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CAPÍTULO QUATRO

Durvāsā Muni Ofende Ambarīṣa Mahārāja

Este capítulo descreve a história de Mahārāja Nabhaga, de seu filho Nābhāga, e de Mahārāja Ambarīṣa.

O filho de Manu, Nabhaga, teve um filho, Nābhāga, que viveu muitos anos no gurukula. Na ausência de Nābhāga, seus irmãos não o incluíram na divisão do reino, senão que, em vez disso, repartiram a propriedade apenas entre si. Uma vez que Nābhāga estava de volta em sua casa, seus irmãos deram-lhe como quinhão seu pai, mas, quando Nābhāga foi ter com seu pai e falou-lhe sobre a conduta dos irmãos, seu pai lhe informou que isso era uma trapaça e lhe deu o conselho de que, para subsistir, ele fosse à arena de sacrifícios e descre­vesse dois mantras para serem cantados ali. Nābhāga cumpriu a ordem de seu pai, em consequência do que Aṅgirā e outras grandes pessoas santas deram-lhe todo o dinheiro coletado naquele sacrifício. Para testar Nābhāga, o senhor Śiva contestou o seu direito de propriedade sobre a riqueza, mas, ao satisfazer-se com o comportamento de Nābhāga, o senhor Śiva ofereceu-lhe todas as riquezas.

De Nābhāga, nasceu Ambarīṣa, o mais poderoso e célebre devo­to. Mahārāja Ambarīṣa foi o imperador do mundo inteiro, mas ele considerava sua opulência como algo temporário. Na verdade, sa­bendo que essa opulência material é a causa da queda na vida con­dicionada, ele não estava apegado a tal opulência. Ele ocupava seus sentidos e sua mente a serviço do Senhor. Esse processo se chama yukta-vairāgya, ou renúncia correta, pois é completamente adequado para que se possa adorar a Suprema Personalidade de Deus. Visto que, como imperador, Mahārāja Ambarīṣa era imensamente opulen­to, ele realizava serviço devocional com grande opulência e, portanto, apesar de sua riqueza, não tinha apego à sua esposa, filhos ou reino. Ele sempre ocupava seus sentidos e sua mente em servir ao Senhor. Portanto, se ele não desejava obter nem mesmo a liberação, por que, então, procuraria desfrutar de opulências materiais?

Certa vez, seguindo o voto de Dvādaśī, Mahārāja Ambarīṣa esta­va adorando a Suprema Personalidade de Deus em Vṛndāvana. No Dvādaśī, o dia após o Ekādaśī, quando ele estava prestes a quebrar seu jejum de Ekādaśī, o grande yogī místico Durvāsā apareceu em sua casa e se tornou seu hóspede. O rei Ambarīṣa respeitosamente recebeu Durvāsā Muni, e Durvāsā Muni, após aceitar o convite para comer, foi banhar-se no rio Yamunā ao meio-dia. Porque estava ab­sorto em samādhi, ele não voltou logo. Mahārāja Ambarīṣa, entre­tanto, ao ver que a hora de quebrar o jejum estava passando, bebeu um pouco de água, de acordo com o conselho de brāhmaṇas erudi­tos, apenas para quebrar o jejum formalmente. Através de poder místi­co, Durvāsā Muni pôde perceber o que acontecera e ficou muito irado. Ao regressar, ele começou a repreender Mahārāja Ambarīṣa, mas não ficou satisfeito com isso e, por fim, criou, a partir de seu cabelo, um demônio que parecia o fogo da morte. A Suprema Personalidade de Deus, entretanto, sempre protege o Seu devoto e, para socorrer Mahārāja Ambarīṣa, Ele enviou Seu disco, o cakra Sudarśana, que imediatamente exterminou o demônio de fogo e, então, saiu em per­seguição a Durvāsā, que sentia muita inveja de Mahārāja Amba­rīṣa. Durvāsā fugiu para Brahmaloka, Śivaloka e todos os outros planetas superiores, mas não conseguiu proteger-se da ira do cakra Sudarśana. Enfim, chegou ao mundo espiritual e rendeu-se ao Senhor Nārāyaṇa, mas o Senhor Nārāyaṇa não podia perdoar alguém que havia ofendido um vaiṣṇava. Para ser perdoado desse tipo de ofensa, o ofensor deveria submeter-se ao vaiṣṇava ofendido. Não há outra maneira de ele ser perdoado. Portanto, o Senhor Nārāyaṇa aconselhou Durvāsā a procurar Mahārāja Ambarīṣa e pedir o seu perdão.

VERSO 1:
Śukadeva Gosvāmī disse: O filho de Nabhaga, chamado Nābhāga, viveu por um longo tempo na residência de seu mestre espiritual. Por­tanto, seus irmãos pensavam que ele não se tornaria gṛhastha nem retornaria. Em consequência disso, sem reservar uma parte para ele, di­vidiram a propriedade de seu pai entre si. Quando Nābhāga retornou da residência de seu mestre espiritual, eles lhe deram como quinhão o seu pai.
VERSO 2:
Nābhāga perguntou: “Meus queridos irmãos, que parte da propriedade do nosso pai reservastes para mim?” Seus irmãos mais velhos responderam: “Mantivemos como tua parte o nosso pai.” Porém, quando Nābhāga se dirigiu ao seu pai e disse: “Meu querido pai, na divisão da propriedade, meus irmãos mais velhos deram-me o senhor como meu quinhão”, o pai respondeu: “Meu querido filho, não confies nas palavras enganosas deles. Eu não sou tua propriedade.”
VERSO 3:
O pai de Nābhāga disse: Todos os descendentes de Aṅgirā realizarão agora um grande sacrifício, mas, embora sejam muito inte­ligentes, a cada seis dias confundem-se na realização do sacrifício e cometem erros em seus deveres naqueles dias.
VERSOS 4-5:
O pai de Nābhāga prosseguiu: “Vai até aquelas grandes almas e descreve dois hinos védicos referentes a Vaiśvadeva. Quando com­pletarem o sacrifício e estiverem se dirigindo aos planetas celestiais, os grandes sábios te darão o restante do dinheiro que receberam no sacrifício. Portanto, vai imediatamente para lá.” Tendo Nābhā­ga procedido exatamente de acordo com o conselho de seu pai, os grandes sábios da dinastia Aṅgirā deram-lhe toda a sua riqueza e, então, dirigiram-se aos planetas celestiais.
VERSO 6:
Em seguida, enquanto Nābhāga tomava posse das riquezas, uma pessoa de tez negra, proveniente do norte, dirigiu a ele as seguintes palavras: “Toda a riqueza desta arena de sacrifícios pertence a mim.”
VERSO 7:
Então, Nābhāga disse: “Estas riquezas pertencem a mim. As personalidades santíssimas entregaram-nas a mim.” Quando Nābhāga disse isso, a pessoa de tez negra respondeu: “Procedamos até o teu pai, para que ele resolva nossa desavença.” Aceitando a sugestão, Nābhāga perguntou ao seu pai.
VERSO 8:
O pai de Nābhāga disse: Tudo o que sacrificaram na arena do Dakṣa-yajña, os grandes sábios ofereceram ao senhor Śiva como a parte que lhe cabia. Portanto, tudo na arena de sacrifícios decerto pertence ao senhor Śiva.
VERSO 9:
Em seguida, após oferecer reverências ao senhor Śiva, Nābhāga disse: Ó senhor adorável, tudo nesta arena de sacrifício é teu. Esta é a afirmação de meu pai. Agora, com muito respeito, curvo minha cabeça diante de ti, suplicando tua misericórdia.
VERSO 10:
O senhor Śiva disse: Tudo o que teu pai disse é verdade, e também estás falando a mesma verdade. Portanto, eu, que conheço os mantras védicos, explicarei a ti o conhecimento transcendental.
VERSO 11:
O senhor Śiva disse: “Agora, podes pegar toda a riqueza que sobrou no sacrifício, pois eu a entrego a ti.” Após dizer isso, o senhor Śiva, que é o mais grandioso adepto dos princípios religiosos, desapareceu daquele lugar.
VERSO 12:
Se alguém, com muita atenção, ouve e canta ou lembra esta narração de manhã e à tardinha, ele decerto torna-se erudito, experiente na compreensão dos hinos védicos e hábil em autorrealização.
VERSO 13:
De Nābhāga, nasceu Mahārāja Ambarīṣa. Mahārāja Ambarīṣa era um devoto muito elevado, célebre por seus grandes méritos. Embora amaldiçoado por um brāhmaṇa infalível, a maldição não o atingiu.
VERSO 14:
O rei Parīkṣit perguntou: Ó grande personalidade, Mahārāja Ambarīṣa­ decerto era muito glorioso e tinha um caráter exemplar. Desejo ouvir a respeito dele. Quão surpreendente é que a maldição lançada por um brāhmaṇa, a qual é inapelável, não tenha conseguido atingi-lo.
VERSOS 15-16:
Śukadeva Gosvāmī disse: Mahārāja Ambarīṣa, a mais afortuna­da das personalidades, governava o mundo inteiro, que consistia em sete ilhas, e alcançou uma opulência inexaurível e ilimitada e prospe­ridade na Terra. Embora essa posição raramente seja obtida, Mahā­rāja Ambarīṣa não se importava nem um pouco com isso, pois sabia muito bem que toda essa opulência era material. Como algo imaginado em um sonho, tal opulência, por fim, será destruída. O rei sabia que qualquer não-devoto que conseguisse essa opulência mergulharia cada vez mais no modo da escuridão encontrado na natureza material.
VERSO 17:
Mahārāja Ambarīṣa era um grande devoto da Suprema Personalidade de Deus, Vāsudeva, e das pessoas santas que são devotos do Senhor. Devido a essa devoção, ele julgava todo o universo tão insignificante como um fragmento de pedra.
VERSOS 18-20:
Mahārāja Ambarīṣa sempre ocupava sua mente em meditar nos pés de lótus de Kṛṣṇa, suas palavras em descrever as glórias do Senhor, suas mãos em limpar o templo do Senhor, e seus ouvidos em ouvir as palavras faladas por Kṛṣṇa ou sobre Kṛṣṇa. Ocupava seus olhos em ver a Deidade de Kṛṣṇa, o templo de Kṛṣṇa e as residências de Kṛṣṇa, tais como Mathura e Vṛndāvana. Ocupava seu sentido tátil em tocar os corpos dos devotos do Senhor, seu sentido olfativo em cheirar a fragrância da tulasī oferecida ao Senhor, e sua língua em saborear a prasāda do Senhor. Ele ocupava suas pernas em caminhar aos lugares sagrados e templos do Senhor, sua cabeça em prostrar­-se diante do Senhor, e todos os seus desejos em servir ao Senhor, vinte e quatro horas por dia. Na verdade, Mahārāja Ambarīṣa nunca desejava nada para o gozo de seus sentidos, senão que ocupava todos os seus sentidos em serviço devocional ou em várias tarefas relacionadas com o Senhor. É através desse processo que alguém pode aumentar seu apego ao Senhor e se livrar inteiramente de todos os desejos ma­teriais.
VERSO 21:
Como rei, Mahārāja Ambarīṣa, na realização de seus deveres pres­critos, sempre oferecia os resultados de suas atividades régias à Su­prema Personalidade de Deus, Kṛṣṇa, que é o desfrutador de tudo e ultrapassa a percepção dos sentidos materiais. Ele certamente con­sultava os brāhmaṇas que eram devotos fiéis do Senhor e, portanto, governava o planeta Terra sem dificuldades.
VERSO 22:
Nas regiões desérticas, por onde fluía o rio Sarasvati, Mahārāja Ambarīṣa realizou grandes sacrifícios, tais como o aśvamedha-yājña, e com isso satisfez o mestre de todos os yajñas, a Suprema Perso­nalidade de Deus. Esses sacrifícios foram realizados com grande opulência e com a parafernália adequada, e foram dadas contribuições de dakṣiṇa aos brāhmaṇas, que eram supervisionados por grandes personalidades como Vasiṣṭha, Asita e Gautama, representando o rei, o realizador dos sacrifícios.
VERSO 23:
No sacrifício organizado por Mahārāja Ambarīṣa, os membros da assembleia e os sacerdotes (especialmente hotā, udgātā, brahmā e adhvaryu) estavam vestidos com muito esmero, e todos pareciam verdadeiros semideuses. Eles zelavam ansiosamente pela adequada realização do yajña.
VERSO 24:
Os cidadãos do Estado de Mahārāja Ambarīṣa estavam habitua­dos a cantar e ouvir as gloriosas atividades da Personalidade de Deus. Assim, eles nunca aspiravam a serem elevados aos planetas celestiais, que são extremamente queridos até mesmo pelos semideuses.
VERSO 25:
Aqueles que transbordam de felicidade transcendental decorrente do fato de prestarem serviço à Suprema Personalidade de Deus não se interessam nem mesmo pelas conquistas alcançadas pelos grandes místicos, pois essas conquistas não aumentam a bem-aventurança transcendental sentida pelo devoto que sempre pensa em Kṛṣṇa no âmago de seu coração.
VERSO 26:
Então, o rei deste planeta, Mahārāja Ambarīṣa, prestou serviço devocional ao Senhor e, neste ensejo, praticou rigorosas austeridades. Sempre satisfazendo a Suprema Personalidade de Deus com suas atividades constitucionais, ele, pouco a pouco, abandonou todos os desejos materiais.
VERSO 27:
Mahārāja Ambarīṣa abandonou todo o apego a afazeres domésti­cos, esposas, filhos, amigos e parentes, aos mais poderosos elefantes, a belas quadrigas, carruagens, cavalos e joias inexauríveis e a ornamentos, roupas e um tesouro inesgotável. Desapegou-se de tudo, considerando tudo isso temporário e material.
VERSO 28:
Estando muito satisfeito com a devoção imaculada de Mahārāja Ambarīṣa, a Suprema Personalidade de Deus conferiu ao rei o Seu disco, que terrifica os inimigos e sempre protege o devoto, defendendo-o dos inimigos e das adversidades.
VERSO 29:
Para adorar o Senhor Kṛṣṇa, Mahārāja Ambarīṣa, juntamente com sua rainha, que era igualmente qualificada, seguiu o voto de Ekādaśī e Dvādaśī por um ano.
VERSO 30:
No mês de Kārtika, após seguir aquele voto por um ano, após jejuar por três noites e após banhar-se no Yamunā, Mahārāja Ambarīṣa adorou a Suprema Personalidade de Deus, Hari, em Madhuvana.
VERSOS 31-32:
Seguindo os princípios reguladores vigentes no mahābhiṣeka, Mahārāja Ambarīṣa, munido de toda a parafernália, realizou a ceri­mônia que consiste em banhar a Deidade do Senhor Kṛṣṇa, após o que vestiu a Deidade com roupas finas, adornos, guirlandas de flores fragrantes e outros artigos necessários à adoração ao Senhor. Com atenção e devoção, ele adorou Kṛṣṇa e todos os brāhmaṇas grande­mente afortunados e despojados de desejos materiais.
VERSOS 33-35:
Em seguida, Mahārāja Ambarīṣa satisfez todos os visitantes que chegaram à sua casa, especialmente os brāhmaṇas. Ele deu em cari­dade seiscentos milhões de vacas cujos chifres estavam cobertos de placas de ouro e cujos cascos estavam cobertos de placas de prata. Todas as vacas estavam vestidas com belos trajes e tinham os úberes cheios de leite. Elas eram mansas, novas e belas e estavam acompa­nhadas de seus bezerros. Após dar essas vacas, o rei, em primeiro lugar, alimentou suntuosamente todos os brāhmaṇas, e quando eles estavam inteiramente satisfeitos, ele, com a permissão deles, estava prestes a observar o fim do Ekādaśī, quebrando o jejum. Naquele exato momento, entretanto, Durvāsā Muni, o grande e poderoso místico, apareceu em cena como um visitante inesperado.
VERSO 36 :
Após levantar-se para receber Durvāsā Muni, o rei Ambarīṣa ofe­receu-lhe um assento e parafernália de adoração. Então, sentando-­se aos seus pés, o rei pediu que o grande sábio comesse.
VERSO 37:
Durvāsā Muni aceitou alegremente o pedido de Mahārāja Am­barīṣa, mas, para realizar as cerimônias ritualísticas reguladoras, dirigiu-se ao rio Yamunā. Ali, ele entrou na água do auspicioso Yamunā e meditou no Brahman impessoal.
VERSO 38:
Neste ínterim, restava apenas um muhūrta do dia de Dvādaśī para que se quebrasse o jejum. Consequentemente, era imperativo que o jejum fosse quebrado de imediato. Nessa situação perigosa, o rei consultou os brāhmaṇas eruditos.
VERSOS 39-40:
O rei disse: “Transgredir as leis que determinam como comportar-se respeitosamente com os brāhmaṇas decerto é uma grande ofen­sa. Por outro lado, se a pessoa não quebra o jejum dentro do limite de tempo estabelecido no Dvādaśī, há uma mácula na observância do voto. Portanto, ó brāhmaṇas, se julgardes auspi­cioso e fiel aos princípios religiosos, quebrarei o jejum bebendo água.” Dessa maneira, após consultar os brāmaṇas, o rei tomou essa decisão, pois, de acordo com a opinião bramânica, beber água é um ato que pode ser aceito como comer e também como não comer.
VERSO 41:
Ó melhor membro da dinastia Kuru, após beber um pouco de água, o rei Ambarīṣa, meditando na Suprema Personalidade de Deus situado dentro de seu coração, esperou a volta do grande mís­tico Durvāsā Muni.
VERSO 42:
Após executar as cerimônias ritualísticas a serem realizadas ao meio-dia, Durvāsā retornou das margens do Yamunā. O rei o recebeu muito bem, oferecendo todos os respeitos, mas Durvāsā Muni, através do seu poder místico, pôde entender que o rei Ambarīṣa bebera água sem sua permissão.
VERSO 43:
Ainda faminto, Durvāsā Muni, com seu corpo trêmulo, seu rosto inclinado e suas sobrancelhas crispadas sobre um olhar de reprovação, ele dirigiu as seguintes palavras coléricas ao rei Ambarīṣa, que permane­cia diante dele com as mãos postas.
VERSO 44:
Oh! Vede só o comportamento deste homem cruel! Ele não é de­voto do Senhor Viṣṇu. Estando orgulhoso de sua opulência material e de sua posição, ele se considera o próprio Deus. Vede só como ele transgrediu as leis da religião!
VERSO 45:
Mahārāja Ambarīṣa, como teu visitante, convidaste-me para comer, mas, em vez de servir-me a refeição, comeste primeiro. Devido ao teu mau comportamento, mostrarei algo para punir-te.
VERSO 46:
Logo que Durvāsā Muni disse isso, o seu rosto ficou vermelho de raiva. Arrancando um cacho de cabelo de sua cabeça, ele, para punir Mahārāja Ambarīṣa, criou um demônio parecido com o abrasante fogo da devastação.
VERSO 47:
Tomando um tridente em sua mão e fazendo a superfície da Terra tremer com suas passadas, aquela criatura abrasadora adiantou-se em direção a Mahārāja Ambarīṣa. Mas o rei, ao vê-lo, não se perturbou nem um pouco, e não deu nem mesmo um passo para ar­redar-se de sua posição.
VERSO 48:
Assim como o fogo na floresta imediatamente reduz a cinzas uma serpente irada, do mesmo modo, por ordem prévia da Suprema Personalidade de Deus, Seu disco, o Sudarśana-cakra, a fim de pro­teger o devoto do Senhor, imediatamente reduziu a cinzas o demô­nio criado.
VERSO 49:
Ao ver que seu intento falhara e que o Sudarśana-cakra movia-se em direção a ele, Durvāsā Muni ficou muito aflito e, que­rendo salvar sua vida, começou a correr em todas as direções.
VERSO 50:
Assim como as chamas abrasadoras de um incêndio florestal per­seguem uma serpente, o disco da Suprema Personalidade de Deus começou a perseguir Durvāsā Muni. Durvāsā Muni viu que aquele disco estava quase tocando suas costas e, então, correu bem depressa, buscando a entrada de uma caverna da montanha Sumeru.
VERSO 51:
Simplesmente para proteger-se, Durvāsā Muni fugia por toda parte, partindo rumo a todas as direções – ao céu, à superfície da terra, às cavernas, ao oceano, a diferentes planetas dos governantes dos três mundos, e mesmo aos planetas celestiais –, mas, aonde quer que fosse, imediatamente via o fogo insuportável do Sudarśana-cakra o perseguindo.
VERSO 52:
Com o coração cheio de temor, Durvāsā Muni ia de um lugar a outro buscando por abrigo, mas, não conseguindo encontrar refúgio algum, aproximou-se enfim do senhor Brahmā e disse: “Ó meu senhor, ó senhor Brahmā, por favor, protege-me do abrasador Sudarśana-cakra enviado pela Suprema Personalidade de Deus!”
VERSOS 53-54:
O senhor Brahmā disse: No final do dvi-parārdha, quando os passatempos do Senhor terminam, o Senhor Viṣṇu, com um leve movimento de Suas sobrancelhas, aniquila todo o universo, incluin­do nossas residências. Personalidades tais como eu e o senhor Śiva, e tais como Dakṣa, Bhṛgu e grandes santos semelhantes, dos quais eles são os líderes, e também os governantes das entidades vivas, os governantes da sociedade humana e os governantes dos semideu­ses – todos nos rendemos a essa Suprema Personalidade de Deus, o Senhor Viṣṇu, curvando nossas cabeças, a fim de executarmos Suas ordens para o benefício de todas as entidades vivas.
VERSO 55:
Quando Durvāsā, que estava muito afligido pelo fogo abrasador emitido pelo Sudarśana-cakra, recebeu esta recusa da parte do senhor Brahmā, ele tentou refugiar-se no senhor Śiva, que sempre reside em seu planeta conhecido como Kailāsa.
VERSO 56:
O senhor Śiva disse: Meu querido filho, eu, o senhor Brahmā e os outros semideuses, que, dentro deste universo, vivemos sob a falsa concepção de nossa grandeza, não podemos exibir nenhum poder que nos permita competir com a Suprema Personalidade de Deus, pois os inúmeros universos e seus habitantes passam a existir e são aniquilados pela simples vontade do Senhor.
VERSOS 57-59:
O passado, o presente e o futuro são conhecidos por mim [senhor Śiva], por Sanat-kumāra, por Nārada, pelo reverenciadíssimo senhor Brahmā, por Kapila [o filho de Devahūti], por Apāntaratama [Senhor Vyāsadeva], por Devala, por Yamarāja, Āsuri, Marīci e muitas pessoas santas encabeçadas por ele, bem como muitos outros que alcançaram a perfeição. Entretanto, como estamos encobertos pela energia ilusória do Senhor, não podemos entender quão extensa é essa energia ilusó­ria. Para conseguir aliviar-te, tudo o que podes fazer é aproximar­-te dessa Suprema Personalidade de Deus, pois esse Sudarśana-cakra é intolerável até mesmo para nós. Busca pelo Senhor Viṣṇu. Ele decerto será assaz bondoso para conceder-te toda a boa fortuna.
VERSO 60:
Em seguida, estando desapontado por não obter refúgio nem Mesmo no senhor Śiva, Durvāsā Muni foi até Vaikuṇṭha-dhāma, onde a Suprema Personalidade de Deus, Nārāyaṇa, reside com Sua consorte, a deusa da fortuna.
VERSO 61:
Durvāsā Muni, o grande místico, levemente queimado pela ação do calor que emanava do Sudarśana-cakra, caiu aos pés de lótus de Nārāyaṇa. Com o corpo trêmulo, ele falou o seguinte: Ó infalível e ilimitado Senhor, protetor de todo o universo, sois o único objetivo desejável para todos os devotos! Sou um grande ofensor, meu Senhor! Por favor, protegei-me!
VERSO 62:
Ó meu Senhor, ó controlador supremo, como desconhecia Vossos poderes ilimitados, ofendi Vosso queridíssimo devoto. Fazei o obséquio de salvar-me da reação a esta ofensa. Podeis fazer tudo, pois, mesmo que alguém mereça ir para o inferno, podeis libertá-lo simplesmente despertando em seu coração o santo nome de Vossa onipotência.
VERSO 63:
A Suprema Personalidade de Deus disse ao brāhmaṇa: Estou sob o completo controle de Meus devotos. Na verdade, não sou independente de modo algum. Porque Meus devotos são inteiramente despro­vidos de desejos materiais, situo-Me apenas no âmago de seus corações. Se mesmo aqueles que são devotos do Meu devoto são muito queri­dos a Mim, o que dizer, então, do Meu devoto?
VERSO 64:
Ó melhor dos brāhmaṇas, sem pessoas santas para quem sou o único destino, não desejo desfrutar de Minha bem-aventurança transcendental e de Minhas opulências supremas.
VERSO 65:
Visto que os devotos puros abandonam seus lares, esposas, filhos, parentes, riquezas e mesmo suas vidas simplesmente para servir-Me, sem nenhum desejo de obter progresso material nesta vida ou na próxima, como posso, em momento algum, abandonar tais devotos?
VERSO 66:
Assim como, através do serviço, as mulheres castas mantêm seus gentis esposos sob controle, os devotos puros, que são equânimes para com todos e inteiramente apegados a Mim no âmago de seus corações, mantêm-Me sob seu pleno controle.
VERSO 67:
Se os Meus devotos, que sempre estão satisfeitos em ocupar-se em Meu serviço amoroso, não estão interessados nem mesmo nas quatro classes de liberação [sālokya, sārūpya, sāmīpya e sārṣṭi], embora estas sejam automaticamente alcançadas através do seu serviço, o que dizer, então, de eles se interessarem por felicidades perecíveis, tais como a elevação aos sistemas planetários superiores?
VERSO 68:
O devoto puro sempre está situado no âmago do Meu coração, e Eu sempre estou no coração do devoto puro. Meus devotos conhe­cem apenas a Mim, e Eu só conheço os Meus devotos.
VERSO 69:
Ó brāhmaṇa, por favor, presta atenção enquanto te aconselho acerca de tua própria proteção. Então, ouve-me. Ao ofender Mahā­rāja Ambarīṣa, agiste com inveja egoísta. Portanto, deves imedia­tamente dirigir-te a ele, sem nenhuma demora. Quando utilizado contra um devoto, o aparente poder de alguém decerto acabará pre­judicando aquele que o emprega. Portanto, o agente, e não a vítima, é quem se prejudica.
VERSO 70:
Para um brāhmaṇa, a austeridade e a erudição decerto são auspi­ciosas, mas, quando adquiridas por alguém que não é cortês, essa austeridade e erudição são muito perigosas.
VERSO 71:
Portanto, ó melhor dos brāhmaṇas, deves imediatamente ir ter com o rei Ambarīṣa, o filho de Mahārāja Nābhāga. Desejo-te toda a boa fortuna. Se conseguires satisfazer Mahārāja Ambarīṣa, haverá paz em teu caminho.