentro nem fora. Vemos isso aqui, no exemplo de Bakāsura.

Texto

tam āpatantaṁ sa nigṛhya tuṇḍayor
dorbhyāṁ bakaṁ kaṁsa-sakhaṁ satāṁ patiḥ
paśyatsu bāleṣu dadāra līlayā
mudāvaho vīraṇavad divaukasām

Sinônimos

tam — a Bakāsura; āpatantam — novamente procurando atacá-lO; saḥ — Senhor Kṛṣṇa; nigṛhya — agarrando; tuṇḍayoḥ — pelo bico; dorbhyām — com Seus braços; bakam — Bakāsura; kaṁsa-sakham — que era amigo e associado de Kaṁsa; satām patiḥ — Senhor Kṛṣṇa, o mestre dos vaiṣṇavas; paśyatsu — enquanto observavam; bāleṣu — todos os vaqueirinhos; dadāra — bifurcou; līlayā — muito facilmente; mudā-āvahaḥ — essa ação foi muito agradável; vīraṇa-vat — como a grama chamada vīraṇa (como se fosse bifurcada); divaukasām — para todos os cidadãos dos céus.

Tradução

Quando Kṛṣṇa, o líder dos vaiṣṇavas, viu que o demônio Bakāsura, amigo de Kaṁsa, procurava atacá-lO com Seus braços, Ele agarrou as duas metades do bico do demônio, e, na presença de todos os va­queirinhos, Kṛṣṇa o bifurcou muito facilmente, assim como uma criança parte uma folha de grama vīraṇa. Pelo fato de ter matado o demô­nio, Kṛṣṇa satisfez muito os cidadãos dos céus.

Texto

tadā bakāriṁ sura-loka-vāsinaḥ
samākiran nandana-mallikādibhiḥ
samīḍire cānaka-śaṅkha-saṁstavais
tad vīkṣya gopāla-sutā visismire

Sinônimos

tadā — naquele momento; baka-arim — no inimigo de Bakāsura; sura-loka-vāsinaḥ — os cidadãos celestiais dos planetas superiores; samākiran — derramaram flores; nandana-mallikā-ādibhiḥ — com flores tais como a mallikā, que são cultivadas em Nandana-kānana; samīḍi­re — também congratularam-nO; ca — e; ānaka-śaṅkha-saṁstavaiḥ — com timbales e búzios celestiais, acompanhados de orações; tat vīk­ṣya — vendo isto; gopāla-sutāḥ — os vaqueirinhos; visismire — ficaram admirados.

Tradução

Naquele momento, os cidadãos celestiais, habitantes do sistema planetário superior, derramaram sobre Kṛṣṇa, o inimigo de Bakāsura, mallikā-puṣpa, flores cultivadas em Nandana-kānana. Eles também O congratularam vibrando timbales e búzios celestiais e oferecendo orações. Vendo isso, os vaqueirinhos ficaram admirados.

Texto

muktaṁ bakāsyād upalabhya bālakā
rāmādayaḥ prāṇam ivendriyo gaṇaḥ
sthānāgataṁ taṁ parirabhya nirvṛtāḥ
praṇīya vatsān vrajam etya taj jaguḥ

Sinônimos

muktam — assim liberto; baka-āsyāt — da boca de Bakāsura; upa­labhya — voltando; bālakāḥ — todos os meninos, os companheiros de folguedo; rāma-ādayaḥ — encabeçados por Balarāma; prāṇam — vida; iva — como; indriyaḥ — sentidos; gaṇaḥ — todos eles; sthāna-āga­tam — indo para sua própria morada; tam — a Kṛṣṇa; parirabhya — abraçando; nirvṛtāḥ — estando livre do perigo; praṇīya — após reuni­rem; vatsān — todos os bezerros; vrajam etya — retornando a Vraja­bhūmi; tat jaguḥ — anunciaram o incidente aos brados.

Tradução

Assim como os sentidos são apaziguados quando a consciência e a vida retornam, do mesmo modo, quando Kṛṣṇa livrou-Se desse perigo, todos os meninos, incluindo Balarāma, pensaram que sua vida ressurgira. Conscientes mais uma vez, eles abraçaram Kṛṣṇa e, então, reuniram seus próprios bezerros e regressaram a Vrajabhūmi, onde anunciaram o incidente aos brados.

Comentário

SIGNIFICADO—Era prática entre os habitantes de Vrajabhūmi compor poemas sobre os incidentes que ocorriam na floresta quando Kṛṣṇa realizava Suas diferentes atividades para matar os asuras. Eles compunham todas as histórias sob a forma de poemas ou incumbiam aos poetas profissionais essa tarefa, após o que cantavam sobre esses incidentes. Por isso, aqui se menciona que os meninos anunciavam de forma muito audível.

Texto

śrutvā tad vismitā gopā
gopyaś cātipriyādṛtāḥ
pretyāgatam ivotsukyād
aikṣanta tṛṣitekṣaṇāḥ

Sinônimos

śrutvā — após ouvirem; tat — esses incidentes; vismitāḥ — estando espantados; gopāḥ — os vaqueiros; gopyaḥ ca — e suas respectivas esposas; ati-priya-ādṛtāḥ — receberam a notícia com grande prazer transcendental; pretya āgatam iva — pensaram que os meninos haviam retornado da morte; utsukyāt — com muita sofreguidão; aikṣanta — começaram a olhar para os meninos; tṛṣita-īkṣaṇāḥ — com plena satisfação, eles não queriam tirar seus olhos de Kṛṣṇa e dos meninos.

Tradução

Ao ouvirem o relato de como Bakāsura fora morto na floresta, os vaqueiros e as vaqueiras ficaram muito espantados. Ao verem Kṛṣṇa e ouvirem a história, eles receberam Kṛṣṇa com grande ansiedade, pensando que Kṛṣṇa e os outros meninos haviam retornado da boca da morte. Assim, eles olharam para Kṛṣṇa e os meninos com olhos silenciosos, não desejando desviar seus olhos, agora que os meninos estavam salvos.

Comentário

SIGNIFICADO—Devido ao intenso amor por Kṛṣṇa, os vaqueiros e as vaqueiras simplesmente permaneceram calados, pensando em como Kṛṣṇa e os meninos haviam sido salvos. Os vaqueiros e as vaqueiras olhavam para Kṛṣṇa e os meninos e não queriam desviar deles o seu olhar.

Texto

aho batāsya bālasya
bahavo mṛtyavo ’bhavan
apy āsīd vipriyaṁ teṣāṁ
kṛtaṁ pūrvaṁ yato bhayam

Sinônimos

aho bata — é muito espantoso; asya — disto; bālasya — Kṛṣṇa; baha­vaḥ — muitas e muitas; mṛtyavaḥ — pausas de morte; abhavan — apareceram; api — mesmo assim; āsīt — houve; vipriyam — a causa da morte; teṣām — delas; kṛtam — feita; pūrvam — anteriormente; yataḥ — das quais; bhayam — havia medo da morte.

Tradução

Os vaqueiros, encabeçados por Nanda Mahārāja, começaram a ponderar: É muito espantoso que, embora este menino Kṛṣṇa tenha diversas vezes defrontado muitas situações que poderiam ter causado a Sua morte; pela graça da Suprema Personalidade de Deus, essas circunstâncias amedrontadoras foram extintas, e não Ele.

Comentário

SIGNIFICADO—Os vaqueiros pensaram com inocência: “Porque nosso Kṛṣṇa é inocente, as situações que poderiam ter causado a morte dEle foram eliminadas, e não Kṛṣṇa. Essa é a maior graça concedida pela Suprema Personalidade de Deus.”

Texto

athāpy abhibhavanty enaṁ
naiva te ghora-darśanāḥ
jighāṁsayainam āsādya
naśyanty agnau pataṅgavat

Sinônimos

atha api — embora elas venham atacar; abhibhavanti — elas são capazes de matar; enam — este menino; na — não; eva — decerto; te — todas elas; ghora-darśanāḥ — parecendo muito ferozes; jighāṁsayā — devido à inveja; enam — de Kṛṣṇa; āsādya — aproximando-se; naśyan­ti — são aniquiladas (a morte dizima o agressor); agnau — no fogo; pataṅga-vat — como mariposas.

Tradução

Embora fossem muito ferozes, as causas da morte, os daityas, não puderam matar este menino Kṛṣṇa. Em vez disso, porque vieram matar meninos inocentes, elas próprias foram mortas logo que se aproximaram, exatamente como mariposas que se atiram sobre o fogo.

Comentário

SIGNIFICADO—De maneira inocente, Nanda Mahārāja pensou: “Talvez este menino Kṛṣṇa tenha matado todos esses demônios anteriormente, em virtude do que, nesta vida, eles sentem inveja e O estão atacando. Mas Kṛṣṇa é o fogo, e eles são as mariposas, e, em uma luta entre o fogo e as mari­posas, o fogo sempre vence.” Sempre ocorre luta entre os demônios e o poder da Personalidade Suprema. Paritrāṇāya sādhūnāṁ vināśāya ca duṣkṛtām. (Bhagavad-gītā 4.8) Todo aquele que se nega a aceitar o controle da Suprema Personalidade de Deus deve ser morto, vida após vida. Os seres vivos ordinários estão sujeitos ao karma, mas a Suprema Personalidade de Deus sempre triunfa sobre os demônios.

Texto

aho brahma-vidāṁ vāco
nāsatyāḥ santi karhicit
gargo yad āha bhagavān
anvabhāvi tathaiva tat

Sinônimos

aho — quão maravilhoso é; brahma-vidām — das pessoas que têm pleno conhecimento acerca do Brahman, acerca da transcendência; vācaḥ — as palavras; na — nunca; asatyāḥ — sem veracidade; santi — tornam-se; karhicit — em momento algum; gargaḥ — Garga Muni; yat — tudo o que; āha — predisse; bhagavān — Garga Muni, o poderosíssimo; an­vabhāvi — está acontecendo exatamente; tathā eva — como; tat — isto.

Tradução

As palavras das pessoas que têm pleno conhecimento acerca do Brahman jamais falham. É muito maravilhoso que tudo o que Garga Muni predisse, agora está ocorrendo com todos os detalhes.

Comentário

SIGNIFICADO—O propósito da vida humana é indicado no Brahma-sūtra: athāto brahma jijñāsā. Para tornar sua vida perfeita – no passado, no presente e no futuro –, a pessoa deve aprender sobre o Brahman. Devido à intensa afeição, Nanda Mahārāja não podia entender Kṛṣṇa como Ele é. Estudando os Vedas, Garga Muni era capaz de conhe­cer tudo – passado, presente e futuro –, mas Nanda Mahārāja não podia entender Kṛṣṇa diretamente. Devido ao seu intenso amor por Kṛṣṇa, ele esqueceu quem era Kṛṣṇa e não podia entender a po­tência de Kṛṣṇa. Embora Kṛṣṇa seja o próprio Nārāyaṇa, Garga Muni não revelou isso. Assim, Nanda Mahārāja apreciava as palavras de Garga Muni, mas, devido à sua afeição profunda, não podia enten­der quem era Kṛṣṇa, embora Garga Muni houvesse dito que as quali­dades de Kṛṣṇa seriam idênticas às qualidades de Nārāyaṇa.

Texto

iti nandādayo gopāḥ
kṛṣṇa-rāma-kathāṁ mudā
kurvanto ramamāṇāś ca
nāvindan bhava-vedanām

Sinônimos

iti — dessa maneira; nanda-ādayaḥ — todos os vaqueiros, encabeça­dos por Nanda Mahārāja; gopāḥ — vaqueiros; kṛṣṇa-rāma-kathām — narração dos incidentes relacionados com Bhagavān Kṛṣṇa e Rāma; mudā — em grande prazer transcendental; kurvantaḥ — fazendo isso; ramamāṇāḥ ca — gozavam a vida e aumentavam sua afeição por Kṛṣṇa; na — não; avindam — percebiam; bhava-vedanām — as tribula­ções da existência material.

Tradução

Dessa maneira, todos os vaqueiros, encabeçados por Nanda Mahā­rāja, desfrutavam de tópicos sobre os passatempos de Kṛṣṇa e Balarāma com muito prazer transcendental, e nem mesmo percebiam a existência de tribulações materiais.

Comentário

SIGNIFICADO—Eis o que acontece quando se estudam ou comentam as kṛṣṇa­-līlās que aparecem no Śrīmad-Bhāgavatam. Sadyo hṛdy avarudhyate ’tra kṛtibhiḥ śuśrūṣubhis tat-kṣaṇāt. (Śrīmad-Bhāgavatam 1.1.2) Em Vṛndāvana, Nanda Mahārāja e Yaśodā pareciam simples pessoas deste mundo material, mas nunca sentiam as tribulações deste mundo, embora às vezes se deparassem com muitas situações perigosas criadas pelos demônios. Este é um exemplo prático. Se seguirmos os passos de Nanda Mahārāja e dos gopas, poderemos todos ser felizes simples­mente discutindo as atividades de Kṛṣṇa.

anarthopaśamaṁ sākṣād
bhakti-yogam adhokṣaje
lokasyājānato vidvāṁś
cakre sātvata-saṁhitām

Vyāsadeva apresentou esta literatura para que todos possam entender sua posição transcendental simplesmente falando sobre bhāgavata-kathā. Mesmo agora, pode-se ser feliz e livre das tribulações materiais em qualquer lugar caso se siga o Śrīmad-Bhāgavatam. Não há necessidade de austeridades e penitências, que nesta era são muito difíceis de serem realizadas. Śrī Caitanya Mahāprabhu, portanto, declara: sarvātma-snapanaṁ paraṁ vijayate śrī-kṛṣṇa-saṅkīrtanam. Através do nosso movimento da consciência de Kṛṣṇa, estamos ten­tando distribuir o Śrīmad-Bhāgavatam para que, em qualquer parte do mundo, todos possam absorver-se no movimento da consciência de Kṛṣṇa cantando e ouvindo sobre as atividades de Kṛṣṇa e tornando­-se livres de todas as tribulações materiais.

Texto

evaṁ vihāraiḥ kaumāraiḥ
kaumāraṁ jahatur vraje
nilāyanaiḥ setu-bandhair
markaṭotplavanādibhiḥ

Sinônimos

evam — dessa maneira; vihāraiḥ — através de diferentes passatempos; kaumāraiḥ — infantis; kaumāram — a idade da infância; jaharuḥ — (Kṛṣṇa e Balarāma) passaram; vraje — em Vrajabhūmi; nilāyanaiḥ — brincando de esconde-esconde; setu-bandhaiḥ — construindo uma ponte imaginária sobre o oceano; markaṭa — como os macacos; ut­plavana-ādibhiḥ — pulando de um lado a outro etc.

Tradução

Dessa maneira, Kṛṣṇa e Balarāma passaram Sua infância em Vrajabhūmi, ocupando-Se em brincadeiras infantis, tais como esconde-esconde, construir uma ponte imaginá­ria sobre o oceano, e pular de um lado a outro como macacos.

Comentário

Neste ponto, encerram-se os Significados Bhaktivedanta do décimo canto, décimo primeiro capítulo, do Śrīmad-Bhāgavatam, intitulado “Os Passatempos Infantis de Kṛṣṇa”.